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Limites do poder familiar nas decisões sobre a saúde de seus filhos – diretrizes

Resumos

O respeito pelo ser humano é um dos princípios fundamentais da bioética, que se manifesta no exercício da autonomia. Quando o paciente não tem competência para tomar suas próprias decisões em relação à saúde, como no caso de crianças com menos de 12 anos, há a presunção de que seus pais decidem por elas, no exercício do poder familiar. O que queremos discutir é a legitimidade e a justiça dessa decisão, quando suas opções ultrapassam os limites tolerados pela ética, pela lei e pela sociedade em determinadas situações, e qual é a prática usual no Brasil quando há conflito de interesses entre a proposta terapêutica do médico e o desejo dos pais.

Bioética; Tomada de decisões; Poder familiar; Análise ética; Legislação


Respect for human beings is one of the fundamental principles of bioethics, and is manifested through the exercise of autonomy. When a patient is not competent to make decisions regarding his or her health, as is the case with children under twelve years of age, there is a presumption that parents should make decisions on behalf of the child through the exercise of parental authority. The present study discusses the legitimacy and judicial right of parents to make decisions for their children when the choices involved go beyond the boundaries permitted by ethics, law and society. The study also considers common practice in Brazil, when there is a conflict of interest between the treatment proposed by the medical professiomal and the wishes of parents.

Bioethics; Decision-making; Parenting; Ethical analysis; Legislation


El respecto por el ser humano es uno de los principios fundamentales de la bioética, que se manifiesta a través del ejercicio de la autonomía. Cuando el paciente no tiene competencia para tomar sus propias decisiones em relación a la salud, como es el caso de niños menores de doze años de edad, existe la presunción de que sus padres, a través del ejercicio del poder familiar, decidan por ellos. Lo que queremos discutir es la legitimidade y la justicia de padres decidiendo por sus hijos menores de edad, cuando sus opciones sobrepasan los limites tolerados por la ética, por la ley y por la sociedad en determinadas situaciones y cuál es la práctica usual em el Brasil, cuando hay conflicto de interés entre la propuesta terapéutica del médico y el deseo de los padres.

Bioética; Toma de decisiones; Responsabilidad parental; Análisis ético; Legislación


A bioética desenvolveu metodologias adequadas para discutir e solucionar os conflitos morais que surgem na prática assistencial, visando ao estudo racional, sistemático e objetivo dos problemas, a fim de que a tomada de decisão se constitua em ato bom e correto 1. Loch JA, Gauer GJC. Comitês de bioética: importante instância de reflexão ética no contexto da assistência à saúde. Rev AMRIGS. 2010;54(1):100-4.,2. Loch JA. Metodologia de análise de casos em bioética clínica. In: Loch JA, Gauer GJC, Casado M, organizadores. Bioética, interdisciplinaridade e prática clínica. Porto Alegre: EdiPUCRS; 2008. p. 367-75.. Há vários modelos para a tomada de decisão em bioética clínica 3. Zoboli E. Tomada de decisão em bioética clínica: casuística e deliberação moral. Rev. bioét. (Impr.). 2013(3): 389-96.,e, nessa reflexão, utilizaremos a casuística, procedimento proposto por Albert Jonsen e Stephen Touilmin em 1988 4. Jonsen AR, Toulmin SE. The abuse of casuistry: a history of moral reasoning. Berkeley: University of California Press; 1988., para propor solução para caso apresentado como exemplo.

Na aplicação do método casuístico analisa-se o caso clínico descoberto como problema ético em função dos tópicos 3. Zoboli E. Tomada de decisão em bioética clínica: casuística e deliberação moral. Rev. bioét. (Impr.). 2013(3): 389-96.: indicações médicas, preferências do paciente, qualidade de vida e aspectos conjunturais. Para cada tópico, há perguntas norteadoras das discussões e análise do caso. Vamos nos ocupar, neste artigo, com decisões substitutivas por delegação em crianças pré-adolescentes (menores de 12 anos de idade), às quais não podem ser aplicados os critérios subjetivo e de juízo substitutivo, uma vez que são legalmente incapazes e, do ponto de vista do desenvolvimento cognitivo, incompetentes, podendo apenas ser aplicado o critério de maior benefício ou de melhor interesse.

O que queremos discutir é a legitimidade e a justiça de pais decidirem pelos filhos menores de idade em situações de conflito de interesses entre a proposta terapêutica do médico e o desejo dos pais. Este artigo pretende considerar mais os aspectos éticos do que os legais, mas utilizará as legislações brasileira e internacional para referenciar alguns pontos.

Cenário

Menina de 9 anos de idade apresenta insuficiência renal crônica. Após extensa revisão do caso e considerando as complicações já apresentadas ao longo de sua história clínica, o médico nefrologista assistente, juntamente com sua equipe, indica transplante renal, para prolongar e melhorar a qualidade da sobrevida. A paciente e seus pais aceitam a possibilidade, mas apresentam um termo de isenção de responsabilidade, notificando que não aceitam transfusão de sangue ou de seus constituintes que poderiam ser usados no tratamento, e isenta médicos, hospital e equipes hospitalares de quaisquer danos que possam resultar de seu cumprimento. O documento vem assinado pela paciente, por seus pais e uma testemunha.

O médico nefrologista, diante desse problema de consciência, por um lado seguro de sua indicação médica e, por outro, inseguro em assumir o risco de um transplante sem uso de sangue ou seus derivados, solicita consultoria ao comitê de bioética clínica da instituição.

Discussão do caso cenário pelo método casuístico

Indicações médicas

O médico da paciente relata que – após exaustiva avaliação do quadro clínico (insuficiência renal crônica, irreversível) e da história pregressa (várias intercorrências que a colocaram em risco de morte prematura), levando em conta sua qualidade de vida (comprometida por três sessões de hemodiálise semanais e consequentes deslocamentos, com seus incômodos e custos), a limitação na mobilidade, internações eventuais, a conduta médica padrão nessas situações (com amplo apoio na literatura disponível) e a sobrevida média menor em pacientes em hemodiálise (10 a 15 anos) do que em pacientes transplantados – indicou o transplante renal de doador cadavérico. Vê nessa proposta terapêutica muito mais benefícios do que os riscos a que a paciente é submetida, mantendo-se a atual abordagem. Sente-se, porém, desconfortável com a recusa da paciente e seus pais em receber, em caso de necessidade, sangue ou seus derivados. Sabe que devia propor o transplante, mas está inseguro em assumir o risco de fazê-lo sem dispor de todos os recursos terapêuticos, caso necessários, mesmo após explicações completas à paciente e seus pais.

