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Candangos: teoria da reconstrução ocupacional como uma ferramenta para a compreensão de problemas sociais e ações transformativas na utópica cidade de Brasília

Resumo

O ensino de uma agenda de transformação social nos cursos de terapia ocupacional nas universidades brasileiras é um projeto em andamento. Neste artigo: (1) introduzimos a teoria de Reconstrução Ocupacional; (2) contextualizamos a situação dos candangos – que são aqueles que construíram a utópica nova capital do Brasil, Brasília – com base na literatura; (3) descrevemos esforços para expandir a temática da inclusão social na Universidade de Brasília, Brasil; e (4) discutimos como a reconstrução ocupacional serviu de estrutura para o ensino, a pesquisa e a prática. A teoria de Reconstrução Ocupacional explica a transformação social como parte da filosofia e do conhecimento de base “ocupacional”. A teoria foi útil para orientar as experiências dos alunos e alcançar resultados de aprendizagem. Durante o curso, os alunos começaram a recontar suas próprias histórias, dialogando com seus familiares mais velhos para conhecer como os candangos lidavam com condições sociais problemáticas nos primeiros dias de Brasília. Eles foram desafiados a apresentar um caso de Reconstrução Ocupacional em forma de literatura de cordel – um livreto impresso de baixo custo; assim, movendo as histórias dos candangos para a esfera pública. O artigo conclui com uma reflexão crítica sobre as vantagens, limitações e possíveis aplicações futuras em currículos.

Palavras-chave:
Teoria Crítica; Terapia Ocupacional; Educação Superior

Abstract

Teaching an occupational therapy agenda of social transformation in Brazilian universities is an ongoing project. In this article we (1) Introduce the theory of occupational reconstructions; (2) Contextualize the candangos ’ – those who built the country’s new utopian Brazilian capital, Brasília - situation based on published literature; (3) Describe reforms to expand social inclusion at University of Brasília, Brazil; and (4) Discuss how occupational reconstruction served as a frame for teaching, research and practice. Occupational reconstruction theory explains social transformation as part of the philosophy and knowledge base of ‘occupation’. The theory was useful to guide the students’ experiences and reach learning outcomes. During the course, students began by recounting their histories while also contacting their elders to find out how the candangos dealt with problematic social conditions in Brasília’s early days. They were challenged to present a case of the occupational reconstruction as an example of literatura de cordel – a low-budget printed booklet ; thus, moving the candangos’ stories into the public sphere. The paper concludes with a critical reflection on the advantages, limitations, and possible future applications of the curriculum.

Keywords:
Critical Theory; Occupational Therapy; Higher Education

1 Introdução

Ensinar sobre transformação social no curso de Terapia Ocupacional nas universidades brasileiras é um desafio, apesar de haver profissionais que falam da necessidade de pesquisa, estudo e práticas voltadas para a exclusão social e a marginalização ( Emmel et al., 2015Emmel, M., Cruz, D., & Figueiredo, M. (2015). An historical overview of the development of occupational therapy educational institutions in Brazil. South African Journal of Occupational Therapy , 45 (2), 63-67. ; Emmel, 2003Emmel, M. L. G. (2003). Atuação da terapia ocupacional no processo de inclusão social: implicações da formação na prática profissional. In M. C. Marquezine, M. A. Almeida, E. D. O. Tanaka, R. M. Busto, S. R. Souza, S. M. F. Meletti & D. S. Fujisawa (Eds.), Inclusão (pp. 295-309). Londrina: Editora Universidade de Londrina. ; Galheigo, 2011Galheigo, S. M. (2011). What needs to be done? Occupational therapy responsibilities and challenges regarding human rights. Australian Occupational Therapy Journal , 58 , 60-66. ; Lopes & Malfitano, 2016Lopes, R. E., & Malfitano, A. P. S. (2016). Terapia ocupacional social: desenhos teóricos e contornos práticos. In: R. E. Lopes & A. P. S. Malfitano (Org.), Terapia Ocupacional Social: desenhos teóricos e contornos práticos (p. 17-28). São Carlos: EDUFSCar. ; Santos, 2017Santos, V. (2017). Occupational therapy across South America: an overview of its backgrounds, current situation and some contemporary issues. In D. Sakellariou & N. Pollard (Eds.), Occupational therapies without borders: integrating justice with practice (pp. 203-209). Edinburgh: Elsevier Science. ; Farias et al., 2019Farias, L., Laliberte Rudman, D., Pollard, N., Schiller, S., Serrata Malfitano, A. P., Thomas, K., & van Bruggen, H. (2019). Critical dialogical approach: a methodological direction for occupation-based social transformative work. Scandinavian Journal of Occupational Therapy , 26 (4), 235-245. ; Farias & Rudman, 2019Farias, L., & Rudman, D. L. (2019). Challenges in enacting occupation-based social transformative practices: A critical dialogical study. Canadian Journal of Occupational Therapy , 86 (3), 243-252. ). A fim de abordar sobre esse problema, em 2017, um currículo experimental, inspirado na teoria da Reconstrução Ocupacional, foi inserido na Universidade de Brasília, Faculdade de Ceilândia (FCE) ( Frank & Santos, 2020Frank, G., & Santos, V. (2020). Occupational reconstructions: resources for social transformation in challenging times. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional , 28 (2), 1-5. http://dx.doi.org/10.4322/2526-8910.ctoED2802.
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; Mizue, 2019Mizue, A. (2019). Reconstrução ocupacional: experiências no Distrito Federal (Bachelor’s thesis). Universidade de Brasília, Brasília. ). Ceilândia foi fundada por trabalhadores imigrantes, um assentamento periférico na cidade utópica de Brasília, cuja história é marcada por racismo, pobreza, violência, e habitação inadequada ( Martins, 2015Martins, A. C. S. (2015). Perfil dos catadores de materiais recicláveis do Distrito Federal: uma análise comparativa entre Associações de Ceilândia e Estrutural-DF (Monografia de Bacharelado). Universidade de Brasília, Ceilândia. ; Tavares, 2005Tavares, B. L. (2005). Feira do rolo na pedagogia da malandragem: memória e representações sociais no espaço urbano de Ceilândia-DF. Sociedade e Estado , 20 , 271-272. , 2009Tavares, B. L. (2009). Na quebrada, a parceria é mais forte - Juventude hip-hop: relacionamento e estratégias contra a discriminação na periferia do Distrito Federal (Tese de doutorado). Universidade de Brasília, Brasília. ).

A teoria de Reconstrução Ocupacional foi selecionada para se alinhar com os objetivos emancipatórios das “epistemologias do sul” na terapia ocupacional ( Guajardo et al., 2015Guajardo, A., Kronenberg, F., & Ramugondo, E. L. (2015). Southern occupational therapies: emerging identities, epistemologies and practices. South African Journal of Occupational Therapy , 45 (1), 3-10. http://dx.doi.org/10.17159/2310-3833/2015/v45no1a2.
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). O currículo focava no aprendizado interativo e dialógico dos alunos da FCE, filhas e netas de candangos que construíram a nova capital utópica, Brasília, nos anos de 1950. Assim, este artigo tem como objetivo: (1) apresentar a teoria das reconstruções ocupacionais; (2) contextualizar a situação dos candangos com base na literatura existente; (3) descrever reformas para expandir a inclusão social na Universidade de Brasília; e (4) discutir como a reconstrução ocupacional serviu como um molde para o ensino, pesquisa e prática. Este artigo é concluído com uma reflexão crítica em relação às vantagens, limitações e possíveis aplicações futuras do currículo.

