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Capital, Agência e Distinção em Dinâmica de Reconversão de Funções Econômicas de Cidades: Lições de Lafayette (EUA)

RESUMO

A transição para a sociedade digital tem atraído a atenção de grupo crescente de estudiosos que buscam investigar limitações dessa nova etapa das forças produtivas nas intervenções urbanas. Desse contexto surge a motivação para este artigo, o qual visa analisar resultados de levantamento empírico de dados realizado na cidade norte-americana de Lafayette (LA), com o objetivo de investigar o processo de reconversão de suas funções econômicas na transição em curso para a economia digital, com implicações significativas na composição do mercado de trabalho, particularmente nos setores comercial e de serviços. Como resultado, a distribuição espacial da Lafayette reflete aspectos marcantes associados a configurações históricas, culturais, éticas e socioeconômicas. De acordo com o arcabouço teórico de Bourdieu, ela também reflete os habitus dos diferentes grupos sociais, bem como a forma pelas quais seus distintos capitais - econômicos, sociais, culturais e simbólicos - são mobilizadas com vistas ao domínio do campo no qual se inserem.

PALAVRAS-CHAVE:
Intervenções Urbanas; Dinâmicas de Reconversão de Funções Econômicas de Cidades; Teoria da Ação Prática de Bourdieu; Agência

ABSTRACT

The transition to the digital society attracts the attention of a growing group of scholars who seek to investigate the constraints of this new stage of the productive forces on urban interventions. From this context comes the motivation for this paper, which proposes to analyze findings of an empirical survey of data conducted in the North American city of Lafayette, with the objective of investigating a process of reconversion of its economic functions in the ongoing transition to the digital economy, with significant implications on the composition of the labor market, particularly in the commercial and services sectors. As a result, Lafayette's spatial distribution reflects striking aspects associated with historical, cultural, ethical and socioeconomic configurations. According to Bourdieu's theoretical framework, it also reflects in this way the habitus of the different social groups, as well as the way in which different capitals - economic, social, cultural and symbolic - are mobilized, aiming at the domain of the field.

KEYWORDS:
Urban Interventions; Dynamics of Conversion of Economic Functions of Cities; Bourdieu’s Theory of Practical Action; Agency

1. INTRODUÇÃO

Tal como Giddens, Elias e, antes deles, Parsons - e até Weber -, Bourdieu está interessado no estudo do tema da agência, tendo seu trabalho o elevado ao nível de um dos cientistas sociais franceses mais reconhecidos e lidos internacionalmente (Sant'Anna & Diniz, 2017Sant'Anna, A. S., & Diniz, D. M. (2017). (Re-)construing Space as Capital: Contributions from a Study with Local Entrepreneurs. BBR, 14(5), 544-558. ; Bourdieu, 2010Bourdieu, P. (2010). O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.). Sua Teoria da Ação Prática gradualmente ganha espaço também no âmbito dos estudos organizacionais, particularmente considerando a relevância de novas abordagens teórico-conceituais e metodológicas capazes de melhor apreender a complexidade do ambiente contemporâneo. Contexto, no qual disrupções e descontinuidades nas relações de indivíduo-trabalho-organizações trazem à tona a relevância de novos modos de produção e regulamentação, típicos da quarta revolução industrial. Centrada na produção em série e na dependência de classes médias de consumo, a economia da terceira revolução industrial se vê enfrentando modos outros de produção e regulação, catalisados pela exponencial introdução de novas tecnologias de base digital, apontando para o que se comumente denomina de quarta revolução industrial (Susskind & Susskind, 2017Susskind, R., & Susskind, D. (2017). The future of the professions: How technology will transform the work of human experts. Glasgow: Oxford University Press.; Schwab, 2017Schwab, K. (2017) The fourth industrial revolution. New York: Hardcover. ).

Da mesma forma, a transição para a sociedade digital atrai atenção de grupo crescente de estudiosos que procuram investigar implicações associadas a esse novo estágio das forças produtivas sobre as intervenções urbanas (Harvey, 1992Harvey, D. (1992). The condition of postmodernity: An enquiry into the origins of cultural change. Cambridge, MA: Blackwell Publishers. ). Nessa direção, registram-se estudos sobre formas pelas quais diferentes agentes sociais - empreendedores, empreendedores, representantes de entidades da sociedade civil, líderes comunitários e governamentais, trabalhadores, cidadãos - articulam-se em dinâmicas de reconversão de funções econômicas de cidades (Nelson, Sant'Anna & Wood, 2016Nelson, R. E., Sant'Anna, A. S., & Wood, M. S. (2016). Sociocultural context, entrepreneurial types, entrepreneurial action, and community dynamics in Tiradentes, Brazil. In A. C. Corbett & Katz J. A. (Eds.), Advances in entrepreneurship, firm emergence, and growth: Models of start-ups thinking and adcton (V. 18, pp. 33-74). Bingley, UK: Emerald Publishing.; Oliveira, Sant’Anna & Diniz, 2013Oliveira, F., Sant’Anna, A., & Diniz, D. (2013). Tipologia de empreendedores em dinâmicas de reconversão de funções econômicas de cidades: Um estudo dos casos Tiradentes e Paraty. Revista de Gestão dos Países de Língua Portuguesa, 12(2), 44-58. ; Sant'Anna, Oliveira & Diniz, 2012Sant'Anna, A. S., Oliveira, F. B., & Diniz, D. M. (2012). Tipos de empreendedores em dinâmicas de reconversão de funções econômicas de cidades: uma análise sob a perspectiva de Bourdieu. Gestão e Sociedade, 6(15), 378-406.).

Dados empíricos evidenciam o protagonismo dos agentes empreendedores em tais processos, considerando, no entanto, que tal agrupamento não se apresenta de forma monolítica. Ao contrário, apresentam variações entre si, em termos de papéis desempenhados, atributos pessoais e modelos de gestão, assim como as constantes inter-relações, conflitos e alianças dentro dos processos de transformação vivenciados em seus contextos. Essas são descobertas relevantes, já que a literatura clássica sobre empreendedorismo ainda não está suficientemente atenta à dinâmica de convivência e tensão entre diferentes tipos de empreendedores (Nelson, Sant'Anna & Wood, 2016Nelson, R. E., Sant'Anna, A. S., & Wood, M. S. (2016). Sociocultural context, entrepreneurial types, entrepreneurial action, and community dynamics in Tiradentes, Brazil. In A. C. Corbett & Katz J. A. (Eds.), Advances in entrepreneurship, firm emergence, and growth: Models of start-ups thinking and adcton (V. 18, pp. 33-74). Bingley, UK: Emerald Publishing.).

A literatura clássica sobre empreendedorismo também não parece muito atenta às dinâmicas de coexistência e tensão entre diferentes tipos de empreendedores. Ao mesmo tempo, revela não considerar a importância da ecologia social comunitária na criação de contextos que contribuam para definir os parâmetros de interação entre tais agentes e seus papéis sociais na comunidade (Nelson, Sant'Anna & Wood, 2016Nelson, R. E., Sant'Anna, A. S., & Wood, M. S. (2016). Sociocultural context, entrepreneurial types, entrepreneurial action, and community dynamics in Tiradentes, Brazil. In A. C. Corbett & Katz J. A. (Eds.), Advances in entrepreneurship, firm emergence, and growth: Models of start-ups thinking and adcton (V. 18, pp. 33-74). Bingley, UK: Emerald Publishing.).

Isso diferentemente dos extremos que caracterizam o pensamento tradicional sobre empreendedorismo, no qual por um lado se temuma visão dos empreendedores como elementos quase míticos - ao contrário de outros indivíduos -, os quais por sua genialidade e habilidades únicas seriam capazes de identificar e aproveitar oportunidades, assim como criar novas riquezas que outros não seriam capazes de vislumbrar. Por outro lado, a ideia de que as macroforças tecnológicas e econômicas criariam oportunidades para novos empreendimentos, aleatoriamente idealizados por pessoas que, não por virtudes particulares, acontecem de estar no lugar certo, no momento certo (Nelson, Sant'Anna & Wood, 2016Nelson, R. E., Sant'Anna, A. S., & Wood, M. S. (2016). Sociocultural context, entrepreneurial types, entrepreneurial action, and community dynamics in Tiradentes, Brazil. In A. C. Corbett & Katz J. A. (Eds.), Advances in entrepreneurship, firm emergence, and growth: Models of start-ups thinking and adcton (V. 18, pp. 33-74). Bingley, UK: Emerald Publishing.).