Preferências do paciente

Um dos princípios fundamentais da bioética é o de que adultos competentes têm o direito de decidir sobre seu próprio corpo e que o médico deve obter um consentimento livre e esclarecido do paciente, antes de praticar qualquer ato 5. Diekema DS. Parental refusals of medical treatment: the harm principle as threshold for state intervention. Theor Med Bioeth. 2004;25(4):243-64.

. Merrick JC. Christian Science healing of minor children: spiritual exemption statutes, first amendment, and fair notice. Issues Law Med. 1994 inverno;10(3):321-42.

. Goldim JR. Princípio do respeito à pessoa ou autonomia. [Internet]. 2004 [acesso 24 jan 2014]. Disponível: http://www.bioetica.ufrgs.br/autonomi.htm
http://www.bioetica.ufrgs.br/autonomi.ht...

. Ubel PA. The challenge of measuring community values in ways appropriate for setting health care priorities. Kennedy Inst Ethics J. 1999;9(3):263-84.

. Tauber AI. Medicine, public health, and the ethics of rationing. Perspect Biol Med. 2002;45(1):16-30.
-1010 . Meisel A. The legal consensus about forgoing life-sustaining treatment: its status and its prospects. Kennedy Inst Ethics J. 1992;2:309-45.. Os pacientes incapazes têm o mesmo direito que os capazes, mas a forma como o exercem é necessariamente diferente 1010 . Meisel A. The legal consensus about forgoing life-sustaining treatment: its status and its prospects. Kennedy Inst Ethics J. 1992;2:309-45.. É o princípio de respeito à pessoa, também denominado de princípio da autonomia.

O marco ético para as decisões substitutivas foi a Patient Self-Determination Act 1111 . Clotet J. Reconhecimento e institucionalização da autonomia do paciente: um estudo da The Patient Self-Determination Act. Bioética. 1993;1(2):158-64., cujas normas de atuação compreendem, nesta hierarquização:

  • Critério subjetivo – o paciente decide, quando capaz ou mediante diretrizes prévias diretas (testamentos vitais) ou indiretas (poderes de representação), como devem tratá-lo quando incapaz e outros tenham de fazê-lo em seu lugar.

  • " Critério de juízo substitutivo – um substituto escolhe o que o paciente elegeria se fosse competente e estivesse a par tanto das opções médicas como de sua situação clínica real, incluindo o fato de ser incompetente.

  • Critério de maior benefício ou de melhor interesse – um substituto elege o que, em seu juízo, melhor promove os interesses do paciente e aquilo que lhe proporciona o maior bem.

A legislação brasileira também é explícita em relação à necessidade do consentimento livre e esclarecido do paciente em qualquer ato médico, salvo em caso de risco iminente de morte 1212 . Brasil. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. [Internet]. 2002 [acesso 22 jan 2015]. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm
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13 . Brasil. Código Penal. Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. [Internet] 2003 [acesso 22 jan 2015]. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/dec...

14 . Conselho Federal de Medicina. Código de Ética Médica. Resolução do Conselho Federal de Medicina nº 1.931/2009. Diário Oficial da União, 24 set 2009, Seção I, p. 90; retificação Diário Oficial da União, 13 out 2009, Seção I, p. 173.
-1515 . Brasil. Código de Defesa do Consumidor. Lei nº 8.078, 11 set 1990. [Internet] 2003 [acesso 22 jan 2015]. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/lei...
.

Competência para exercer pessoalmente os atos da vida civil

No caso cenário, a paciente tem 9 anos de idade e, pelo Código Civil Brasileiro 1212 . Brasil. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. [Internet]. 2002 [acesso 22 jan 2015]. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm
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, é absolutamente incapaz de exercer pessoalmente os atos da vida civil, cabendo aos pais decidirem por ela, no exercício do poder familiar, usando o critério de “maior benefício” ou de “melhor interesse” que, por força da lei e pressuposto ético, é desempenhado pelos pais. Inaugura-se, assim, o bastante complexo campo das decisões por delegação, e o problema imediato que se apresenta é: Até que ponto os pais têm o direito de decidirem por seus filhos? 1616 . Kipper DJ. Até que ponto os pais têm o direito de decidir por seus filhos. J. pediatr. 1997;73(2):67-74.

Buchanan e Brock definem “melhor interesse” como agindo de modo a promover ao máximo o bem do indivíduo 1717 . Buchanan AE, Brock DW. Deciding for others: the ethics of surrogate decision-making. Nova York: Cambridge University Press; 1990. p. 234-7.,e Beauchamp e Childress 1818 . Beauchamp TL, Childress JF. Principles of biomedical ethics. 5ª ed. Nova York: Oxford; 2001. p. 93-126. como aquele em que um substituto na tomada de decisões deve determinar a maior rede de benefícios entre as opções existentes, designando diferentes pesos a cada opção e descontando ou subtraindo os riscos ou custos inerentes. Em ambas as opiniões, requer-se que o substituto aja de modo a sempre escolher o que seja mais favorável à criança.

