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Avaliação volumétrica de segmentos faríngeos em pacientes com apneia obstrutivado sono Como citar este artigo: Rodrigues MM, Pereira Filho VA, Gabrielli MF, Oliveira TF, Batatinha JA, Passeri LA. Volumetric evaluation of pharyngeal segments in obstructive sleep apnea patients. Braz J Otorhinolaryngol. 2018;84:89-94. ,☆☆ ☆☆ Instituição: Divisão de Cirurgia Oral e Maxilofacial da Faculdade de Odontologia de Araraquara - UNESP e Clínica de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Araraquara - UNIARA, Araraquara, SP, Brasil.

Resumo

Introdução

A Apneia Obstrutiva do Sono ocorre por colapso recorrente das vias aéreas superiores durante o sono, resultando em redução total (apneia) ou parcial (hipopneia) do fluxo aéreo, tendo relação estreita com alterações nas vias aéreas superiores. A TC de feixe cônico permite a análise da via aérea superior e seu volume através da reconstrução tridimensional.

Objetivo

Avaliar uma possível correlação entre o volume da via aérea superior e a gravidade da apneia obstrutiva do sono.

Método

Realizou-se um estudo retrospectivo, com revisão de dados polissonográficos e registros de TC de feixe cônico de 29 pacientes (13 do sexo masculino e 16 do sexo feminino). A correlação entre o volume total da nasofaringe, a orofaringe e a faringe superior com o IAH (Índice de Apneia-Hipopneia) foi avaliada pelo coeficiente de correlação de Pearson.

Resultados

A divisão por gravidade da Apneia Obstrutiva do Sono foi: dez pacientes apresentaram apneia na forma severa, 7 apresentaram apneia moderada, 6 tinham a forma leve e 6 estavam saudáveis. A correlação entre a nasofaringe, a orofaringe e os volumes da faringe superior e o Índice de Apneia-Hipopneia foram respectivamente: -0,415 (p = 0,025), 0,186 (p = 0,334) e -0329 (p = 0,089). A classificação de Spearman controlada pelo Índice de Massa Corporal, idade e sexo foi: -0,206 (p = 0,304), -0,155 (p = 0,439) e 0,242 (p = 0,284).

Conclusão

Não há correlação entre o volume da via aérea e a apneia obstrutiva do sono, avaliada pelo índice de apneia-hipopneia e controlada pelo índice de massa corporal, idade e sexo. O volume das vias aéreas superiores como parâmetro isolado não se correlacionou com a gravidade da síndrome da apneia obstrutiva do sono, e deve ser avaliado em conjunto com outros fatores.

PALAVRAS-CHAVE
Via aérea superior; Apneia obstrutiva do sono; TC de feixe cônico

Abstract

Introduction

Obstructive sleep apnea occurs by recurrent collapse of the upper airway during sleep, resulting in total (apnea) or partial (hypopnea) reduction of the airflow and has intimate relation with changes in the upper airway. Cone Beam CT allows the analysis of the upper airway and its volume by three-dimensional reconstruction.

Objective

To evaluate a possible correlation between the volume of the upper airway and the severity of the obstructive sleep apnea.

Methods

A retrospective study was performed reviewing polysomnographic data and Cone Beam CT records of 29 patients (13 males and 16 females). The correlation between the volume of the nasopharynx, the oropharynx and the total superior pharynx with the AHI was assessed by Pearson's rank correlation coefficient.

Results

The obstructive sleep apnea severity division was: ten patients had severe, 7 had moderate, 6 had mild and 6 of them were healthy. The correlation between the nasopharynx, the oropharynx and the total superior pharynx volumes and the Apnea-Hypopnea-Index was respectively: −0.415 (p = 0.025), 0.186 (p = 0.334) and −0329 (p = 0.089). The Spearman's rank controlled by the Body Mass Index, the age and the gender was: −0.206 (p = 0.304), −0.155 (p = 0.439) and 0.242 (p = 0.284).

Conclusion

There is no correlation between the volume of the airway and the obstructive sleep apnea, assessed by Apnea-Hypopnea-Index and controlled by the Body Mass Index, the age and the gender. The volume of the upper airways as an isolated parameter did not correlate to the severity of the obstructive sleep apnea syndrome, and should be evaluated together with other factors.