1.1 Epistemologias do sul e a teoria de reconstrução ocupacional

A ideia de “epistemologia do sul” não é estritamente geográfica, mas mapeia as condições de exclusão criadas pelo capitalismo, colonialismo, racismo e patriarcado onde quer que elas existam ( Guajardo et al., 2015Guajardo, A., Kronenberg, F., & Ramugondo, E. L. (2015). Southern occupational therapies: emerging identities, epistemologies and practices. South African Journal of Occupational Therapy , 45 (1), 3-10. http://dx.doi.org/10.17159/2310-3833/2015/v45no1a2.
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). O filósofo Boaventura de Sousa Santos (2018)Santos, B. (2018). Why the epistemologies of the south? The end of the cognitive empire: the coming of age of epistemologies of the South . Durham: Duke University Press. , criador do conceito das “epistemologias do sul”, descreve que essas epistemologias têm que proceder de acordo com o que ele chama de sociologia das ausências, que quer dizer tornar conteúdos ausentes em conteúdos presentes como uma condição primordial para a identificação e validação de conhecimentos que podem reinventar a emancipação e a liberação social. A teoria de Reconstrução Ocupacional se alinha às “epistemologias do sul” por conta da transparência ou da falta de seus pressupostos, mas, além disso, devido ao seu interesse em apoiar a capacidade das pessoas marginalizadas para que sejam libertas.

A teoria de Reconstrução Ocupacional explica a transformação social como parte da filosofia e conhecimento base da “ocupação” ( Frank & Santos, 2020Frank, G., & Santos, V. (2020). Occupational reconstructions: resources for social transformation in challenging times. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional , 28 (2), 1-5. http://dx.doi.org/10.4322/2526-8910.ctoED2802.
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; Baranek et al., 2020Baranek, G. T., Frank, G., & Aldrich, R. M. (2020). Meliorism and knowledge mobilization: past, present, and future possibilities for occupational science. Journal of Occupational Science . No prelo. ). Ela foca na ação coletiva como uma expressão de um desejo compartilhado de melhorar situações por meio do “fazer alguma coisa em relação a algo”, ou seja, por meio do engajamento ativo e de práticas de mente-corpo ( Frank, 2013Frank, G. (2013). Twenty-first century pragmatism and social justice: problematic situations and occupational reconstructions in post-civil war Guatemala. In M. Cutchin & V. Dickie (Eds.), Transactional perspectives on occupation (pp. 229-243). Dordrecht: Springer. http://dx.doi.org/10.1007/978-94-007-4429-5_18. , 2017Frank, G. (2017). Collective occupations and social transformations: a mad hot curriculum. In N. Pollard & D. Sakellariou (Eds.), Occupational therapies without borders: integrating justice with practice (pp. 596-604). Edinburgh: Elsevier Press. , 2020Frank, G. (2020). Social transformation theory and practice: resources for radicals in participatory art, occupational therapy and social movements. In H. Van Bruggen, S. Kantartzis & N. Pollard (Eds.), And a seed was planted (pp. 107-128). London: Whiting & Birch. ; Frank & Muriithi, 2015Frank, G., & Muriithi, B. (2015). Theorising social transformation in occupational science: the American Civil Rights Movement and South African struggle against apartheid as ‘Occupational Reconstructions’. South African Journal of Occupational Therapy , 45 , 11-19. ). Uma heurística de trabalho inclui os seguintes elementos inter-relacionados: (1) A situação problemática identificada por atores sociais; (2) As ocupações coletivas – ou seja, os tipos de “fazeres” ou ação – envolvidas em seus esforços mútuos; (3) As práticas de mente-corpo que incluem suas participações nessas ocupações; (4) A dimensão narrativa de histórias que permite a participantes alinhar suas ações e que estrutura suas participações como um evento no tempo; (5) As possibilidades criativas que surgem quando ações coletivas interrompem hábitos de pensar e fazer; (6) O desejo de auto-organização, ou motivação intrínseca , de fazer algo em relação a alguma coisa; e (7) O senso de esperança diante do risco e resultados indeterminados quando a autoridade e poder são reivindicados.

1.2 A situação dos candangos: o subdesenvolvimento na utopia

Os candangos recrutados para o interior remoto para a construção da nova capital, Brasília, nos anos 1950, ainda permanecem na zona de exclusão social. Como os historiadores Luiz & Kuyumjian (2010Luiz, E. B., & Kuyumjian, M. M. M. (2010). Candangos: uma história de trabalho e exclusão. Revista Tempos Históricos , 14 (1), 257-279. , p. 257) apontam, Brasília foi construída em uma atmosfera de euforia com base nos países de desenvolvidos, “[...] onde o capitalismo rendia generosos dividendos sociais, fazendo com que o sonho de consumo se transformasse em uma extasiante realidade”. Assim foi iniciada a “Era de Ouro” no Brasil (1950-1960), sob o governo do presidente Juscelino Kubitschek, uma mudança do mercado da economia agrícola para os ideais de modernidade, industrialização e progresso social. O trabalho dos candangos ajudou a fazer essa mudança possível, mas eles foram excluídos dos ganhos de tal ação.

1.3 Construindo uma cidade utópica; 1957-1960

Kubitscheck guiou o projeto de mudar a capital do ambiente cheio e agitado do Rio de Janeiro para o remoto planalto central do país e de criar um Distrito Federal completamente novo, de acordo com um plano preciso, detalhado e racional ( Kubitschek, 1975Kubitschek, J. (1975). Por que construí Brasília . Brasília: Bloch. ). Os candangos foram essenciais para essa visão política e de engenharia e arquitetura expansiva. Uma enorme força de trabalho foi necessária para construir a nova capital, começando com a tarefa de remoção da vegetação do ecossistema local, o cerrado. Os trabalhadores foram facilmente recrutados, vindos de estados vizinhos, principalmente do nordeste do país, devido às condições de desemprego e pobreza ( Goldsmith & Wilson, 1991Goldsmith, W. W., & Wilson, R. (1991). Poverty and distorted industrialization in the Brazilian Northeast. World Development , 19 (5), 435-455. ).

