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O uso da tDCS como opção terapêutica para o zumbido: uma revisão sistemática Como citar este artigo: Santos AH, Santos AP, Santos HS, Silva ACd. The use of tDCS as a therapeutic option for tinnitus: a systematic review. Braz J Otorhinolaryngol. 2018;84:653-59.

Resumo

Introdução:

Devido à subjetividade do diagnóstico do zumbido e a suas diversas etiologias, o estabelecimento de um tratamento eficaz é complexo. Nesse contexto surge a transcranial direct current stimulation, uma opção não invasiva, acessível para grande parte dos pacientes, e que tem apresentado bons resultados no tratamento de outros sintomas como dor crônica.

Objetivo:

Avaliar a resposta terapêutica do zumbido ao transcranial direct current stimulation.

Método:

Foi realizada uma revisão sistemática da literatura, por meio dos seguintes descritores: zumbido, transcranial direct current stimulation e ensaio clínico randomizado. A pesquisa foi realizada nas bases de dados MEDLINE/PubMed, Lilacs, Scielo. Os critérios de inclusão foram: pacientes maiores de 18 anos sem outras comorbidades associadas, que tiveram diagnóstico estabelecido por um especialista ou por meio da aplicação de escalas e critérios previamente validados aplicados por médico não especialista.

Resultados:

Foram encontrados 4.165 estudos, sendo selecionado após a aplicação dos critérios de inclusão um total de seis, obtendo-se uma amostra de 602 pacientes. A partir dos critérios definidos, houve uma resposta positiva ao transcranial direct current stimulation em 14.86% dos participantes.

Conclusão:

Baseada na presente revisão, não há ainda uma resposta terapêutica do zumbido ao transcranial direct current stimulation.

PALAVRAS-CHAVE
Zumbido; tDCS; Estimulação transcraniana direta

Abstract

Introduction:

Due to the subjectivity of the tinnitus diagnosis and its diverse etiologies, establishing an effective treatment is complex. In this context, transcranial direct current stimulation, a noninvasive option, is available for most patients and has shown good results in the treatment of other symptoms such as chronic pain.

Objective:

To evaluate the therapeutic response of tinnitus to transcranial direct current stimulation.

Methods:

A systematic review of the literature was performed using the following descriptors: tinnitus, transcranial direct current stimulation and randomized clinical trial. The research was carried out in the MEDLINE/PUBMED, Lilacs, and Scielo databases. The inclusion criteria were: patients over 18 years of age with no associated comorbidities, who had a diagnosis established by a specialist or through the application of previously validated scales and criteria applied by a non-specialist physician.

Results:

A total of 4165 studies were found, and a total of six were selected after the inclusion criteria were applied, obtaining a sample of 602 patients. Based on the defined criteria, there was a positive response to transcranial direct current stimulation in 14.86% of the participants.

Conclusion:

Based on literature studied, there is no therapeutic response of tinnitus to transcranial direct current stimulation.

KEYWORDS
Tinnitus; tDCS; Transcranial direct current stimulation

Introdução

O zumbido pode ser caracterizado como uma ilusão auditiva, ou seja, uma percepção sonora não relacionada com uma fonte externa de estimulação. Acomete igualmente ambos os sexos, ocorre com maior frequência entre os 40 e 70 anos.11 Rider D, Vanneste S, Weisz N, Londero A, Schlee W, Elgoyhen A, et al. An integrative model of auditory phantom perception: tinnitus as a unified percept of interacting separable sub networks. Neurosci Biobehav Rev. 2014;44:16-32.

