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Comunicação de más notícias em unidade de terapia intensiva neonatal

Resumo

O protocolo Spikes é um dos instrumentos mais didáticos para o ensino da habilidade de comunicar más notícias, que exige sensibilidade e preparo. Neste artigo foram analisadas as percepções de residentes de pediatria, bem como de mães de neonatos, sobre a comunicação de más notícias em uma unidade de terapia intensiva neonatal. Trata-se de estudo qualitativo, descritivo e exploratório, baseado na antropologia visual, no qual o protocolo Spikes foi empregado em dois grupos focais, com abordagem analítica de conteúdo de Bardin por categorias. Foram relatados problemas como ambiente inadequado para comunicar más notícias, limitações na percepção das mães, falta de disponibilidade médica para conversar, linguagem inadequada e dificuldade para lidar com emoções, esclarecer dúvidas e discutir estratégias com os familiares. A reflexões sobre essas questões visa melhorar o aprendizado teórico e estimular a autocrítica, buscando a empatia e a humanização da assistência.

Comunicação em saúde; Unidades de terapia intensiva neonatal; Humanização da assistência

Abstract

The SPIKES protocol is one of the most didactic tools to teach the communication of bad news, a skill that requires sensitivity and preparation. This article analyzed the perceptions of pediatrics residents and the mothers of neonates about the communication of bad news in a neonatal intensive care unit. This is a qualitative, descriptive and exploratory study, based on visual anthropology, in which the SPIKES protocol was used in two focus groups, with Bardin’s content analytics approach by categories. Problems were reported as inadequate environment to break bad news, limitations in the perception of mothers, lack of medical availability to talk, inadequate language and difficulty to deal with emotions, clarify doubts and discuss strategies with family members. Reflection on these issues aims to improve theoretical learning and stimulate self-criticism, seeking empathy and the humanization of care.

Health communication; Intensive care units, neonatal; Humanization of assistance

Resumen

El protocolo SPIKES es uno de los instrumentos más didácticos para enseñar la capacidad de comunicar malas noticias, lo que requiere sensibilidad y preparación. Este estudio analizó las percepciones de los residentes de pediatría y de las madres de recién nacidos sobre la comunicación de malas noticias en una unidad de cuidados intensivos neonatales. Se trata de un estudio cualitativo, descriptivo y exploratorio, basado en la antropología visual, en que se utilizó el protocolo SPIKES en dos grupos focales para categorizar el enfoque analítico del contenido. Se reportaron problemas como ambiente inadecuado para comunicar malas noticias, limitaciones en la percepción de las madres, falta de disponibilidad médica para hablar, lenguaje inadecuado y dificultad para lidiar con las emociones, aclarar dudas y discutir estrategias con los miembros de la familia. Las reflexiones sobre estos temas pretenden mejorar el aprendizaje teórico y estimular la autocrítica, buscando una atención más empática y humanizada.

Comunicación en salud; Unidades de cuidado intensivo neonatal; Humanización de la atención

Aprovação CEP 3.060.832

Comunicação é relação, portanto, algo que não se reduz simplesmente ao ato de falar, sendo antes um conjunto de ações que inclui comportamentos verbais e não verbais empregados nas dinâmicas entre as pessoas 11. Silva LMG, Brasil VV, Guimarães HCQCP, Savonitti BHRA, Silva MJP. Comunicação não-verbal: reflexões acerca da linguagem corporal. Rev Latinoam Enferm [Internet]. 2000 [acesso 10 maio 2023];8(4):52-8. DOI: 10.1590/S0104-11692000000400008
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, 22. Silva MJP. Comunicação de más notícias. Mundo Saúde [Internet]. 2012 [acesso 10 maio 2023];36(1):49-53. Disponível: https://bit.ly/3raKzez
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. A partir da conexão entre os sujeitos são formados os vínculos, essenciais para a humanização em saúde. Assim, a boa comunicação resulta em um processo de ligação afetiva e ética entre profissionais, usuários e gestores, promovendo uma convivência de apoio e respeito mútuos, como preconizado pela Política Nacional de Humanização 33. Brasil. Ministério da Saúde. Política Nacional de Humanização: HumanizaSUS. Ministério da Saúde [Internet]. 2013 [acesso 10 maio 2023]. Disponível: https://bit.ly/46ErlOQ
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e pelo HumanizaSUS 44. Brasil. Ministério da Saúde. Cadernos HumanizaSUS [Internet]. Brasília: Secretaria de Atenção à Saúde; 2010 [acesso 10 maio 2023]. Disponível: https://bit.ly/3D7D22Q
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.