Enquanto o projeto oferecia emprego para muitos, os benefícios eram misturados ( Lobo & Sampaio, 2002Lobo, M., & Sampaio, M. (2002). Brasília, da utopia à distopia . São Paulo: Universidade de São Paulo. ). Em 1956, já havia 256 homens das regiões norte e nordeste trabalhando no local da construção. Em 1957, o número de trabalhadores havia crescido para 12.283 e, em 1958, cresceu para cerca de 28.000, com o trabalho de força aumentando para mais de 2.000 homens por mês ( Holston, 1989Holston, J. (1989). The modernist city: an anthropological critique of Brasília . Chicago: University of Chicago Press. ). A moradia era precária, pois os campos autorizados pelo governo não podiam acomodar o inchaço da força de trabalho, uma população exageradamente composta por homens solteiros; apenas 15% eram casados ou tinham família ( Holston, 1989Holston, J. (1989). The modernist city: an anthropological critique of Brasília . Chicago: University of Chicago Press. ). O antropólogo James Holston (1989Holston, J. (1989). The modernist city: an anthropological critique of Brasília . Chicago: University of Chicago Press. , p. 223) descreve o ambiente de fronteira como “[...] uma arena de uma cultura exageradamente masculina de dinheiro abundante, ambição, e desejo reprimido”.

As histórias contadas por candangos atestam as condições de moradia precária e exploração como mão de obra, incluindo salários injustos e o abuso de horas extras de trabalho que causavam acidentes, e “[...] a violenta atuação da improvisada milícia policial da época e o papel de – mito – fundador exercido pelo presidente” ( Luiz & Kuyumjian, 2010Luiz, E. B., & Kuyumjian, M. M. M. (2010). Candangos: uma história de trabalho e exclusão. Revista Tempos Históricos , 14 (1), 257-279. , p. 257). Sob a pressão de completar a construção com seus trabalhos heroicos, a carga de trabalho dos candangos era de 90 horas semanais ( Holston, 1989Holston, J. (1989). The modernist city: an anthropological critique of Brasília . Chicago: University of Chicago Press. ).

1.4 De heróis a invasores, após 1960

Durante o período de construção de Brasília, os candangos foram reconhecidos como os heróis nacionais e construtores da nação, representando os “titãs anônimos” ( Holston, 1989Holston, J. (1989). The modernist city: an anthropological critique of Brasília . Chicago: University of Chicago Press. ). Esse reconhecimento social promoveu a moral dos trabalhadores, dando a eles a sensação de pertencerem ao Distrito Federal e à nação. Dentro do breve período de 1957 a 1960, os candangos construíram o Plano Piloto, o projeto urbano original em formato de um avião ( Figura 1 ). A retórica populista do governo valorizava o projeto como uma rejeição e rompimento com o passado e o substituiu com a promessa de modernidade, industrialização e progresso. No entanto, as condições precárias de trabalho dos candangos ficaram reconhecidas, mas não foram levadas em consideração pelo governo ( Holston, 1989Holston, J. (1989). The modernist city: an anthropological critique of Brasília . Chicago: University of Chicago Press. ; Luiz & Kuyumjian, 2010Luiz, E. B., & Kuyumjian, M. M. M. (2010). Candangos: uma história de trabalho e exclusão. Revista Tempos Históricos , 14 (1), 257-279. ).

Figura 1
Brasília desenhada pelo urbanista Lúcio Costa. Fonte: IPHAN ( Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, 2020Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN (2020). Centro Lucio Costa. Recuperado em 12 de Abril de 2020, de www.iphan.gov.br.
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). Perceba o design, inspirado em um avião, do Plano Piloto com duas “asas” de edifícios abrangentes da praça central. O Plano Piloto se tornou Patrimônio da Humanidade da UNESCO. Brasília, incluindo esse centro e as cidades satélites ao redor, incluindo Ceilândia, agora é classificada como a quarta cidade mais populosa do Brasil.

A exclusão dos trabalhadores já havia sido definida. Diferentemente dos administradores e da classe empresarial designada como os “pioneiros”, os trabalhadores que colocavam os tijolos pertenciam a uma categoria diferente, os candangos ( Laraia, 1996Laraia, R. D. B. (1996). Candangos e pioneiros . Brasília: Departamento de Antropologia, Universidade de Brasília. ). Após a inauguração da capital, no primeiro dia de primavera em 1960, eles foram reconhecidos e marginalizados como força de trabalho de baixa habilidade e desqualificados. Os trabalhadores tinham construído uma cidade onde eles não teriam condições de viver. Assim, a maioria se realocou em áreas próximas, deslocando-se de suas cidades-satélites para trabalhar no centro de Brasília, mas não mais em construções, e sim em outros trabalhos que exigiam menos habilidades e pagavam pouco.

Ceilândia foi uma dessas cidades-satélites, a qual o governo acabou designando como uma região administrativa. Localizada aproximadamente a 40 quilômetros do Plano Piloto, o nome Ceilândia representa precisamente como o estado buscou controlar a população de candangos. O nome é um acrônimo de “Centro de Erradicação de Invasores” com a adição do sufixo -lândia. O pouco interesse político nas cidades satélites resultou em acordos informais de moradia, incluindo bairros construídos pelos moradores, que em seguida as autoridades locais tentaram regularizar.

Ceilândia continuou a crescer com uma nova onda de candangos que se estabeleceram lá em busca de um local onde conseguiriam arcar com o custo de vida. A sua economia e identidade local começaram a se desenvolver ( Tavares, 2005Tavares, B. L. (2005). Feira do rolo na pedagogia da malandragem: memória e representações sociais no espaço urbano de Ceilândia-DF. Sociedade e Estado , 20 , 271-272. , 2017Tavares, B. L. (2017). Mercados informais e sociabilidades urbanas na periferia de brasília: o caso de Ceilândia – DF. Urbe. Revista Brasileira de Gestão Urbana , 1 (1), 23-32. ). Ceilândia é, hoje, uma das maiores cidades do Distrito Federal ( Brasília, 2018Brasília. Companhia de Planejamento do Distrito Federal – CODEPLAN. (2018). Pesquisa distrital por amostra de domícilio 2018 . Brasília. Recuperado em 1 de junho de 2020, de http://www.codeplan.df.gov.br/pdad-2018/
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), com muitos vivendo em favelas. Após 1960, os candangos foram rapidamente redefinidos como o “outro perigoso”, um tipo de invasor permanente que a população privilegiada do Plano Piloto tinha que aprender a tolerar, a conviver perto, sendo uma fonte de trabalho barata e de baixo custo ( Santos et al., 2019bSantos, V., Rodrigues, I. O., & Galvaan, R. (2019b). It is not what I planned for my life: occupations of live-in domestic workers. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional , 27 (3), 467-479. ).