2 Sanchez T, Zonato A, Bittar R, Bento R. Auditory hallucinations in tinnitus patients: emotional relationships and depression. Int Arch Otorhinolaryngol. 2012;16:322-7.
-33 Lissi P, Amaral N, Oliveira P. Estudo da prevalência e das características em trabalhadores expostos a ruído ocupacional. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2006 [dissertação]. Afeta cerca de 40 milhões de pessoas, tanto nos Estados Unidos como na Inglaterra, e é considerado o terceiro pior problema que pode acometer o ser humano,22 Sanchez T, Zonato A, Bittar R, Bento R. Auditory hallucinations in tinnitus patients: emotional relationships and depression. Int Arch Otorhinolaryngol. 2012;16:322-7. diminui a qualidade de vida da população em torno de 1%.44 Song JJ, Vanneste S, Van de Heyning P, De Ridder D. Transcranial direct current stimulation in tinnitus patients: a systemic review and meta-analysis. ScientificWorldJournal. 2012;12:427-34. Devido à dificuldade inicial de determinar o diagnóstico etiológico, o tratamento não consegue ser estabelecido facilmente, muitas vezes foca apenas na redução sintomatológica.11 Rider D, Vanneste S, Weisz N, Londero A, Schlee W, Elgoyhen A, et al. An integrative model of auditory phantom perception: tinnitus as a unified percept of interacting separable sub networks. Neurosci Biobehav Rev. 2014;44:16-32.,44 Song JJ, Vanneste S, Van de Heyning P, De Ridder D. Transcranial direct current stimulation in tinnitus patients: a systemic review and meta-analysis. ScientificWorldJournal. 2012;12:427-34.

A etiologia do zumbido tem diversas classificações na literatura, é a mais usada, pela simplicidade na diferenciação da origem do zumbido, aquela que difere o zumbido proveniente de estruturas para-auditivas, normalmente de origem muscular ou vascular, das estruturas auditivas neurossensoriais.55 Kalu UG, Sexton CE, Loo CK, Ebmeier KP. Transcranial direct current stimulation in the treatment of major depression: a meta-analysis. Psychol Med. 2012;42:1791-800. O zumbido resultante do sistema auditivo neurossensorial pode ter diversas causas: otológica, cardiovascular, metabólica, neurológica, farmacológica, odontogênica e psicogênica.55 Kalu UG, Sexton CE, Loo CK, Ebmeier KP. Transcranial direct current stimulation in the treatment of major depression: a meta-analysis. Psychol Med. 2012;42:1791-800.,66 Vanneste S, Plazier M, Ost J, Lou EV, Heyning PV, Ridder D. Bilateral dorsolateral prefrontal cortex modulation for tinnitus by transcranial direct current stimulation: a preliminary clinical study. Exp Brain Res. 2010;202:779-85.

Em relação ao tratamento, não existe evidência clínica que corrobore um tratamento como ideal. Todavia, deve-se sempre tratar a sintomatologia do zumbido e, principalmente, buscar por uma causa estrutural como as já citadas. Caso não haja causa estrutural evidente e o paciente tenha um zumbido persistente, existem algumas opções de terapia medicamentosa e não medicamentosa.66 Vanneste S, Plazier M, Ost J, Lou EV, Heyning PV, Ridder D. Bilateral dorsolateral prefrontal cortex modulation for tinnitus by transcranial direct current stimulation: a preliminary clinical study. Exp Brain Res. 2010;202:779-85.

É nesse contexto que surge a Transcranial Direct Current Stimulation (tDCS) como opção de tratamento para diminuir a percepção do zumbido. A tDCS é uma forma não invasiva de estimulação transcraniana na qual uma corrente elétrica passa pelo córtex cerebral através de eletrodos implantados na pele.66 Vanneste S, Plazier M, Ost J, Lou EV, Heyning PV, Ridder D. Bilateral dorsolateral prefrontal cortex modulation for tinnitus by transcranial direct current stimulation: a preliminary clinical study. Exp Brain Res. 2010;202:779-85. Devido a sua característica não invasiva, ao baixocusto, à aplicação fácil e com pouca dor, além de uma inibição residual menor do que outros métodos de estimulação, a tDCS é um método de escolha interessante para o tratamento do zumbido.66 Vanneste S, Plazier M, Ost J, Lou EV, Heyning PV, Ridder D. Bilateral dorsolateral prefrontal cortex modulation for tinnitus by transcranial direct current stimulation: a preliminary clinical study. Exp Brain Res. 2010;202:779-85.,77 Pal N, Maire R, Stephan M, Hermnann F. Transcranial direct current stimulation for the treatment of chronic tinnitus: a randomized controlled study. Brain Stimul. 2013;:1101-7. No entanto, não há consenso sobre alguns parâmetros para seu uso nessa condição específica. Esta revisão, portanto, reúne os resultados existentes em ensaios clínicos sobre a melhoria da sintomatologia, com o objetivo de analisar a resposta terapêutica do zumbido ao tDCS e as possíveis diferenças apresentadas a depender da localização e do tipo de eletrodo.