Má notícia é qualquer informação que produza alteração negativa nas perspectivas sobre o presente e o futuro de uma pessoa, e requer franqueza na relação médico-paciente ou médico- -familiar 55. Buckman R. Breaking bad news: why is it still so difficult? Br Med J (Clin Res Ed) [Internet]. 1984 [acesso 10 maio 2023];288(6430):1597-9. DOI: 10.1136/bmj.288.6430.1597
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. Dar más notícias, portanto, é um aspecto importante da formação médica, mas representa um desafio para todos os profissionais de saúde, em razão de sua complexidade e de diversos aspectos sensíveis envolvidos 66. Bhadra K, Manir KS, Adhikary A, Kumar G, Manna A, Sarkar SK. Awareness of palliative care among doctors of various departments in all four teaching medical colleges in a metropolitan city in Eastern India: a survey. J Educ Health Promot [Internet]. 2015 [acesso 10 maio 2023];4:20. DOI: 10.4103/2277-9531.154041
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7. Reed S, Kassis K, Nagel R, Verbeck N, Mahan JD, Shell R. Does emotional intelligence predict breaking bad news skills in pediatric interns? A pilot study. Med Educ Online [Internet]. 2015 [acesso 10 maio 2023];20:242-5. DOI: 10.3402/meo.v20.24245
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- 88. Campos CACA, Silva LB, Bernardes JS, Santos RGA, Oliveira HMNS, Ferreira SMS. Entre pássaros e flores: desafios de equipes multiprofissionais de saúde. Atas CIAIQ 2017 [Internet]. 2017 [acesso 10 maio 2023];2:1446-55. Disponível: https://bit.ly/3rpDF5b
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. Muitos estudos detectaram problemas na preparação para comunicar más notícias em vários países, incluindo Paquistão, Irã, Austrália, Índia, Malásia e Brasil 99. Abbas SQ, Muhammad SR, Mubeen SM, Abbas SZ. Awareness of palliative medicine among pakistani doctors: a survey. J Pak Med Assoc [Internet]. 2004 [acesso 10 maio 2023];54(4):195-9. Disponível: https://bit.ly/3PNfbNu
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10. Chan SC. Views of Malaysian interns and their supervisors on the adequacy of undergraduate clinical skills training. Singapore Med J [Internet]. 2012 [acesso 10 maio 2023];53(3):196-202. Disponível: https://bit.ly/3D8yQA5
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11. Santos TFC. Comunicação de más notícias no contexto da UTI neonatal [dissertação] [Internet]. Recife: Universidade Federal de Pernambuco; 2016 [acesso 10 maio 2023]. Disponível: https://bit.ly/3NJUnnt
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- 1212. Cavalcante M, Grossman S, Pedrosa CMS, Dermeval D, Vasconcelos DAL, Freire CJ, Vasconcelos MVL. Teaching and training how to communicate bad news using simulation techniques and technology: mobile learning through role-play. In: Costa AP, Reis LP, Moreira A, Longo L, Bryda G, editores. Computer supported qualitative research [Internet]. New York: Springer; 2021 [acesso 10 maio 2023]. p. 191-205. Disponível: https://bit.ly/3JP4juX
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.

Além dessas dificuldades, há relatos de desafios diários vivenciados pelas equipes de saúde de unidades de terapia intensiva neonatal (Utin), o que torna necessário refletir e discutir aspectos técnicos, científicos e éticos do cuidado, tanto dos pacientes críticos como de seus familiares. Esse é um processo imperativo, particularmente em se tratando de médicos em formação, pois visa melhorar a qualidade do atendimento e da relação médico-familiar 1313. Leite MA, Vila VSC. Dificuldades vivenciadas pela equipe multiprofissional na unidade de terapia intensiva. Rev Latinoam Enferm [Internet]. 2005 [acesso 10 maio 2023];13(2):145-50. DOI: 10.1590/S0104-11692005000200003
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. Tudo isso envolve sensibilizar a equipe de saúde, além de estimular a reflexão sobre a escuta da população-alvo, que, no caso das Utin, são os cuidadores e/ou familiares.

Não existem regras nem modelos únicos para uma comunicação adequada na área da saúde, de modo que a eficácia desse processo depende da flexibilidade para adequar a técnica profissional a cada circunstância, conforme os diversos contextos: cultural, social, educacional e familiar 22. Silva MJP. Comunicação de más notícias. Mundo Saúde [Internet]. 2012 [acesso 10 maio 2023];36(1):49-53. Disponível: https://bit.ly/3raKzez
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. Dessa maneira, alguns protocolos têm sido utilizados para auxiliar profissionais de saúde a entender como comunicar notícias difíceis. Dentre esses protocolos, um dos mais didáticos e conhecidos é o Spikes, em que cada letra representa uma etapa do aprendizado da comunicação de más notícias 1414. Baile WF, Buckman R, Lenzi R, Glober G, Beale EA, Kudelka AP. Spikes: a six-step protocol for delivering bad news: application to the patient with cancer. Oncologist [Internet]. 2000 [acesso 10 maio 2023];5(4):302-11. DOI: 10.1634/theoncologist.5-4-302
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15. Buckman RA. Breaking bad news: the S-P-I-K-E-S strategy. Community Oncology [Internet]. 2005 [acesso 10 maio 2023];2(2):138-42. Disponível: https://bit.ly/46ImtYO
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- 1616. Kaplan M. Spikes: a framework for breaking bad news to patients with cancer. Clin J Oncol Nurs [Internet]. 2010 [acesso 10 maio 2023];14(4):514-6. DOI: 10.1188/10.CJON.514-516
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:

  • Setting (S): começo adequado, com preparação do ambiente, tendo em vista a forma de comunicar e quem deve estar presente, ou seja, é o início propriamente dito;

  • Perception (P): percepção sobre o conhecimento do familiar acerca da doença;

  • Invitation (I): convite para descobrir quanto o familiar gostaria de saber sobre a doença do paciente;

  • Knowledge (K): o compartilhamento das informações com os familiares;

  • Empathy (E): empatia para lidar com os sentimentos do familiar;

  • Strategy and summary (S): resumo das informações e promoção de estratégias em conjunto com a família, visando o planejamento terapêutico do paciente.

A antropologia visual consiste em utilizar recursos audiovisuais para auxiliar no processo de comunicação em saúde, incentivando o diálogo entre profissionais e familiares. Isso engloba conhecer os processos de saúde, entender as necessidades dos sujeitos, auxiliar na formação de profissionais de saúde e nas pesquisas sobre as práticas comunicacionais, de serviços e de cuidados na saúde, além de humanizar a assistência 1717. Ramos N, Serafim JF. Comunicação em saúde e antropologia fílmica. In: Anais do XII Congresso Latino-Americano de Investigadores de la Comunicación; 2014; Lima. Lima: PUCP; 2014 [acesso 10 maio 2023]. Disponível: https://bit.ly/3XLuHM3
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.

Os preceitos da antropologia visual são diálogo, subjetividade, empatia e percepção da opinião e da cultura do sujeito por meio do compartilhamento de sua vida cotidiana. Dessa forma, estimula-se a reflexividade, a complexidade, a análise do contexto social e a participação do sujeito na avaliação crítica, mantendo ética, honestidade e compromisso com a pessoa 1818. Landa MB. Antropología audiovisual y comunicación intercultural. In: Landa MB, Alvarez GO, organizadores. Olhar in(com)formado: teorias e práticas na antropologia visual [Internet]. Goiânia: Editora da Imprensa Universitária; 2017 [acesso 10 maio 2023]. p. 379-400. Disponível: https://bit.ly/44zM9Fb
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.

Neste trabalho qualitativo, descritivo e exploratório, foram analisadas as percepções de residentes de pediatria, bem como das mães de pacientes, sobre a comunicação de más notícias em Utin, com base na antropologia visual e utilizando o protocolo Spikes nas conversas dos grupos focais e a abordagem analítica de conteúdo de Bardin por categorias 1919. Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2011. .

Método

Este projeto foi conduzido por meio de estudo qualitativo, de tipo descritivo e exploratório, que visa compreender de maneira interpretativa falas e sentidos que elas produzem 2020. Minayo MCS, Deslandes SF, Cruz Neto O, Gomes R. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 29ª ed. Petrópolis: Vozes; 2002. , sendo organizado em duas etapas. Na primeira, foram estabelecidos dois grupos focais, para entender as dificuldades em uma Utin quanto aos processos de comunicação de más notícias entre os profissionais e as mães de neonatos. Por sua vez, na segunda etapa, foram analisadas as informações e gravações produzidas durante as conversas nos grupos focais, objetivando compreender a percepção dos participantes sobre a comunicação de más notícias em Utin.

Um dos grupos focais (GF) 2121. Kind L. Notas para o trabalho com a técnica de grupos focais. Psicol Rev [Internet]. 2008 [acesso 10 maio 2023];10(15):124-38. Disponível: https://bit.ly/3O8RjCF
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foi composto pelos residentes de pediatria (GF1) e outro pelas mães de neonatos internos na Utin (GF2). Os instrumentos utilizados foram os seguintes: método criativo sensível 2222. Soratto J, Pires DEP, Cabral IE, Lazzari DD, Witt RR, Sipriano CAS. A maneira criativa e sensível de pesquisar. Rev Bras Enferm [Internet]. 2014 [acesso 10 maio 2023];67(6):994-9. DOI: 10.1590/0034-7167.2014670619
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, empregando a dinâmica de criatividade e sensibilidade, ou almanaque 2222. Soratto J, Pires DEP, Cabral IE, Lazzari DD, Witt RR, Sipriano CAS. A maneira criativa e sensível de pesquisar. Rev Bras Enferm [Internet]. 2014 [acesso 10 maio 2023];67(6):994-9. DOI: 10.1590/0034-7167.2014670619
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, para estimular as conversas no GF2; e o questionário do comportamento comunicativo do médico (QCCM) 2323. Croitor LMN. Percepção de pacientes do comportamento comunicativo do médico: elaboração e validação de um novo instrumento de medida [dissertação] [Internet]. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais; 2010 [acesso 10 maio 2023]. Disponível: https://bit.ly/3XL4zkd
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, além do protocolo Spikes 1414. Baile WF, Buckman R, Lenzi R, Glober G, Beale EA, Kudelka AP. Spikes: a six-step protocol for delivering bad news: application to the patient with cancer. Oncologist [Internet]. 2000 [acesso 10 maio 2023];5(4):302-11. DOI: 10.1634/theoncologist.5-4-302
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15. Buckman RA. Breaking bad news: the S-P-I-K-E-S strategy. Community Oncology [Internet]. 2005 [acesso 10 maio 2023];2(2):138-42. Disponível: https://bit.ly/46ImtYO
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- 1616. Kaplan M. Spikes: a framework for breaking bad news to patients with cancer. Clin J Oncol Nurs [Internet]. 2010 [acesso 10 maio 2023];14(4):514-6. DOI: 10.1188/10.CJON.514-516
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, que orientaram o roteiro de perguntas para os GF.