Argumentos para a presunção da autonomia dos pais

Existem boas razões para a presunção em respeitar a autonomia dos pais e a privacidade da família:

  • A maioria dos pais é motivada pelos melhores interesses de seus filhos, deseja o que é melhor para eles e toma decisões que lhes são benéficas 1919 . Horn C. Religion, blood transfusions, and childrens’ rights. [Internet]. 2013 [acesso 27 jan 2014]. http://www.hmcwriter.com/religion-blood-transfusions-and-childrens-rights/
    http://www.hmcwriter.com/religion-blood-...
    ;

  • A motivação pelo bem-estar de seus filhos leva os pais a fazer a melhor escolha para eles 2020 . Dare T. Parental rights and medical decisions. Paediatr Anaesth. 2009;19:947-52.;

  • Os pais têm insights privilegiados sobre as preferências e capacidades de seus filhos, em razão da proximidade com eles;

  • O apoio dos pais tem significado clínico, melhorando a recuperação do paciente;

  • Os interesses dos membros da família algumas vezes entram em conflito, e algumas desses entes podem sofrer danos em consequência de certas decisões. Os pais normalmente estão mais bem posicionados do que pessoas de fora da família para pesar os interesses em competição e tomar a melhor decisão;

  • Os pais devem ter o direito de ver seus filhos crescerem de acordo com seus próprios padrões e valores e de transmiti-los a eles;

  • Para que as relações intrafamiliares possam florescer, a família deve ter suficiente espaço e estar livre da intromissão de outros. Sem autonomia para tomar decisões, incluindo a escolha da religião, as famílias não frutificam, e sua importante função na sociedade será prejudicada;

  • Os fardos das consequências deverão ser suportados pela família 2121 . Whitney SN, Ethier AM, Frugé E, Berg S, McCullough LB, Hockenberry M. Decision-making in pediatric oncology: who should take the lead? The decisional priority in pediatric oncology model. J Clin Oncol. 2006 1 jan;24(1):160-5.;

  • Os pais têm autoridade natural sobre os filhos;

  • É temerário refutar as opções dos pais quando não há certeza sobre o prognóstico da intervenção proposta;

  • O desconforto causado pela solicitação de ordens judiciais é prejudicial para a sociedade e para outros pais por comprometer a relação médico-paciente 2222 . Wilson P. Jehovah’s Witness children: when religion and the law collide. Paediatr Nurs. abr 2005;17(3):34-7.;

  • Pragmaticamente, (a) se não respeitamos o direito dos pais de decidir por seus filhos, corre-se o risco de eles não os trazerem para os cuidados médicos 2020 . Dare T. Parental rights and medical decisions. Paediatr Anaesth. 2009;19:947-52. e; (b) perde-se tempo para o início do tratamento 2323 . Kopelman LM. Children and bioethics: uses and abuses of the best-interests standard. J Med Philos. 1997;22(3):213-7..

Questionamentos sobre a presunção dos direitos dos pais

Dare 2020 . Dare T. Parental rights and medical decisions. Paediatr Anaesth. 2009;19:947-52. coloca em dúvida a maioria dos argumentos a favor da presunção da autoridade dos pais para decidir por seus filhos. Eis o resumo de seus argumentos:

Os pais são motivados pelos melhores interesses de seus filhos

  • Mesmo que seja verdade, isso não implica que outros, como profissionais de saúde, também não sejam motivados pelos melhores interesses de seus pacientes;

  • Bem motivados, mas clinicamente ignorantes ou inexperientes, os pais podem simplesmente confundir o que sejam os melhores interesses do filho;

  • Também os pais podem ter outros interesses em conflito com os interesses da criança, como, por exemplo, os melhores interesses da família como um todo ou os melhores interesses de outro filho.

Os pais conhecem melhor os interesses da criança

  • Quando se fala em interesses da criança, trata-se do que é bom ou melhor para ela. Entretanto, o que é bom para a criança envolve julgamentos clínicos complexos, que provavelmente os pais não conseguem fazer. O que os pais conhecem melhor são os desejos, as preferências e as disposições a curto prazo;

  • Mesmo assim, pela relação assimétrica entre pais e filhos, provavelmente estes não conseguem ser autênticos. Ainda que a criança tivesse tal habilidade, não teria maturidade cognitiva para pensar nas consequências futuras, especialmente se a intervenção for traumática ou dolorosa. Quanto mais velha for, talvez seja maior o conhecimento dos pais sobre as preferências dos filhos;

  • Deve-se considerar a capacidade que os pais têm de conhecer a tolerância dos filhos ao desconforto. Mas isso novamente pode valorizar mais os danos atuais do que os futuros;

  • Por fim, é preciso considerar o estresse dos pais em situações de doenças de seus filhos, o que pode afetar suas decisões. Os médicos ficam muitas vezes surpreendidos com a tolerância das crianças a procedimentos dolorosos ou desconfortáveis, mas menos surpresos do que os pais.

O apoio da família tem significado clínico

  • Tal afirmação é verdadeira, porém, havendo boa relação e comunicação com os pais, mesmo quando refutadas suas decisões, eles continuam cuidando bem de seus filhos;

  • Ainda que os pais e a família tenham de suportar os fardos das intervenções médicas, isso não tem relação direta com os melhores interesses da criança. O que interessa é o prognóstico, ao se fazer o bem para a criança e não deixando fazer o mal.

Aspecto religioso

Quando a religião dos pais interfere nos cuidados de saúde dos filhos, a preocupação dos médicos deve ser com a terceira parte (a criança). Todos têm direito de escolher sua preferência religiosa, mas não de fazer mártires seus filhos. Ademais, a criança também deve ter o direito de escolher sua religião, quando tiver competência para decisões autônomas. Mas, para isso, precisa sobreviver.

Dúvidas e certezas do tratamento

Alguns argumentam que não é bom contestar as decisões da família quando não se tem certeza do diagnóstico ou do prognóstico. Mas profissionais da área da saúde, algumas vezes, podem não ter certeza do diagnóstico e mesmo assim precisar agir. Além disso, existe verdade permanente na ciência? O prognóstico é um cálculo probabilístico baseado em situações anteriores semelhantes, em tentativa de antever o futuro – mas este sempre é incerto.

Resumindo, não se pode negar que os pais têm autoridade natural sobre os filhos. No passado, inclusive, escolhiam o marido, entregavam as filhas por dote, puniam fisicamente os filhos etc. Estavam certos? Nesse caso específico, o argumento que realmente não pode ser refutado é pragmático: o risco de pais não trazerem seus filhos para tratamentos se não lhes for dado o direito de determinar o que aceitarão. Isso estimula a busca por maneiras de alinhar a prática com as conclusões teóricas defensáveis 2020 . Dare T. Parental rights and medical decisions. Paediatr Anaesth. 2009;19:947-52..

