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Reflexões sobre resiliência empresarial, governança corporativa e responsabilidade social

O mundo empresarial de hoje enfrenta um panorama de desafios e oportunidades sem precedentes. Neste editorial, exploramos a interconexão crítica entre três pilares fundamentais para o sucesso e a sustentabilidade das organizações modernas: resiliência empresarial, governança corporativa e responsabilidade social. A sinergia entre estes elementos é essencial para a criação de empresas robustas, adaptáveis e socialmente responsáveis (Zaman et al. 2022Zaman, R., Jain, T., Samara, G., & Jamali, D. (2022). Corporate governance meets corporate social responsibility: Mapping the interface. Business & Society, 61(3), 690-752. https://doi.org/10.1177/0007650320973415
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No atual cenário global, marcado por incertezas econômicas, transformações tecnológicas e crises socioambientais, a resiliência empresarial tornou-se uma habilidade indispensável. Empresas resilientes não apenas sobrevivem às adversidades, também aprendem, adaptam-se e prosperam diante delas. A capacidade de resiliência é crucial para a longevidade e o sucesso no ambiente de negócios volátil atualmente (Irigaray & Stocker, 2022Irigaray, H. A. R., & Stocker, F. (2022). ESG: novo conceito para velhos problemas. Cadernos EBAPE.BR, 20(4), 1-4. https://doi.org/10.1590/1679-395186096
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A governança corporativa eficaz é o alicerce sobre o qual a resiliência empresarial é construída. Práticas sólidas de governança asseguram a transparência, a ética e a responsabilidade; elementos fundamentais para ganhar a confiança dos stakeholders e para a tomada de decisões ágeis e informadas em tempos de crise (Oliveira & Fontes, 2021Oliveira, F. B., & Fontes, J. R. Filho. (2021). Mudanças nas configurações de governança corporativa e relações de agência: uma análise longitudinal em empresa de capital fechado. Cadernos EBAPE.BR, 19(3), 510-523. https://doi.org/10.1590/1679-395120200107
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A responsabilidade social corporativa deixou de ser uma opção para se tornar uma necessidade entre empresas que buscam sustentabilidade de longo prazo. O investimento em práticas socialmente responsáveis não é apenas um imperativo ético, mas também uma estratégia inteligente de negócios, visto que consumidores e investidores estão cada vez mais inclinados a apoiar empresas que demonstram um compromisso genuíno com questões sociais e ambientais (Gull et al., 2023Gull, A. A., Hussain, N., Khan, S. A., Khan, Z., & Saeed, A. (2023). Governing corporate social responsibility decoupling: The effect of the governance committee on corporate social responsibility decoupling. Journal of Business Ethics, 185(2), 349-374. https://doi.org/10.1007/s10551-022-05181-3
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A resiliência empresarial e a governança corporativa estão intrinsecamente ligadas. Uma governança forte cria um ambiente no qual a resiliência pode florescer por meio de estruturas robustas de tomada de decisão, políticas claras e uma cultura de responsabilidade e transparência com os diversos stakeholders (Bridoux & Stoelhorst, 2022Bridoux, F., & Stoelhorst, J. W. (2022). Stakeholder governance: Solving the collective action problems in joint value creation. Academy of Management Review, 47(2), 214-236. https://doi.org/10.5465/amr.2019.0441
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A Responsabilidade Social Empresarial (RSE) reforça a resiliência ao construir uma base sólida de confiança e apoio mútuos entre a empresa e seus stakeholders. Empresas que priorizam a RSE tendem a desfrutar de maior lealdade do cliente e engajamento dos funcionários, ambos cruciais para a recuperação e adaptação em tempos de crise.

Integrar resiliência, governança e responsabilidade social requer uma abordagem holística da estratégia empresarial. Isso implica adotar políticas e práticas específicas e, ao mesmo tempo, cultivar uma cultura organizacional que valorize a adaptabilidade, a ética e o compromisso social (Gull et al., 2023Gull, A. A., Hussain, N., Khan, S. A., Khan, Z., & Saeed, A. (2023). Governing corporate social responsibility decoupling: The effect of the governance committee on corporate social responsibility decoupling. Journal of Business Ethics, 185(2), 349-374. https://doi.org/10.1007/s10551-022-05181-3
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Líderes empresariais enfrentam o desafio de equilibrar essas três dimensões em um ambiente empresarial cada vez mais complexo e dinâmico. No entanto, esse equilíbrio oferece oportunidades significativas para inovação, crescimento sustentável e liderança no mercado. Empresas que efetivamente integram a resiliência empresarial, a governança corporativa e a responsabilidade social em suas operações estão mais bem posicionadas ante os desafios futuros. Essa integração, além de fortalecer a empresa individualmente, contribui para a saúde e sustentabilidade do ecossistema empresarial global.