1.5 Ceilândia como uma zona de injustiça, revanchismo e cultura, hoje

Ceilândia é uma parte de um grande problema da crescente desigualdade de riqueza no Brasil e no mundo ( United Nations Educational, Scientific, and Cultural Organization, 2016United Nations Educational, Scientific, and Cultural Organization – UNESCO. International Social Science Council – ISSC. Institute of Development Studies – IDS. (2016). World social science report 2016, challenging inequalities: pathways to a just world . Paris: UNESCO Publishing. ). Por exemplo, entre 2006 e 2012, 1% da população mais rica no Brasil acumulou 28% de toda a renda de crescimento pessoal ( Medeiros, 2016Medeiros, M. (2016). Income inequality in Brazil: new evidence from combined tax and survey data. In United Nations Educational, Scientific, and Cultural Organization – UNESCO. International Social Science Council – ISSC. Institute of Development Studies – IDS. World social science report 2016, challenging inequalities: pathways to a just world (pp. 107-110). Paris: UNESCO Publishing. ). Ceilândia “hospeda” a favela do Sol Nascente, que, de acordo com as notícias nacionais, está no caminho de se tornar a maior favela do país ( Mariz, 2018Mariz, R. (2018, 16 de abril). Sol Nascente, a favela de Brasília que caminha para se tornar a maior do Brasil. Época . ). O investimento do governo existe majoritariamente na forma de respostas paliativas às crises de saúde pública, de educação ou de segurança pública. O Sol Nascente possui apenas uma escola pública e um posto de saúde para mais de 80.000 habitantes ( Santos et al., 2018Santos, V., Dourado, P. H., & Gandolfi, L. (2018). Parents’ use of physical and verbal punishment: cross-sectional study in underprivileged neighborhoods. Jornal de Pediatria , 94 (5), 511-517. ). A Ceilândia é apresentada pela mídia como repleta de crime e um paraíso para os criminosos.

Ceilândia se tornou seu próprio centro para migração interna de pessoas de outros estados, principalmente do nordeste brasileiro, com sua população atingindo cerca de 432.927 pessoas, em comparação com 221.326 pessoas no centro administrativo de Brasília, o Plano Piloto ( Brasília, 2018Brasília. Companhia de Planejamento do Distrito Federal – CODEPLAN. (2018). Pesquisa distrital por amostra de domícilio 2018 . Brasília. Recuperado em 1 de junho de 2020, de http://www.codeplan.df.gov.br/pdad-2018/
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). O resultado tem sido uma cultura urbana híbrida, com um forte componente afro-brasileiro. Os movimentos sociais reafirmando o orgulho negro tem crescido, apurando as dimensões raciais da identidade local e denunciando a violência policial, abandono pelo estado e outras injustiças sociais ( Procopio et al., 2019Procopio, A. S., Lago, M. C. S., & Müller, V. B. (2019). A(s) voz(es) de Ellen Oléria: multiplicidade, interseccionalidade e resistência em uma carreira musical. Revista Latino-Americana de Estudos em Cultura e Sociedade , 5 , 10-20. ; Tavares, 2009Tavares, B. L. (2009). Na quebrada, a parceria é mais forte - Juventude hip-hop: relacionamento e estratégias contra a discriminação na periferia do Distrito Federal (Tese de doutorado). Universidade de Brasília, Brasília. ). Os participantes têm resistido à marginalização e criaram “textos culturais” alternativos por meio da música, eventos e iniciativas educacionais ( Beal, 2015Beal, S. (2015). Making space in Brasília: cultural texts from 2009 to 2014. Journal of Lusophone Studies , 13 (2), 55-77. ). Em 2012, por exemplo, o grupo Viela 17 – o nome de uma rua na Ceilândia – liberaram um vídeo de sua música “20 de 40” que expressa um tema comum no hip-hop brasileiro, a contestação e a renegociação da reivindicação do território ( Beal, 2015Beal, S. (2015). Making space in Brasília: cultural texts from 2009 to 2014. Journal of Lusophone Studies , 13 (2), 55-77. ).

O vídeo do Viela 17 se inicia com um clipe de 1971, de um filme produzido pelo governo com imagens de ônibus, fileiras de moradias públicas, cabos elétricos e água encanada. Ceilândia foi descrita como uma “[...] solução social pioneira na América do Sul”, parte da Campanha de Erradicação de Invasões ( Beal, 2015Beal, S. (2015). Making space in Brasília: cultural texts from 2009 to 2014. Journal of Lusophone Studies , 13 (2), 55-77. , p. 65). O filme não menciona que, em maio de 1971, 80 mil pessoas, que trabalhavam na economia informal de Brasília, foram forçadamente realocadas do centro para a Ceilândia, que sofria com a falta de água potável e eletricidade. Enquanto havia transporte público para que os trabalhadores pudessem se locomover, a passagem de ônibus era a mais cara do país.

Como uma intelectual dos estudos culturais, Sophia Beal aponta que o Viela 17 expõe essa violência estrutural e história de injustiça por meio de seu clipe irônico do filme de propaganda do governo. A análise de Beal chama atenção para a vitalidade e importância da narrativa em formas culturais locais. A letra da música “20 de 40”, citada por Beal, expressa uma identificação e posse cultural do território contestado da Ceilândia, especificamente a Expansão do Setor O:

Ceilândia na cena, Viela, expansão Onde fiz a minha história, meu irmão [...] As luzes da cidade escura não ofuscam o meu brilho, não.

1.6 O ensino superior na periferia, a terapia ocupacional na FCE e a disciplina de reconstruções ocupacionais

Como o sociólogo brasileiro Jessé de Souza (2017)Souza, J. (2017). A elite do atraso . São Paulo: LeYa. afirma, o acesso a universidades públicas no Brasil tem sido historicamente limitado às classes média e alta, reproduzindo injustiças estruturais, incluindo exclusão racial. Em 2008, um número de reformas ocorreu no país, incluindo um projeto federal ambicioso, Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais, cujo foco era dobrar as matrículas em instituições públicas de ensino superior e promover o acesso em localidades periféricas ( Almeida-Filho, 2011Almeida-Filho, N. (2011). Higher education and health care in Brazil. Lancet , 377 (9781), 1898-1900. ). Assim, a Universidade de Brasília, Faculdade de Ceilândia (FCE), foi criada incluindo o curso de bacharelado em terapia ocupacional como consequência dessa política.

1.7 A geografia cultural e as políticas de educação na FCE

O campus da Ceilândia só foi criado devido à forte mobilização da comunidade, que se aproveitou do momento político da época para formar o Movimento Pró-Universidade Pública de Ceilândia. A Universidade de Brasília, inicialmente, planejou oferecer programas de treinamento em áreas interdisciplinares. No entanto, a comunidade considerou esses programas desconhecidos e não atrativos, e eles deixaram claro seu desejo de atribuir prestígio social e valor ao campus com programas de treinamento na área da saúde que eles fossem escolher como uma forma de melhoria das suas oportunidades de vida. Esse processo de negociação entre os representantes da universidade e da comunidade resultou na decisão de oferecer treinamento às profissões aliadas à saúde, enfermagem e saúde pública ( Universidade de Brasília, 2018Universidade de Brasília – UnB. UnB TV. (2018). 10 anos da Faculdade de Ceilândia da UnB . Recuperado em 1 de fevereiro de 2020, de https://www.youtube.com/watch?v=ZBz9kQl1vN0&feature=emb_logo
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).