“Melhor interesse” ou “menos dano”?

Diekema 5. Diekema DS. Parental refusals of medical treatment: the harm principle as threshold for state intervention. Theor Med Bioeth. 2004;25(4):243-64. considera que, embora o critério de melhor interesse seja o padrão jurídico e ético para determinar quando a intervenção do Estado é justificada, ele não é suficiente para os padrões atualmente utilizados por médicos e juízes, por ser de difícil aplicação e oferecer pouca praticidade. O autor propõe o uso do princípio da não maleficência ou do dano e apresenta as quatro razões a seguir.

Primeiro, é difícil definir precisamente o melhor interesse da criança, e isso pode gerar controvérsias. O melhor interesse é mais fácil de ser aplicado em situações em que a vida da criança está em risco e em que isso pode ser impedido com medidas fáceis, seguras e efetivas. Por esse motivo, há pouca controvérsia quanto ao uso de transfusão de sangue quando indicada em situação de risco. Entretanto, em situações nas quais os riscos são menores, como na reparação de uma fenda palatina, é difícil assegurar que a recusa dos pais viola o padrão.

Segundo, a noção de “melhores interesses” é intrinsecamente uma questão de valores, e muitos pais consideram que sua opção vai ao encontro dos melhores interesses da criança. Por exemplo, para Testemunhas de Jevoá, perder a vida eterna ao lado do Criador não é uma consequência trivial de se aceitar a recomendação médica de transfusão. Neste caso, entram em conflito aquilo que os pais consideram “melhor interesse” com o que o médico avalia. Não há um “melhor interesse” objetivo, mas uma questão de valores.

Terceiro, a natureza dos interesses é normalmente complexa. Embora considerações médicas sejam importantes, os interesses da criança também podem ser afetados, com as consequências emocionais ou físicas que acompanham a ação escolhida. Os melhores interesses são, por demais, reduzidos a objetivos médicos somente. Por exemplo, em tratamento com quimioterapia, a preocupação do profissional é com a possibilidade da melhora da qualidade de vida ou de cura do câncer. Os pais poderão se preocupar mais com as consequências ruins da quimioterapia e pesar se vale a pena tanto sofrimento para uma possível cura.

Finalmente, não está claro que o melhor interesse da criança se refira sempre e tão-somente à relação com sua saúde 2424 . Humphrey T. Children, medical treatment and religion: defining the limits of parental responsibility. Austr J Human Rights. 1998; 14(1):141-69.,2525 . Hickey KS, Lyckholm L. Child welfare versus parental autonomy: medical ethics, the law, and faith based healing. Theor Med Bioeth. 2004;25(4):265-76..

Enquanto os pais têm certos direitos presumíveis, Whitney 2121 . Whitney SN, Ethier AM, Frugé E, Berg S, McCullough LB, Hockenberry M. Decision-making in pediatric oncology: who should take the lead? The decisional priority in pediatric oncology model. J Clin Oncol. 2006 1 jan;24(1):160-5. observa que sua autoridade ética e legal sobre os cuidados de saúde dos filhos decorre da responsabilidade em promover os melhores interesses pela saúde da criança.

Qualidade de vida

A medicina baseada em evidências recomenda o transplante de rim em casos de insuficiência renal crônica de pacientes dependentes de hemodiálise, se não houver comorbidades que o contraindiquem 2626 . Romão Junior JE. Insuficiência renal crônica. In: Cruz J, Praxedes JN, Cruz HMM. Nefrologia. São Paulo: Sarvier; 1995. p. 187-200.,2727 . Associação Médica Brasileira. Projeto Diretrizes. Transplante renal: indicações e contraindicações. [Internet]. [acesso 7 fev 2014]. Disponível: http://www.projetodiretrizes.org.br/volume_4.php
http://www.projetodiretrizes.org.br/volu...
.

Aspectos conjunturais

Os aspectos conjunturais são as circunstanciais sociais, legais e institucionais envolvidas no caso, ou seja, o contexto. É preciso analisar as seguintes perguntas norteadoras no caso cenário:

  • Há assuntos familiares influenciando indevidamente as decisões terapêuticas?

  • Há fatores religiosos ou culturais pesando nas escolhas?

  • Há implicações legais, dependendo da opção terapêutica?

  • A resposta é positiva às três perguntas norteadoras.

Assuntos familiares e fatores religiosos

Os pais, Testemunhas de Jeová, recusam-se a receber transfusão de sangue e alguns de seus derivados pela interpretação literal das Sagradas Escrituras (Bíblia) 2828 . Bíblia. São Paulo: Sociedade Bíblica Católica Internacional/Paulinas, 1990. em Gênesis 9:3,4, Levítico 7:26, 1 Samuel 14:32,33 e Atos 15:28,29. Não aceitam sangue coletado por doação autóloga pré-operatória porque, para eles, o sangue não deve ser retirado e estocado. Há variações entre as comunidades de Testemunhas de Jeová quanto aos componentes sanguíneos aceitos 2929 . Watch Tower Bible and Tract Society of Pennsylvania. Rightly, value your gift of life. [Internet]. 2004 [acesso 8 fev 2014]. Disponível: http://wol.jw.org/en/wol/d/r1/lp-e/2004444
http://wol.jw.org/en/wol/d/r1/lp-e/20044...
,3030 . Crookston KP. The approach to the patient who refuses blood transfusion. UpToDate. [Internet]. dez 2004 [acesso 13 nov 2013]. Disponível: http://www.uptodate.com/contents/the-approach-to-the-patient-who-refuses-blood-transfusion/abstract/4
http://www.uptodate.com/contents/the-app...
.

Implicações legais das decisões terapêuticas

A questão seguinte que se apresentou foi: atender ao pedido da família, caso a transfusão seja necessária para evitar a morte ou danos graves e irreversíveis à paciente, teria implicações legais?