Primeira etapa

O GF1 contava com 12 residentes de pediatria, enquanto o GF2 era composto por seis mães de neonatos que estavam ou que já haviam sido internados na Utin. Três facilitadores com experiência em GF de pesquisas qualitativas (dentre eles a pesquisadora deste estudo) participaram de ambos os GF.

A amostragem e o recrutamento dos participantes foram realizados por conveniência, e a maioria dos participantes dos dois GF se dispôs a falar, comentar as intervenções dos colegas e se manifestar acerca do tema e seus desenvolvimentos. As perguntas foram semelhantes nos dois GF, embora a linguagem tenha sido adaptada tendo em vista a compreensão dos participantes, que iniciaram e finalizaram as conversas nos GF juntos, nas quais todos tomaram parte, sem desistências ou recusas a participar.

Devido à qualidade e à quantidade de informações produzidas nos dois GF, não foi necessário repeti-los, e, com o encerramento dos grupos, quando as falas começaram a se iterar, agradeceu-se aos participantes e disponibilizou-se tempo para sanar dúvidas. Eles concordaram que os GF fossem gravados e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) antes do início do estudo.

Os GF contaram com os seguintes momentos: 1) agendamento do horário; 2) preparação do ambiente; 3) acolhimento do grupo e apresentação dos organizadores e dos objetivos das atividades; 4) estímulo a conversas, no GF2, com base na dinâmica almanaque 2222. Soratto J, Pires DEP, Cabral IE, Lazzari DD, Witt RR, Sipriano CAS. A maneira criativa e sensível de pesquisar. Rev Bras Enferm [Internet]. 2014 [acesso 10 maio 2023];67(6):994-9. DOI: 10.1590/0034-7167.2014670619
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– na qual figuras, frases e palavras relacionadas ao tema ou à questão central são recortadas e coladas –; 5) roteiro de perguntas baseadas no QCCM, para pacientes e médicos, dando a cada participante a possibilidade de apresentar sua percepção ao grupo, a partir da qual se iniciou então a discussão coletiva; e 6) análise e validação coletiva dos dados.

Segunda etapa

Nessa etapa foram analisadas as informações produzidas durante as conversas nos GF, visando compreender a percepção dos participantes sobre a comunicação de más notícias em uma Utin. Após os GF, as gravações foram escutadas e transcritas integralmente, e as falas e seus sentidos classificados segundo as seis diretrizes do protocolo Spikes, sendo posteriormente articuladas aos constructos da antropologia visual 1616. Kaplan M. Spikes: a framework for breaking bad news to patients with cancer. Clin J Oncol Nurs [Internet]. 2010 [acesso 10 maio 2023];14(4):514-6. DOI: 10.1188/10.CJON.514-516
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, 1717. Ramos N, Serafim JF. Comunicação em saúde e antropologia fílmica. In: Anais do XII Congresso Latino-Americano de Investigadores de la Comunicación; 2014; Lima. Lima: PUCP; 2014 [acesso 10 maio 2023]. Disponível: https://bit.ly/3XLuHM3
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. Depois de transcritas, as falas foram analisadas com base em Bardin 1919. Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2011. . Para manter o sigilo e anonimato, identificaram-se os residentes de pediatria pelas iniciais “Res”, as mães participantes como “Mãe” e os facilitadores como “Fac”.

Resultados

Dentre os 12 residentes de pediatria do primeiro GF, que durou 2h22, metade cursava o primeiro ano de residência, e a outra metade o segundo ano. Em sua maioria, estudaram em universidade pública e concluíram a graduação entre 2015 e 2018. Todos já tinham tido contato com neonatos internados e com as mães deles; oito tiveram experiência teórica em comunicação de más notícias somente durante a graduação; e quatro não tinham experiência teórica nessa área.

Dentre as seis mães, cujo GF durou 52 minutos, quatro eram do interior e duas da capital do estado; quatro haviam cursado o ensino médio; e duas tinham concluído apenas o ensino fundamental. Todas eram inexperientes quanto à internação em Utin – cinco delas estavam em sua primeira gestação –; já os bebês eram todos prematuros e ficaram internados por um período de nove a 37 dias.