Inicialmente, a expansão da FCE sofria com a falta de seu próprio campus . As aulas eram ministradas em pequenas salas de aula no centro da cidade; e posteriormente, em um espaço que os funcionários e alunos compartilhavam com uma escola local de ensino médio. Essas limitações foram fortemente contestadas pelo Movimento dos Estudantes Sem Campus . Finalmente, em 2013, o campus da Ceilândia (FCE) foi finalmente inaugurado à distância de quatro quadras da escola; agora com amplas salas de aulas, auditórios, biblioteca, salas de reunião e de funcionários, juntamente com uma bela vista da vegetação local. As principais características dos cursos da Ceilândia foram: (1) o foco na saúde e reabilitação com uma perspectiva interprofissional e não individualista; e (2) a articulação com os sistemas de saúde universal no Brasil e de saúde pública ( Parreira et al., 2016Parreira, C., Cyrino, A., & Escalda, P. (2016). Educação interprofissional e os desafios para a formação docente em saúde: o caso da Faculdade de Ceilândia/Universidade de Brasília. Criar Educação , 1 , 173-202. ). No entanto, houve desafios em relação ao conteúdo de questões sociais na educação dos alunos. Por exemplo, o primeiro autor, identificou que seus alunos frequentemente não tinham a compreensão – e às vezes interesse – em materiais acadêmicos que eles achavam muito distantes de suas vidas.

Esse foi o contexto que fez com que o primeiro autor fizesse a proposta de uma disciplina voltada para as reconstruções ocupacionais na Universidade de Brasília, Faculdade de Ceilândia (FCE). A disciplina foi planejada por meio de conversas online entre o primeiro e segundo autores. O primeiro ofereceu o curso como disciplina optativa no segundo semestre de 2017. Assim, a proposta para a FCE teve como referência o crescente conjunto de teoria na terapia ocupacional em relação à exclusão social, injustiças ocupacionais e práticas transformacionais ( Farias et al., 2019Farias, L., Laliberte Rudman, D., Pollard, N., Schiller, S., Serrata Malfitano, A. P., Thomas, K., & van Bruggen, H. (2019). Critical dialogical approach: a methodological direction for occupation-based social transformative work. Scandinavian Journal of Occupational Therapy , 26 (4), 235-245. ; Farias & Rudman, 2019Farias, L., & Rudman, D. L. (2019). Challenges in enacting occupation-based social transformative practices: A critical dialogical study. Canadian Journal of Occupational Therapy , 86 (3), 243-252. ; Hammell & Beagan, 2016Hammell, K. R. W., & Beagan, B. (2016). Occupational injustice: a critique. Canadian Journal of Occupational Therapy , 84 (1), 58-68. ; Pereira, 2017Pereira, R. (2017). Towards inclusive occupational therapy: introducing the CORE approach for inclusive and occupation-focused practice. Australian Occupational Therapy Journal , 64 (6), 429-435. ; Whiteford et al., 2018Whiteford, G., Jones, K., Rahal, C., & Suleman, A. (2018). The Participatory Occupational Justice Framework as a tool for change: three contrasting case narratives. Journal of Occupational Science , 25 (4), 497-508. ). O curso Reconstrução Ocupacional e Transformação Social foi oferecido durante o segundo semestre de 2017 e primeiro de 2018, e, com a decisão da FCE, foi ofertado aos alunos de graduação que se encaixavam no pré-requisito, ter cursado a disciplina Saúde e Sociedade III: Diversidade e Saúde Social. Os alunos que escolheram fazer essa disciplina vinham dos cursos de terapia ocupacional, fisioterapia, saúde coletiva e enfermagem.

Essa foi uma disciplina de dois créditos, que corresponde a duas horas semanais de aula presencial ou oficinas no período de 14 semanas. O conteúdo foi planejado para, inicialmente, apresentar e explorar os assuntos de ocupação, ocupações coletivas e transformação social. Em seguida, foi apresentado aos alunos uma introdução à teoria de reconstrução ocupacional; e revisão constante do posicionamento dos alunos e a história da cidade. Esse foi um processo reflexivo e colaborativo – influenciado pela abordagem dialógica, com leituras, palestras, tutoriais e oficinas para a conclusão da tarefa avaliativa: literatura de cordel.

1.8 O currículo da FCE como uma pesquisa sobre (e prática de) reconstrução ocupacional

A vasta maioria dos vinte alunos na Ceilândia (FCE) que cursaram a disciplina de reconstrução ocupacional se identificaram como parte da nova geração de candangos. Todos eles vinham de cidades-satélites ao redor de Brasília, mas principalmente da Ceilândia, onde o campus da FCE está localizado. Sendo típico da demografia do campus , os participantes eram majoritariamente mulheres jovens nascidas em regiões cujos pais e/ou avós eram imigrantes. A maioria era solteira e sem filhos. Elas manifestavam, no entanto, um forte sentimento de responsabilidade familiar em relação à satisfação das esperanças e expectativas de seus pais e mães como primeira geração de candangas a chegar até o ensino superior.

Os alunos começaram narrando suas próprias histórias enquanto também entravam em contato com seus familiares mais velhos para descobrir como os candangos lidaram com as condições problemáticas sociais durante os primeiros dias de Brasília. A literatura da ciência ocupacional foi apresentada para envolver os alunos nas teorias de transformação social, pensamento crítico e abordagens narrativas. Consequentemente, a sala de aula foi o local para conversas contínuas sobre a visões de mundo, percepções, discursos e envolvimento em problemas sociais dos alunos e seus familiares mais velhos. A fase de pesquisa da disciplina envolveu a realização de entrevistas formais com os candangos para obter as suas narrativas sobre as situações problemáticas, nas quais eles participavam, dentro de ações coletivas, para abordar uma injustiça específica.

Na parte prática, os alunos levaram as histórias dos candangos para a esfera pública de duas maneiras. Primeiro, apesar de seu status periférico em relação à Brasília, os alunos estavam bem familiarizados e adaptados com o uso da mídia digital. Eles criaram uma página na internet ( Reconstrução Ocupacional Candanga, 2020Reconstrução Ocupacional Candanga. (2020). Recuperado em 1 de junho de 2020, de hhttp://reconstrucaoocupacionalcandanga.blogspot.com/
http://reconstrucaoocupacionalcandanga.b...
) na qual postavam a transcrição das histórias dos candangos, em forma de cordel. Segundo, mas de grande importância para a relevância social do curso, a avaliação final dos alunos não foi por meio de provas ou redações tradicionais. Pelo contrário, os alunos foram desafiados a apresentar um caso de reconstrução ocupacional como um exemplo de literatura de cordel.

A literatura de cordel é um gênero narrativo característico dos estados do nordeste brasileiro e uma parte da herança cultural dos alunos. A literatura de cordel possui uma história longa, mas a literatura de cordel brasileiro é única, conforme se combina com as tradições faladas e escritas em livretos de baixo custo que continham poemas, músicas, história de folclore e lendas, parecidos com os panfletos ingleses, chapbooks , vendidos por ambulantes. Esses cordéis se diferem dos cordéis portugueses do século 18 e 19, pois esses não tinham uniformidade ( Alves, 2017Alves, P. (2017). Brazilian children’s literature and booklet literature. In J. Stephens (Ed.), The Routledge companion to international children’s literature (pp. 233-242). Abingdon: Routledge. ). Devido à sua importância cultural, a literatura de cordel foi declarada como parte do Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro (ver Figura 2 ). Ao longo do semestre, enquanto mergulhavam na teoria de reconstruções ocupacionais, eles também aprenderam sobre a literatura de cordel como uma tradição popular e folclórica. O uso da literatura de cordel foi uma reafirmação da importância dos alunos como participantes da forma de arte local e do compartilhamento das histórias dos candangos.

