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Inibição retrógrada das vias centrais hiperativas nas dores nociplásticas

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

A dor nociplástica ocorre por uma combinação de hiperexcitabilidade e diminuição da atividade inibitória no sistema nervoso central, responsável por um estado de amplificação de estímulos diversos, presente em muitas doenças crônicas. Entre essas doenças estão: fibromialgia, migrânea crônica, síndrome do intestino irritável, síndrome dolorosa miofascial e síndrome de dor complexa regional. Frequentemente, várias dessas doenças se apresentam associadas. A terapia da dor nociplástica é um desafio na prática clínica, uma vez que a maioria dos tratamentos tradicionais não são eficazes no controle dos sintomas, causando muitas vezes dificuldade de adesão ou até mesmo interrupção do tratamento, devido aos efeitos adversos indesejáveis. O objetivo deste artigo foi demonstrar a importância da identificação da presença da dor nociplástica no quadro do paciente, e do conhecimento dos mecanismos fisiopatológicos envolvidos. Dessa forma, devido à neuromodulação retrógrada, característica exclusiva do sistema endocanabinoide até o momento, avaliar a utilização de fármacos de grau farmacêutico à base da planta cannabis como coadjuvante na terapia da dor e dos outros sintomas associados a essa doença.

CONTEÚDO:

Este artigo abordou a fisiopatologia da dor nociplástica, a fisiologia do sistema endocanabinoide, a planta cannabis com seus componentes e sua utilização como medicação coadjuvante no tratamento multimodal da dor nociplástica (decorrente da neuromodulação retrógrada), com base em artigos científicos publicados entre 1981 e 2022.

CONCLUSÃO:

Apesar das evidências científicas que apoiam o uso da cannabis medicinal na terapia da dor nociplástica serem insuficientes até o momento, ela pode e deve ser considerada como um possível fármaco coadjuvante na terapia multimodal da dor, sempre de forma individualizada, quando os tratamentos preconizados falharem ou não forem tolerados.

Descritores:
Cannabis; Dor crônica; Dor nociplástica; Sistema endocanabinoide

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

Nociplastic pain occurs due to a combination of hyperexcitability and decreased inhibitory activity in the central nervous system, responsible for a state of amplification of different stimuli, present in many chronic disorders. Among them: fibromyalgia, chronic migraine, irritable bowel syndrome, myofascial pain syndrome and complex regional pain syndrome. Often, several of these diseases are associated. Nociplastic pain therapy is a challenge in clinical practice, since most traditional treatments are not effective in controlling symptoms, often causing difficulty in adherence or even interruption of treatment due to undesirable adverse effects. The objective of this article was to demonstrate the importance of identifying the presence of nociplastic pain in the patient’s condition, and also the pathophysiological mechanisms involved. Thus, due to retrograde neuromodulation, a unique feature of the endocannabinoid system until now, evaluate the use of pharmaceutical grade medicines based on the cannabis plant as an adjunct in the therapy of pain and other symptoms associated with this disorder.

CONTENTS:

This article was addressed the pathophysiology of nociplastic pain, the physiology to the endocannabinoid system, the cannabis plant with its components and its use as an adjuvant medication in the multimodal treatment of nociplastic pain (due to retrograde neuromodulation), based on published scientific articles between 1981 and 2022.

CONCLUSION:

Although the scientific evidence supporting the use of medical cannabis in nociplastic pain therapy is insufficient so far, it can and should be considered as a possible adjuvant medication in multimodal pain therapy, always on an individual basis, when recommended treatments fail or are not tolerated.

Keywords:
Cannabis; Chronic pain; Endocannabinoid system; Nociplastic pain

DESTAQUES

Importância da identificação da presença da dor nociplástica.

Rrelação entre dor nociplástica e sistema endocanabinoide.

Importância do tratamento da dor nociplástica através da modulação retrógrada na hiper-excitabilidade central.

INTRODUÇÃO

O termo Dor Nociplástica (DN) foi introduzido pela Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) em 2017 como um terceiro descritor de dor. A DN é definida pela IASP como “dor que surge por aumento da capacidade de resposta dos neurônios nociceptivos no sistema nervoso central (SNC) à entrada aferente normal ou sublimiar, sem nenhuma evidência de lesão tecidual real ou potencial ou de lesão do sistema somatossensorial, causando dor”11 IASP.2021.https://www.iasppain.org/Education/Content.aspx?ItemNumber=1698#-Nociplasticpain.
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A DN é um estado de amplificação supraespinhal de estímulos sensitivos provenientes de diferentes sistemas orgânicos, originando sintomas de origem central, como fadiga, distúrbios do sono e alterações cognitivas. Ela está presente em grande número de doenças crônicas de difícil explicação devido à ausência de alteração tecidual identificável.