A fim de verificar que diferentes empreendedores estão inseridos em contextos sociais, nos quais seus agentes têm papéis diferentes e conflitantes, parece não ser a única contribuição de nossos estudos recentes. É também evidente que o empreendedor depende de seu ambiente de uma forma ainda não explicitada pela literatura. Não é sem importância que, por exemplo, a existência e disponibilidade de um centro comercial antigo valoriza e facilita os dons e inclinações dos "tipos" de empreendedores de uma forma mais relevante que em outros contextos (Nelson, Sant'Anna & Wood, 2016Nelson, R. E., Sant'Anna, A. S., & Wood, M. S. (2016). Sociocultural context, entrepreneurial types, entrepreneurial action, and community dynamics in Tiradentes, Brazil. In A. C. Corbett & Katz J. A. (Eds.), Advances in entrepreneurship, firm emergence, and growth: Models of start-ups thinking and adcton (V. 18, pp. 33-74). Bingley, UK: Emerald Publishing.).

Além disso, os resultados sugerem que, embora os tipos de empreendedores encontrados na literatura internacional possam ser reconhecidos em diferentes contextos, as trajetórias e origens sociais das pessoas que representam tais tipos podem ser bem diferentes. Isso indica que mesmo que os tipos de empreendedores acabem tendo um perfil universal típico, o caminho que eles seguem para ocupar dado papel dominante em seu campo pode variar significativamente, dependendo da dinâmica socioeconômica predominante (Nelson, Sant'Anna & Wood, 2016Nelson, R. E., Sant'Anna, A. S., & Wood, M. S. (2016). Sociocultural context, entrepreneurial types, entrepreneurial action, and community dynamics in Tiradentes, Brazil. In A. C. Corbett & Katz J. A. (Eds.), Advances in entrepreneurship, firm emergence, and growth: Models of start-ups thinking and adcton (V. 18, pp. 33-74). Bingley, UK: Emerald Publishing.; Oliveira, Sant'Anna & Diniz, 2013Oliveira, F., Sant’Anna, A., & Diniz, D. (2013). Tipologia de empreendedores em dinâmicas de reconversão de funções econômicas de cidades: Um estudo dos casos Tiradentes e Paraty. Revista de Gestão dos Países de Língua Portuguesa, 12(2), 44-58. ; Sant'Anna, Oliveira & Diniz, 2012Sant'Anna, A. S., Oliveira, F. B., & Diniz, D. M. (2012). Tipos de empreendedores em dinâmicas de reconversão de funções econômicas de cidades: uma análise sob a perspectiva de Bourdieu. Gestão e Sociedade, 6(15), 378-406.). No mais, a diversidade entre os tipos de empreendedores, impedindo-os de perseguir objetivos comuns, tende a preservar o poder das oligarquias políticas tradicionais (Nelson, Sant'Anna & Wood, 2016Nelson, R. E., Sant'Anna, A. S., & Wood, M. S. (2016). Sociocultural context, entrepreneurial types, entrepreneurial action, and community dynamics in Tiradentes, Brazil. In A. C. Corbett & Katz J. A. (Eds.), Advances in entrepreneurship, firm emergence, and growth: Models of start-ups thinking and adcton (V. 18, pp. 33-74). Bingley, UK: Emerald Publishing.).

Finalmente, o protagonismo desempenhado pelos empreendedores é frequentemente acompanhado por um enfraquecimento do poder dos agentes públicos locais (Harvey, 2018Harvey, D. (2018). The limits to capital. London: Verso. ). Convergente com pressupostos defendidos por Maricato (1997Maricato, E. (1997). Brazil 2000: what urban planning? Cadernos IPPUR, XI(1-2), 113-130. ) - e, ao contrário do que foi defendido por Borja e Castells (1996Borja, J., & Castells, M. (1996). Cities as political actors. New CEBRAP Studies, 45(1), 152-166. ) - aponta-se para a perda de influência de grupos políticos tradicionais e ou o recrudescimento de antigas táticas tais como populismo, assistencialismo, clientelismo e a troca de favores. Há também um panorama de baixa cultura de cooperação e articulação fraca entre os campos político, empresarial e comunitário, o que, segundo Ferreira (2007Ferreira, J. S. W. (2007). The myth of the global city: the role of ideology in the production of urban space. Petrópolis, RJ: Vozes. ), tem sérias conseqüências para a sustentabilidade do conceito de "cidade empreendedora".Isso, na medida em que as parcerias entre iniciativas privadas e o setor público, ou seja, uma "liderança compartilhada", apresenta-se fundamental à implementação de projetos de interesse público (Borja & Castells, 1996Borja, J., & Castells, M. (1996). Cities as political actors. New CEBRAP Studies, 45(1), 152-166. ).

Ferreira (2007Ferreira, J. S. W. (2007). The myth of the global city: the role of ideology in the production of urban space. Petrópolis, RJ: Vozes. ) também acrescenta que o desenvolvimento de "cidades de negócios" requer "consenso" entre os agentes sociais, com vistas a legitimar a "vocação" local, bem como os investimentos públicos necessários para tornar a cidade atraente. Sob tal perspectiva, para alcançar um desenvolvimento efetivamente sustentável, parece relevante fomentar mecanismos que ampliem a integração entre os diferentes campos sociais - político, empresarial e comunitário - para que as ações empreendidas atinjam abrangência e representatividade.

Entretanto, é relevante observer que a principal contribuição dos nossos estudos é a "descoberta" do marco teórico de Bourdieu como dispositivo de análise da dinâmica investigada, em particular, do capital mobilizado e das principais relações (re)estabelecidas pelos agentes sociais nele envolvidos (Nelson, Sant'Anna & Wood, 2016Nelson, R. E., Sant'Anna, A. S., & Wood, M. S. (2016). Sociocultural context, entrepreneurial types, entrepreneurial action, and community dynamics in Tiradentes, Brazil. In A. C. Corbett & Katz J. A. (Eds.), Advances in entrepreneurship, firm emergence, and growth: Models of start-ups thinking and adcton (V. 18, pp. 33-74). Bingley, UK: Emerald Publishing.; Oliveira, Sant'Anna & Diniz, 2013Oliveira, F., Sant’Anna, A., & Diniz, D. (2013). Tipologia de empreendedores em dinâmicas de reconversão de funções econômicas de cidades: Um estudo dos casos Tiradentes e Paraty. Revista de Gestão dos Países de Língua Portuguesa, 12(2), 44-58. ; Sant'Anna, Oliveira & Diniz, 2012Sant'Anna, A. S., Oliveira, F. B., & Diniz, D. M. (2012). Tipos de empreendedores em dinâmicas de reconversão de funções econômicas de cidades: uma análise sob a perspectiva de Bourdieu. Gestão e Sociedade, 6(15), 378-406.).Isso, além de permitir um marco teórico para aprofundar questões como agência, dominação, distinção, entre outras inerentes à sociologia de Bourdieu (Bourdieu, 2010Bourdieu, P. (2010). O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil., 2009Bourdieu, P. (2009). O senso prático. Petrópolis: Vozes.).

Mesmo no campo do empreendedorismo, como a maioria dos estudos são de origem norte-americana e, ocasionalmente, europeia, pouco se sabe sobre distinções entre empreendedores brasileiros e de outros países, senão os de origem nórdica. As exceções são os estudos realizados por Mallmann, Borba e Ruppenthal (2005Mallmann, T. D. M., Borba, B. W., & Ruppenthal, J. E. (2005). Avaliação da tipologia dos empreendedores residentes de incubadoras utilizando o teste "Keirsey Temperament Sorter". In Anais do Enanpad, Brasília, DF, Brasil, 29 oct. 01 nov. 2005.) sobre tipos psicológicos encontrados em incubadoras de empresas em Santa Maria (Rio Grande do Sul) e, mais recentemente, os estudos realizados por Sant'Anna e colaboradores, nos estados brasileiros de Minas Gerais e Rio de Janeiro, que trazem contribuições sobre o desempenho dos empreendedoresin loco, no país, onde muito pouco se sabe sobre o desempenho dos emprendedores em relação à comunidade na qual se instalam (Nelson et al., 2016Nelson, R. E., Sant'Anna, A. S., & Wood, M. S. (2016). Sociocultural context, entrepreneurial types, entrepreneurial action, and community dynamics in Tiradentes, Brazil. In A. C. Corbett & Katz J. A. (Eds.), Advances in entrepreneurship, firm emergence, and growth: Models of start-ups thinking and adcton (V. 18, pp. 33-74). Bingley, UK: Emerald Publishing.; Sant'Anna et al., 2012Sant'Anna, A. S. et al. (2012). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades: um estudo do caso Sete Lagoas (MG). Belo Horizonte: FAPEMIG.).

Desse contexto emerge a motivação deste artigo, o qual se propõe a analisar resultados de levantamento empírico de dados realizado na cidade norte-americana de Lafayette, no estado sulista da Louisiana (LA), com o objetivo de investigar processo de reconversão de suas funções econômicas na transição em curso para a economia digital, com implicações significativas sobre a composição das forças sociais que a constituem.