KEYWORDS
Upper airway; Obstructive sleep apnea; Cone beam CT

Introdução

A apneia obstrutiva do sono (AOS) é o principal distúrbio respiratório do sono.11 Partinen M, Telakivi T. Epidemiology of obstructive sleep apnea syndrome. Sleep. 1992;15:S1-4. A AOS é definida como um colapso recorrente da via aérea superior durante o sono, resulta em uma redução total (apneia) ou parcial (hipopneia) do fluxo de ar.22 Sleep-related breathing disorders in adults: recommendations for syndrome definition and measurement techniques in clinical research. The Report of an American Academy of Sleep Medicine Task Force. Sleep. 1999;22:667-89. Os achados clínicos incluem aumento da circunferência do pescoço, obstrução nasal, hipertrofia de conchas, desvios do septo nasal, flacidez do palato, hipertrofia das tonsilas faríngeas, macroglossia e obstrução orofaríngea.33 Epstein LJ, Kristo D, Strollo PJ, Friedman N, Malhotra A, Patil SP, et al. Clinical guideline for the evaluation, management and long-term care of obstructive sleep apnea in adults. Sleep Med. 2009;5:263-76. Os fatores de risco associados à apneia incluem sexo masculino, índice de massa corporal (IMC) > 25 kg/m2, baixo nível socioeconômico, idade avançada e menopausa.44 Tufik S, Santos-Silva R, Taddei JA, Bittencourt LRA. Obstructive sleep apnea syndrome in the Sao Paulo Epidemiologic Sleep Study. Sleep Med. 2010;11:441-6. A patência das vias aéreas também é relatada como um fator determinante da AOS. Obesidade, edema e fatores genéticos contribuem para seu desenvolvimento, uma vez que tais situações podem promover variações no volume das vias aéreas.33 Epstein LJ, Kristo D, Strollo PJ, Friedman N, Malhotra A, Patil SP, et al. Clinical guideline for the evaluation, management and long-term care of obstructive sleep apnea in adults. Sleep Med. 2009;5:263-76. Em populações de adultos ocidentais estima-se que a prevalência da AOS seja em torno de 1% a 5%.11 Partinen M, Telakivi T. Epidemiology of obstructive sleep apnea syndrome. Sleep. 1992;15:S1-4.

O estudo das vias aéreas em pacientes com AOS têm apresentado um avanço importante devido ao uso da tomografia computadorizada de feixe cônico (TCFC) em associação com software de reconstrução 3D. Isso permite a avaliação tridimensional das vias aéreas, a determinação de seu volume e a detecção de locais de constrição máxima.55 Guijarro-Martínez R, Swennen GRJ. Cone-beam computerized tomography imaging and analysis of the upper airway: a systematic review of the literature. Int J Oral Maxillofac Surg. 2011;40:1227-37. Esses parâmetros são muito importantes na avaliação da AOS. Trata-se de uma doença que afeta principalmente a via aérea superior e induz alterações cardiovasculares e metabólicas. A avaliação da via aérea em 3D nos possibilita determinar os diferentes locais de obstrução e programar um tratamento correto da redução da patência das vias aéreas. A avaliação em 2D permite medição em apenas um plano e pode levar a interpretações errôneas das estruturas das vias aéreas superiores.55 Guijarro-Martínez R, Swennen GRJ. Cone-beam computerized tomography imaging and analysis of the upper airway: a systematic review of the literature. Int J Oral Maxillofac Surg. 2011;40:1227-37.

Os estudos que correlacionam a AOS com o volume da via aérea superior e anormalidades tomográficas são raros e conflitantes. A TCFC é uma poderosa ferramenta para o entendimento da AOS e deve ser explorada para facilitar o planejamento terapêutico de pacientes com AOS.55 Guijarro-Martínez R, Swennen GRJ. Cone-beam computerized tomography imaging and analysis of the upper airway: a systematic review of the literature. Int J Oral Maxillofac Surg. 2011;40:1227-37.

O objetivo deste estudo foi buscar uma correlação entre o volume da faringe, avaliado pela TCFC, e a gravidade da AOS.

Método

Estudo retrospectivo de revisão dos prontuários de 33 pacientes. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa (registro no 13185113.9.0000).

Os critérios de inclusão foram idade mínima de 18 anos, indivíduos com avaliação clínica de distúrbios respiratórios do sono associados a sinais e sintomas, tais como ronco, sonolência diurna, apneia testemunhada e sensação de sufocamento durante o sono. Pacientes com obesidade mórbida (IMC > 40), anormalidades craniofaciais, obstrução nasal por polipose, tumores craniofaciais ou de vias aéreas; paralisia da laringe ou faringe e cirurgia prévia maxilofacial ou das vias aéreas superiores foram excluídos. O estudo foi limitado a pacientes com dados suficientes em relação a dados demográficos, IMC, polissonografia basal e TCFC adequada.