Dinâmica almanaque

No início das conversas solicitou-se às mães que pensassem em imagens que representassem suas vivências na Utin ao acompanharem seus filhos. Foram distribuídas revistas aleatoriamente, e as mães deveriam fazer recortes e colagens dessas imagens em cartolinas. Algumas artes, estimuladas pela dinâmica almanaque 2121. Kind L. Notas para o trabalho com a técnica de grupos focais. Psicol Rev [Internet]. 2008 [acesso 10 maio 2023];10(15):124-38. Disponível: https://bit.ly/3O8RjCF
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, revelaram as dificuldades diárias das mães de bebês internados na Utin: um jovem exausto com uma bomba pairando sobre sua cabeça, uma pessoa escalando uma montanha, outra pedindo silêncio e ainda uma última pegando fogo. As participantes expressaram em seus depoimentos as representações pessoais para as imagens escolhidas:

“Minha imagem foi a fadiga ou o cansaço mental e físico. O [cansaço] mental mexe no psicológico da gente nesse lugar. A gente sofre muito também e o cansaço físico” (Mãe 1).

“A minha eu escolhi uma pessoa pegando fogo… [choro]. Pra representar a dor da gente… [choro]” (Mãe 2).

“Eu escolhi o silêncio, também a educação e a atenção” (Mãe 3).

“Escolhi a imagem de uma gravidez e de um parto aqui que foi normal. Foi uma coisa que aconteceu comigo aqui. Com 24 horas que minha bolsa estourou eu falei pra médica que eu queria muito que meu menino fosse [de] cesárea. Não me preocupava comigo, com a recuperação, mas me preocupava com ele. Por conta disso meu menino nasceu com problema respiratório e até hoje ele não… [choro]… Ele nasceu muito cansadinho e hoje, com um mês e 17 dias, mais ou menos, é que ele está se recuperando. Ainda está muito cansadinho” (Mãe 4).

“Eu escolhi o silêncio. E também a educação. E a atenção” (Mãe 5).

“Eu escolhi essa imagem porque significa muito pra mim. Um cara subindo uma montanha e atrás tem um precipício” (Mãe 6).

Categorias: diretrizes do protocolo Spikes

Tanto no GF dos residentes como no das mães verificou-se que não havia ambiente adequado para comunicar más notícias na Utin. Tendo em vista o primeiro passo do protocolo Spikes, que está relacionado ao preparo do ambiente para amparar os familiares dos pacientes, observou-se que não existia acolhimento:

“Ela chegava, às vezes eu estava com meu filho e ela gritava: venha aqui que eu quero falar com você” (Mãe 4).

“Aqui é na beira do leito!” (Res 1).

Constatou-se que não houve preocupação dos residentes quanto ao entendimento das mães sobre o quadro clínico dos filhos. No segundo passo do protocolo Spikes, relacionado à percepção dos familiares sobre a doença do paciente, observou-se deficiência na relação com o outro:

“Acho que eu que acabei me isolando” (Mãe 2).

“Mas ninguém percebeu seu isolamento?” (Fac 1).

“Não sei” (Mãe 2).

“Então ela passou muitos dias na UTI e ela não sabia o que a criança tinha. Ela só sabia que a criança estava [em estado] grave” (Res 2).

Ambos os grupos perceberam que não houve iniciativa médica, espaço ou tempo para conversas entre familiares e equipe multiprofissional. Quanto ao terceiro passo do protocolo Spikes, relacionado ao convite para conhecer o diagnóstico, tratamento e prognóstico do paciente, na maioria das vezes não se convocava o familiar para conversar de forma adequada:

“Não sabem falar com a gente, não sabem chamar, elas não têm educação de chamar a gente, simplesmente ignoram a gente” (Mãe 3).

“É sempre muito corrido, então às vezes não dá tempo de você chamar pra conversar com a mãe” (Res 3).

Os dois grupos entenderam que na comunicação na Utin a linguagem é inadequada. Sobre o quarto passo do protocolo Spikes, que diz respeito a compartilhar informações, as mães não entendem a linguagem médica usada nas conversas:

“Eu, quando não entendia, pedia pra repetir. Eu digo: dá pra repetir?” (Mãe 5).

“Alguns pais não têm entendimento nenhum, mesmo você tentando falar com linguagem muito básica. Mesmo assim, acho que todo dia você tem que reforçar a mesma coisa porque a maioria ali não entende” (Res 3).

Com relação a colocar-se no lugar do outro, os dois grupos perceberam a dificuldade em lidar com as emoções. O quinto passo do protocolo Spikes, envolvendo a empatia, foi um dos mais difíceis nas relações em saúde:

“Eu me sentia culpada. Eu chorava demais” (Mãe 6).

“Na hora de dar a notícia eu comecei a chorar, sem condições, comecei a chorar e a lembrar da minha sobrinha” (Res 4).