Mais especificamente, além de análises comparativas com pesquisas sobre o tema realizadas no Brasil (Sant'Anna et al., 2016Sant'Anna, A. S. et al. (2016). Relações entre múltiplos agentes sociais em contextos de diversidade e inovação: Contribuições do espaço público. Brasília: CNPq., 2012Sant'Anna, A. S. et al. (2012). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades: um estudo do caso Sete Lagoas (MG). Belo Horizonte: FAPEMIG., 2011Sant'Anna, A. S. et al. (2011). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades: um estudo do caso Tiradentes (MG). Belo Horizonte: FAPEMIG .; Oliveira, Sant'Anna & Diniz, 2011Oliveira, F. B., Sant’Anna, A. S., & Diniz, D. M. (2011). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades com foco no turismo e na indústria criativa: Um estudo do caso Paraty (RJ). Rio de Janeiro: FAPERJ.), os achados apontam problemas e questões que são significativos para nossas análises, notadamente pela antecipação de movimentos e tendências, conflitos e coalizões vividos em Lafayette, incluindo a relevância da mobilização de antigos e novos capitais necessários para dominar os campos empreendedores locais em vista de alterações nas relações sociais decorrentes da quarta revolução industrial em curso. Soma-se a presença em Lafayette de características históricas (colonização latina), culturais (diversidade étnica), religiosas (catolicismo) e urbanas (disposição dos centros históricos), que a distinguem de outras cidades norte-americanas, tornando-a significativa para análises comparativas com dinâmicas similares estudadas no Brasil (Sant'Anna et al., 2016Sant'Anna, A. S. et al. (2016). Relações entre múltiplos agentes sociais em contextos de diversidade e inovação: Contribuições do espaço público. Brasília: CNPq., 2012Sant'Anna, A. S. et al. (2012). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades: um estudo do caso Sete Lagoas (MG). Belo Horizonte: FAPEMIG., 2011Sant'Anna, A. S. et al. (2011). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades: um estudo do caso Tiradentes (MG). Belo Horizonte: FAPEMIG .; Oliveira, Sant'Anna & Diniz, 2011Oliveira, F. B., Sant’Anna, A. S., & Diniz, D. M. (2011). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades com foco no turismo e na indústria criativa: Um estudo do caso Paraty (RJ). Rio de Janeiro: FAPERJ.).

Nessa transição é relevante destacar, ainda, configurações históricas, demográficas, culturais, espaciais e socioeconômicas de Lafayette. Em termos espaciais, assim como em um grande número de cidades norte-americanas, Lafayette merece ser apontada como espacialmente distribuída e dependente do transporte rodoviário. Esses agentes, como recomendado por Jacobs (2011Jacobs, J. (2011) The death and life of great American cities. New York: Vintage. ), são potenciais infragentes da integração e mobilização das habilidades humanas para a produção de "novo trabalho", elementos centrais para a vitalidade social e espacial.

A distribuição espacial da Lafayette também reflete aspectos marcantes associados à segregação étnica. Anos de escravidão deixaram, especialmente em cidades norte-americanas de estados do Sul, profundas cicatrizes nas relações e articulações entre White Americans e Creoles - incluindo negros, latinos, asiáticos - constituindo elemento relevante para a compreensão de suas dinâmicas locais, seus habitus e mecanismos de (re)produção de diferentes capitais, mobilizados na busca pelo domínio de seus diferentes campos de atuação, incluindo o empreendedor. Isso posto, busca-se investigar, por meio de repetições, mesmo que transvestidas por novos formatos, suposições que transversalisam a dinâmica de reconversão de Lafayette para a economia digital. Para tais articulações e análises, a Teoria da Ação Prática de Bourdieu apresenta-se significativa.

2. A SOCIOLOGIA DE BOURDIEU

Uma das principais contribuições da sociologia de Bourdieu é a compreensão de que os agentes sociais, dotados de habitus semelhantes ou distintos e de capitais desigualmente distribuídos, se inter-relacionam dentro de um espaço social, no qual ocorrem conflitos e alianças, na busca da manutenção ou transformação do estado de poder vigente. Tal consideração destaca, portanto, os conceitos propostos pelo autor: Habitus, Campo e Capital (Bourdieu, 2010Bourdieu, P. (2010). O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil., 2009Bourdieu, P. (2009). O senso prático. Petrópolis: Vozes.).

Bourdieu (1998Bourdieu, M. (1998). Distinction: A social critique of the judgement of taste. Cambridge, MA: Harvard. ) define Habitus como um sistema de arranjos e princípios duráveis que podem funcionar como estruturas estruturantes, ou seja, como esquemas que geram e organizam ações coletivas e individuais. Habitus pressupõe, então, um conjunto de princípios de visão e gostos que orientam a escolha dos indivíduos e os orientam a agir de determinadas maneiras. Os agentes sociais dotados de habitus distintos tendem, como resultado, a comportar-se de forma diferente e, por conseguinte, constituem um princípio diferenciador.

O habitus é adquirido pelos agentes através da interiorização das estruturas sociais, as quais trazem histórias individuais e coletivas que são incorporadas pelos agentes. Ao socializar, é provável que os agentes dominem, mesmo sem plena consciência, as leis de funcionamento de seu grupo e se comportem de acordo com essas disposições. Dessa forma, pessoas da mesma classe tendem a ter práticas bastante harmonizadas, mais do que sabem ou mesmo querem, pois, ao serem guiadas pelas leis, cada uma se ajusta à outra.

O campo, por sua vez, compreende um espaço dinâmico, composto de posições distintas determinadas pelo volume de capital detido por cada um de seus agentes. Define também o ambiente em que se realizam as lutas e alianças entre tais agentes em busca da manutenção ou transformação do estado atual das forças.

Como a propriedade do capital, em cada campo, tende a ser desigual, grupos e subgrupos caracterizados por diferentes estilos de vida são observados. Assim, um campo tende a viver em permanente conflito, onde os grupos dominantes procuram manter seus privilégios, e os outros tentam alterar a distribuição atual do capital. Também é possível observar a formação de alianças entre grupos distintos de agentes (Bourdieu, 2010Bourdieu, P. (2010). O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil., 2009Bourdieu, P. (2009). O senso prático. Petrópolis: Vozes.).

Cada campo, portanto, tem sua própria história, seu próprio objeto (artístico, educacional, político) e mecanismos específicos. Como resultado, tem uma certa autonomia em relação a outros espaços sociais. No entanto, os campos se inter-relacionam e sofrem influências uns dos outros, pressões externas que são interpretadas e traduzidas com base na lógica interna do campo.

Embora cada campo apresente atributos peculiares, é possível destacar algumas características universais, que são: 1. a inserção em um campo requer a internalização de suas leis operacionais; 2. a estrutura do campo reflete as diferentes posições ocupadas pelos agentes e o volume de capital detido por eles e, finalmente, 3. sua natureza dinâmica (Bourdieu, 2010Bourdieu, P. (2010). O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil., 2009Bourdieu, P. (2009). O senso prático. Petrópolis: Vozes.).

Finalmente, o capital é conceitualizado por Bourdieu como principal forma de poder dentro de dado campo sendo, simultaneamente, instrumento e objeto de disputa. Bourdieu assume a existência de três tipos de capitais superando as abordagens anteriores que reduzem o mundo social à perspectiva econômica. Além disso, o autor propõe que as formas de capital podem ser conversíveis umas nas outras, pois, por exemplo, o capital cultural pode ser socialmente reconhecido em um determinado campo e assim ser transformado em capital simbólico e vice-versa (Tabela 1).

Tabela 1.
Capitais segundo a perspectiva de Bourdieu (2008)

O conceito de capital econômico em Bourdieu é semelhante à definição de Marx: Recursos associados a agentes de produção (terra) e a bens econômicos, tais como bens materiais. O capital cultural, por sua vez, corresponde ao conjunto de conhecimentos e qualificações intelectuais transmitidos pela família e pelas instituições escolares ao longo da vida da disciplina. Esse capital pode assumir três formas: 1. o estado incorporado, como característica duradoura do corpo (o modo de falar, habitus familiares); 2. o estado objetivo, como a posse de bens culturais (obras de arte); 3. o estado institucionalizado, como títulos acadêmicos (Bourdieu, 2010Bourdieu, P. (2010). O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil., 2009Bourdieu, P. (2009). O senso prático. Petrópolis: Vozes.).

Finalmente, o capital simbólico está relacionado ao acúmulo de prestígio e reconhecimento social por um indivíduo que preserva sob seu controle os recursos considerados essenciais em um determinado campo. Assim, ele pode ser considerado uma síntese do capital econômico e cultural que foi reconhecido como legítimo em um espaço social.

As diferenças dentro de um campo, especialmente em termos de capital, geram a divisão do espaço em classes sociais, ou melhor, posições de classe, que estão associadas a uma cultura ou habitus específico. Ao optar por um estilo de vida, os indivíduos acabam se classificando como membros de uma determinada classe social ou posição de classe.