Figura 2
Um exemplo de literatura de cordel da Biblioteca Nacional de Cordel. Fonte: CON/VIDA (2019)CON/VIDA. (2019). Recuperado em 1 de junho de 2020, de http://www.convida.org/images/abraao2.jpg
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1.9 As reconstruções ocupacionais dos candangos

As histórias dos candangos foram elaboradas por meio da forma poética folclórica em estrofes curtas que expressam confiança, orgulho e um pouco do ritmo de hip-hop ( Reconstrução Ocupacional Candanga, 2020Reconstrução Ocupacional Candanga. (2020). Recuperado em 1 de junho de 2020, de hhttp://reconstrucaoocupacionalcandanga.blogspot.com/
http://reconstrucaoocupacionalcandanga.b...
). O conteúdo foi analisado minuciosamente pelo terceiro autor ( Mizue, 2019Mizue, A. (2019). Reconstrução ocupacional: experiências no Distrito Federal (Bachelor’s thesis). Universidade de Brasília, Brasília. ). Aqui, nós focamos nos temas gerais e exemplos de conteúdo. Os trabalhos dos alunos de literatura de cordel descrevem como a população local promoveu soluções criativas em situações de recursos escassos e serviços públicos insuficientes, vividas pelos membros de suas famílias, pelos membros da comunidade ou pelos próprios alunos. Nós selecionamos o seguinte cordel para discussão: A Caixa D’água, por Júlio Cesar Alencar Ramos ( Apêndice A Apêndice A Cordel: A Caixa D’água. Em algum ponto da história de nosso país No final do século passado Pessoas viviam por um triz Com a miséria dormindo ao seu lado E eu quero lhes apresentar A população do Sol Nascente Um povo que apesar de tudo que passou e passa É um povo forte, batalhador e sorridente Haaa, meus amigos e minhas amigas Espero que vocês não duvidem disso Pois posso lhes apresentar provas De tudo isso que lhes digo O Sol Nascente no DF Sempre foi tratado como “magiqui landi” Ninguém sabe, ninguém viu Como sofria e ainda sofre tanta gente E já que falamos no DF É bom relembrar um pouco de sua história De quem realmente deu sua vida para lhe construir De quem, no fim das contas, recebeu toda glória O DF foi erguido Pelas mãos do povo nordestino E eu escuto esta comprida história Desde que eu era apenas um menino Mas o sistema é cruel E esse povo o DF construiu Porém o Estado lhes mandou um curto e grosso recado: “Nordestinos, vão pra puta que pariu” E assim surgiu o chamado “entorno” Aglomerados com todo tipo de gente Com a pobreza e muitos sonhos em comum Assim também surgiu o Sol Nascente Dentre tantos e tantos sonhos Existia e ainda existe um em particular O sonho de fugir dos altos aluguéis E construir um “barraco” para chamá-lo de lar Quando construíam seus “barracos” O governo do DF mandava e manda derrubar Era e é a AGEFIS que fazia e faz o trabalho sujo E deixava e deixa esse povo sem ter onde morar Mas esse povo é insistente Muito batalhador, como eu disse agora há pouco Não desistiram de suas casas E continuaram levantando parede e passando reboco Além disso que acabei de lhes contar Existiam problemas que a população enfrentava Problemas que muitos ainda vivenciam Como falta de luz, saneamento e água Eu tenho um objetivo final nesse cordel Que é lhes contar uma história em particular História de ação voluntária e de esperança Que surgiu para uma situação problema melhorar A falta de água é o problema que foi resolvido Presente em um trecho específico da ocupação Foi resolvido de forma pragmática e valente Por alguns membros daquela população Haa, e de que forma que eles resolveram? Eles construíram uma grande caixa d’água Caixa que captava água de uma nascente Nascente que entregava água de casa em casa A caixa realmente era muito grande Possuía 8 por 10 metros de largura Armazenava 50 litros de água E tinha 2 metros de fundura Através de encanamentos distribuídos para a caixa e poços A água chegava às casas Umas 70 pessoas se beneficiaram Dos canos dessa rede improvisada Antes disso a comunidade ia até o centro da Ceilândia E comprava galões a 5 conto Galões que tinham água gostosa e fresca Mas que eram pesados pros braços e pro bolso era um rombo Alguns pequenos obstáculos apareciam Como carros passando por cima dos canos Entupimentos e pessoas capinando Ou o Estado através do IBAMA, enchendo o saco e alertando Encontram-se falas diferentes sobre a água Mas alguns nem avaliavam a sua qualidade Uns dizem que era limpa, outros dizem que era suja E no fim das contas o que pesava era a necessidade E sim, pra tudo essa água servia Servia pra sorrir, servia pra amar, servia pra comer Servia pra banhar, servia pra beber Servia pra lavar, servia pra viver E assim foram seguindo até início dos anos 2000 Até que o Estado começou a chegar junto Trazendo transporte, comércio e moradia Asfalto, energia e água pra todo mundo A CAESB solicitou que entupissem a caixa Logo todos viam o que ia se modificando Encanamentos adequados e relógios nas casas A nascente perdendo água, caixa e poços secando É importante ressaltar E claro que não posso deixar de dizer Que muitas pessoas que moram no Sol Nascente Ainda não têm vida adequada pra viver Que muitas pessoas no Sol Nascente Ainda não têm casa adequada pra morar Ainda não têm comida boa pra comer Ainda não têm água boa pra usar E agora, começo a questionar Até quando o Estado não vai se importar? Até quando viveremos nessas situações? Quando nossos governantes cumprirão suas obrigações? Enquanto este dia não chega Devemos manter a crença na humanidade Executando ações como esta que foi narrada Para assim chegarmos a outro nível de sociedade Acredito e digo também neste cordel Que temos o dever e a chance de nos organizar Não importa a forma e onde Para que juntos do Estado nossos direitos possamos reivindicar. ).

A Caixa D’água é um conto heroico de resistência à marginalização social, econômica e política pela população imigrante. A situação problemática está relacionada à falta de abastecimento de água quando a população pobre se estabeleceu na favela do Sol Nascente, na década de 1990, onde o autor da narrativa, Júlio Ramos, reside. Ele descreve esse povo, que “dormia com a miséria ao seu lado”, como esperançosos e resilientes.

… E eu quero lhes apresentar A população do Sol Nascente Um povo que apesar de tudo que passou e passa É um povo forte, batalhador e sorridente E assim surgiu o chamado “entorno” Aglomerados com todo tipo de gente Com a pobreza e muitos sonhos em comum Assim também surgiu o Sol Nascente Dentre tantos e tantos sonhos Existia e ainda existe um em particular O sonho de fugir dos altos aluguéis E construir um “barraco” para chamá-lo de lar.