O tamanho da amostra foi calculado com o erro de amostra em 7%, nível de confiança de 90% e uma diferença de volume da via aérea de 6% entre os grupos de gravidade da AOS. A amostra consistiu em 1920 pacientes, o que representa a capacidade do serviço ambulatorial durante o período de análise desse estudo. O tamanho da amostra foi calculado em 29 indivíduos.

Para obtenção das imagens tomográficas os pacientes ficavam sentados, a posição principal do exame físico, com a cabeça em posição natural, e foram instruídos a não engolir durante o exame. As imagens foram obtidas em um scanner CBCT (I-Cat, KaVo - Brasil) configurado a 120kVp, 36 mA, voxel 0,25 mm e FOV de 16 × 22 cm, desde o vértice do crânio até o nível C3. Todas as imagens foram armazenadas em um DVD para análise com software específico. As imagens Dicom (Digital Imaging and Communications in Medicine) foram importadas e reconstruídas com o software Dolphin (Dolphin Imaging Management Solutions, Chatsworth, Califórnia, EUA). A orientação de cada conjunto de dados foi padronizada de acordo com o plano horizontal de Frankfurt e plano médio-sagital, com renderização de volume e cortes multiplanares, como descrito por Guijarro-Martinez e Swennen.66 Guijarro-Martínez R, Swennen GRJ. Three-dimensional cone beam computed tomography definition of the anatomical subregions of the upper airway: a validation study. Int J Oral Maxillofac Surg. 2013;42:1140-9. A análise volumétrica das sub-regiões tridimensionais da faringe foi feita com esse mesmo software e a soma dos volumes em milímetros cúbicos.

Para a medida dos volumes, foram selecionados os cortes sagitais e os planos foram formados com recurso às referências anatômicas, definiram-se dessa forma seus limites superiores e inferiores. A faringe foi segmentada em nasofaringe e orofaringe. Os limites de cada porção foram determinados conforme o estudo de validação de Guijarro-Martinez e Swennen.66 Guijarro-Martínez R, Swennen GRJ. Three-dimensional cone beam computed tomography definition of the anatomical subregions of the upper airway: a validation study. Int J Oral Maxillofac Surg. 2013;42:1140-9. Os limites da nasofaringe foram: anteriormente, um plano perpendicular ao plano horizontal de Frankfurt (FHP) que passa através da espinha nasal posterior (PNS) e inferiormente um plano paralelo ao FHP passa pelo PNS e estende-se até a parede posterior da faringe. A orofaringe se iniciava nesse último plano e seu limite inferior era um plano paralelo ao FHP que passava pelo ponto mais anteroinferior do corpo de C3. O volume total da faringe superior foi obtido pela soma dos volumes da nasofaringe e orofaringe.

As polissonografias foram feitas após a obtenção da TCFC. O sono foi avaliado durante um período médio de seis horas. As variáveis eletrofisiológicas avaliadas durante o sono foram: eletroencefalograma (EEG), eletro-oculograma (EOG), eletromiograma (EMG), eletrocardiograma (ECG), fluxo aéreo (oral e nasal), esforço respiratório (torácico e abdominal), outros movimentos corporais (medidos pelo EMG), gasometria arterial (saturação de oxigênio) e temperatura corporal. Os exames foram avaliados pelos critérios do Manual AASM de 2012.77 Berry RB, Budhiraja R, Gottlieb DJ, Gozal D, Iber C, Kapur VK, et al. Rules for scoring respiratory events in sleep: update of the 2007 AASM Manual for the Scoring of Sleep and Associated Events. Deliberations of the Sleep Apnea Definitions Task Force of the American Academy of Sleep Medicine. J Clin Sleep. 2012;8:597-619. Um especialista em distúrbios do sono (MMR) obteve o índice de apneia/hipopneia ao somar os eventos de apneia e hipopneia divididos pelas horas de sono. De acordo com os resultados, a AOS foi classificada como ausente (AHI < 5 eventos/h), leve (5 ≤ AHI < 15 eventos/h), moderada (15 ≤ AHI < 30 eventos/h) ou grave (AHI ≥ 30 eventos/h).