Método

Tipo de estudo: revisão sistemática

Aprovação do comitê de ética: por se tratar de uma revisão sistemática, não houve necessidade.

Critérios de inclusão

Foram incluídos ensaios clínicos randomizados (ECR), ensaios clínicos quasi-randomizados e estudos abertos cujos pacientes tinham mais de 18 anos. Consideramos ECR aqueles que fizeram a randomização através do uso de moedas, dados ou randomização feita por computador.

Estudos que usaram outras formas de randomização foram classificados como quasi-randomizados. Incluíram-se os estudos nos quais o zumbido foi diagnosticado através da avaliação do especialista ou aplicação de escalas e critérios validados para o sintoma e que avaliaram o uso do tDCS como opção terapêutica para o zumbido, o grupo controle teve um estímulo placebo. O estudo deveria ter usado o tDCS por ao menos duas sessões, foi considerada melhoria da sintomatologia qualquer atenuação da intensidade e do incômodo causado pelo zumbido, assim como dos outros sintomas associados.

Critérios de exclusão

Foram excluídos outros tipos de estudo apresentados (caso controle, coorte, relato de caso), estudos com populações menores que 18 anos, sem a presença de um grupo controle placebo ou que usaram outra terapia associada ao tDCS. Além disso, foram excluídos estudos que apresentaram pacientes com comorbidades associadas ao sintoma do zumbido (traumatismo craniano prévio, uso de substâncias ototóxicas, doença de Meniere, epilepsia, tumor intracraniano) ou que fizeram uso apenas de uma sessão com o tDCS.

Busca eletrônica

A busca dos artigos foi feita nas bases de dados: Medline/Pubmed, Lilacs, Scielo, sem restrição de ano ou idioma de publicação. Para captura de artigos relevantes nas bases de dados eletrônicos, foram usadas as seguintes palavras - chaves: zumbido, tDCS, ensaio clínico randomizado e seus respectivos correlatos em inglês, além do uso do Medical Subject Headings (MeSH).

Seleção dos estudos

A pesquisa e análise dos artigos ocorreram de 01/09/2016 a 25/09/2016. Inicialmente, foram verificadas as duplicidades de artigos com o uso do gerenciamento de banco de dados Microsoft Office Access 2013. Após essa etapa, foram avaliados os artigos selecionados apenas através do título e do resumo de acordo com os critérios de elegibilidade, excluíram-se os artigos irrelevantes. Os artigos selecionados foram lidos na íntegra para decidir-se sobre a sua inclusão. Em seguida, os pesquisadores separadamente fizeram a extração de dados e, após a coleta, nova reunião de consenso foi feita para verificar o grau de concordância entre os autores. Quando ocorreram discordâncias nas reuniões de consenso, o terceiro pesquisador (A.H.M.S) foi solicitado para que se chegasse a um acordo.

Para avaliação da qualidade dos artigos selecionados, foi aplicado o checklist Consolidated Standards of Reporting Trials (Consort) e, para avaliação da qualidade final da revisão sistemática, o checklist Preferred Report Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (Prisma). Adicionalmente, foi feita uma busca ativa por outros estudos citados nas referências dos artigos selecionados para adicionar na revisão de literatura.