Bem-estar das crianças versus autonomia dos pais

A paciente do caso cenário, menor de 12 anos, é considerada incompetente civilmente para tomar decisões em relação a sua saúde 1212 . Brasil. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. [Internet]. 2002 [acesso 22 jan 2015]. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm
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, e os pais são “empoderados” para fazê-lo em seu lugar, em virtude do poder familiar 1212 . Brasil. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. [Internet]. 2002 [acesso 22 jan 2015]. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm
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. Estamos diante de um conflito em que os pais, por opções religiosas, interferem na indicação médica e nos melhores interesses da paciente, considerando que a recusa de eventual transfusão de sangue poderá resultar em severo dano.

Embora se presuma, por força da lei e pela ética, que os pais detenham a prioridade para tomar decisões pelos filhos, existem situações em que cabe aos médicos o papel de desafiar essa primazia para que tenham a capacidade de dispor de todos os procedimentos, pessoais e técnicos, da melhor forma possível, a serviço do paciente 2222 . Wilson P. Jehovah’s Witness children: when religion and the law collide. Paediatr Nurs. abr 2005;17(3):34-7., sob o dever de se basear no ordenamento jurídico 2525 . Hickey KS, Lyckholm L. Child welfare versus parental autonomy: medical ethics, the law, and faith based healing. Theor Med Bioeth. 2004;25(4):265-76..

Como a autoridade dos pais não é absoluta, quando sua escolha contraria os melhores interesses da criança, o Estado pode intervir, agindo segundo a doutrina parens patriae 3131 . Wikipédia. Parens Patriae [verbete]. [acesso 10 fev 2014]. Disponível: http://en.wikipedia.org/wiki/Parens_patriae
http://en.wikipedia.org/wiki/Parens_patr...
(que, em latim, significa pai da pátria). Na lei, isso se refere ao poder de vigilância do Estado para intervir contra um pai abusivo ou negligente e para agir como “pai” de qualquer criança ou indivíduo necessitando de proteção 1212 . Brasil. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. [Internet]. 2002 [acesso 22 jan 2015]. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm
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,3131 . Wikipédia. Parens Patriae [verbete]. [acesso 10 fev 2014]. Disponível: http://en.wikipedia.org/wiki/Parens_patriae
http://en.wikipedia.org/wiki/Parens_patr...

32 . Tillett J. Adolescents and informed consent: ethical and legal issues. J Perinat Neonatal Nurs. 2005;19(2):112-21.
-3333 . US Supreme Court. Prince v. Massachusetts, 321 US 158. Justia US Supreme Court. [Internet]. 1994 [acesso 22 jan 2015]. Disponível: https://supreme.justia.com/cases/federal/us/321/158/case.html
https://supreme.justia.com/cases/federal...
. De acordo com a suprema corte estadunidense, no caso Prince versus Massachusetts, nem os direitos de religião e tampouco a paternidade estão além desta limitação 3333 . US Supreme Court. Prince v. Massachusetts, 321 US 158. Justia US Supreme Court. [Internet]. 1994 [acesso 22 jan 2015]. Disponível: https://supreme.justia.com/cases/federal/us/321/158/case.html
https://supreme.justia.com/cases/federal...
. A legislação brasileira é explícita, nesse aspecto, no artigo 227 da Constituição da República Federativa do Brasil 3434 . Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal; 1988. e no artigo 13 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) 3535 . Brasil. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/lei...
. Além desses, vários outros instrumentos normativos, nacionais e internacionais, recomendam tal conduta 1414 . Conselho Federal de Medicina. Código de Ética Médica. Resolução do Conselho Federal de Medicina nº 1.931/2009. Diário Oficial da União, 24 set 2009, Seção I, p. 90; retificação Diário Oficial da União, 13 out 2009, Seção I, p. 173.,3535 . Brasil. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/lei...

36 . Brasil. Decreto nº 99.710, de 21 de novembro de 1990. Promulga a Convenção sobre os Direitos da Criança. [Internet]. 1990. [acesso 22 jan 2015]. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D99710.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/dec...
-3737 . American Academy of Pediatrics. Committee on Bioethics. Religious objections to medical care. Pediatrics. 1997;99(2):279-81..

Porém, simplesmente obter uma ordem judicial, não dando o devido peso à posição dos pais sem esgotar todas as possibilidades dialógicas, pode causar excessivo dano à unidade familiar e à criança 2323 . Kopelman LM. Children and bioethics: uses and abuses of the best-interests standard. J Med Philos. 1997;22(3):213-7.. Kopelman e Deville 3838 . DeVille KA, Kopelman LM. Fetal protection in Wisconsin’s revised child abuse law: right goal, wrong remedy. J Law Med Ethics. 1999;27(4):332-42. argumentam que a interferência coercitiva do Estado nas prerrogativas dos pais, para o bem da sociedade e das crianças, é justificada quando há evidência convincente de que as ações ou decisões dos pais representam sério risco para os filhos. Por outro lado, Sher 3939 . Elizabeth J. Sher EJ. Choosing for children: adjudicating medical care disputes between parents and the State. NYU Law Rev. 1983;58:176-7. aponta que a negligência, base da ação do Estado em muitos casos de cuidados com a saúde, tem sido definida como a falha em prover um mínimo de qualidade de cuidado que a comunidade pode tolerar 3838 . DeVille KA, Kopelman LM. Fetal protection in Wisconsin’s revised child abuse law: right goal, wrong remedy. J Law Med Ethics. 1999;27(4):332-42..

Esses autores delineiam para a intervenção do Estado não um padrão calcado no melhor interesse, mas, antes, um modelo baseado no dano. Assim, a questão fundamental não parece ser a identificação da alternativa que melhor representa os interesses da criança, mas do limite abaixo do qual as decisões dos pais não podem ser toleradas. Diekema 5. Diekema DS. Parental refusals of medical treatment: the harm principle as threshold for state intervention. Theor Med Bioeth. 2004;25(4):243-64. defende a ideia de que o princípio do dano representa a base legal e ética para tal intervenção. Adverte que o princípio é consistente com os limites sugeridos pela maioria dos autores e aplicado pela maioria das cortes.