O termo DN é utilizado tanto científica como clinicamente, referindo-se aos indivíduos que se queixam de dor e hipersensibilidade em regiões com tecidos aparentemente normais e sem quaisquer sinais de neuropatia22 Kosek E, Cohen M, Baron R, Gebhart GF, Mico JA, Rice ASC, Rief W, Sluka AK. Do we need a third mechanistic descriptor for chronic pain states? Pain. 2016;157(7):1382-6.. Entre as diversas doenças dolorosas crônicas que apresentam DN estão a fibromialgia (FM), a migrânea crônica (MC), a dor visceral crônica (DVC), a síndrome do intestino irritável (SII), a dor facial atípica (DFA), a síndrome dolorosa miofascial (SDM) e a síndrome de dor complexa regional (SDCR). É comum os pacientes apresentarem a associação de mais de uma das doenças em algum período da vida33 Peres MF, Young WB, Kaup AO, Zukerman E, Silberstein SD. Fibromyalgia is common in patients with transformed migraine. Neurology. 200157(7):1326-8.. Um estudo44 Yunus M, Masi AT, Calabro JJ, Miller KA, Feigenbaum SL. Primary fibromyalgia (fibrositis): clinical study of 50 patients with matched normal controls. Semin Arthritis Rheum. 1981;11(1):151-71. descreveu a associação entre FM, MC e SII pela primeira vez em 1981. Em 2007 o autor do referido estudo propôs o termo “síndromes de sensibilização central” para as doenças já descritas, como um termo clínico e fisiopatológico55 Yunus MB. Fibromyalgia and overlapping disorders: the unifying concept of central sensitivity syndromes. Semin Arthritis Rheum. 2007;36(6):339-56.. Nas últimas décadas, exames de ressonância magnética funcional colaboraram para a elucidação do mecanismo fisiopatológico relacionado à DN33 Peres MF, Young WB, Kaup AO, Zukerman E, Silberstein SD. Fibromyalgia is common in patients with transformed migraine. Neurology. 200157(7):1326-8.,66 Walitt B, Ceko M, Gracely JL, Gracely RH. Neuroimaging of central sensitivity syndromes: key insights from the scientific literature. Curr Rheumatol Rev. 2016;12(1):55-87..

A dor crônica (DC) em geral, e em particular a dor neuropática e a DN, constituem um desafio na prática clínica. A maioria dos tratamentos tradicionais para DC não são eficazes no controle dos sintomas e muitas vezes causam efeitos adversos que impedem a adesão ao tratamento. Dessa forma, existe uma necessidade constante, tanto por parte da comunidade científica como por parte dos pacientes, da busca por novas opções terapêuticas, que sejam mais eficazes e melhorem a qualidade de vida do portador de DC. Neste contexto, os fármacos à base da planta cannabis chamaram a atenção como tratamento potencial para preencher essa lacuna terapêutica. Com um melhor conhecimento das bases neurofisiológicas da DN e do sistema endocanabinoide (SEC), além das evidências do efeito de fármacos à base de cannabis em várias condições nociplásticas, nota-se que tal terapêutica promete ser promissora para o tratamento da DN77 Fitzcharles MA, Petzke F, Tölle TR, Häuser W. Cannabis-based medicines and medical cannabis in the treatment of nociplastic pain. Drugs. 2021;81(18):2103-16..

DOR NOCIPLÁSTICA

A DN é considerada atualmente como um terceiro tipo de dor, com fisiopatologia diferente da dor nociceptiva e da dor neuropática. Sua fisiopatologia é provavelmente o fator responsável por inúmeras doenças crônicas que até então eram difíceis de entender, categorizar e tratar.

Provavelmente, existe uma sensibilização à aferência periférica no corno posterior da medula espinhal, responsável pela alodinia e hiperpatia, sintomas característicos de hiperexcitabilidade neuronal no corno posterior da medula espinhal, bem como uma sensibilização central supraespinhal responsável por sensações como fadiga, disfunções cognitivas, alterações de humor, hipersensibilidade a estímulos externos (som, luz), estímulos não dolorosos provenientes do próprio organismo e externos, além da dor. De maneira geral, a DN pode ser considerada uma combinação de hiperexcitabilidade com diminuição da atividade inibitória.

A DN não é nem nociceptiva nem neuropática. A DN tem como característica a ausência de lesão tecidual, atual ou antiga, responsável por ativação dos nociceptores, ou de lesão somatossensitiva, responsável pela dor. A DN é diferente da dor neuropática porque não existe lesão do sistema nervoso central ou periférico, nem doença de base que possa causar esse tipo de lesão88 Toda, K. Are nociplastic pain and neuropathic pain different pains? Univ J Neurosci. 2022;1(1):1-2..