Nesta edição do Cadernos EBAPE.BR, abordamos desde os desafios econômicos impostos pela pandemia até as práticas de compliance e sustentabilidade em um mundo em transformação. Por meio de uma seleção criteriosa de artigos, iluminamos tanto os avanços teóricos quanto as implicações práticas que emergem do encontro da academia com os setores público e privado.

No artigo inaugural “Impacto da COVID-19 nas PMEs no Brasil e drivers de percepção gerencial: um novo modelo neural baseado em funções de utilidade ponderadas pela entropia”, Luiz Gustavo Medeiros Barbosa, Peter Fernandes Wanke,

Jorge Junio Moreira Antunes e Saulo Barroso Rocha investigam o impacto da COVID-19 nas PMEs brasileiras e revelam a resiliência de empresas de serviços e construção. Recorrendo a uma metodologia inovadora, a qual integra funções de utilidade ponderadas pela entropia e regressão de redes neurais, os autores propõem um modelo neural capaz de decifrar a complexa teia de percepções gerenciais. Essa abordagem não apenas abre novas avenidas para a pesquisa em gestão empresarial, mas também sinaliza caminhos para políticas públicas mais eficazes na era pós-pandêmica.

Em “Estrutura do conselho de administração como mecanismo para atingir a Agenda 2030 na América Latina”, o compromisso com a sustentabilidade e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) é meticulosamente examinado por Alan Bandeira Pinheiro, Cintia de Melo de Albuquerque Ribeiro e André Luiz Villagelim Bizerra ao correlacionar a estrutura do conselho de administração com a divulgação dos ODS, os autores oferecem insights valiosos sobre como a alta administração pode influenciar positivamente práticas corporativas sustentáveis. Esse artigo reafirma a importância de uma governança transparente e diversificada como um mecanismo chave para alcançar as metas da Agenda 2030 na América Latina.

Com um foco global, Victoria Barboza de Castro Cunha, Thiago Cavalcante Nascimento e Rodrigo Alves Silva examinam o papel do progresso social na promoção da igualdade de gênero, empregando análise de regressão múltipla para esclarecer esta relação em “Inovação ou progresso social? Uma análise dos fatores preditores para o avanço mundial da igualdade de gênero”. Os autores rompem com a suposição de que a inovação é um impulsionador da igualdade de gênero. Em vez disso, enfatizam o progresso social como um preditor mais significativo. Esse trabalho não só informa os formuladores de políticas, mas também provoca uma reflexão mais ampla sobre os caminhos para o avanço das mulheres na sociedade.

Letícia Gracielle Vieira Ferreira e Cíntia Rodrigues de Oliveira confrontam-nos com a realidade sombria dos crimes estatais-corporativos em “Crimes estatais-corporativos e violações de direitos humanos: um ensaio sobre a relação simbiótica entre Estados e corporações”. As autoras argumentam que tais violações de direitos humanos são um produto de uma relação simbiótica facilitada pela globalização. Esse ensaio traduz-se em um chamado à ação para repensar as estruturas de poder que permitem a normalização da violência e da exploração no capitalismo moderno.

Renata Mendes de Oliveira e Ilse Maria Beuren, em “Estilo cooperativo ou competitivo de gerenciamento de conflitos? Efeitos no compartilhamento de informações e no desempenho de cooperativas agropecuárias”, exploram os efeitos dos estilos cooperativos e competitivos de gerenciamento de conflitos no compartilhamento de informações e no desempenho organizacional. Em um estudo que poderia facilmente ser transposto para outras áreas, descobrem que o estilo cooperativo prevalece, reforçando a importância da colaboração e comunicação para o sucesso organizacional.