Princípio do dano e ação do Estado

A autoridade do Estado no âmbito da saúde provém primariamente de seu papel constitucional de vigiar para proteger a saúde pública, o bem-estar e a segurança. A base ética para o exercício desse poder assenta-se naquilo que é conhecido como o princípio do dano ou da não maleficência. John Stuart Mill, citado por Diekema 4040 . Diekema DS. Op. cit. p. 250., argumenta que o único propósito para o qual pode ser exercido o poder, de forma correta, sobre qualquer membro de uma comunidade civilizada, contra sua vontade, é para prevenir dano a outros. Seu próprio bem, quer seja físico, quer seja moral, não é empecilho suficiente 4040 . Diekema DS. Op. cit. p. 250..

Joel Feinberg, também citado por Diekema 4141 . Diekema DS. Op. cit. p. 250., refinou esse conceito, argumentando que, para ser justificada, a restrição de uma liberdade individual deve ser efetiva para prevenir o dano em questão e que não deve haver nenhuma opção menos intrusiva para a liberdade individual e que seja igualmente efetiva em prevenir o dano.

O princípio provê a base capaz de identificar o limite para a intervenção do Estado. A característica da decisão parental que justifica a intervenção não é aquela que contraria os melhores interesses da criança, mas a que pode lhe causar mal ou dano. As autoridades terão então legitimada sua intervenção em duas situações, ambas preenchendo os critérios do princípio do dano: 1) A intervenção deve ser baseada na doutrina do parens patriae 3131 . Wikipédia. Parens Patriae [verbete]. [acesso 10 fev 2014]. Disponível: http://en.wikipedia.org/wiki/Parens_patriae
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, isto é, o Estado tem autoridade para proteger e cuidar aqueles que não o podem fazer por si mesmos, podendo intervir quando existe evidência de que as decisões dos pais podem causar mal aos seus filhos; 2) A intervenção pode ser justificada como exercício de vigilância para a proteção da saúde da população ou de outros.

A doutrina do poder do Estado reconhece que a sociedade tem a obrigação de assegurar acesso às necessidades básicas de seus membros mais vulneráveis. Normalmente as decisões dos pais são aceitas, exceto quando colocam substancial risco de dano severo. A Academia Americana de Pediatria 3737 . American Academy of Pediatrics. Committee on Bioethics. Religious objections to medical care. Pediatrics. 1997;99(2):279-81. argumenta que a intervenção estatal deve ser o último recurso, indicada somente quando o tratamento recusado pode prevenir dano substancial, sofrimento ou morte. Decidida a ação do Estado, deve-se ainda responder a uma série de oito perguntas sugeridas por Diekema 5. Diekema DS. Parental refusals of medical treatment: the harm principle as threshold for state intervention. Theor Med Bioeth. 2004;25(4):243-64.: 1) Ao recusar o procedimento proposto, estão os pais colocando a criança em risco de dano significativo?; 2) O risco de dano é iminente, requerendo uma ação imediata para preveni-lo?; 3) É necessária a intervenção que foi recusada para prevenir o dano?; 4) É comprovada a eficácia da intervenção recusada e, portanto, ela é capaz de prevenir o dano?; 5) A intervenção recusada não coloca a criança em alto risco de dano, e seus benefícios seriam bem maiores do que aquela escolhida pelos pais?; 6) Outra opção, que interferia menos na autonomia dos pais e, portanto, mais bem aceita por eles, não poderia prevenir o dano à criança?; 7) A intervenção do Estado pode ser generalizada a todas as outras situações semelhantes?; 8) A maioria dos pais concordará que a intervenção do Estado foi razoável? O caso cenário em questão satisfaz facilmente as oito condições.

Agindo como guardião dos interesses gerais e do bem-estar das crianças, o Estado, como parens patriae, pode restringir o controle parental requerendo atendimento na escola, regulando ou delimitando o trabalho infantil, e muitas outras situações. As leis sobre abuso infantil expressam o reconhecimento de que os direitos dos pais não são absolutos. Se estes recusam providenciar o cuidado necessário para a criança, o Estado pode assumir a custódia temporária com o propósito de autorizar o cuidado médico fundamental, sob o argumento de negligência nos cuidados dos pais com a saúde da criança.

O mais comum e convincente argumento usado pelos pais para a não intervenção do Estado é que as pessoas são livres para a prática religiosa. Entretanto há uma diferença essencial entre o direito de fazer uma opção religiosa (liberdade de consciência) e o de praticar uma religião (liberdade de ação). Enquanto a violação do primeiro nunca é justificada numa sociedade livre, o último é inconsistente em uma comunidade que rejeita a iniciação à força entre seus membros. Liberdade de ação, acima do ponto em que causa danos a outros, quando considerada em nosso contexto, indica que o direito de praticar uma religião não inclui a liberdade de expor a comunidade ou uma criança à doença ou à morte 2323 . Kopelman LM. Children and bioethics: uses and abuses of the best-interests standard. J Med Philos. 1997;22(3):213-7.. Em outras palavras, o direito de uma pessoa praticar sua religião é suplantado pelo direito à vida de outra 2020 . Dare T. Parental rights and medical decisions. Paediatr Anaesth. 2009;19:947-52..

Pontos que reforçam os argumentos do Estado

Segundo Horn 1919 . Horn C. Religion, blood transfusions, and childrens’ rights. [Internet]. 2013 [acesso 27 jan 2014]. http://www.hmcwriter.com/religion-blood-transfusions-and-childrens-rights/
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, os médicos têm os interesses das crianças como paradigma e não podem assumir, antecipadamente, que todos os envolvidos, mesmo os pais, tenham somente esses interesses como prioridade. Ainda que imbuídos no bem-estar de seus filhos, eles têm limitada capacidade para entender o contexto clínico envolvido, podem dar peso exagerado aos sofrimentos do filho a curto prazo, em detrimento dos benefícios a longo prazo, e, além disso, estão submersos na emoção da situação, enquanto o Estado, representado pelas cortes, é invariavelmente mais objetivo na capacidade de tomar decisões 2323 . Kopelman LM. Children and bioethics: uses and abuses of the best-interests standard. J Med Philos. 1997;22(3):213-7..