De todo modo, os pacientes podem apresentar uma combinação de dor nociceptiva e DN. Evidências indicam que a dor nociceptiva contínua é um fator de risco para o desenvolvimento da DN pois a hipersensibilidade está associada a uma duração mais longa da dor nociceptiva. Dessa forma, são observadas altas taxas de DN em portadores de osteoartrite, artrite reumatoide e outros distúrbios que apresentam dor nociceptiva persistente99 Leffler AS, Kosek E, Lerndal T, Nordmark B, Hansson P. Somatosensory perception and function of diffuse noxious inhibitory controls (DNIC) in patients suffering from rheumatoid arthritis. Eur J Pain. 2002;6(2):161-76.,1010 Pollard LC, Ibrahim F, Choy EH, Scott DL. Pain thresholds in rheumatoid arthritis: the effect of tender point counts and disease duration. J Rheumatol. 2012;39(1):28-31..

Embora a sensibilização central seja provavelmente um mecanismo dominante em condições de DN, o termo DN não deve ser considerado sinônimo do termo neurofisiológico “sensibilização central”11 IASP.2021.https://www.iasppain.org/Education/Content.aspx?ItemNumber=1698#-Nociplasticpain.
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. Nas últimas décadas, os exames de neuroimagem funcional (tomografia por emissão de pósitrons, ressonância magnética funcional, espectroscopia), mostraram alterações estruturais, químicas e funcionais em áreas cerebrais de pacientes portadores de DC, compatíveis com um estado de hiperatividade, além das alterações no corno posterior da medula espinhal. Os estudos também comprovaram alterações na substância da matriz dolorosa (tálamo, substância cinzenta periaquedutal, insula, córtex cingulado anterior e somatossensorial) nesses pacientes1111 Smallwood RF, Laird AR, Ramage AE, Parkinson AL, Lewis J, Clauw DJ, Williams DA, Schmidt-Wilcke T, Farrell MJ, Eickhoff SB, Robin DA. Structural brain anomalies and chronic pain: a quantitative meta-analysis of gray matter volume. J Pain. 2013;14(7):663-75.. Observou-se também alterações neuroquímicas com aumento de neurotransmissores excitatórios (glutamato) e diminuição de neurotransmissores inibitórios (ácido gama amino butírico - GABA) em diversas áreas corticais e subcorticais1212 Napadow V, Harris RE. What has functional connectivity and chemical neuroimaging in fibromyalgia taught us about the mechanisms and management of ‘centralized’ pain? Arthritis Res Ther. 2014;16(5):425.,1313 Loggia ML, Kim J, Gollub RL, Vangel MG, Kirsch I, Kong J, Wasan AD, Napadow V. Default mode network connectivity encodes clinical pain: an arterial spin labeling study. Pain. 2013;154(1):24-33.,1414 Ichesco E, Puiu T, Hampson JP, Kairys AE, Clauw DJ, Harte SE, Peltier SJ, Harris RE, Schmidt-Wilcke T. Altered fMRI resting-state connectivity in individuals with fibromyalgia on acute pain stimulation. Eur J Pain. 2016;20(7):1079-89.. Alguns casos são considerados fatores de risco para desenvolvimento da DN, entre eles doenças crônicas, autoimunes, histórico familiar de DC ou de doenças de saúde mental, infecções ou traumas emocionais importantes na infância1515 Fleming KC, Volcheck MM. Central sensitization syndrome and the initial evaluation of a patient with fibromyalgia: a review. Rambam Maimonides Med J. 2015;6(2):e0020..

Esse tipo de dor pode ocorrer isoladamente em condições como FM ou MC, ou como parte de um estado de dor mista, em combinação com dor nociceptiva ou neuropática contínua, como na lombalgia crônica. É importante reconhecer a presença desse tipo de dor nos quadros crônicos, uma vez que ela não responderá da mesma forma que a dor nociceptiva às terapias preconizadas para esta, como anti-inflamatórios e analgésicos, cirurgia ou outros procedimentos eficazes contra a dor nociceptiva1616 Fitzcharles MA, Cohen SP, Clauw DJ, Littlejohn G, Usui C, Häuser W. Nociplastic pain: towards an understanding of prevalent pain conditions. Lancet. 2021;397(10289):2098-110..