3. MÉTODO

Com base nos objetivos e no quadro teórico delineado por meio da pesquisa empírica realizada, busca-se reconstruir a dinâmica de reconversão de funções econômicas vivenciada por Lafayette com vistas à sua inserção no circuito superior da economia da quarta revolução industrial (Susskind & Susskind, 2017Susskind, R., & Susskind, D. (2017). The future of the professions: How technology will transform the work of human experts. Glasgow: Oxford University Press.; Schwab, 2017Schwab, K. (2017) The fourth industrial revolution. New York: Hardcover. ; Santos, 1979Santos, M. (1979).The shared space: the two circuits of the urban economy in underdeveloped economies. London: Methuen.). Seguindo os discursos pós-industriais disseminados junto com outras cidades norte-americanas - e também brasileiras -, busca-se verificar de que forma características como virtualização, digitalização, horizontalização e descentralização das relações de produção e regulação, encontram-se presentes na dinâmica dos capitais - econômicos, sociais, culturais, simbólicos - mobilizadas pelos diferentes agentes que compõem o ecossistema empreendedor da cidade, bem como disputas e coalizões desenvolvidas com vistas a manter o status quo ou articular transformações (Bourdieu, 2010Bourdieu, P. (2010). O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil., 2009Bourdieu, P. (2009). O senso prático. Petrópolis: Vozes.).

Em Lafayette, o abandono do centro histórico como espaço de socialização, intercâmbio comercial e exercício do poder (Lefebvre, 1991Lefebvre, H. (1991). The production of the space. Oxford, UK: Blackwell Publishing.); o contínuo fechamento de lojas de departamento e shopping centers; a proliferação de compras pela internet; o crescimento da automação; a proliferação de empregos virtuais e de home-office; a expansão de grandes empresas nacionais com modelos de negócios baseados em plataformas e redes; a segregação da população em condomínios e bairros de baixo valor imobiliário são alguns dos sintomas facilmente observados tanto in loco como nos documentos, fotografias e citações de entrevistas registradas.

Como ponto de partida do estudo, foi realizada extensa análise da história do estado da Louisiana e, mais especificamente, da cidade de Lafayette e seus arredores (Martinez, 2017Martinez, M. (2017). Blackreole: Too white to be black, too black to be white. New Orleans: Torin-Miles Publishers. ; Allured & Martin, 2013Allured, J., & Martin, M. S. (2013). Louisiana legacies: Readings in the history of the pelican state. New Orleans: Wiley-Blackwell. ; Reed, 2009Reed, L-A. (2009). Transitional generations: African American workers, industrialization, and education in the northern Louisiana lumber and paper industries, 1930-1950. The Jornal of the Louisiana Historical Association, 50(1), 25-56. ; Gauthreaux, 2007Gauthreaux, A. G. (2007). Louisiana history. The Journal of the Louisiana Historical Association, 48(2), 133-155. ; Hyde Jr, 2007Hyde Jr., S. (2007). Feuding is our means of societal regulation: elusive stability in southeastern Louisiana’s piney woods. The Jornal of the Louisiana Historical Association, 48(2), 133-155. ; Bernard, 2003Bernard, S. K. (2003). The cajuns: Americanization of a people. Jackson: University Press of Mississippi.), acompanhada de entrevistas semiestruturadas e aprofundadas com entrevistados dedicados à história da cidade e/ou diretamente envolvidos no atual processo de reconversão experimentado em Lafayette.

Como resultado, além da observação direta - do tipo não participante - foram realizadas 20 entrevistas, resultando em mais de 30 horas de gravação de áudio. As entrevistas variaram em duração e estrutura, tornando-se mais seletivas à medida que o estudo avançava. Tipicamente, incluíam história pessoal e relacionamentos do entrevistado com a comunidade; descrições das principais mudanças experimentadas pela comunidade ao longo do tempo; história e estrutura de seus desenvolvimentos mais significativos.

Quanto ao tratamento e análise dos dados obtidos, em primeiro lugar, são utilizados dados de todas as fontes para desenvolver uma história detalhada da cidade e de sua trajetória econômica e social. Para isso, procuramos identificar e caracterizar as principais fases ou ciclos de evolução da comunidade, os principais agentes e forças sociais, econômicas e políticas em jogo durante cada fase. Também procuramos identificar com cada uma de nossas fontes seu papel na comunidade e exposição pessoal aos notáveis eventos sociais em relação ao processo atual de reconversão das funções econômicas da cidade.

Em seguida, a partir da estrutura teórica de Bourdieu, busca-se identificar as principais categorias cognitivas, tanto em relação às dinâmicas socioinstitucionais quanto às variações individuais, emergentes das entrevistas. Como resultado, é possível identificar temas e categorias utilizadas pelos membros da comunidade para descrever a comunidade e seus membros, bem como, posteriormente, compor a "tipologia" de seus empreendedores, a partir dos capitais econômicos, sociais e simbólicos por eles mobilizados (Bourdieu, 1998Bourdieu, M. (1998). Distinction: A social critique of the judgement of taste. Cambridge, MA: Harvard. ).

Com base em pares opostos de temas associados à dinâmica comunitária da cidade, repetidamente presentes nos relatos obtidos nas entrevistas e na análise da trajetória histórica da cidade é possível identificar diferentes grupos de empreendedores. A despeito da pequena dimensão da comunidade, nossas entrevistas indicaram que a cidade ainda experimenta intenso processo de transformação econômica e social, assim como que esse processo é marcado por fortes antíteses e contradiçõesas quais, entre outras coisas, restringem uma coordenação comum e ações coletivas de empreendedores como um grupo - ou "classe" - homogênea. Foram, assim, identificados os principais pares antitéticos que forjam e expressam tensões, distinções e contradições experimentadas na dinâmica atual de reconversão de suas funções econômicas: White Americans vs. Indians, White Americans vs.Cajuns, White Americans vs. Blackcreoles.

4. O CASO LAFAYETTE

4.1. Lafayette e arredores

A cidade e a paróquia de Lafayette compreendem uma mistura de culturas, em particular indígenas, africanas, inglesas, francesas e espanholas. Com uma população atual de cerca de 126.000 habitantes e situada no sudoeste do estado de Louisiana, Lafayette, até 1765, era uma região ocupada principalmente pelos índios Atakapa, com a presença de poucos europeus, principalmente caçadores e contrabandistas. No início do século XVIII, os colonos franceses fundaram um primeiro assentamento europeu na região (Petit Manchac), um posto comercial ao longo do rio Vermilion. Foi, entretanto, em meados do mesmo século que a região recebeu um fluxo significativo de imigrantes católicos de língua francesa (Cajuns), expulsos do Canadá (Acadie) após a vitória da Grã-Bretanha sobre a França na Guerra dos Sete Anos.

Em 1824, a região foi designada como a sede da Paróquia Lafayette. Durante esse período, suas terras foram convertidas por colonos europeus - franceses e britânicos - em grandes plantações de cana-de-açúcar, utilizando mão de obra escrava africana e indígena. De acordo com dados do censo americano, em 1830, a população escrava representava 41% da população. Em 1860, quase metade da população (49,6%) era formada por escravos. A população de Free Persons of Color representava 3,0% e 2,4% da população, respectivamente em 1830 e 1860. A economia da paróquia e da cidade permanecera baseada na agricultura até o século XX.

Nos anos 1930, porém, a mecanização da agricultura reduziu a necessidade de trabalhadores agrícolas e, nos anos 1940, a descoberta de petróleo e gás na paróquia mudou significativamente o perfil econômico da região, iniciando um novo ciclo econômico baseado na indústria de extração de petróleo e gás. Ao mesmo tempo, as duas grandes guerras mundiais trarão mudanças significativas na dinâmica socioeconômica da região, incluindo o movimento sistemático de "americanização" do povo Cajun e a segregação da população negra, limitando os poucos empregos agrícolas remanescentes ou o trabalho urbano pouco qualificado.

Após sua quase extinção nos anos 1990, favorecida pelas flutuações nos preços do petróleo e pelo movimento Yuppie, as culturas Cajun e Creole estão experimentando um renascimento e Lafayette se consolidando como sede do "Cajun Country" e importante centro da cultura Creole, uma mistura que atrai empresários e empreendedores, abrindo espaço para a diversificação de sua economia.