Extração de dados

Os dados dos artigos selecionados foram coletados mediante formulário pré-definido com as seguintes informações: título, autor (es), ano de publicação, país de origem, idioma, palavras-chave, objetivos, definição do desenho de estudo, método, período da pesquisa, tamanho da amostra, critério diagnóstico para o zumbido, tempo de tratamento com tDCS, caracterização dos participantes, média de idade e sexo.

Por fim, foi feita busca na base de dados Cochrane e Prospero por revisões similares para que não houvesse a presença de informação duplicada.

Resultados

Seleção dos estudos

Na primeira etapa, foram identificados 4.165 estudos encontrados nas bases de dados eletrônicas, segundo estratégica de busca definida. Trezentos foram excluídos por serem duplicados e 3.108 foram excluídos através do filtro clinical trial. Dos 658 restantes, 643 foram excluídos, após a análise de título e resumo, na etapa de triagem. Dos artigos excluídos, 546 (85%) não condiziam com o objetivo do estudo, 67 (10,5%) usavam outro método de tratamento e 30 (4,5%) eram estudos de revisão. Dentre aqueles que não condiziam com o objetivo de estudo, estavam artigos que abordavam outros tipos de neuroestimulação, métodos farmacológicos. Dentre os 114 estudos selecionados na etapa de triagem 99 (95,19%) não eram compatíveis com o objetivo do estudo, um (0,96%) caracterizava-se como ensaio clínico apenas com dados preliminares, um. (0,96%) obteve uma pontuação < 40% no Consort, quatro (3,84%) usavam outros métodos de tratamento associados e, por fim, três (2,88%) estavam duplicados.

Dessa forma, seis (0,14%) estudos foram selecionados na etapa de elegibilidade. As etapas seguidas para a seleção dos estudos estão apresentadas na figura 1, com o detalhamento quanto aos critérios de inclusão e exclusão adotados. A tabela 2 descreve as características gerais dos estudos. O resultado da avaliação qualitativa dos estudos através do checklist Consort está descrita na tabela 3.

Figura 1
Algoritmo da seleção dos estudos.

Tabela 1
Critérios de inclusão e exclusão
Tabela 2
Dados gerais dos estudos incluídos na revisão sistemática, ordenados por ano de publicação
Tabela 3
Avaliação da qualidade dos estudos selecionados, com base nos itens essenciais do Consort

Escalas usadas para avaliar o objetivo primário

Dentre os estudos selecionados, três (50%) tinham como objetivo avaliar a melhoria da intensidade e da irritação causada pelo zumbido, com o uso da Escala Visual Analógica (EVA). Apenas um estudo objetivou avaliar o seu desfecho primário através da escala Clinical Global Impression (CGI). Dois estudos (33,3%) tinham como objetivo primário avaliar o grau de severidade do zumbido, com o uso do Tinnitus Handicap Inventory (THI).

Resposta terapêutica do zumbido ao tDCS

Dentre os estudos que usaram a escala EVA para mensurar a resposta ao sintoma, todos (100%) tiveram ao menos um resultado estatisticamente significante. O estudo de Vanneste et al.66 Vanneste S, Plazier M, Ost J, Lou EV, Heyning PV, Ridder D. Bilateral dorsolateral prefrontal cortex modulation for tinnitus by transcranial direct current stimulation: a preliminary clinical study. Exp Brain Res. 2010;202:779-85. demonstrou uma resposta significante quando eletrodo implantado com ânodo à direita e cátodo à esquerda, foi uma melhoria tanto para a intensidade como pelo estresse causado pelo zumbido (p < 0,001*). Quando implantados como ânodo à esquerda e cátodo à direita, não houve melhoria em qualquer das escalas (p > 0,05). Pal et al.77 Pal N, Maire R, Stephan M, Hermnann F. Transcranial direct current stimulation for the treatment of chronic tinnitus: a randomized controlled study. Brain Stimul. 2013;:1101-7. usaram a escala THI como objetivo primário, obtiveram-se resultados estatisticamente não significantes (p = 0,69).