Em resumo, pode-se destacar as alterações centrais relacionadas com a DN: hiper-responsividade a estímulos dolorosos, hiperatividade e conectividade dentro e entre o cérebro e as regiões envolvidas na dor, diminuição da atividade das regiões cerebrais envolvidas na dor, vias inibitórias descendentes ineficientes, elevação da substância P e do glutamato no líquido cefalorraquidiano, diminuição da concentração GABAérgica, alterações da substância cinzenta e branca nas regiões corticais envolvidas no processamento da dor e ativação glial.

SISTEMA ENDOCANABINOIDE

O sistema endocanabinoide (SEC) desempenha papéis importantes no desenvolvimento do SNC, na plasticidade sináptica e na resposta a insultos endógenos e exógenos. O SEC é extremamente complexo e está presente em todas as células orgânicas desempenhando papel essencial na homeostase. Nos últimos 25 anos o SEC ganhou destaque como importante sistema neuromodulador.

O SEC é composto por três componentes:

  1. Endocanabinoides,

  2. Receptores,

  3. Enzimas metabolizadoras de síntese e degradação.

Os endocanabinoides mais estudados são a anandamida (N-araquidonoiletanolamina ou AEA) e o 2-araquidonoilglicerol (2-AG). A eficácia dos canabinoides endógenos depende da sua afinidade pelos receptores. O 2-AG é um agonista altamente eficaz dos receptores CB1 e CB2, enquanto a AEA é um agonista de baixa eficácia nos receptores CB1 e um agonista de eficácia muito baixa nos receptores CB2. Consequentemente, em sistemas com baixa expressão de receptores ou quando os receptores se acoplam fracamente às vias de sinalização, a AEA pode antagonizar os efeitos de agonistas mais eficazes. Outros endocanabinoides foram isolados recentemente como a virodamina (“anandamida invertida”), o noladin éter e a N-araquidonoil dopamina (NADA). No entanto, a biologia desses compostos não está tão esclarecida quanto a da AEA e do 2-AG. São importantes também os chamados endocannabinoid-like, a N-oleoiletanolamida (OEA) e a N-palmitoiletanolamida (PEA), que além de reduzirem a hidrólise da AEA e 2-AG, atuam sinergicamente com esses endocanabinoides. Porém, este sinergismo se dá através da ação dos en-docannabinoid-like em receptores acoplados à proteína G (GPR55, GPR18, GPR119), TRPV1 e PPARs.

Os receptores CB1 e CB2 estão presentes em todo o organismo. O receptor CB1 é o mais abundante no organismo, predominando no SNC e no sistema nervoso periférico (SNP). A ação do receptor CB1 depende da sua localização no sistema nervoso. O receptor CB2 é mais numeroso na periferia e é importante na imuno-modulação e controle da inflamação. Os receptores CB1 e CB2 foram os primeiros a serem identificados e estudados, porém os endocanabinoides interagem também com receptores de potencial transitório (TRPs) e receptores ativados por proliferadores de peroxissoma (PPARs), particularmente com TRPV1 e com GPR55.

Apesar da AEA e do 2-AG conterem TRPV1, GPR55 e ácido, a síntese e particularmente a degradação in vivo são praticamente distintas, e mediadas por diferentes enzimas. A AEA é sintetizada pela NAPE-specific phospholipase D (NAPE-PLD) e o 2-AG pela DAG lipase (DAGL). As enzimas de degradação são a fatty acid amide hydrolase (FAAH), que degrada a AEA e a monoacylglycerol lipase (MAGL), que metaboliza o 2-AG.

O 2-AG, além de servir como um ligante endógeno para receptores canabinoides, é um importante intermediário metabólico na síntese de lipídios e serve como uma importante fonte de ácido araquidônico na síntese de prostaglandinas.

Os precursores dos endocanabinoides estão presentes nas membranas lipídicas. Os endocanabinoides são sintetizados somente quando necessário, ou seja, sob demanda, em uma ou duas etapas enzimáticas rápidas, e liberados no espaço extracelular por ativação de certos receptores acoplados à proteína G ou por despolarização. Portanto, o SEC contrasta com a produção e liberação dos neurotransmissores clássicos, uma vez que esses são sintetizados antecipadamente e armazenados em vesículas sinápticas. Outra peculiaridade do SEC, é que os endocanabinoides são produzidos na membrana pós-sináptica e vão atuar em receptores pré-sinápticos modulando a hiperexcitabilidade neuronal, ou seja, atuam de forma retrógrada.