Seguindo as pegadas deixadas por estudos anteriores sobre o tema (Sant'Anna et al., 2016Sant'Anna, A. S. et al. (2016). Relações entre múltiplos agentes sociais em contextos de diversidade e inovação: Contribuições do espaço público. Brasília: CNPq., 2012Sant'Anna, A. S. et al. (2012). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades: um estudo do caso Sete Lagoas (MG). Belo Horizonte: FAPEMIG., 2011Sant'Anna, A. S. et al. (2011). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades: um estudo do caso Tiradentes (MG). Belo Horizonte: FAPEMIG .; Oliveira, Sant'Anna & Diniz, 2011Oliveira, F. B., Sant’Anna, A. S., & Diniz, D. M. (2011). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades com foco no turismo e na indústria criativa: Um estudo do caso Paraty (RJ). Rio de Janeiro: FAPERJ.) e o cruzamento de dados teóricos e empíricos obtidos em Lafayette, é possível delinear a dinâmica das redes de competição e colaboração ao longo de seus principais ciclos econômicos, assim como as diferentes capitais apoiadas e/ou legitimadas pelo habitus hegemônico, mobilizadas com vistas a dominar o campo das relações sociais e do poder local (Bourdieu, 1998Bourdieu, M. (1998). Distinction: A social critique of the judgement of taste. Cambridge, MA: Harvard. ). Como em todos os casos anteriores, em Lafayette, historicamente, os empreendedores - locais e externos - ocupam uma posição de destaque nos processos e dinâmicas de reconversão de suas funções econômicas. No caso de Lafayette, tal protagonismo é evidente, especialmente dada a ampla difusão, a partir da Segunda Guerra Mundial, do fortalecimento do habitus baseado em valores associados aos colonos brancos.

De todos os dados coletados pode-se destacar a possibilidade de retratar a história de Lafayette como uma arena de forças - como um "jogo" (Bourdieu, 1998Bourdieu, M. (1998). Distinction: A social critique of the judgement of taste. Cambridge, MA: Harvard. ) - em que diferentes habitus e capitais são mobilizados pelos diferentes agentes no palco, com o objetivo de alcançar fagentes distintivos que lhes permitam hegemonia no controle do campo de poder local. Em geral, os principais ciclos econômicos locais podem ser facilmente associados a complexas disputas e coalizões realizadas pelos diferentes "tipos" de empreendedores locais de hoje e do passado.

No caso de Lafayette, tais disputas e coalizões estão associadas a fortes componentes étnicos e de identidade envolvendo, ao longo de sua história, alianças e lutas intestinais, resultando em "grupos" vitoriosos e perdedores: White Americans (descendentes de colonos britânicos e franceses), Cajuns (descendentes de acadianos), Creoles (descendentes de colonos hispânicos, italianos e alemães, nascidos em solo norte-americano), Backcreoles (afro-descendentes), Free Persons of Color (descendentes de escravos e mestiços libertados), e American Indians (índios Atakapa), cujos habitus e capitais identificados estão resumidos na Tabela 2.

Tabela 2.
Habitus e principais capitais por grupos de agentes sociais

Vale reiterar que os dados apresentados na Tabela 2 resultam de análise de documentos relativos à história da Lafayette - incluindo seus ciclos econômicos; dinâmica social; empreendedores, heróis e líderes - consultados na biblioteca da Universidade da Louisiana em Lafayette, bem como relatórios do conjunto de entrevistas realizadas. Para o tratamento dos dados obtidos, foi utilizado o método de análise de conteúdo de acordo com os procedimentos definidos por Bardin (2011Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70.).

4.2. A dinâmica do ecossistema Acadiano

Conectando as noções propostas em torno da sociologia de Bourdieu com dados empíricos e produção bibliográfica envolvendo a história, economia, sociedade e cultura de Lafayette e da região (Martinez, 2017Martinez, M. (2017). Blackreole: Too white to be black, too black to be white. New Orleans: Torin-Miles Publishers. ; Allured & Martin, 2013Allured, J., & Martin, M. S. (2013). Louisiana legacies: Readings in the history of the pelican state. New Orleans: Wiley-Blackwell. ; Reed, 2009Reed, L-A. (2009). Transitional generations: African American workers, industrialization, and education in the northern Louisiana lumber and paper industries, 1930-1950. The Jornal of the Louisiana Historical Association, 50(1), 25-56. ; Gauthreaux, 2007Gauthreaux, A. G. (2007). Louisiana history. The Journal of the Louisiana Historical Association, 48(2), 133-155. ; Hyde Jr, 2007Hyde Jr., S. (2007). Feuding is our means of societal regulation: elusive stability in southeastern Louisiana’s piney woods. The Jornal of the Louisiana Historical Association, 48(2), 133-155. ; Bernard, 2003Bernard, S. K. (2003). The cajuns: Americanization of a people. Jackson: University Press of Mississippi.), é possível reconstituir os jogos e tensões subjacentes à dinâmica socioespacial ao longo de seus principais ciclos de desenvolvimento: o ciclo marcado pela agricultura, que se estende do século XVIII até meados do século XX; e o ciclo de desenvolvimento subsequente baseado na indústria de extração de petróleo e gás, a partir da década de 1940. A instabilidade dos preços internacionais das commodities e a busca de fontes limpas de energia acentuam, entretanto, a preocupação por uma maior diversificação da economia acadêmica e, dessa forma, o desenvolvimento de estratégias e habilidades necessárias para a inserção nas indústrias da quarta revolução industrial, tais como em pesquisa, ciência, tecnologia e inovação (PD&I), turismo e criatividade.

Como resultado, é possível identificar o capital econômico como o pivô da articulação e mobilização de outros capitais, seja por meio de seus detentores, seja dos excluídos. Não é por coincidência que as principais ações são desencadeadas pelos empreendedores.

Da mesma forma, pode-se novamente identificar semelhanças entre grupos de empreendedores observados em análise realizada por Sant'Anna e colaboradores em estudos de dinâmicas de reconversão de funções econômicas vivenciados por cidades brasileiras (Sant'Anna et al., 2016Sant'Anna, A. S. et al. (2016). Relações entre múltiplos agentes sociais em contextos de diversidade e inovação: Contribuições do espaço público. Brasília: CNPq., 2012Sant'Anna, A. S. et al. (2012). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades: um estudo do caso Sete Lagoas (MG). Belo Horizonte: FAPEMIG., 2011Sant'Anna, A. S. et al. (2011). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades: um estudo do caso Tiradentes (MG). Belo Horizonte: FAPEMIG .; Oliveira, Sant'Anna & Diniz, 2011Oliveira, F. B., Sant’Anna, A. S., & Diniz, D. M. (2011). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades com foco no turismo e na indústria criativa: Um estudo do caso Paraty (RJ). Rio de Janeiro: FAPERJ.).

Mais complexo, porém, é aprender que no caso da Lafayette, o conceito de empreendedorismo tem nuances particulares. Enquanto nas cidades brasileiras investigadas a noção de empreendedorismo é praticamente sobreposta à de empresário, no caso de Lafayette, ela adquire papel mais pessoal, mais centrado no modo de ser, no habitus, que forja seu modo de ser e de agir. Isso se reflete na própria caracterização atribuída por aqueles pesquisados em relação aos agentes sociais mais protagonistas no campo.

Não obstante, se no Brasil se tende a definir os "tipos" de empreendedores por suas características como empresário, em Lafayette, tal construção tende a se dar a partir de características dos grupos étnicos e sociais a que se ligam os indivíduos: europeus, afro-descendentes, latinos, cajuns e assim por diante. É provável, dada a proximidade entre noções de habitus e cultura, que enquanto nos Estados Unidos o empreendedorismo seja algo intrínseco ao habitus que forja sua cultura - assim como o individualismo e o patriotismo -, no caso brasileiro, o empreendedorismo, na medida em que está associado ao risco e à possibilidade de fracasso, está menos associado a um atributo individual valioso que à sobrevivência e à morte do empreendimento (Stinchfield, Nelson & Wood, 2010Stinchfield, B. T., Nelson, R. E., & Wood, M. (2010). Entrepreneurial opportunities: bricolage, art, craft, engineering, and brokerage. In: Babson Entrepreneurship Research Conference Proceedings… Lausanne, Swiss: Babson College. ; Stinchfield, 2009Stinchfield, B. (2009). Toward a theory of entrepreneurial work. [Doctoral dissertation]. Southern Illinois University. , Levi-Strauss, 1962Levi-Strauss, C. (1962). Wild Thought. Paris: Plon. ). No Brasil, não raro, registra-se a associação entre o fracasso de um empreendimento e a pessoa do empreendedor, o que acaba por desencorajar novas tentativas, além de lhe imprimir estigmas de"quebrado" ou "falido" (Nelson et al., 2016Nelson, R. E., Sant'Anna, A. S., & Wood, M. S. (2016). Sociocultural context, entrepreneurial types, entrepreneurial action, and community dynamics in Tiradentes, Brazil. In A. C. Corbett & Katz J. A. (Eds.), Advances in entrepreneurship, firm emergence, and growth: Models of start-ups thinking and adcton (V. 18, pp. 33-74). Bingley, UK: Emerald Publishing.).