Os dois grupos notaram que não há espaço para conversar com os familiares, dirimir suas dúvidas, ou mesmo discutir estratégias com a família. O sexto passo do protocolo Spikes, que envolve resumir e traçar estratégias em conjunto com os familiares para o futuro do paciente, não era realizado na Utin:

“Elas, como se fosse impor. Elas não perguntam se a gente quer” (Mãe 4).

“Mesmo com toda sobrecarga de trabalho, a gente já passou por isso e a gente sabe que dá pra fazer” (Res 7).

O processo de trabalho e sua sobrecarga, a personalidade dos médicos e a obrigação de ter que lidar com a vida e a morte diariamente foram alguns fatores que prejudicaram a comunicação de más notícias no cotidiano da Utin:

“Teve poucos momentos bons, mas teve mais dolorosos, porque a maioria das enfermeiras são muito ruins” (Mãe 2).

“Foi bem traumatizante pra mim e talvez se tivesse tido esse treinamento antes me ajudaria” (Res 5).

“O profissional não quer dar a notícia ou não quer fazer declaração de óbito porque não quer ficar relacionado ao fato da morte” (Res 2).

Discussão

Os participantes desta pesquisa relataram muitos momentos difíceis que poderiam ter sido minimizados caso houvesse preparo adequado da equipe profissional, estrutura física e boas condições de trabalho para acolher os familiares dos neonatos na Utin. As falhas estruturais da Utin analisada (referentes à categoria setting do protocolo Spikes), por exemplo, a falta de uma sala reservada e adequada para comunicar más notícias aos familiares de pacientes, favorecem o distanciamento entre médicos e mães, prejudicando a comunicação dos desfechos difíceis 88. Campos CACA, Silva LB, Bernardes JS, Santos RGA, Oliveira HMNS, Ferreira SMS. Entre pássaros e flores: desafios de equipes multiprofissionais de saúde. Atas CIAIQ 2017 [Internet]. 2017 [acesso 10 maio 2023];2:1446-55. Disponível: https://bit.ly/3rpDF5b
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.

Para evitar o isolamento e embasar as relações médico-paciente e médico-familiar, deve-se reforçar o princípio de compromisso do profissional de saúde com as famílias, estabelecendo uma ligação afetiva e ética entre profissionais e usuários, conforme preconizado pela antropologia visual 1717. Ramos N, Serafim JF. Comunicação em saúde e antropologia fílmica. In: Anais do XII Congresso Latino-Americano de Investigadores de la Comunicación; 2014; Lima. Lima: PUCP; 2014 [acesso 10 maio 2023]. Disponível: https://bit.ly/3XLuHM3
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, 1818. Landa MB. Antropología audiovisual y comunicación intercultural. In: Landa MB, Alvarez GO, organizadores. Olhar in(com)formado: teorias e práticas na antropologia visual [Internet]. Goiânia: Editora da Imprensa Universitária; 2017 [acesso 10 maio 2023]. p. 379-400. Disponível: https://bit.ly/44zM9Fb
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.

A diretriz perception do protocolo Spikes 1616. Kaplan M. Spikes: a framework for breaking bad news to patients with cancer. Clin J Oncol Nurs [Internet]. 2010 [acesso 10 maio 2023];14(4):514-6. DOI: 10.1188/10.CJON.514-516
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foi prejudicada pelo acúmulo de trabalho, que impede a equipe de se alinhar para se comunicar com a família. Os residentes indicaram que não há tempo para perceber os familiares no contexto da Utin, o que está de acordo com os trabalhos de Leite e Vila 1313. Leite MA, Vila VSC. Dificuldades vivenciadas pela equipe multiprofissional na unidade de terapia intensiva. Rev Latinoam Enferm [Internet]. 2005 [acesso 10 maio 2023];13(2):145-50. DOI: 10.1590/S0104-11692005000200003
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e Campos e colaboradores 88. Campos CACA, Silva LB, Bernardes JS, Santos RGA, Oliveira HMNS, Ferreira SMS. Entre pássaros e flores: desafios de equipes multiprofissionais de saúde. Atas CIAIQ 2017 [Internet]. 2017 [acesso 10 maio 2023];2:1446-55. Disponível: https://bit.ly/3rpDF5b
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, que relatam dificuldades no cotidiano das equipes de saúde em UTI.

Dentre essas dificuldades, estão o estresse de lidar com a morte e com as famílias e a escassez de recursos materiais e humanos, além da falta de união e comprometimento dos membros da equipe, o que gera cansaço, desânimo e sensação de fracasso. O fundamento da antropologia visual 1717. Ramos N, Serafim JF. Comunicação em saúde e antropologia fílmica. In: Anais do XII Congresso Latino-Americano de Investigadores de la Comunicación; 2014; Lima. Lima: PUCP; 2014 [acesso 10 maio 2023]. Disponível: https://bit.ly/3XLuHM3
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, 1818. Landa MB. Antropología audiovisual y comunicación intercultural. In: Landa MB, Alvarez GO, organizadores. Olhar in(com)formado: teorias e práticas na antropologia visual [Internet]. Goiânia: Editora da Imprensa Universitária; 2017 [acesso 10 maio 2023]. p. 379-400. Disponível: https://bit.ly/44zM9Fb
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de valorização dos saberes e das vivências dos sujeitos em seu contexto socioeconômico e familiar fortalece o segundo passo do protocolo Spikes 1616. Kaplan M. Spikes: a framework for breaking bad news to patients with cancer. Clin J Oncol Nurs [Internet]. 2010 [acesso 10 maio 2023];14(4):514-6. DOI: 10.1188/10.CJON.514-516
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, isto é, a percepção do outro e do que esse sujeito consegue ou quer conhecer sobre sua realidade.