A ação do SEC nas vias da dor ocorre tanto de forma independente, como por atuação sinérgica com outros sistemas endógenos dos circuitos de dor, representados por moléculas inflamatórias, endorfinas, encefalina e vários canais iônicos. O sistema endocanabinoide funciona em vários níveis no sistema nervoso como uma via alternativa para a via inflamatória da prostaglandina, com potencial para modular a dor e a inflamação. O efeito na modulação da dor ocorre por meio das vias inibitórias supraespinhais descendentes, através de um mecanismo complexo, de interação entre vários ligantes, reação cruzada com receptores não canabinoides, plasticidade de resposta dependente de características locais do tecido e presença de outras moléculas, como opioides77 Fitzcharles MA, Petzke F, Tölle TR, Häuser W. Cannabis-based medicines and medical cannabis in the treatment of nociplastic pain. Drugs. 2021;81(18):2103-16.,1717 Lu HC, Mackie K. An introduction to the endogenous cannabinoid system. Biol Psychiatry. 2016;79(7):516-25.,1818 Zou S, Kumar U. Cannabinoid receptors and the endocannabinoid system: signaling and function in the central nervous system. Int J Mol Sci. 2018;19(3):833.,1919 Di Marzo, V, Piscitelli F. The endocannabinoid system and its modulation by phytocannabinoids. Neurotherapeutics. 2015;12(4):692-8.,2020 Cravatt BF, Lichtman AH. The endogenous cannabinoid system and its role in nociceptive behavior. J Neurobiol. 2004;61(1):149-60..

Uma hipótese mais recente sugeriu que muitas condições de dor caracterizadas por DN, podem ter relação com deficiências do sistema endocanabinoide. Em 2004, uma pesquisa relacionou pela primeira vez uma possível deficiência do sistema endocanabinoide com um dos mecanismos fisiopatológicos envolvido em doenças como FM, MC e SII. Nessa época já se observava a presença de várias dessas doenças como comorbidades, e os estudos já evidenciavam uma possível hiperatividade central como parte do mecanismo fisiopatológico2121 Staud R. New evidence for central sensitization in patients with fibromyalgia. Curr Rheumatol Rep. 2004;6(4):259.,2222 Bennett R. Fibromyalgia: present to future. Curr Pain Headache Rep. 2004;8(5):379-84.. Diante dessa hipótese, a referida pesquisa sugeriu que essas e outras doenças, nas quais a deficiência do SEC estivesse presente, poderiam ser adequadamente tratadas com fármacos à base de cannabis reequilibrando a deficiência do SEC e restaurando a modulação central2323 Russo EB. Clinical endocannabinoid deficiency (CECD): can this concept explain therapeutic benefits of cannabis in migraine, fibromyalgia, irritable bowel syndrome and other treatment-resistant conditions? Neuroendocrinol Lett. 2004;25(1):31-9..

Em 2010, com um conhecimento mais aprofundado do SEC, uma pesquisa2424 Greco R, Gasperi V, Maccarrone M, Tassorelli C. The endocannabinoid system and migraine. Exp Neurol. 2010;224(1):85-91. apresentou dados experimentais e clínicos que demonstraram a ligação entre endocanabinoides e enxaqueca, um distúrbio neurovascular causado por processamento anormal de informações sensoriais devido à sensibilização periférica e/ou central. Mesmo sem os mecanismos dependentes do SEC envolvidos na fisiopatologia da enxaqueca não estarem totalmente esclarecidos, os resultados disponíveis na época sugeriam fortemente que a ativação do SEC poderia representar uma ferramenta terapêutica promissora para reduzir os componentes fisiológicos e inflamatórios da dor envolvidos nos ataques de enxaqueca.

Em 2016, uma revisão do referido estudo de 20042525 Sarchielli P, Pini LA, Coppola F, Rossi C, Baldi A, Mancini ML, Calabresi P. Endocannabinoids in chronic migraine: CSF findings suggest a system failure. Neuropsychopharmacology. 2007;32(6):1384-90. evidenciou diferenças estaticamente significativas nos níveis de AEA do líquido cefalorraquidiano em portadores de migrânea crônica. Outro estudo, citado nesta revisão, demonstrou a hipofunção do SEC em diferentes áreas corticais e subcorticais de pacientes portadores de doença de Huntington, com reduções significativas na disponibilidade do receptor CB1 versus controles (p<0,0001). Essas reduções variaram de 15% no cerebelo até 25% no córtex frontal, confirmando uma hipoatividade do SEC inversamente relacionada à gravidade da doença. A profunda redução precoce e generalizada da disponibilidade de CB1 in vivo é consistente com a hipótese de que a alteração gênica reprime a transcrição de CB1. Essa foi provavelmente a primeira demonstração in vivo de um distúrbio do SEC em uma doença neurológica humana2626 Van Laere K, Casteels C, Dhollander I, Goffin K, Grachev I, Bormans G, Vandenberghe W. Widespread decrease of type 1 cannabinoid receptor availability in Huntington disease in vivo. J Nucl Med. 2010;51(9):1413-7.. Esses estudos reforçaram a teoria de 2004, e em muito contribuíram para o entendimento da fisiopatologia da DC, principalmente a neuropática e a nociplástica.