Finalmente, em vez de agrupar os capitais do ecossistema investigado em categorias, como recomendado por Bourdieu, ou mesmo identificar seus principais agentes - no caso de empreendedores locais - em tipologias de empreendedores, o mais relevante parece entender as formas pelas quais os diferentes habitus que os constituem - e sua tradução em capitais - são mobilizados ao longo do tempo; bem como de que forma se articulam agências e institucionalidades, com vistas ao domínio do campo empreendedor, produzindo alianças e disputas, que forjam e caracterizam o ecossistema Lafayette, com ênfase nas relações entre White Americans e American Indians, White Americanse Cajuns, assim como White Americanse Blackcreoles.

Usando dados da historiografia revisada, assim como relatórios de entrevistas, a primeira grande disputa no campo das relações econômicas no contexto dos Lafayette e da região é travada entre os primeiros colonos e índios nativos (Atakapa). Isto, recorrendo-se a práticas como a troca, por meio do comércio de couros e produtos naturais, assim como de coação para a expulsão de "estrangeiros", incluindo a disputa pela terra e o controle do território, a fim de possibilitar a disseminação de grandes plantações de cana-de-açúcar. Portanto, narrativas, recursos, legislação, aparato institucional e militar são decisivos para os resultados retratados nos atuais compêndios e artigos dos historiadores.

Nesse contexto, o capital econômico (moeda, armas, fortificações), associado ao capital social (igreja, sistema colonial), cultural (treinamento militar, treinamento agrícola) e simbólico ("making America", "spreading the Christian faith", "civilizing the new world"), será incessantemente aplicado, resultando praticamente na eliminação do elemento indígena da arena de disputa, com implicações para esses povos, ainda hoje presentes.

Na virada do século XX, a população indígena sobrevivente dos Estados Unidos se encontrava isolada e confinada a reservas. Além da morte de milhares de seus ancestrais em guerras ou como vítimas de doenças transmitidas por estrangeiros, há processos deliberados que visam isolar e apagar sua cultura. No caso da Louisiana, embora a presença de sessenta e uma tribos indígenas, a interação com colonos brancos, se diária, está sob a marca da "invisibilidade", como cidadãos não americanos. Uma exceção é feita aos períodos de carnaval ou Mardi Gras Indígenas, onde estereótipos e (re-)significados de fragmentos de sua cultura são apropriados pelo mercado de consumo de massa.

O resultado de tudo isso é que o habitus do colonizador anglo-saxão se imporá,fortalecido pelas "vitórias" nas batalhas contra os povos indígenas e igualmente demarcando uma posição de supremacia - econômica, militar, cultural, social e simbólica - perante os outros grupos étnicos presentes na região - incluindo os recém-chegados, entre eles alemães e italianos, sendo estes últimos, por traços alegadamente latinos, incluindo a cor da pele. A esses se somam os American Indians escravizados, os Creolos (descendentes de espanhóis e filhos de migrantes nascidos na Louisiana), o crescente contingente de Blackcreoles submetidos ao sistema de escravidão, o mestre melaço do sistema latifundiário e os Free Persons of Color (incluindo os mulatos, escravos libertados, em sua maioria resultado de relações legalmente proibidas entre Blackcreoles ou Person Free of Colar e White Americans). A essa complexidade de "tipos" e "instâncias" étnicas será acrescentado um grupo de exilados católicos de língua francesa: os Cajuns.

4.2.1. White Americans vs Cajuns

A história dos Cajuns em Lafayette remonta à região da Acadia no Canadá, colonizada no século XVII por católicos franceses. Desprezados pela metrópole francesa e tendo seu território incorporado ao império britânico, os acádios - católicos de língua francesa, agricultores, pescadores, caçadores, essencialmente um povo camponês cujos antepassados tinham vindo à província para colonizar a "Acadie", hoje Nova Escócia (Canadá), já em 1604. Povo independente e autossuficiente, os acadenses buscavam sua autossubsistência desenvolvendo padrões particulares de vida sem impedimentos por parte dos funcionários coloniais franceses.

Em 1713, porém, com sua incorporação ao império britânico, os acádios recusaram o juramento incondicional de lealdade ao novo rei, enfatizando a posição de cidadãos remanescentes de um território neutro. A posição adotada acabou contribuindo, em 1755, para sua expulsão, no caso chamado Grand Dérangement.

De forma ditatorial, a grande maioria da população acádia francesa, cerca de dez mil pessoas, é levada a navios que aguardam sua deportação, com pouca ou nenhuma notificação. Embarcados e dispersos pelas colônias americanas da Nova Inglaterra, França e Caribe entre aquele ano e 1763, os acádios são separados de suas famílias e submetidos a condições desumanas tanto em navios de deportação como em suas terras de exílio. Eles geralmente encontram hostilidade e desprezo, sentindo o medo e o ódio dos anglo-americanos pelos católicos francófonos. Deve-se notar que o Grand Dérangement coincidirá com os estágios iniciais da guerra sangrenta entre a Inglaterra e a França, travada em parte do deserto da América colonial britânica. Como resultado, os exilados acádios estão comumente sujeitos à discriminação e à pobreza, senão mesmo à miséria.

A experiência do banimento, entretanto, teve um efeito poderoso sobre os exilados acádios: serviu para uni-los onde quer que eles estivessem. Afinal de contas, mesmo os exilados dispersos geograficamente muitas vezes compartilharam um passado comum e uma provação histórica coletiva. Eles também compartilhavam laços de parentesco, uma língua, religião, costumes e uma herança popular. Em suma, um hábito particularmente consolidado.

Por volta de 1765, um grupo desses acádios, ouvindo falar de uma terra onde se falava francês, viajou para a Louisiana, passando por Saint Domingue, hoje Haiti, para construir uma nova Acadia. Estabelecendo-se na região, pouco a pouco, outros acádios se unem ao grupo. Misturando com outros grupos étnicos vizinhos - crioulos franceses, espanhóis, americanos de origem anglo-saxônica, africanos e caribenhos, alemães e italianos - o grupo incorpora gradualmente influências de outras tradições culturais, constituindo, no final do século XIX, um grupo étnico de caráter híbrido, no entanto marcado pelo hábito dos primeiros acádios, de origem francesa e católicos, que desembarcaram na Luisiana.

Na virada do século XX, um intenso movimento promovido pelos brancos americanos de "americanização" afetará significativamente a cultura Cajun (Bernard, 2003Bernard, S. K. (2003). The cajuns: Americanization of a people. Jackson: University Press of Mississippi.). Em 1921, o ensino do francês é proibido nas escolas públicas do estado. As duas guerras mundiais, acompanhadas pela descoberta de petróleo na região, intensificam a campanha de americanização dos descendentes de Cajun. Incapazes de resistir à ofensiva da corrente anglo-saxônica americana, eles perderam gradualmente a língua e o patrimônio cultural de origem francesa.

No final dos anos 1960, no entanto, com a disseminação dos movimentos éticos e de direitos civis, houve um renascimento local do interesse pela cultura Cajun, com a crescente conscientização entre os descendentes dos acádios sobre as ameaças reais às suas origens culturais.

O interesse pela língua francesa, o resgate da música e da culinária são acompanhados pelo crescente interesse acadêmico pela história e cultura Cajun, assim como os esforços de preservação cultural. Graças aos esforços promovidos por professores e pesquisadores da Universidade da Louisiana em Lafayette, a mobilização de grupos comunitários, artistas, poetas, músicos, bem como a inserção em instituições como o Conselho para o Desenvolvimento do Francês na Louisiana - CODIFF, a atenção está agora sendo dada às singularidades da cultura e especialmente aos mitos e eventos que envolvem a expulsão de seus ancestrais acadêmicos.

Apropriando-se das narrativas de Cajun, os acádios conseguem que sua cultura não seja totalmente absorvida pelo mainstream anglo-saxão americano. Em vez disso, eles fortalecem seus laços com o Canadá francófono através de intercâmbios acadêmicos e do estabelecimento do Congresso Mundial Acadiano, realizado pela primeira vez em 1994. Ao mesmo tempo, um boom de poetas, escritores, músicos, estudiosos e contadores de histórias de Cajun testemunhou a vitalidade de sua cultura (Köstler, 2014Köstler, M. (2014) Migrating literature: Zachary Richard’s cajun tales. European Journal of American Studies, 9(3), 1-17. ).

Esse movimento também será salutar diante da superação dos preconceitos associados à população Cajun, explicados de forma mais ampla em períodos históricos como a Guerra de Secessão e as duas grandes guerras mundiais, particularmente a segunda: as dificuldades com a língua inglesa.

No contexto contemporâneo, a renascença da cultura Cajun tende a ser um capital fundamental para enfrentar as transformações que caracterizam a economia global e seus impactos sobre a Lafayette. A transição para a economia digital já deixa efeitos, incluindo a exclusão de um forte contingente de profissionais do mercado de trabalho formal por meio da automação, bem como a introdução de novos comportamentos de consumo, incluindo as compras on-line, o que tem repercussões no fechamento de shopping centers, grandes redes de varejo e lojas de departamento. Além disso, o impacto de sua alta dependência da indústria de petróleo e gás, altamente sujeita às flutuações de preços internacionais. Os efeitos das crises financeiras, como a de 2008, ainda são visíveis no número de empregos eliminados, na evasão estudantil - particularmente entre o Blackcreoles.