As medidas das imagens tomográficas em 3D foram obtidas por um examinador experiente, cego para qualquer outro dado do estudo, tais como elementos antropométricos, exame físico e polissonografia. Foram obtidas duas determinações de volume separadas por um intervalo de 30 dias, foi usada a média dessas medidas. A reprodutibilidade foi avaliada pela fórmula de Dahlberg (e o coeficiente de correlação intraclasse [ICC]). Os dados foram analisados por meio de testes estatísticos descritivos e a frequência dos resultados. Usou-se o coeficiente de correlação de Pearson para a correlação do volume das sub-regiões da faringe e do IAH. Para a análise com nível de significância de 5% (α = 0,05), usou-se o sistema SAS System for Windows (software Statistical Analisis System), versão 9.3 (SAS Institute Inc, 2002-2008, Cary, NY, EUA).

Resultados

Foram avaliados 33 pacientes entre junho de 2012 e dezembro de 2013. Quatro foram excluídos. Dois deles apresentavam exames tomográficos inadequados e dois tinham registros incompletos. Portanto, 29 foram incluídos, 16 do sexo feminino (55%) e 13 do masculino (45%).

Os dados descritivos das variáveis antropométricas em cada grupo de gravidade da AOS podem ser encontrados na tabela 1. O teste H de Kruskal-Wallis foi usado para avaliar a igualdade desses grupos, considerando que a idade e o sexo dos grupos eram semelhantes. Os grupos de gravidade da AOS diferiram apenas no IMC. A tabela 2 demonstra que as variáveis apresentaram distribuição normal pelo teste de Kolgomorov-Smirnov. Um teste de homogeneidade marginal pareada foi usado para avaliar a força da medida do volume da via aérea. Os resultados da análise de reprodutibilidade estão resumidos na tabela 3.

Tabela 1
Distribuição dos pacientes de acordo com a gravidade da AOS, segundo o IAH
Tabela 2
Descrição e teste de normalidade das variáveis contínuas
Tabela 3
Teste de homogeneidade marginal, erro de Dahlberg e coeficiente de correlação intraclasse (CCI) para as duas determinações de volume em mm3

O IAH foi estatisticamente avaliado como uma variável contínua e o coeficiente de correlação de Spearman foi escolhido. Os resultados desta análise aparecem nas tabelas 4 e 5. Na tabela 5, a correlação da graduação de Spearman foi controlada pelo IMC, pela idade e pelo sexo. Houve correlação estatisticamente significativa entre o IAH e o IMC. Houve uma correlação moderada entre o IAH e a nasofaringe. A relação entre as medidas de volume da orofaringe e faringe superior total com o IAH foi baixa, não mostrou significância estatística. A correlação entre o volume de sub-regiões da faringe e o IAH também foi baixa, sem significância estatística quando controlada por IMC, idade e sexo.

Tabela 4
Coeficiente de correlação de Spearman entre as variáveis antropométricas do IAH
Tabela 5
Coeficiente de correlação de Spearman entre os índices IAH e volume ou segmentos da faringe

Discussão

A AOS é uma doença dinâmica, que se desenvolve com a obstrução total ou parcial da via aérea superior durante o sono. Os pacientes podem apresentar um ou mais locais de obstrução localizados na cavidade nasal, orofaringe, base da língua e hipofaringe.88 Friedman M, Soans R, Joseph N, Kakodkar S, Friedman J. The effect of multilevel upper airway surgery on continuous positive airway pressure therapy in obstructive sleep apnea/hypopnea syndrome. Laryngoscope. 2009;119:193-6. A avaliação completa das vias aéreas é fundamental para o diagnóstico da AOS. A eficácia do tratamento cirúrgico baseia-se na determinação e no tratamento de todos os múltiplos sítios obstrutivos da via aérea superior.88 Friedman M, Soans R, Joseph N, Kakodkar S, Friedman J. The effect of multilevel upper airway surgery on continuous positive airway pressure therapy in obstructive sleep apnea/hypopnea syndrome. Laryngoscope. 2009;119:193-6.

A distribuição dos pacientes avaliados de acordo com a gravidade da AOS pode ser observada na tabela 1. A maior incidência de pacientes graves foi considerada normal, uma vez que os pacientes vieram de um centro de referência de AOS. Os dados antropométricos obtidos, como o IMC médio compatível com obesidade e idade prevalente entre 40 e 50 anos, permitem concluir que a AOS predominou em indivíduos obesos de meia-idade neste estudo.44 Tufik S, Santos-Silva R, Taddei JA, Bittencourt LRA. Obstructive sleep apnea syndrome in the Sao Paulo Epidemiologic Sleep Study. Sleep Med. 2010;11:441-6. A obesidade é uma variável importante na avaliação da AOS. Nesta amostra os grupos com diferentes níveis de gravidade da AOS foram estatisticamente semelhantes em idade e sexo, mas diferentes no IMC (tabela 4).