O fato de a família ser a única a sofrer com a morte da criança não dá suporte à discussão sobre o valor de sua vida. Se o filho, para que tenha um bom prognóstico, for exigir muitos cuidados após a intervenção, deve-se dar algum peso às decisões dos pais. Contudo, a necessidade de cuidados intensivos pós-intervenção não deve ser o fator decisivo, e sim o próprio prognóstico. É assumido que crianças se recuperam melhor quando têm apoio da família, mas isso não significa que pais cujas opções terapêuticas são rejeitadas não cuidem bem de seus filhos depois 5. Diekema DS. Parental refusals of medical treatment: the harm principle as threshold for state intervention. Theor Med Bioeth. 2004;25(4):243-64..

Quais são a natureza das informações privilegiadas que os pais detêm e sua significância clínica? A relação próxima com a criança pode resultar em um viés pelos sentimentos de um em relação ao outro, como culpa, desamparo, esperança ou desespero ou mesmo falta de vontade de discordar. Para se ter uma noção mais imparcial da realidade, deve-se refletir sobre o que um adulto razoável faria 5. Diekema DS. Parental refusals of medical treatment: the harm principle as threshold for state intervention. Theor Med Bioeth. 2004;25(4):243-64..

Haverá repercussões sociais ao usurpar a autonomia dos pais, mas há outros interesses que devem ser reconhecidos. Primeiro, o valor da vida humana; segundo, a proteção de partes inocentes, que não têm a capacidade de se defender; terceiro, a manutenção de uma sociedade produtiva e autoperpetuada 2424 . Humphrey T. Children, medical treatment and religion: defining the limits of parental responsibility. Austr J Human Rights. 1998; 14(1):141-69.. É possível argumentar que, se o Estado não for o defensor do bem-estar da criança contra o desejo dos pais, o mal à sociedade não será menor.

É dever médico não permitir que uma decisão de substituição considerada inválida tecnicamente vá contra a conduta médica padrão e seus compromissos de defender os valores da beneficência, da não maleficência e da justiça.

Finalmente, a intervenção do Estado é válida em circunstâncias em que, pela gravidade e urgência da situação clínica do paciente, necessita ser feita antes que se possa evoluir por meio de processo deliberativo e compartilhado.

Entretanto, nunca é recomendado, quando possível, buscar ordem judicial sem dar o devido peso à posição dos pais e sem esgotar todas as possibilidades dialógicas 2323 . Kopelman LM. Children and bioethics: uses and abuses of the best-interests standard. J Med Philos. 1997;22(3):213-7.. A imposição da lei entre os valores e desejos dos pais e seus filhos constitui situação delicada, que requer consideração extensiva. No caso de rejeitar um princípio tão sagrado como a primazia dos pais na condição de guardiões dos filhos e delegados a tomar decisões por eles, o ônus da prova é de quem foi escolhido para refutá-lo 2525 . Hickey KS, Lyckholm L. Child welfare versus parental autonomy: medical ethics, the law, and faith based healing. Theor Med Bioeth. 2004;25(4):265-76..

De acordo com Beauchamp e Childress 1818 . Beauchamp TL, Childress JF. Principles of biomedical ethics. 5ª ed. Nova York: Oxford; 2001. p. 93-126., a fim de legitimar a infração a uma norma prima facie para aderir a outra, é necessário:

  • Oferecer melhores argumentos para a norma que prevaleceu do que para a que foi infringida. A alegação pode ser de que a vida da criança é mais importante do que um conjunto de desejos ou valores morais. Não é a moral do filho que está em discussão, mas a dos pais. A criança merece ter a chance de crescer e fazer suas próprias opções religiosas;

  • O objetivo moral que justificou a infração tem chance real de ser alcançado;

  • Nenhuma ação alternativa moralmente preferível pode ser encontrada;

  • A forma de infração selecionada é a única possível para atingir o bem procurado pela ação;

  • O agente infrator procurará minimizar os efeitos negativos da infração.

O problema ético

Está-se agora claramente diante do problema ético: por um lado, do ponto de vista médico e legal, poderá ser obrigatória a transfusão de sangue, necessária para evitar danos graves e irreversíveis ou a morte da paciente; por outro, os pais recusam a transfusão de sangue em sua filha.

Transfusão de sangue

A literatura cita como benefício associado à transfusão de sangue 4242 . Carson JL, Noveck H, Berlin JA, Gould AS. Mortality and morbidity in patients with very low postoperative Hb levels who decline blood transfusion. Transfusion. jul 2002;42(7):812. a supressão do efeito deletério da anemia severa no pós-operatório, situação comprovada em pacientes que recusaram a transfusão de sangue por motivos religiosos 4343 . Tobian AA, Ness PM, Noveck H, Carson JL. Time course and etiology of death in patients with severe anemia. Transfusion. 2009;49(7):1.395-9.. Se os níveis de hemoglobina (Hb) entre 7 e 8g/dL não parecem ter efeitos deletérios na mortalidade, o risco de morte aumenta na medida em que a Hb cai para menos de 7g/dL. Este risco aumenta 2,5 vezes para cada grama de Hb/dL a menos e chega a 64% em níveis iguais ou inferiores a 3g/dL. A morte normalmente não ocorre de imediato 4444 . Jo KI, Shin JW, Choi TY, Park YJ, Youm W, Kim MJ. Eight-year experience of bloodless surgery at a tertiary care hospital in Korea. Transfusion. 2013 May;53(5):948-54.. Estudo posterior mostrou mortalidade de 50% nos trinta dias de pós-operatório, com níveis iguais ou inferiores a 3 gdL, em pacientes hospitalizados, sugerindo que houve melhora do manejo de pacientes que recusam transfusão de sangue 4545 . Rogers DM, Crookston KP. The approach to the patient who refuse blood transfusion. Transfusion. set 2006;46(9):1.471-7..

É possível identificar vários riscos, desde infecções até problemas imunológicos. Nesse aspecto, chama-se a atenção para dois tópicos: 1) estudos randomizados mostram diferenças entre práticas transfusionais liberais e práticas restritivas, com resultados melhores nas últimas 4444 . Jo KI, Shin JW, Choi TY, Park YJ, Youm W, Kim MJ. Eight-year experience of bloodless surgery at a tertiary care hospital in Korea. Transfusion. 2013 May;53(5):948-54.; 2) estudos randomizados mostram que sangue velho, comparado com o fresco, aumenta a morbidade e a mortalidade 4444 . Jo KI, Shin JW, Choi TY, Park YJ, Youm W, Kim MJ. Eight-year experience of bloodless surgery at a tertiary care hospital in Korea. Transfusion. 2013 May;53(5):948-54..