Como resultado, o capital social e simbólico associado ao habitusCajun parece constituir uma importante moeda de troca diante dos desafios da transição para um novo padrão de produção associado com a "quarta revolução industrial". O sentido comunitário, a capacidade de constituição e inserção em redes de relações, o patrimônio cultural, ligado à música, à gastronomia e ao "estilo de vida acádio" dá ao grupo potencial de diferenciação em setores importantes da nova economia, como o turismo, o design, as artes, a criação gráfica e outros ramos da indústria criativa. Os setores de inovação, tecnologia da informação e entretenimento são acrescentados a esses, incluindo os segmentos de eventos, programação de jogos e produção de conteúdo.

Com base na análise de conteúdo executada, a Tabela 3 resume os principais significantes associados aos empreendedores White American e Cajuns de Lafayette, permitindo diferenciá-los na disputa pelo domínio do campo empreendedor da cidade (Bourdieu, 2010Bourdieu, P. (2010). O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil., 2009Bourdieu, P. (2009). O senso prático. Petrópolis: Vozes.).

Tabela 3.
White Americans vs. Cajuns: Resultados de Análise de Conteúdo

O desafio, no entanto, como apontado por autores como Bernard (2003Bernard, S. K. (2003). The cajuns: Americanization of a people. Jackson: University Press of Mississippi.), será não permitir a comoditização de seu capital simbólico. Em outros termos, a massificação e o barateamento de seu patrimônio: a "McDonaldização" (como pode ser visto na expansão de grandes cadeias de fast-food, como o Popeye) e a difusão de sua cozinha étnica em sessões de alimentos congelados de mega supermercados virtuais; massificação da marca Cajun; imitações e descaracterizações de produtos, incluindo a produção musical. A natureza dessas ameaças também é evidente nas cenas culturais, acadêmicas e intelectuais da Lafayette na época do boomCajun nos anos 1980-1990, com repercussões, por exemplo, em campanhas de valorização da marca Cajun, bem como na criação de institucionalidades, como o selo de "Certificação de Produto Cajun".

4.2.2. White Americans vs Blackcreoles

Outra arena em que o habitus e a mobilização de capitais ganham importância ao longo da dinâmica social em que Lafayette está inserida diz respeito às políticas e iniciativas de segregação da população negra. As marcas de um passado de escravidão, exclusão, desreferenciamento familiar e humilhações parecem continuamente (re)significadas, mas ainda longe de serem superadas. Os significantes comumente apresentados para caracterizá-los por si mesmos denotam, não obstante os avanços e realizações, a mobilização, de um lado e de outro, dos dispositivos que historicamente mantêm a assimetria de forças e o "privilégio branco" (Rankine, 2019Rankine, C. (2019). Whiteness. Saw, 33(1), 74-95. ).

Corroborando essa perspectiva, resultados da análise do conteúdo de documentos e relatos de entrevistas realizadas trazem à tona a referência a termos e expressões que ainda hoje, explícita ou sub-repticiamente, apontam para preconceitos que transversalizam disposições e estratégias de exclusão de certos agentes da disputa pelo domínio do campo empresarial, favorecendo a manutenção do status quo, por meio da desqualificação e/ou estereotipagem de rivais reais ou potenciais, bem como desvendam possibilidades de transformação, por meio de ações de resistência e/ou confronto. No caso das relações entre White Americans vs. Blackcreoles, consciente ou inconscientemente, emergem marcas de conflito, evidenciadas a partir de análise de conteúdo realizada (Tabela 4).

Tabela 4.
White Americans vs. Blackcreoles: Resultados de Análise de Conteúdo

A literatura revisada é pródiga em apontar mecanismos historicamente criados no contexto macro em que Lafayette está localizada, com implicações críticas para a população negra, praticamente excluindo-a do tabuleiro de jogo: Código Noir (1724); Atos de Abril (1770); Lei estadual exige que os negros livres demonstrem deferência em seu tratamento aos brancos (1806); proibição de uniões inter-raciais (1825); proibição de negros livres de ocuparem cargos públicos ou se reunirem em assembleia sob qualquer pretexto (1834); Emenda à Constituição da Louisiana afirma que "[....] o legislativo nunca deve aprovar qualquer ato autorizando negros livres a votar ou imigrar para o estado sob qualquer pretexto" (1864); criação do sistema de segregação racial nas escolas públicas (1864); retirada das tropas federais do estado, pondo fim ao período pós-guerra civil conhecido como o "Black Renaissance" e a ascensão dos grupos de ódio: KKK e de privação do direito de voto para pessoas de cor (1906).

Sem dúvida, medidas como essas não são recebidas de forma passiva. Pelo contrário, elas implicam reações, lutas, derrotas e conquistas. Nessa luta, os capitais sociais e simbólico são construídos pela população negra a fim de enfrentar os processos de dominação. Entretanto, a assimetria de forças presente nesse histórico "teatro de operações", no qual o capital econômico e cultural (por exemplo, educação de qualidade e formação acadêmica) é praticamente inexistente, não pode ser desconsiderada. Todavia, como resultado das mobilizações, sejam elas lideradas por grupos afrodescendentes, líderes religiosos e políticos, associações, ativistas sociais ou representantes da contracultura, tais leis são, uma a uma, suprimidas, e o século XX verá, particularmente a partir dos anos 1960, forte movimento de lutas por uma maior igualdade de direitos e oportunidades.

O fim da segregação nas escolas, a inserção de jovens negros nas melhores universidades, a maior inserção no cenário político - tendo, em 2009, a eleição do primeiro presidente afrodescedente do país -, a expansão das agendas em torno da diversidade são conquistas notáveis. No entanto, não representam a superação da questão. Séculos de dominação, segregação, limitação às possibilidades e recursos de mobilidade social e econômica deixam feridas profundas, de lenta cicatrização.

Além disso, em um mundo cada vez mais interligado, fenômenos como o atual surto de ondas de conservadorismo, a escalada do discurso do ódio, o fortalecimento dos partidos e grupos de ultradireita, a desconstrução das instituições democráticas, a concentração da riqueza e a expansão das desigualdades econômicas, a insustentabilidade de modelos econômicos focados no consumo, o esgotamento de experiências neoliberais, as mudanças demográficas e geopolíticas, como o recrudescimento das disputas comerciais entre os EUA e a China, configuram cenário de incertezas, no qual velhos e novos capitais começam a se arregimentar para “novos” jogos.

Ao legado, construído sobre dispositivos e institucionalidades que limitaram afrodescendentes e outras minorias, o acesso à educação de qualidade e, portanto, a oportunidades de empregos mais qualificados e bem remunerados; a construção de barreiras visíveis e invisíveis à requalificação e ao avanço profissional; a alienação dos círculos de decisão e poder; a erosão da autoestima podem, diante das mudanças em curso no ambiente, adquirir novas roupagens e ainda mais perversas.

O ritmo dos avanços tecnológicos, o domínio da tecnociência, os modelos empresariais e arquiteturas organizacionais emergentes, as mudanças nas noções de trabalho, carreira e habilidades necessárias para inserção nas bandejas reconfiguradas de interesses, criam barreiras renovadas à entrada, beneficiando jogadores já conhecidos, ao invés de outros. As descobertas da Lafayette provavelmente sinalizam dispositivos já em operação, que através de estratégias de exclusão digital, "Uberização" do trabalho, barreiras de acesso aos "centros de inovação", interseccionalidade do capital desfavorável à competitividade, por exemplo, sendo simultaneamente negros, mulheres, homossexuais e pouco qualificados.

Outra constatação é que a competição no contexto de Lafayette, em comparação com as cidades brasileiras anteriormente estudadas, é dissociada da díade Capital-Trabalho (K-T), no sentido que lhe foi atribuído ao longo das revoluções industriais anteriores. Assim, na medida em que todos são convertidos em Capital, ou melhor, em Empreendedores, inclusive de suas próprias carreiras - a competição pode liquefazer-se, configurando-se em competição de todos contra todos, parecendo assim enfraquecer valores intrinsecamente mais comunitários e altruístas. As alianças e coalizões entre grupos parecem assim tender a ser mais fracas, mais fluidas e focadas em ganhos individuais e de curto prazo. Ao mesmo tempo, os contratos podem sinalizar mais opções cooperativas, centradas em causas coletivas e comunitárias, com menos foco no consumismo e mais atenção às relações sociais e interpessoais. O desafio, em qualquer caso, será sobre como fazer a transição, considerando, por exemplo, a construção de novos e ou a resignificação do capital antigo. Em cidades como Lafayette, a própria configuração espacial, baseada na dispersão geográfica, pode constituir um desafio adicional para, como sugere Jacobs (2011Jacobs, J. (2011) The death and life of great American cities. New York: Vintage. ), impor restrições a sua vitalidade. De todo modo, os dados estão lançados.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Embora o crescente interesse dos pesquisadores pelas contribuições da Teoria da Ação Prática de Bourdieu em relação aos estudos em torno da noção de agência, uma das principais lacunas deixadas por esse autor, como explicou Alain Touraine, foi seu foco no estudo da dinâmica inerente à sociedade industrial, ignorando os processos de transição e coexistência de uma sociedade pós-industrial, com características peculiares, tanto na abordagem de conflitos como de agentes.