Os residentes identificaram que, na rotina da Utin, os médicos valorizam pouco o convite às conversas com as famílias dos pacientes. Para justificar essa falha na terceira etapa do protocolo Spikes 1616. Kaplan M. Spikes: a framework for breaking bad news to patients with cancer. Clin J Oncol Nurs [Internet]. 2010 [acesso 10 maio 2023];14(4):514-6. DOI: 10.1188/10.CJON.514-516
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( invitation ), foram apontadas mais uma vez as dificuldades no processo de trabalho, como sobrecarga e escassez de recursos humanos, além da responsabilidade de salvar vidas, em detrimento da adequada comunicação e da boa relação médico-familiar.

No entanto, os residentes reconheceram que as dificuldades diárias do trabalho na Utin não os impedem de valorizar a empatia e de tentar se comunicar melhor com as mães dos bebês. Isso valida as ideias de Peduzzi 2424. Peduzzi M. Equipe multiprofissional de saúde: conceito e tipologia. Rev Saúde Pública [Internet]. 2001 [acesso 10 maio 2023];35(1):103-9. Disponível: https://bit.ly/3pFkSCE
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, que nega o prejuízo para os projetos técnicos quando são articuladas as ações multiprofissionais, de cooperação e a comunicação adequada. O diálogo é um dos mais importantes fundamentos da antropologia visual 1717. Ramos N, Serafim JF. Comunicação em saúde e antropologia fílmica. In: Anais do XII Congresso Latino-Americano de Investigadores de la Comunicación; 2014; Lima. Lima: PUCP; 2014 [acesso 10 maio 2023]. Disponível: https://bit.ly/3XLuHM3
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, 1818. Landa MB. Antropología audiovisual y comunicación intercultural. In: Landa MB, Alvarez GO, organizadores. Olhar in(com)formado: teorias e práticas na antropologia visual [Internet]. Goiânia: Editora da Imprensa Universitária; 2017 [acesso 10 maio 2023]. p. 379-400. Disponível: https://bit.ly/44zM9Fb
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, e é por meio dele que se dissemina o conhecimento, se estimula a reflexão e se contribui para mudar a realidade.

A quarta etapa do protocolo Spikes 1616. Kaplan M. Spikes: a framework for breaking bad news to patients with cancer. Clin J Oncol Nurs [Internet]. 2010 [acesso 10 maio 2023];14(4):514-6. DOI: 10.1188/10.CJON.514-516
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( knowledge ) indica a necessidade de preparo para adequar a linguagem técnica à compreensão das famílias, principalmente em razão dos variados níveis de escolaridade nas Utin públicas. A linguagem utilizada com as famílias dos pacientes foi considerada inadequada na Utin estudada, gerando mal-entendidos e dificultando a comunicação entre equipe de saúde e familiares.

O processo de comunicação é ineficaz quando a técnica profissional não se adequa ao contexto cultural, social, educacional e familiar 22. Silva MJP. Comunicação de más notícias. Mundo Saúde [Internet]. 2012 [acesso 10 maio 2023];36(1):49-53. Disponível: https://bit.ly/3raKzez
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. Na antropologia visual 1717. Ramos N, Serafim JF. Comunicação em saúde e antropologia fílmica. In: Anais do XII Congresso Latino-Americano de Investigadores de la Comunicación; 2014; Lima. Lima: PUCP; 2014 [acesso 10 maio 2023]. Disponível: https://bit.ly/3XLuHM3
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, 1818. Landa MB. Antropología audiovisual y comunicación intercultural. In: Landa MB, Alvarez GO, organizadores. Olhar in(com)formado: teorias e práticas na antropologia visual [Internet]. Goiânia: Editora da Imprensa Universitária; 2017 [acesso 10 maio 2023]. p. 379-400. Disponível: https://bit.ly/44zM9Fb
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se enfatiza a importância de compreender a realidade das famílias, permitindo empoderar os sujeitos e conscientizá-los criticamente para que possam modificar suas práticas.