O autor se coloca dentro da história, incluindo a falta de apreciação, respeito e preocupação com as contribuições dos candangos para o Distrito Federal (DF).

O DF foi erguido Pelas mãos do povo nordestino E eu escuto esta comprida história Desde que eu era apenas um menino Mas o sistema é cruel E esse povo o DF construiu Porém o Estado lhes mandou um curto e grosso recado: “Nordestinos, vão pra puta que pariu”.

O Distrito Federal respondeu com o objetivo de remover a população imigrante por meio da destruição de seus barracos. Mas o povo se recusou a partir.

Mas esse povo é insistente Muito batalhador, como eu disse agora há pouco Não desistiram de suas casas E continuaram levantando parede e passando reboco Além disso que acabei de lhes contar Existiam problemas que a população enfrentava Problemas que muitos ainda vivenciam Como falta de luz, saneamento e água.

Já que o Distrito Federal recusou a fornecer serviços públicos, cada família tinha que se abastecer com água usando galões. Sobrava para a população a realização dessa tarefa difícil e cara, porém, necessária para a sua família.

Antes disso a comunidade ia até o centro da Ceilândia E comprava galões a 5 conto Galões que tinham água gostosa e fresca Mas que eram pesados pros braços e pro bolso era um rombo.

Os vizinhos agiram para reconstruir a situação por meio da criação de seu próprio sistema de água improvisado. Eles construíram um tanque com oito metros de altura e dez metros de largura, com tubulação precária mas útil que acessava as nascentes e abastecia 70 casas. Esse improviso é o elemento pivô da ocupação coletiva – “o fazer algo em relação à alguma coisa”. Essa solução não era perfeita, mas melhorou a vida das pessoas na vizinhança.

Encontram-se falas diferentes sobre a água Mas alguns nem avaliavam a sua qualidade Uns dizem que era limpa, outros dizem que era suja E no fim das contas o que pesava era a necessidade E sim, pra tudo essa água servia Servia pra sorrir, servia pra amar, servia pra comer Servia pra banhar, servia pra beber Servia pra lavar, servia pra viver.

Finalmente, nos anos 2000, o governo brasileiro (“o Estado”) não podia mais ignorar a situação e começou a fornecer vias públicas, transporte, moradia, eletricidade e água “para todos”. A caixa d’água foi substituída por um sistema novo e moderno. Para o autor Júlio Ramos, essa é outra melhoria, mas, claro, a luta continua.

É importante ressaltar E claro que não posso deixar de dizer Que muitas pessoas que moram no Sol Nascente Ainda não têm vida adequada pra viver Que muitas pessoas no Sol Nascente Ainda não têm casa adequada pra morar Ainda não têm comida boa pra comer Ainda não têm água boa pra usar.

Júlio Ramos finaliza o cordel enfatizando as lições que sua narrativa transmite. Primeiro, ele exige que o Estado reconheça e tenha responsabilidade pela população que ainda vive na zona de exclusão na periferia de Brasília. Ele apresenta essa exigência como perguntas de conscientização e as segue com três afirmações de esperança.

Primeiro, ele insiste que “Nós” – os candangos, mas também parecendo incluir o leitor do cordel – devemos acreditar em nossa capacidade para realizar ações sociais transformacionais. Além disso, nós temos uma responsabilidade e a oportunidade (“o dever e uma chance”) de nos organizarmos coletivamente. E, finalmente, há a esperançosa e ainda não irreal perspectiva baseada nos fatos apresentados no cordel de que o mundo pode se tornar melhor gradualmente por meio da asseguração de reivindicações à cidadania.

E agora, começo a questionar Até quando o Estado não vai se importar? Até quando viveremos nessas situações? Quando nossos governantes cumprirão suas obrigações? Enquanto este dia não chega Devemos manter a crença na humanidade Executando ações como esta que foi narrada Para assim chegarmos a outro nível de sociedade Acredito e digo também neste cordel Que temos o dever e a chance de nos organizar Não importa a forma e onde Para que juntos do Estado nossos direitos possamos reivindicar.

2 Conclusão

A teoria de Reconstrução Ocupacional está alinhada às “epistemologias do sul” devido ao seu interesse em perspectivas locais, ação coletiva e possibilidades para a transformação social. Enquanto não completamente sem pressupostos, a teoria é relativamente aberta, ao invés de prescritiva, a uma estrutura para a investigação ao invés de uma ideologia ou um conjunto de normas. Foi possível apresentar aos alunos da Universidade de Brasília a teoria de reconstrução ocupacional com base na perspectiva de ensino e pesquisa. Os exemplos contaram com a inclusão da reconstrução pós-guerra civil na Guatemala ( Frank, 2013Frank, G. (2013). Twenty-first century pragmatism and social justice: problematic situations and occupational reconstructions in post-civil war Guatemala. In M. Cutchin & V. Dickie (Eds.), Transactional perspectives on occupation (pp. 229-243). Dordrecht: Springer. http://dx.doi.org/10.1007/978-94-007-4429-5_18. ) e os direitos civis e movimentos anti- apartheid nos Estados Unidos e na África do Sul ( Frank & Muriithi, 2015Frank, G., & Muriithi, B. (2015). Theorising social transformation in occupational science: the American Civil Rights Movement and South African struggle against apartheid as ‘Occupational Reconstructions’. South African Journal of Occupational Therapy , 45 , 11-19. ). Esses e outros casos ajudaram a despertar nos alunos da FCE a conscientização e o preparo para estudarem a sua própria história e sua comunidade na periferia da cidade utópica de Brasília.

A cientista ocupacional Gail Whiteford (2017Whiteford, G. (2017). Participation in higher education as social inclusion: an occupational perspective. Journal of Occupational Science , 24 (1), 54-63. , p. 54) apontou que a participação no ensino superior é, em si, uma forma poderosa de inclusão social, possibilitando “[...] uma transformação da identidade e status sócio-econômico através da ocupação transicional dos alunos”. Isso é relevante no desenvolvimento de países onde o racismo e desigualdades limitam as oportunidades e experiências no ensino superior ( Santos et al., 2019aSantos, V., Leon Spesny, S., Kleintjes, S., & Galvaan, R. (2019a). Racism and mental health in higher education: a challenge for LMICs. International Journal of Methods in Psychiatric Research , 28 (4), e1799. ). O convite feito aos alunos da FCE para apresentarem suas descobertas em forma de literatura de cordel incluiu uma terceira dimensão transformativa crucial para o currículo de reconstrução ocupacional, o da prática . Nós chamamos atenção para a recursiva natureza dessa prática, que oferece aos alunos uma ocupação criativa incorporada – a produção de cordel – que lhes deu uma oportunidade de explorar e dar voz a uma contribuição aos desafios contínuos dos candangos por inclusão e justiça, das quais eles fazem parte. Desse modo, os cordéis manifestaram e afirmaram a presença dos candangos como conteúdo, sua liberdade, criatividade, persistência, orgulho e esperança.