Isto posto e por não se tratar de uma situação emergencial, o Comitê de Bioética Clínica recomendou para o caso clínico em discussão:

Aumentar o entrosamento com os pais da paciente. É importante ter a mente aberta e envolver os pais no debate, para entender suas razões, seus argumentos e seus desejos. Não é uma opção qualquer que os pais devem fazer por sua filha. É a escolha entre uma vida terrestre, limitada, e a vida eterna ao lado do Criador. Podem se sentir pressionados a comprometer valores éticos e, neste caso, verem a filha rejeitada na comunidade, levando, eventualmente, ao abandono do tratamento.

Em um encontro reservado, garantir a confidencialidade e a privacidade. Assim, todos terão a oportunidade de se expressar, sem pressões ou coações. Devem ser rediscutidos os benefícios e os riscos das transfusões, de modo que os pais possam estar bem informados. Apesar do problema que se apresenta, o médico deve explicitar sua obrigação de providenciar o melhor manejo possível e consistente com os valores e preferências dos pais e da paciente.

Compartilhar a decisão. Verificar com a paciente e seus familiares o que entendem – exatamente – por não receber sangue e derivados. Deve haver um plano inequívoco sobre o que vai acontecer no pior cenário, quando se terá que decidir entre transfundir, a severa morbidade ou a morte. Alguns pacientes aceitam transfusão nesta situação.

Expor com transparência as ansiedades e os desconfortos do médico. O médico pode não se sentir confortável com as escolhas do paciente e também não ter habilidade para lidar com a situação. Neste caso, pode referir o paciente, que não necessita de tratamento urgente, para outro profissional que aceite cuidar dele. A retirada de cuidados nesses casos é eticamente aceitável e não constitui má prática profissional, se o médico conseguir outro profissional para cuidar da paciente.

O médico deve deixar explícito que, na eventualidade de uma situação em que a vida do menor esteja em risco de morte, não há necessidade de autorização judicial para a transfusão. Deve ser colocado para a família que se trata de um dever legal 4545 . Rogers DM, Crookston KP. The approach to the patient who refuse blood transfusion. Transfusion. set 2006;46(9):1.471-7.. Os juízes, nesses casos, devem ter a sensibilidade de não acusar os pais, tirando o poder familiar apenas para a transfusão, e não para outras decisões que os pais possam tomar que não trarão danos ao paciente 4646 . Frankel LS, Damme CJ, Van Eys J. Childhood cancer and the Jehovah’s Witness faith. Paediatrics. 1977 dez;60(6):916-21..

Volta ao Comitê de Bioética Clínica

Apesar das orientações do Comitê, o problema ético continua o mesmo. Os pais, pelos vínculos criados com a instituição e com o médico, não gostariam de serem referidos a outro profissional e outra instituição. O médico, por seu lado, explicou que fará tudo o que estiver a seu alcance para evitar a transfusão, incluindo: a) preparo e manejo adequado do paciente no pré-operatório: b) discussão do caso com profissional que já tenha tido experiência semelhante: c) durante o trans e pós-operatório, reduzirá ao máximo as perdas sanguíneas, maximizará a oferta de O2 e reduzirá seu consumo; usará substitutos do sangue, se disponíveis; terá um plano de contingência, não tomando sozinho a decisão de transfundir; e, no pior cenário, compartilhará a decisão com o anestesista e o cirurgião auxiliar.

Diante do exposto, o Comitê de Bioética Clínica propôs os seguintes cursos de ação:

Oferecer aos pais, por meio do médico assistente, o encaminhamento da paciente a outro profissional médico que aceite realizar o transplante sem transfusão de sangue;

Realizar o transplante na instituição e, por intermédio do serviço social local, solicitar autorização judicial para a transfusão, caso necessária, apesar de todos os cuidados propostos;

Assegurar aos pais que a autorização se limitará à eventual transfusão de sangue ou derivados e de que todas as outras opções serão consideradas na medida do possível, assegurando que a confidencialidade e a privacidade do contexto serão respeitadas. Todas as deliberações devem ser registradas no prontuário da paciente.

Discussão

A perda da autonomia dos pais pode ter grande impacto na unidade familiar, mas, após considerar os argumentos, é evidente que, no atual contexto social, os direitos das crianças devem ser protegidos pela intervenção do Estado quando as decisões dos pais ultrapassam o limite de tolerância da sociedade em relação à possibilidade de causar danos à criança. Isso é benéfico e ainda caro para a comunidade e os indivíduos.

Embora as práticas religiosas dos pais sejam consideradas secundárias em avaliações sobre os melhores interesses da criança, no âmbito das decisões judiciais deve ser dado peso adequado às crenças dos pais e ao impacto das decisões sobre a unidade familiar. Igualmente é importante conter restrições autocráticas e arbitrárias a intervenções estatais sobre a autonomia dos pais e dar a devida importância à abordagem individualizada aos pacientes, principalmente por causa da diversidade de opiniões sobre diferentes aspectos da transfusão.

A experiência mostra que raramente as comunidades religiosas recusam cuidar de crianças transfundidas, e muitas vezes os pais se sentem aliviados após a decisão ter sido tomada de suas mãos, permitindo-lhes recusar a transfusão e ainda ter sua criança tratada 4747 . Muramoto O. Recent developments in medical care of Jehovah’s Witnesses. West J Med. 1999;170(5):297-301.. Uma intervenção mínima do Estado só se justifica em casos em que a opinião médica considera unanimemente que não tratar irá resultar em danos graves e irreparáveis ou morte e que a vida após a intervenção terá qualidade suficiente para valer a pena 2323 . Kopelman LM. Children and bioethics: uses and abuses of the best-interests standard. J Med Philos. 1997;22(3):213-7..

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2015

Histórico

  • Recebido
    7 Nov 2014
  • Revisado
    26 Fev 2015
  • Aceito
    3 Mar 2015
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