Além da provável deficiência do SEC confirmada por esses estudos, foi avaliada também a resposta terapêutica ao uso da cannabis medicinal para MC. Foi comprovada uma diminuição estatisticamente significativa das crises de MC após a introdução de canabinoides. Outra comprovação interessante foi a da eficácia do tratamento com cannabis de uso médico em pacientes portadores de FM, quando comparada com a utilização de Duloxetina, Pregabalina e Minalciprano, fármacos aprovados pela Food and Drug Administration (FDA) e pela European Medicines Agency (EMA), para essa doença2727 Russo EB. Clinical endocannabinoid deficiency reconsidered: current research supports the theory in migraine, fibromyalgia, irritable bowel, and other treatment-resistant syndromes. Cannabis Cannabinoid Res. 2016;1(1):154-65. doi: 10.1089/can.2016.0009.
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Sistema endocanabinoide e dor

O potencial de ação gerado na terminação pré-sináptica faz com que as vesículas citoplasmáticas se fundam com a membrana pré-sináptica e ocorra a liberação de neurotransmissores excitatórios. Os endocanabinoides são então sintetizados em resposta ao aumento da atividade no neurônio pós-sináptico. A ligação do neurotransmissor aos receptores da membrana pós-sináptica causa acúmulo de Ca2+, despolarização da membrana e ativação de enzimas dependentes de cálcio, responsáveis pela síntese dos endocanabinoides NAPE-PLD e DAGL.

A AEA e o 2-AG, então sintetizados, passam a atuar de modo retrógrado nos receptores da membrana pré-sináptica. Esses endocanabinoides se ligam aos receptores canabinoides da membrana pré-sináptica e da membrana celular das células da micróglia no corno posterior da medula espinhal.

Os receptores CB1 estão presentes predominantemente nos neurônios do terminal pré-sináptico, e sua ativação diminui a liberação vesicular, reduzindo a liberação de glutamato nos neurônios de projeção nociceptiva. Esse mecanismo é conhecido como sinalização retrógrada.

Os receptores CB2 estão presentes predominantemente na micróglia, e sua ativação suprime a ativação microglial, responsável pelos sintomas clássicos da sensibilização central (alodinia e hiperpatia), pelos sintomas clássicos de tal forma que a micróglia passa a produzir mais mediadores anti-inflamatórios e menos mediadores pró-inflamatórios. A ativação dos receptores canabinoides neuronais e microgliais leva a uma modulação da nocicepção.

Após atuarem, os canabinoides endógenos presentes na fenda sináptica são captados por transportadores de canabinoides celulares, sendo então decompostos pelas enzimas de degradação, a FAAH e a MAGL. A inativação dos endocanabinoides AEA pela FAAH e 2-AG pela MAGL, ocorre por hidrólise, formando ácido araquidônico e etanolamina ou glicerol, respectivamente2828 van den Hoogen NJ, Harding EK, Davidson CED, Trang T. Cannabinoids in chronic pain: therapeutic potential through microglia modulation. Front Neural Circuits. 2022;15:816747..

Um estudo publicado em 2020 sugere que a manutenção e a potencialização da alodinia mecânica no córtex pré-límbico seja decorrente da estimulação de receptores NMDA e TRPV1. Essa hiperexcitabilidade pode ser atenuada pela ativação de receptores CB1 corticais2929 Medeiros P, Oliveira-Silva M, Negrini-Ferrari SE, Medeiros AC, Elias-Filho DH, Coimbra NC, de Freitas RL. CB1-cannabinoid-, TRPV1-vanilloid- and NMDA-glutamatergic-receptor-signalling systems interact in the prelimbic cerebral cortex to control neuropathic pain symptoms. Brain Res Bull. 2020;165:118-28..

Cannabis de uso médico no tratamento da hiperatividade central

A cannabis é usada para fins medicinais há milhares de anos. Com a proibição da planta em meados do século XX, as pesquisas sobre o uso da planta com fins medicinais foram interrompidas. Nas últimas décadas, houve um crescente debate sobre o uso da cannabis para diversas doenças crônicas refratárias a tratamento convencional, principalmente a DC3030 Hill KP, Palastro MD, Johnson B, Ditre JW. Cannabis and pain: a clinical review. Cannabis Cannabinoid Res. 2017;2(1):96-104..

Há vários estudos pré-clínicos sobre o uso de canabinoides para a dor, porém os estudos clínicos ainda permanecem um pouco limitados. Existem muitas evidências em estudos observacionais, relatórios anedóticos e mesmo em revisões sistemáticas. Porém, como no caso de outras doenças crônicas refratárias a tratamentos convencionais, para a dor também são necessários mais ensaios clínicos randomizados.