As aplicações educacionais futuras da teoria de reconstrução ocupacional deveriam considerar que o currículo da FCE funcionou bem com um grupo pequeno de alunos, no qual cada um teve a chance de participar ativamente e trocar ideias e no qual se identificaram como pertencentes à mesma comunidade local. Eles compartilharam um repertório de história, experiências locais e memórias, e um sentimento de solidariedade. Uma disciplina optativa na diversificada Universidade do Sul da Califórnia também funcionou com grupos pequenos (de 12 a 15 alunos), nos quais os alunos trabalharam em pares para identificar e analisar casos de reconstrução ocupacional e apresentaram à turma em formato digital ( Frank, 2017Frank, G. (2017). Collective occupations and social transformations: a mad hot curriculum. In N. Pollard & D. Sakellariou (Eds.), Occupational therapies without borders: integrating justice with practice (pp. 596-604). Edinburgh: Elsevier Press. ).

Este artigo focou na inclusão da teoria de reconstrução ocupacional no currículo da FCE. Nós convidamos os leitores a considerarem a participação nestas recomendações: (1) Use a teoria para o ensino, pesquisa e prática com outros grupos de alunos em comunidades marginalizadas; (2) Documente os resultados nas publicações acadêmicas, leve o conhecimento produzido sobre as reconstruções ocupacionais locais para os espaços públicos apropriados e também documente essas ações; (3) Desenvolva medidas de avaliação das experiências de ensino dos alunos comparando o antes e depois do impacto social do aprendizado e da prática; e (4) Faça uso da teoria de reconstrução ocupacional na prática de terapia ocupacional profissional com o planejamento de transformação social.

Apêndice A  Cordel: A Caixa D’água.

Em algum ponto da história de nosso país No final do século passado Pessoas viviam por um triz Com a miséria dormindo ao seu lado

E eu quero lhes apresentar A população do Sol Nascente Um povo que apesar de tudo que passou e passa É um povo forte, batalhador e sorridente

Haaa, meus amigos e minhas amigas Espero que vocês não duvidem disso Pois posso lhes apresentar provas De tudo isso que lhes digo

O Sol Nascente no DF Sempre foi tratado como “magiqui landi” Ninguém sabe, ninguém viu Como sofria e ainda sofre tanta gente

E já que falamos no DF É bom relembrar um pouco de sua história De quem realmente deu sua vida para lhe construir De quem, no fim das contas, recebeu toda glória

O DF foi erguido Pelas mãos do povo nordestino E eu escuto esta comprida história Desde que eu era apenas um menino

Mas o sistema é cruel E esse povo o DF construiu Porém o Estado lhes mandou um curto e grosso recado: “Nordestinos, vão pra puta que pariu”

E assim surgiu o chamado “entorno” Aglomerados com todo tipo de gente Com a pobreza e muitos sonhos em comum Assim também surgiu o Sol Nascente

Dentre tantos e tantos sonhos Existia e ainda existe um em particular O sonho de fugir dos altos aluguéis E construir um “barraco” para chamá-lo de lar

Quando construíam seus “barracos” O governo do DF mandava e manda derrubar Era e é a AGEFIS que fazia e faz o trabalho sujo E deixava e deixa esse povo sem ter onde morar

Mas esse povo é insistente Muito batalhador, como eu disse agora há pouco Não desistiram de suas casas E continuaram levantando parede e passando reboco

Além disso que acabei de lhes contar Existiam problemas que a população enfrentava Problemas que muitos ainda vivenciam Como falta de luz, saneamento e água

Eu tenho um objetivo final nesse cordel Que é lhes contar uma história em particular História de ação voluntária e de esperança Que surgiu para uma situação problema melhorar

A falta de água é o problema que foi resolvido Presente em um trecho específico da ocupação Foi resolvido de forma pragmática e valente Por alguns membros daquela população

Haa, e de que forma que eles resolveram? Eles construíram uma grande caixa d’água Caixa que captava água de uma nascente Nascente que entregava água de casa em casa

A caixa realmente era muito grande Possuía 8 por 10 metros de largura Armazenava 50 litros de água E tinha 2 metros de fundura

Através de encanamentos distribuídos para a caixa e poços A água chegava às casas Umas 70 pessoas se beneficiaram Dos canos dessa rede improvisada

Antes disso a comunidade ia até o centro da Ceilândia E comprava galões a 5 conto Galões que tinham água gostosa e fresca Mas que eram pesados pros braços e pro bolso era um rombo

Alguns pequenos obstáculos apareciam Como carros passando por cima dos canos Entupimentos e pessoas capinando Ou o Estado através do IBAMA, enchendo o saco e alertando

Encontram-se falas diferentes sobre a água Mas alguns nem avaliavam a sua qualidade Uns dizem que era limpa, outros dizem que era suja E no fim das contas o que pesava era a necessidade

E sim, pra tudo essa água servia Servia pra sorrir, servia pra amar, servia pra comer Servia pra banhar, servia pra beber Servia pra lavar, servia pra viver

E assim foram seguindo até início dos anos 2000 Até que o Estado começou a chegar junto Trazendo transporte, comércio e moradia Asfalto, energia e água pra todo mundo

A CAESB solicitou que entupissem a caixa Logo todos viam o que ia se modificando Encanamentos adequados e relógios nas casas A nascente perdendo água, caixa e poços secando

É importante ressaltar E claro que não posso deixar de dizer Que muitas pessoas que moram no Sol Nascente Ainda não têm vida adequada pra viver

Que muitas pessoas no Sol Nascente Ainda não têm casa adequada pra morar Ainda não têm comida boa pra comer Ainda não têm água boa pra usar

E agora, começo a questionar Até quando o Estado não vai se importar? Até quando viveremos nessas situações? Quando nossos governantes cumprirão suas obrigações?

Enquanto este dia não chega Devemos manter a crença na humanidade Executando ações como esta que foi narrada Para assim chegarmos a outro nível de sociedade

Acredito e digo também neste cordel Que temos o dever e a chance de nos organizar Não importa a forma e onde Para que juntos do Estado nossos direitos possamos reivindicar.

Agradecimentos

Vagner dos Santos agradece a todos os estudantes, especialmente ao Julio, por sua participação na disciplina. Vagner dos Santos agradece também a suas colegas e amigas do curso de Terapia Ocupacional da Faculdade de Ceilândia, Universidade de Brasília, que possibilitaram a implementação deste curso.

  • Como citar:Santos, V., Frank, G., & Mizue, A. (2020). Candangos: teoria da reconstrução ocupacional como uma ferramenta para a compreensão de problemas sociais e ações transformativas na utópica cidade de Brasília. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional. Ahead of Print. https://doi.org/10.4322/2526-8910.ctoAO2061

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Set 2020
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2020

Histórico

  • Recebido
    22 Fev 2020
  • Revisado
    24 Mar 2020
  • Aceito
    11 Jun 2020
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