O estudo de Faber et al.88 Faber M, Vannest S, Fregni F, Ridder D. Top down pre-frontal affective modulation of tinnitus with multiple sessions of TDCS of dorsolateral prefrontal cortex. Brain Stimul. 2012;:492-550. evidenciou uma melhoria da escala EVA sobre incômodo (p < 0,05*), com o uso dos eletrodos implantados com ânodo à esquerda e cátodo à direita. O estudo desenvolvido por Garin et al.99 Garin P, Gilain C, Philipe J. Short and long lasting tinnitus relief induced by transcranial current direct stimulation. J Neurol. 2011;:1940-8. evidenciou uma resposta estatisticamente significante na escala EVA para intensidade (p = 0,013* para o cátodo e p = 0,020* para o ânodo) e não significante para o desconforto (p = 0,108 para ambos os estímulos).

O estudo de Forogh et al.1010 Forogh B, Mirshaki Z, Raisse G, Shirazi A, Mansoori K, Ahadi T. Repeated sessions of transcranial direct current stimulation for treatment of chronic subjective tinnitus: a pilot randomized controlled trial. Neurol Sci. 2016;37:253-9. usou a escala CGI como objetivo primário e também obteve um resultado estatisticamente não significante (p = 0,807). Por fim, o estudo de Frank et al.1111 Frank E, Schecklman M, Landgrebe M, Burger J, Kreuzer P, Poeppl T, et al. Treatment of chronic tinnitus with repeated sessions of prefrontal transcranial direct current stimulation: outcomes from no open label pilot study. J Neurol. 2012;259:327-33. também fez uso da escala THI como objetivo primário, obteve resultados estatisticamente não significantes (p = 0,957). A tabela 4 resume as respostas terapêuticas do zumbido ao tDCS, baseada no valor de p de cada estudo.

Tabela 4
Resposta terapêutica do zumbido ao tDCS, ordenados por ano de publicação

Comparação entre a resposta terapêutica quando estimulados a ATPE e o CPFDL

Dentre os que usaram a ATPE como local do estímulo, apenas um99 Garin P, Gilain C, Philipe J. Short and long lasting tinnitus relief induced by transcranial current direct stimulation. J Neurol. 2011;:1940-8. (50%) obteve algum resultado estatisticamente significante. Em relação aos estudos com estímulo no CPFDL, dois deles66 Vanneste S, Plazier M, Ost J, Lou EV, Heyning PV, Ridder D. Bilateral dorsolateral prefrontal cortex modulation for tinnitus by transcranial direct current stimulation: a preliminary clinical study. Exp Brain Res. 2010;202:779-85.,88 Faber M, Vannest S, Fregni F, Ridder D. Top down pre-frontal affective modulation of tinnitus with multiple sessions of TDCS of dorsolateral prefrontal cortex. Brain Stimul. 2012;:492-550. (50%) obtiveram resultados estatisticamente significantes. A tabela 5 descreve o posicionamento dos eletrodos em cada estudo separadamente e sua correspondência com o Sistema Internacional de Eletroencefalograma.

Tabela 5
Posicionamento do eletrodo em cada estudo separadamente

Discussão

A partir desta revisão sistemática, foi obtida uma amostra de 602 pacientes, com sítios de estimulação distintos. A partir dos critérios avaliativos usados por cada estudo, houve uma resposta positiva ao tDCS em 14,86% dos participantes. Tal resposta positiva foi obtida a partir de dois dos seis estudos participantes (33,3%).