O termo “cannabis medicinal” refere-se ao uso da planta e seus componentes, principalmente os canabinoides, sob recomendação e acompanhamento médico, para tratar ou melhorar os sintomas de diferentes doenças. Estudos recentes comprovaram que os fitocanabinoides exercem suas ações terapêuticas sobre a dor através de diferentes alvos, tanto na periferia como no SNC, da mesma forma que os endocanabinoides. Esses alvos incluem não apenas os receptores CB1 e CB2, presentes ao longo de toda a via da dor, mas também outros receptores acoplados à proteína G importantes na via analgésica, como o GPR55, o GPR18, receptores opioides, receptores serotoninérgicos (5-HT), além de receptores de potencial transitório (TRVP, TRPA e subfamílias, e TRPM).

Muitos estudos relataram a capacidade de certos canabinoides na modulação de receptores PPARs, importantes como analgésicos, neuroprotetores e moduladores da função neuronal. Os estudos demonstraram também a interação entre os receptores opioides μ e os receptores CB1, o que potencializa a ação dos fitocanabinoides3131 Lago-Fernandez A, Zarzo-Arias S, Jagerovic N, Morales P. Relevance of peroxisome proliferator activated receptors in multitarget paradigm associated with the endocannabinoid system. Int J Mol Sci. 2021;22(3):1001.,3232 Pascual D, Sánchez-Robles EM, García MM, Goicoechea C. Chronic pain and cannabinoids. Great expectations or a christmas carol. Biochem Pharmacol. 2018;157:33-42.,3333 Al-Hasani R, Bruchas MR. Molecular mechanisms of opioid receptor-dependent signaling and behavior. Anesthesiology. 2011;115(6):1363-81.. Os canabinoides têm mecanismos de ação multimodais no tratamento da dor, incluindo: modulação do processamento nociceptivo neuronal, inibição da liberação de moléculas pró-inflamatórias, inibição da ativação de mastócitos e modulação de receptores opioides endógenos em vias aferentes primárias3434 Vučković S, Srebro D, Vujović KS, Vučetić Č, Prostran M. Cannabinoids and pain: new insights from old molecules. Front Pharmacol. 2018;9:1259.,3535 Amin MR, Ali DW. Pharmacology of medical cannabis. Adv Exp Med Biol. 2019;1162:151-65.,3636 McKenna M, McDougall JJ. Cannabinoid control of neurogenic inflammation. Br J Pharmacol. 2020;177(19):4386-99..

Da mesma forma, a cannabis também pode fornecer alívio para grupos de sintomas que acompanham os quadros de DN, como náusea, ansiedade, insônia e depressão, por meio de seus efeitos no sistema endocanabinoide. Esse grupo de sintomas pode ser difícil de aliviar usando agentes farmacêuticos tradicionais, que geralmente se concentram em um único sintoma. Portanto, além da melhora da dor, melhorando sintomas associados nos portadores de DN, ela ajuda a reduzir o sofrimento psicológico associado à DN3737 Feingold D, Rehm J, Lev-Ran S. Cannabis use and the course and outcome of major depressive disorder: a population based longitudinal study. Psychiatry Res. 2017;251:225-34..

Tetrahidrocanabinol

O THC é o responsável pela maioria das ações farmacológicas da planta, como ação analgésica, anti-inflamatória, antioxidante, antiespasmódica, relaxante muscular, broncodilatadora e antipruriginosa. Apesar de todos os canabinoides serem psicoativos, pois atuam no SNC, o THC é o único que possui efeito disléptico, provavelmente por ser agonista parcial do receptor CB1, com alta afinidade pelo receptor CB13434 Vučković S, Srebro D, Vujović KS, Vučetić Č, Prostran M. Cannabinoids and pain: new insights from old molecules. Front Pharmacol. 2018;9:1259..

Além de modular a liberação de neurotransmissores excitatórios nas sinapses hiperativas, o THC inibe a COX-2 e ativa os receptores CB2 na micróglia com controle e diminuição da hiperpatia e alodinia. O THC também atua nos receptores PPARs, importantes na analgesia.

Apesar do papel dos receptores CB2 na mediação dos efeitos do THC na analgesia não ter sido esclarecido totalmente, os efeitos dos agonistas do receptor CB2 na dor induzida por inflamação são mais bem descritos do que seus efeitos na dor relacionada à disfunção do sistema nervoso3838 Henderson LA, Kotsirilos V, Cairns EA, Ramachandran A, Peck CC, McGregor IS. Medicinal cannabis in the treatment of chronic pain. Aust J Gen Pract. 2021;50(10):724-32.,3939 Alves P, Amaral C, Teixeira N, Correia-da-Silva G. Cannabis sativa: much more beyond Δ9-tetrahydrocannabinol. Pharmacol Res. 2020;157:104822..