Na quinta etapa do protocolo Spikes ( empathy ) 1616. Kaplan M. Spikes: a framework for breaking bad news to patients with cancer. Clin J Oncol Nurs [Internet]. 2010 [acesso 10 maio 2023];14(4):514-6. DOI: 10.1188/10.CJON.514-516
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notou-se dificuldade em lidar com as próprias emoções e com as reações dos familiares às más notícias comunicadas. Isso está em consonância com o estudo de Coutinho e Ramessur 2525. Coutinho F, Ramessur A. An overview of teaching communication of bad news in medical school: should a lecture be adequate to address the topic? Acta Med Port [Internet]. 2016 [acesso 10 maio 2023];29(12):826-31. DOI: 10.20344/amp.7909
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, no qual a empatia foi o aspecto percebido pelos estudantes de medicina como mais difícil de aprender para aplicar à rotina médica diária, justificando a necessidade de capacitações profissionais contínuas na área. A antropologia visual 1717. Ramos N, Serafim JF. Comunicação em saúde e antropologia fílmica. In: Anais do XII Congresso Latino-Americano de Investigadores de la Comunicación; 2014; Lima. Lima: PUCP; 2014 [acesso 10 maio 2023]. Disponível: https://bit.ly/3XLuHM3
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, 1818. Landa MB. Antropología audiovisual y comunicación intercultural. In: Landa MB, Alvarez GO, organizadores. Olhar in(com)formado: teorias e práticas na antropologia visual [Internet]. Goiânia: Editora da Imprensa Universitária; 2017 [acesso 10 maio 2023]. p. 379-400. Disponível: https://bit.ly/44zM9Fb
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aborda a capacidade de se colocar no lugar do outro, entendê-lo e oferecer oportunidades para sua evolução.

A última competência do protocolo Spikes 1616. Kaplan M. Spikes: a framework for breaking bad news to patients with cancer. Clin J Oncol Nurs [Internet]. 2010 [acesso 10 maio 2023];14(4):514-6. DOI: 10.1188/10.CJON.514-516
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é a que permite sintetizar e discutir estratégias sobre o futuro dos pacientes com suas famílias ( strategy and summary ). Os residentes de pediatria, mais uma vez, mencionaram falta de espaço e tempo para esclarecer dúvidas dos familiares e discutir estratégias. Essas falhas foram justificadas pela deficiência no espaço físico, sobrecarga de trabalho, preparação inadequada para a comunicação e dificuldade de lidar com as emoções e com a morte.

Nesse sentido, Kovács 2626. Kovács MJ. Educação para a morte. Psicol Ciênc Prof [Internet]. 2005 [acesso 10 maio 2023];25(3):484-97. DOI: 10.1590/S1414-98932005000300012
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se refere ao equilíbrio da capacidade técnica com a emoção como um desafio constante para os profissionais da saúde. Quando se estimula a família a discutir sobre o paciente, abre-se espaço para o respeito à ética e à verdade, porém sem privar as pessoas da esperança 1616. Kaplan M. Spikes: a framework for breaking bad news to patients with cancer. Clin J Oncol Nurs [Internet]. 2010 [acesso 10 maio 2023];14(4):514-6. DOI: 10.1188/10.CJON.514-516
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.

Considerações finais

No trabalho na Utin, a comunicação adequada de más notícias é dificultada por fatores como: sobrecarga de atividades; deficiência de recursos materiais e humanos; falta de tempo e espaço para conversas entre usuários, equipe multiprofissional e gestores do serviço; carência de preparo adequado para comunicação; e dificuldade em lidar com emoções e com a morte.

Essa situação demanda discussões entre os sujeitos envolvidos no processo: equipe multiprofissional, usuários e gestores. Portanto, incentiva-se o diálogo entre usuários, profissionais da saúde e gestores, sugerindo intervenções educativas continuadas para os profissionais como forma de melhorar as relações médico- -familiares e, consequentemente, a humanização da assistência à saúde.

O caráter exploratório deste estudo é um estímulo para prosseguir as pesquisas e aprofundar a análise dos aspectos do processo de trabalho e da organização em Utin, a fim de melhorar a comunicação de más notícias. Ao mesmo tempo, porém, representa uma limitação, em vista de seu tipo de desenho, que não avalia modificações nas práticas profissionais.

Por fim, essa abordagem também colabora para sensibilizar médicos em formação quanto à reflexão sobre a realidade de seu trabalho, e incentiva a busca por aprendizado contínuo nessa área e por espaços de diálogo para melhorar a comunicação de más notícias em Utin.

Não é fácil aprender esse tipo de comunicação, mas, por se tratar de uma competência médica exigida no cotidiano da Utin, é necessário incentivar a formação médica humanizada, buscar aprendizado continuado e melhores condições de trabalho. Nesse sentido, a realidade da Utin estudada não está adequada às diretrizes preconizadas pela Política Nacional de Humanização, de modo que esta pesquisa contribuiu para que as mães identificassem falhas na comunicação entre usuários e profissionais, concedendo voz àquelas que tinham pouco espaço para falar.

Em suma, a reflexão sobre as dificuldades no processo de comunicação de más notícias ajuda a sensibilizar os médicos quanto à busca por aprendizado teórico, além de estimular a autocrítica, visando a empatia e a humanização da assistência na Utin.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    19 Nov 2022
  • Revisado
    10 Maio 2023
  • Aceito
    18 Maio 2023
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