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Editorial

EDITORIAL

Este número dos Cadernos EBAPE.BR encerra o segundo volume do periódico. É com satisfação que constato que em dois anos de atividade, em seu novo formato, a revista tem atingido um grande público leitor, que cresce cada vez mais.

O trabalho que vem sendo realizado, e que enfatizo não ser exclusivamente meu, mas de toda a equipe da revista, tem sido reconhecido pela comunidade acadêmica, o que pode ser observado na aceitação da revista no sistema de classificação Qualis da Capes e na sua indexação em outras fontes de informação como, por exemplo, o Canal Ciência.

Como este é o número de encerramento de 2004 gostaria de reforçar aqui que esta revista dedica-se prioritariamente a questões teóricas, a trabalhos de natureza qualitativa e, fundamentalmente, a ensaios críticos e opinativos com base científica. Ressalto a importância de se ter na academia brasileira um espaço dedicado à possibilidade de tomada de posição dos autores em relação aos fatos administrativos, organizacionais e sociais, respeitados, evidentemente, os critérios de qualidade acadêmica. Quero deixar aqui explícita a disposição deste periódico em aceitar sem "pré-conceitos" trabalhos que fujam aos ditames do dogmatismo positivista, que isenta o pesquisador de responsabilidade sobre seu trabalho. Acredito que, por trabalharmos com uma ciência social (aplicada, mas fundamentalmente social) como a Administração, e ainda mais, em um país que está longe se ser um exemplo de sociedade justa, não podemos nos dedicar a simples reprodução de modelos gerados e legitimados nos centros mundiais de produção do conhecimento sem uma avaliação crítica a respeito dos efeitos de sua aplicabilidade na nossa realidade.

Alguns dos trabalhos aqui apresentados incorporam mais esse espírito da crítica, outros menos. O importante é explicitar este espaço como um espaço de debate, tão salutar para o desenvolvimento de nossa academia e de nossa sociedade.

O primeiro artigo, de Jésus Gomes e José Carlos Barbieri, analisa a questão da gestão de recursos hídricos no Brasil e, particularmente, no estado de São Paulo. Os autores introduzem o artigo com uma descrição da situação atual dos recursos hídricos no Brasil e no mundo, salientando sua importância, e passam, a seguir, a desenvolver uma análise da questão da gestão das águas tendo por base o Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos, com destaque para os comitês de bacias hidrográficas. Finalizam o trabalho com uma discussão acerca dos conflitos sócio-ambientais na condução dos comitês e os problemas de interface desses com o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.

O segundo artigo versa sobre o mesmo tema. Entretanto, Márcia Pizaia, Rosane Alves, Márcia Câmara, Antônio Jungles, Márcia Godoy e Rita Gomes põem o foco de sua análise na política pública relativa ao sistema de regulação dos recursos hídricos, afirmando que embora haja dificuldades em avaliar como a relação entre política e regulação funcionará na prática fica evidente o poder atribuído aos órgãos reguladores no sistema.

Carlos Alberto Ciose, no terceiro artigo, realiza um esforço propositivo que, quero salientar, é bastante oportuno. Com base em elementos teóricos de gestão organizacional, espaço local, arranjo institucional e dimensões de sustentabilidade, o autor constrói um modelo de gestão que promove o desenvolvimento sustentável que denomina SiGOS. O modelo é baseado em três tipos de ação: a política, a técnica e a ética. Como todo o esforço propositivo, este também deve gerar polêmica, saudável à nossa academia, que vem se acostumando a uma situação cada vez maior de conformidade ao conhecimento já estabelecido, caracterizada pela ausência de debate.

O quatro artigo deste número é de Fernando Dias Lopes. Nele o autor também apresenta um modelo, sendo que aqui trata-se de um esforço teórico para a compreensão de alianças estratégicas internacionais do tipo joint ventures. O modelo utiliza fundamentos teóricos de três importantes teorias da área de Estudos Organizacionais: a teoria institucional, a teoria dos custos de transação e a teoria da dependência de recursos.

Saindo da questão exclusivamente teórica e visitando o mundo empírico das organizações contemporâneas, Rosimeri Carvalho e Eloise Dellagnelo, no quinto artigo, analisam o processo de formação de uma rede de organizações não-governamentais ligadas ao desenvolvimento ou recuperação da cidadania por meio da arte. As autoras concluem que há um direcionamento na formação de gestores de ONGs que trabalham com atividades culturais no sentido da disseminação do modelo empresarial de gestão. Ainda, que esse direcionamento é fortemente orientado por um dos atores componentes da rede que detém um grande volume de recursos de poder.

O sexto artigo é assinado por Félix Rossato Neto e Neusa Cavedon. Por meio de uma etnografia, os autores analisam a configuração do mercado público de Porto Alegre, uma instituição centenária, com foco no processo de sucessão. Os autores descrevem detalhadamente o papel de pais, mães, filhos e filhas na condução dos negócios e os conflitos geracionais que se desenvolvem a partir da necessidade de sucessão.

Paulo Vilarinho, no sétimo artigo, descreve e analisa o campo da saúde suplementar no Brasil, à luz da teoria do poder de Pierre Bourdieu. Após extensiva contextualização histórica sobre a formação e desenvolvimento do campo, o autor explicita uma série de fatores que poderão elitizar o acesso aos serviços de saúde suplementar, o que, futuramente, representará um grave problema para esse segmento da política social do governo brasileiro.

O oitavo artigo, que fecha este número da revista, é de autoria de Paulo Jatahy. O autor analisa de maneira criativa a criação do que ele chama de "mito da eficácia" no Banco Central do Brasil, no que se refere à administração da política econômica. Para tanto, Jatahy lança mão da noção de poder simbólico e do conceito de gerenciamento de impressões.

Este número, que encerra o ano de 2004 e o segundo ano de atuação da revista em seu novo formato, traz duas resenhas que apresento com grande prazer. A primeira é de autoria de Enrique Saravia sobre o livro "Sobreviver ao Trabalho", de Hermano Thiry-Cherques. Aqui, o prazer em apresentar tal resenha é duplo, pois tanto o autor da resenha quanto o autor do livro são renomados professores da EBAPE/FGV, com uma carreira acadêmica nacional e internacional respeitável e, permitam-me dizer, invejável. A segunda resenha é escrita por Débora Dourado, a respeito do livro "Metamorfoses do Trabalho: crítica à razão econômica", de André Gorz. Aqui, o prazer em apresentar essa resenha deve-se, fundamentalmente, a sua autora, de quem fui colega quando professor no Departamento de Ciências Administrativas da Universidade Federal de Pernambuco. Hoje, como pesquisadora do Observatório da Realidade Organizacional, grupo interinstitucional de pesquisa do qual sou coordenador na unidade que opera na EBAPE, Débora Dourado me presenteia com o prazer de um convívio intelectual rico e instigante.

Boa leitura a todos!

Marcelo Milano Falcão Vieira

Editor

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Jul 2012
  • Data do Fascículo
    Dez 2004
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