Fabio Vizeu conduz-nos a uma reflexão crítica sobre o citacionismo na academia em “Citacionismo como erudição acadêmica e como ação estratégica”. O autor desafia a comunidade científica a ir além da retórica e engajar-se em um discurso acadêmico mais autêntico e menos dominado por jogos de poder.

André Luiz Maranhão de Souza-Leão, Bruno Rafael Torres Ferreira e Bruno Melo Moura, apresentam um estudo intrigante - “Fã cínico: dizendo a verdade sem vergonha” - sobre a dinâmica dos fãs frente à politização do entretenimento, usando o caso de Star Wars para discutir questões de identidade e subjetividade.

Henrique Adriano de Sousa, Gabriela de Abreu Passos, Henrique Portulhak e Sayuri Unoki de Azevedo analisam como as companhias abertas brasileiras responderam ao escândalo da Lava Jato em termos de práticas de compliance em “A evolução na divulgação de práticas de compliance por companhias abertas brasileiras no período Lava Jato”. Com esse artigo, os autores oferecem uma visão reveladora da evolução corporativa diante de crises.

Em “Pirataria intelectual nas práticas de pesquisa em administração”, Marcelo de Souza Bispo e Almir Martins Vieira abordam uma forma sutil de plágio que desafia os padrões éticos na pesquisa. Promovem, assim, um debate necessário sobre a originalidade e integridade na academia.

Henrique Muzzio propicia-nos uma resenha bibliográfica sobre o livro “The Emerald handbook of entrepreneurship in Latin America: unleashing a millennial potential”, na qual destaca o vigoroso potencial empreendedor da região.

Nesta edição, apresentamos dois estudos de casos & ensino. Em “Aceitar ou recusar órgão doado para transplante: o dilema do Dr. Jonas”, Luis Antonio da Rocha Dib, Claudia Affonso Silva Araujo, Joel de Andrade e Mônica Ferreira da Silva colocam-nos diante de um dilema ético no campo da saúde ao ilustrar a complexidade das decisões médicas utilizando-se de um caso de transplante de rim.

Eduardo Russo e Ariane Roder Figueira concluem esta edição com um estudo de caso & ensino sobre os desafios de sustentabilidade enfrentados pela marca brasileira Melissa em sua expansão internacional em “O caso Melissa: desafios de sustentabilidade para a expansão internacional de uma marca brasileira de sandálias plásticas”.

Com estes artigos, a edição atual busca alimentar o diálogo interdisciplinar e fomentar uma compreensão mais profunda das múltiplas dimensões da administração, da responsabilidade social e da ética empresarial. Convidamos nossos leitores a se juntarem a nós nesta jornada de descoberta e reflexão.

Boa leitura!

REFERÊNCIAS

  • Bridoux, F., & Stoelhorst, J. W. (2022). Stakeholder governance: Solving the collective action problems in joint value creation. Academy of Management Review, 47(2), 214-236. https://doi.org/10.5465/amr.2019.0441
    » https://doi.org/10.5465/amr.2019.0441
  • Gull, A. A., Hussain, N., Khan, S. A., Khan, Z., & Saeed, A. (2023). Governing corporate social responsibility decoupling: The effect of the governance committee on corporate social responsibility decoupling. Journal of Business Ethics, 185(2), 349-374. https://doi.org/10.1007/s10551-022-05181-3
    » https://doi.org/10.1007/s10551-022-05181-3
  • Irigaray, H. A. R., & Stocker, F. (2022). ESG: novo conceito para velhos problemas. Cadernos EBAPE.BR, 20(4), 1-4. https://doi.org/10.1590/1679-395186096
    » https://doi.org/10.1590/1679-395186096
  • Oliveira, F. B., & Fontes, J. R. Filho. (2021). Mudanças nas configurações de governança corporativa e relações de agência: uma análise longitudinal em empresa de capital fechado. Cadernos EBAPE.BR, 19(3), 510-523. https://doi.org/10.1590/1679-395120200107
    » https://doi.org/10.1590/1679-395120200107
  • Zaman, R., Jain, T., Samara, G., & Jamali, D. (2022). Corporate governance meets corporate social responsibility: Mapping the interface. Business & Society, 61(3), 690-752. https://doi.org/10.1177/0007650320973415
    » https://doi.org/10.1177/0007650320973415

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Mar 2024
  • Data do Fascículo
    2024
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