Em comparação com o único estudo de revisão já publicado na literatura sobre o assunto, houve uma diferença importante, visto que esse traz uma resposta ao zumbido de 39,5%.44 Song JJ, Vanneste S, Van de Heyning P, De Ridder D. Transcranial direct current stimulation in tinnitus patients: a systemic review and meta-analysis. ScientificWorldJournal. 2012;12:427-34. Tal discrepância pode estar relacionada com o surgimento de novos estudos já adicionados na presente revisão sistemática que, por sua vez, não trouxeram respostas positivas do tDCS ao zumbido.77 Pal N, Maire R, Stephan M, Hermnann F. Transcranial direct current stimulation for the treatment of chronic tinnitus: a randomized controlled study. Brain Stimul. 2013;:1101-7.,1010 Forogh B, Mirshaki Z, Raisse G, Shirazi A, Mansoori K, Ahadi T. Repeated sessions of transcranial direct current stimulation for treatment of chronic subjective tinnitus: a pilot randomized controlled trial. Neurol Sci. 2016;37:253-9. Além disso, o uso de diversos métodos e escalas para quantificar o zumbido dificulta a homogeneização dos resultados.1212 Song J, Vanneste S, Heyning P, Ridder D. Transcranial direct current stimulation in tinnitus patients: a systematic review and meta-analysis. ScientificWorldJournal. 2012;134:567-72. Outro impasse também relacionado com a divergência dos resultados de tais estudos pode estar associado às próprias diferenças nas definições de zumbido, como citado por Duijvestijing et al.1313 Duijvestijn JA, Anteunis LJ, Hendriks JJ, Manni JJ. Definition of hearing impairment and its effect on prevalence figures: a survey among senior citizens. Acta Otolaryngol. 1999;119:420-3.

Dentre os critérios avaliativos para mensurar a resposta terapêutica da tDCS ao zumbido, aqueles que obtiveram êxito, ou seja, uma resposta positiva comprovada pelos estudos selecionados, foram aquelas relacionadas à intensidade e ao estresse causado pelo zumbido. A escala escolhida foi a Escala Visual Analógica (EVA), que consiste em pedir para que o participante quantifique o incômodo ou estresse caudado pelo zumbido em uma nota de 0 a 10, com o uso de uma régua apropriada e padrão. Todavia, essa avaliação por muitas vezes já foi considerada como superficial, visto que sofre uma grande influência de aspectos psicológicos e intelectuais do paciente.1414 Figueiredo R, Azevedo A, Oliveira P. Análise da correlação entre a escala visual análoga e o Tinnitus Handicap Inventory na avaliação de pacientes com zumbido. Braz J Otorhinolaryngol. 2009;75:76-9.,1515 Azevedo AA, Mello PO, Siqueira AG, Figueiredo RR. Análise crítica dos métodos de mensuração do zumbido. Braz J Otorhinolaryngol. 2007;73:418-23.

Dessa forma, Figueiredo et al.,1414 Figueiredo R, Azevedo A, Oliveira P. Análise da correlação entre a escala visual análoga e o Tinnitus Handicap Inventory na avaliação de pacientes com zumbido. Braz J Otorhinolaryngol. 2009;75:76-9. desenvolveram um estudo transversal comparativo entre a escala EVA e a escala Tinnitus Handcap Inventory (THI), considerada por muitos pesquisadores mais complexa e, por conclusão, mais eficaz. Esse estudo foi capaz de identificar uma correlação positiva entre a EVA e a THI, ou seja: quando maior a pontuação na EVA, maior a pontuação no THI. Tal conclusão sugere uma maior confiabilidade aos estudos que aplicam a escala EVA na sua avaliação, mesmo considerando a THI ainda mais completa.