Nessa direção, os resultados obtidos em Lafayette contribuem com elementos importantes para superar tal lacuna, indicando as potencialidades da sociologia de Bourdieu no estudo não apenas nos processos de reconversão promovidos pelas indústrias turísticas e criativas (Sant'Anna et al., 2011Sant'Anna, A. S. et al. (2011). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades: um estudo do caso Tiradentes (MG). Belo Horizonte: FAPEMIG .; Oliveira, Sant'Anna & Diniz, 2011Oliveira, F. B., Sant’Anna, A. S., & Diniz, D. M. (2011). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades com foco no turismo e na indústria criativa: Um estudo do caso Paraty (RJ). Rio de Janeiro: FAPERJ.) ou pelos processos de industrialização tardia (Sant'Anna et al., 2012Sant'Anna, A. S. et al. (2012). Liderança e reconversão de funções econômicas de cidades: um estudo do caso Sete Lagoas (MG). Belo Horizonte: FAPEMIG.), mas também nas transições para indústrias baseadas na tecnologia digital, como em Lafayette.

Os resultados obtidos na Lafayette também corroboram a relevância da aplicação da Teoria da Ação Prática de Bourdieu como um dispositivo para apreender dinâmicas de requalificação de funções econômicas envolvendo diferentes espacialidades, realidades socioeconômicas, políticas e culturais. Da mesma forma, aponta para sua robustez e aplicabilidade em análises, construção de cenários, intervenções e desenvolvimento de políticas públicas destinadas a fomentar o empreendedorismo em contextos de mudanças macroeconômicas e/ou perturbações tecnológicas, permitindo modelar como diferentes capitais - social, econômico, cultural, simbólico - podem ser mobilizados por diferentes grupos empresariais permitindo formas inovadoras de sinergia e cooperação, mitigando conflitos e antecipando crises.

Nesse sentido, os resultados obtidos em Lafayette chamam atenção para a forma como a relação entre habitus e capital permite, em contextos específicos (campo e momento histórico), estratégias e dispositivos que são aplicados, resultando em práticas de obtenção de distinção entre os principais agentes historicamente envolvidos (White Americans, American Indians, Blackcreoles, Cajuns). Em outros termos, as formas pelas quais o hábito pode forjar capital, que quando transacionadas, são capazes de (re)produzir práticas que asseguram o domínio de um determinado campo. Isso é consistente com a formulação de Bourdieu (1998Bourdieu, M. (1998). Distinction: A social critique of the judgement of taste. Cambridge, MA: Harvard. ): [(Habitus) (Capital)] + Campo = Prática.

Mudando as posições dos termos da equação, é necessário: [(Habitus)(Capital)] = [Prática - Campo], ou isso: Habitus = [(Prática - Campo)]/Capital. Nessa configuração, o Capital é inversamente proporcional ao Habitus. Ou seja, quanto maior o volume de Capital, menor o papel do Habitus e vice-versa. Como resultado, determinado agente, visando à conquista/manutenção do domínio de dado campo, em um específico momento histórico, pode vislumbrar na manipulação do Capital importante componente estratégico, particularmente considerando a dificuldade em modificar a estrutura do Habitus:

[(Habitus) (Capital)] + Campo = Prática

(Habitus) (Capital) = Prática - Campo

Habitus = [Prática - Campo]

Capital

Ainda com base na formulação proposta por Bourdieu (1998Bourdieu, M. (1998). Distinction: A social critique of the judgement of taste. Cambridge, MA: Harvard. ), assumindo [(Habitus)(Capital)] = Agência, tem-se Agência = [Prática - Campo]. Isso posto e considerando o Campo como uma constante (na medida em que é compartilhado por todos os agentes no mesmo contexto), pode-se sugerir uma relação direta entre a Prática e a Agência:

Considerando:

Agência = [(Habitus) (Capital)]

Campo = Contexto

Prática = Jogo

Tem-se:

[(Habitus) (Capital)] + Campo = Prática

Agência + Campo = Prática

Agência = Prática - Campo

Como resultado,

Agência = Prática - Campo

Agência = Jogo - Contexto

Jogo = Agência + Contexto

No caso de Lafayette, as relações entre White Americans e Blackcreoles ou White Americans e Cajuns, no rescaldo da grande guerra, são ilustrações de como as transações entre Capital (Agência) se relacionam com a construção de dispositivos políticos, institucionais, legais (Prática, Jogo) que favorecem o domínio do Campo (Contexto).

As relações entre White Americanse Blackcreoles, igualmente, evidenciam, ao longo da história, formas pelas quais a gestão de dispositivos político-institucionais (por exemplo, exclusão do direito de voto, ao final do período que ficou conhecido como “Black Renaissance”) e institucionais (controle do orçamento para o sistema educacional), implicou a exclusão dos Blackcreoles das oportunidades de emprego presentes e futuras e, consequentemente, de ascensão social, mantendo-os limitados ao universo de trabalhos agrícolas e de baixa qualificação. Como resultado, praticamente excluí-los do jogo sob a dinâmica da indústria extrativa de petróleo e gás.

Aplicando a fórmula ao processo contemporâneo de reconfiguração das funções econômicas de Lafayette na direção da economia digital, é possível valorizar o habitus do grupo Cajun, atribuindo-lhe vantagens competitivas, as quais podem ser obtidas por meio da transação de capitais sociais e simbólicos, da obtenção de diferenciais competitivos, de redes de relações pessoais e de integração empresarial. Ou ainda, de seu potencial para mobilizar desses mesmos capitais na institucionalização de parcerias e alianças capazes de mobilizar elementos-chave de seus habitus, como a indústria cultural, criativa, de entretenimento e do turismo, assim como de design e de conteúdo para a era digital.

Em todo caso, as descobertas contribuem para superar críticas de que a sociologia de Bourdieu é demasiado estatística, a-histórica e não explica sobre como o habitus concede liberdade aos agentes, apontando-a, portanto, como determinista, por desconsiderar a autonomia dos agentes sociais. Críticas, que não parecem ser sustentadas, pelo menos no caso estudado.

Finalmente, devemos destacar as contribuições de nossa incursão em Lafayette para as leituras de Levi-Strauss (1962Levi-Strauss, C. (1962). Wild Thought. Paris: Plon. ) lideradas por autores como Stinchfield, Nelson, Wood (2010Stinchfield, B. T., Nelson, R. E., & Wood, M. (2010). Entrepreneurial opportunities: bricolage, art, craft, engineering, and brokerage. In: Babson Entrepreneurship Research Conference Proceedings… Lausanne, Swiss: Babson College. ), sugerindo outro tipo de atuação empreendedora a ser agregada aos tipos artista, engenheiro e artesão: o bricoleur. As descobertas anteriores de Sant'Anna e colaboradores no Brasil já corroboram o Bricoleur como um tipo ativo em suas respectivas dinâmicas de reconversão das funções econômicas em direção ao turismo e à indústria criativa (Nelson et al., 2016Nelson, R. E., Sant'Anna, A. S., & Wood, M. S. (2016). Sociocultural context, entrepreneurial types, entrepreneurial action, and community dynamics in Tiradentes, Brazil. In A. C. Corbett & Katz J. A. (Eds.), Advances in entrepreneurship, firm emergence, and growth: Models of start-ups thinking and adcton (V. 18, pp. 33-74). Bingley, UK: Emerald Publishing.). Por outro lado, em Lafayette, cidade de forte tradição industrial, esse perfil não é muito pronunciado. Assim, se o núcleo das teses defendidas por autores como Stinchfield, Nelson e Wood (2010Stinchfield, B. T., Nelson, R. E., & Wood, M. (2010). Entrepreneurial opportunities: bricolage, art, craft, engineering, and brokerage. In: Babson Entrepreneurship Research Conference Proceedings… Lausanne, Swiss: Babson College. ) e Stinchfield (2009) estiverem corretas, o fortalecimento da dimensão bricoleur dos Cajuns pode constituir singular fator de diferenciação competitiva na transição das funções econômicas em curso em Lafayette, (re)definindo, quem sabe, os "novos" vencedores e perdedores.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Mar 2022
  • Data do Fascículo
    Mar-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    12 Ago 2020
  • Revisado
    07 Abr 2021
  • Aceito
    09 Ago 2021
  • Publicado
    23 Fev 2022
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