A correlação entre o volume dos segmentos da faringe e a AOS (tabela 5), avaliada pelo IAH, foi moderada e negativa em relação à nasofaringe (−0,437, p = 0,018), mas essa relação não foi mantida quando controlada por IMC, idade e sexo (tabela 6). Não houve correlação entre o volume da orofaringe e o volume total de faringe superior e o AHI (tabela 5), e o IMC não influenciou essa relação (tabela 6). Esses dados vão contra o senso comum, em que se acredita que o alargamento cirúrgico da faringe seja a intervenção primária das vias aéreas no tratamento de pacientes com AOS.88 Friedman M, Soans R, Joseph N, Kakodkar S, Friedman J. The effect of multilevel upper airway surgery on continuous positive airway pressure therapy in obstructive sleep apnea/hypopnea syndrome. Laryngoscope. 2009;119:193-6.

Tabela 6
Coeficiente de correlação de Spearman entre volume e IAH, controlado por IMC, idade e sexo

Existem poucos estudos sobre a relação entre nasofaringe e AOS em adultos. Cai et al. (2010)99 Zhang L, Li S, Cai C. Compare of CT scan of the nasopharynx in patients with obstructive sleep apnea-hypopnea syndrome and health. Lin Chuang Er Bi Yan Hou Tou Jing Wai Ke Za Zhi. 2010;24:746-9. constataram que o estreitamento da via aérea superior em pacientes com AOS pode ser atribuído principalmente à nasofaringe, mas consideraram a influência do comprimento do palato duro nessa relação. É provável que o IMC seja mais importante na avaliação da AOS do que a nasofaringe como variável isolada, pois o volume dessa sub-região não permaneceu estatisticamente significante quando se considerou o IMC.

Abramson et al. (2010)1010 Abramson Z, Susarla S, August M, Troulis M, Kaban L. Three-dimensional computed tomographic analysis of airway anatomy in patients with obstructive sleep apnea. J Oral Maxillofac Surg. 2010;68:354-62. mostraram que a análise linear do volume da via aérea e da AIH não foi positiva. A AOS também está relacionada com o comprimento da via aérea. Quanto maior o comprimento, maior a chance de ocorrência de colapso. Uma vez que a via aérea é um ducto simples, a resistência ao fluxo de ar apresenta uma combinação seriada, resulta num aumento da resistência total.1010 Abramson Z, Susarla S, August M, Troulis M, Kaban L. Three-dimensional computed tomographic analysis of airway anatomy in patients with obstructive sleep apnea. J Oral Maxillofac Surg. 2010;68:354-62. A análise de volume com controle do IMC e da idade também não mostrou interação com a AOS.

Resultados semelhantes foram encontrados em um estudo sul-coreano, no qual os pacientes foram divididos em dois grupos com IAH maior ou menor do que 30 eventos/hora, mas não houve diferença entre o volume das vias aéreas dos dois grupos.1111 Kim EJ, Choi JH, Kim YS, Kim TH, Lee SH, Lee HM, et al. Upper airway changes in severe obstructive sleep apnea: upper airway length and volumetric analyses using 3D MDCT. Acta Otolaryngol. 2011;131:527-32. Outro estudo que comparou as anormalidades tomográficas das vias aéreas em pacientes com AOS com boca aberta ou fechada encontrou uma redução significativa do comprimento da via aérea superior quando a boca estava aberta. Na avaliação do volume das vias aéreas não houve diferença entre os dois grupos. Portanto, o volume da via aérea não flutuou significativamente em pacientes com diferentes graus de AOS ou devido à abertura bucal.1212 Kim EJ, Choi JH, Kim KW, Kim TH, Lee SH, Lee HM, et al. The impacts of open-mouth breathing on upper airway space in obstructive sleep apnea: 3-D MDCT analysis. Eur Arch Otorhinolaryngol. 2011;268:533-9.

Esses estudos avaliaram a relação entre a AOS e o volume total da via aérea. Em nossa amostra, a faringe foi estudada por suas sub-regiões, avaliaram-se separadamente a correspondência entre a AOS e os segmentos da faringe (nasofaringe e orofaringe).