Dentre as áreas estimuladas, Vanneste et al.66 Vanneste S, Plazier M, Ost J, Lou EV, Heyning PV, Ridder D. Bilateral dorsolateral prefrontal cortex modulation for tinnitus by transcranial direct current stimulation: a preliminary clinical study. Exp Brain Res. 2010;202:779-85. usaram a aplicação no córtex pré-frontal dorsolateral bilateral, enquanto o estudo de Garin et al.99 Garin P, Gilain C, Philipe J. Short and long lasting tinnitus relief induced by transcranial current direct stimulation. J Neurol. 2011;:1940-8. fez a estimulação na região temporoparietal esquerda. Outros estudos, como o de Fregni et al.,1616 Fregni F, Marcondes R, Boggio OS. Transient tinnitus suppression induced by repetitive transcranial magnetic stimulation and transcranial direct current stimulation. Eur J Neurol. 2006;13:996-1001. já tinham demonstrado uma resposta positiva à estimulação em região temporal esquerda. Tal afirmação pode corroborar as diferenças entre as respostas terapêuticas dos estudos selecionados, mesmo quando usadas regiões iguais para o estímulo.

Quando comparada a média da idade dos pacientes desta revisão sistemática com revisões relacionadas à prevalência do zumbido, observou-se uma faixa etária semelhante, entre 20 e 80 anos, com média de 55,6 anos. Se a variação da idade for muito grande, é possível que as causas do zumbido em indivíduos mais jovens e mais velhos sejam distintas, o que pode influenciar a resposta terapêutica da tDCS. Além disso, assim como neste estudo, a maior parte da amostra é proveniente de países desenvolvidos, não foram encontrados dados sobre os portadores de zumbido nos países em desenvolvimento.1717 McCormack A, Jones M, Somerset S, Hall D. A systematic review of the reporting tinnitus prevalence and severity. Hear Res. 2016;337:70-9.,1818 Rabau S, Rompaey V, Heyning P. The effect of transcranial direct current stimulation in addition to tinnitus retraining therapy for treatment of chronic tinnitus patients: a study protocol for a double-blind controlled randomized trial. Trials. 2015;16:1138.

Um grande estudo de corte transversal desenvolvido nos Estados Unidos por Bhatt et al.1919 Bhatt J, Lin H, Batacharrya N. Prevalence, severity, exposures, and treatment patterns of tinnitus in the United States. JAMA Otolaryngol Head Neck Surg. 2016;142:959-65. analisou, através de um questionário, a prevalência do zumbido, assim como a sua intensidade e incômodo causado, foi respondido por 75.764 habitantes. Tal estudo corroborou ainda mais a prevalência do zumbido na população, visto que 9,6% dos entrevistados citaram ter tido a experiência do zumbido. Dentre esses, 56,1% por mais de cinco anos. A média da idade também foi semelhante, foi identificada neste estudo uma média de 53,1 anos.

As principais limitações da presente revisão estão relacionadas à heterogeneidade dos estudos selecionados em relação à definição do zumbido e também das escalas aplicadas, o que traz muitas divergências na comparação dos resultados encontrados. Além disso, a falta de estudos no Brasil traz uma maior dificuldade de aplicar os resultados encontrados na população brasileira, visto que a maioria dos estudos ocorre em países desenvolvidos e com maior contingente literário sobre prevalência e incidência da doença.

Devido à heterogeneidade dos estudos sobre o assunto, não há ainda uma resposta terapêutica do zumbido ao tDCS. Em função do reduzido número de trabalhos com o uso de metodologias semelhantes também não foi possível fazer metanálise, culminou-se em uma análise de caráter qualitativo. Dessa forma, os resultados encontrados reforçam a necessidade de mais ensaios clínicos, principalmente no Brasil, para verificação da eficácia da tDCS no tratamento desses pacientes.

Todavia, nesta revisão sistemática os artigos que demonstraram resposta positiva com o uso da estimulação, apontaram, com maior frequência, uma redução da intensidade do zumbido.

Conclusão

Baseada na presente revisão, não há ainda uma resposta terapêutica do zumbido ao tDCS.

  • A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial.
  • Como citar este artigo: Santos AH, Santos AP, Santos HS, Silva ACd. The use of tDCS as a therapeutic option for tinnitus: a systematic review. Braz J Otorhinolaryngol. 2018;84:653-59.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2018

Histórico

  • Recebido
    23 Nov 2017
  • Aceito
    2 Fev 2018
  • Publicado
    9 Mar 2018
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