Canabidiol

São poucos ensaios clínicos explorando os efeitos analgésicos do canabidiol (CBD) em humanos. Um estudo observacional recente avaliou retrospectivamente as mudanças na qualidade de vida em um subconjunto dos primeiros 400 pacientes da Nova Zelândia a receberem prescrição de CBD (principalmente 100 mg CBD/mL de óleo administrado por conta-gotas)4040 Gulbransen G, Xu W, Arroll B. Cannabidiol prescription in clinical practice: An audit on the first 400 patients in New Zealand. BJGP Open 2020;4(1):bjgpopen20X101010.. Nesse estudo, os pacientes com dor não oncológica (n=53) relataram melhorias significativas na qualidade de vida relacionada à dor, melhor mobilidade e redução da ansiedade e depressão. Pesquisas realizadas com usuários, em países onde os produtos de cannabis estão mais disponíveis gratuitamente (por exemplo, na América do Norte), sugerem que produtos com predominância de CBD tendem a ser consumidos com mais frequência para ansiedade e depressão, enquanto produtos com predominância de THC são preferencialmente usados para dor e sono4141 Kalaba M, Ware MA. Cannabinoid profiles in medical cannabis users: effects of age, gender, symptoms, and duration of use. Cannabis Cannabinoid Res. 2022;7(6):840-51..

Os dados atuais do Special Access Scheme Category B indicam que quase um quarto das aprovações atuais para DC envolvem produtos CBD-dominantes, apesar da evidência mínima disponível em relação à sua eficácia (SAS-B, abril 2021).

Considerando as evidências atuais, um painel de 20 especialistas de nove países recomendou o uso da cannabis medicinal para os mecanismos neuropáticos e nociplásticos da dor e não para a dor nociceptiva4242 Bhaskar A, Bell A, Boivin M, Briques W, Brown M, Clarke H, Cyr C, Eisenberg E, de Oliveira Silva RF, Frohlich E, Georgius P, Hogg M, Horsted TI, MacCallum CA, Müller-Vahl KR, O’Connell C, Sealey R, Seibolt M, Sihota A, Smith BK, Sulak D, Vigano A, Moulin DE. Consensus recommendations on dosing and administration of medical cannabis to treat chronic pain: results of a modified Delphi process. J Cannabis Res. 2021;3(1):22.. Existe um extenso número de estudos pré-clínicos sobre os efeitos dos canabinoides na DC, porém estudos clínicos permanecem limitados. Há muitos estudos observacionais, relatos anedóticos e mesmo revisões sistemáticas, mas poucos ensaios clínicos randomizados4343 Fitzcharles MA, Shir Y, Häuser W. Medical cannabis: strengthening evidence in the face of hype and public pressure. CMAJ. 2019;191(33):E907-E908..

Os desafios são consideráveis em termos de evidências confiáveis sobre os efeitos médicos dos canabinoides na DC neuropática e na DN devido à heterogeneidade de produtos à base de cannabis e diferentes métodos de administração em várias populações. Observa-se também uma falta de compromisso da indústria da cannabis em apoiar pesquisas de melhor qualidade que confirmem o que os estudos observacionais, os relatos anedóticos e as revisões sistemáticas demonstram4444 Martin JH, Hall W, Fitzcharles MA, Borgelt L, Crippa J. Ensuring access to safe, effective, and affordable cannabis-based medicines. Br J Clin Pharmacol. 2020;86(4):630-4..

CONCLUSÃO

A cannabis medicinal e os fármacos à base de cannabis podem potencialmente preencher a lacuna terapêutica no tratamento da DC neuropática e da DN. Seu mecanismo de ação na DN é importante devido à neuromodulação retrógrada nas vias nervosas centrais, diminuindo a hiperexcitabilidade. Além disso, ela também modula a inflamação neuronal microglial, potencializa o sistema opioide e outros mecanismos inibitórios centrais (em toda a via envolvida na fisiopatologia da dor), e tem ações analgésicas periféricas. Embora as evidências que apoiem sua recomendação para DN sejam insuficientes para endossar o uso geral, ela pode e deve ser considerada como uma possível medicação coadjuvante na terapia multimodal da dor, sempre de forma individualizada, quando os tratamentos preconizados falharem ou não forem tolerados.

  • Fontes de fomento: não há.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    28 Mar 2023
  • Aceito
    28 Abr 2023
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