O volume da faringe, como avaliado neste estudo, não prevê a gravidade da AOS. A doença é multifatorial e a avaliação de um setor localizado da via aérea pode conduzir a uma interpretação errônea e falha do tratamento, pois não avalia todos os níveis da via aérea e não avalia os fatores de compressão extrínseca da faringe.1313 Goh YH, Mark I, Fee WE. Quality of life 17 to 20 years after uvulopalatopharyngoplasty. Laryngoscope. 2007;117:503-6.,1414 Caples SM, Rowley JA, Prinsell JR, Pallanch JF, Elamin MB, Katz SG, et al. Surgical modifications of the upper airway for obstructive sleep apnea in adults: a systematic review and meta-analysis. Sleep. 2010;33:1396-407. É importante considerar que o volume da faringe não é uma medida estática, mas dinâmica. Ele é afetado pela deglutição, respiração e posicionamento. Neste estudo, o volume da faringe foi avaliado por imagens fixas. O volume da faringe pode variar no mesmo indivíduo, embora todos os pacientes tenham recebido as mesmas instruções no momento da aquisição da imagem.

A Academia Americana de Medicina do Sono (American Academy of Sleep Medicine - AASM) publicou em 2010 uma metanálise sobre procedimentos cirúrgicos da via aérea superior. Esse estudo concluiu que os procedimentos em uma região isolada das vias aéreas não mostraram consistência na redução do IAH, resultaram em AOS residual após o procedimento. Os melhores resultados foram obtidos com a abordagem cirúrgica multinível.1414 Caples SM, Rowley JA, Prinsell JR, Pallanch JF, Elamin MB, Katz SG, et al. Surgical modifications of the upper airway for obstructive sleep apnea in adults: a systematic review and meta-analysis. Sleep. 2010;33:1396-407. Conclui-se que uma das causas desses achados é a falta de correlação entre o volume da via aérea e o IAH.

A AOS é uma doença relacionada a alterações intrínsecas e extrínsecas de toda a via aérea. Apesar de a faringe desempenhar um papel central no desenvolvimento da doença, não houve correlação entre o volume desse setor isolado da via aérea e a gravidade da AOS. A TCFC é um método rápido e de baixo risco para o exame do paciente, com pequena emissão de radiação. Ela atinge até três vezes a velocidade das usadas na TC convencional, enquanto emite 10 vezes menos radiação para os pacientes. O ciclo não dura mais do que 40 segundos e o feixe emitido é pulsátil, reduz a quantidade de radiação empregada.

No entanto, é um teste estático, feito com o paciente sentado. A medida do IAH, que define a gravidade da AOS, é obtida com o paciente deitado em sono natural. A diferença de posição e a análise estática da faringe podem levar a resultados diferentes entre IAH e volume. É importante notar que na prática atual os pacientes são examinados em estado de vigília e em posição sentada. As decisões cirúrgicas tomadas nessa posição podem levar a uma má interpretação dos espaços da faringe, uma vez que em nossa amostra as dimensões da orofaringe não se correlacionaram com a gravidade da AOS.

Conclusão

Na população estudada, considerando o índice de massa corporal, o volume das sub-regiões da faringe não apresenta relação linear com a gravidade da AOS, conforme o índice de apneia-hipopneia. O volume da nasofaringe apresentou relação negativa e significativa com a gravidade da apneia obstrutiva do sono, mas essa relação não foi sustentada quando se consideraram o IMC, a idade e o sexo.

  • A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial.
  • Como citar este artigo: Rodrigues MM, Pereira Filho VA, Gabrielli MF, Oliveira TF, Batatinha JA, Passeri LA. Volumetric evaluation of pharyngeal segments in obstructive sleep apnea patients. Braz J Otorhinolaryngol. 2018;84:89-94.
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    Instituição: Divisão de Cirurgia Oral e Maxilofacial da Faculdade de Odontologia de Araraquara - UNESP e Clínica de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Araraquara - UNIARA, Araraquara, SP, Brasil.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2018

Histórico

  • Recebido
    23 Out 2015
  • Aceito
    10 Dez 2016
Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial. Sede da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial, Av. Indianópolia, 1287, 04063-002 São Paulo/SP Brasil, Tel.: (0xx11) 5053-7500, Fax: (0xx11) 5053-7512 - São Paulo - SP - Brazil
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