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Conversas e ‘vozes’ nas narrativas de crianças de 5 a 8 anos falantes de francês

RESUMO

De acordo com Bakhtin, o dialogismo polifônico, um princípio geral para que haja um avanço de conhecimento, é bem representado no romance literário e mais comumente em narrativas, nas quais diferentes “vozes” podem ser expressas. Assim, neste artigo analisamos narrativas baseadas em imagens e construídas por trinta crianças, entre 5 e 8 anos de idade, falantes de francês, narrativas essas produzidas antes e depois de uma conversa sobre as causas dos eventos. As análises tiveram como foco a habilidade das crianças de fazer diferentes vozes serem ouvidas, particularmente as vozes dos personagens, as quais as crianças fizeram ser ouvidas não apenas por meio do discurso direto e indireto, mas também por meio de expressões dos seus estados interiores, como crenças, intenções e sentimentos. Os resultados mostram tanto um desenvolvimento da habilidade das crianças de fazer com que essas vozes sejam ouvidas em suas narrativas, quanto um papel facilitador da troca conversacional em suas expressões. Argumentamos que esses resultados dão suporte para se considerar o lugar central que o diálogo ocupa no panorama geral da abordagem bakhtiniana.

PALAVRAS-CHAVE:
Narrativas orais; Vozes; Aquisição; Dialogismo; Conversa

ABSTRACT

According to Bakhtin, polyphonic dialogism, a general principle for advancing knowledge, is well instantiated in the literary novel, and more generally in narratives, where different ‘voices’ can find expression. Accordingly, in this paper we analyzed picture-based narratives constructed by thirty 5-to-8-year-old French-speaking children, produced before and after a conversation on the causes of the events. The analysis focused on children’s ability to make different voices heard, particularly the voices of the characters which children made heard not only through direct or reported discourse forms, but also through the expression of their inner states such as beliefs, intentions and feelings. Results show a development in children’s ability to make these voices heard in their narratives, as well as a facilitating role of the conversational exchange on their expression. It will be argued that these results provide support to the central place that dialogue occupies in the overall Bakhtinian approach.

KEYWORDS:
Oral narratives; Voices; Acquisition; Dialogism; Conversation

Introdução

De acordo com Bakhtin (1997 [1979]1 1 BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In: BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. Tradução de Maria Ermantina Galvão Gomes Pereira. São Paulo: Martins Fontes, 1997. p.277-326. [1979] ), os gêneros do discurso são aprendidos ao mesmo tempo que as formas lexicais e estruturais da língua, por meio de interações dialógicas do dia a dia entre o sujeito e os outros. Para Bakhtin, o significado das formas da língua, das palavras e frases, é moldado por meio de suas diversas ocorrências nos diálogos com os outros, ou mesmo em diálogos internos de um sujeito (BAKHTIN, 1998 [1934-1935]2 2 BAKHTIN, M. O discurso no romance. [1934-1935]. In: BAKHTIN, M. Questões de literatura e de estética: a teoria do romance. Tradução Autora Bernadini et al. 4. ed. São Paulo: Unesp/Hucitec,1998. p.71-210. ). Diálogos, particularmente aqueles que trazem diferentes pontos de vista, são fundamentais para o avanço da compreensão e do conhecimento, assim como para alcançar as características especificamente humanas da consciência de si. Esse princípio geral é consistente com as abordagens interacionais e funcionalistas de aquisição da linguagem, que mostram os efeitos benéficos do funcionamento conversacional na aquisição de diferentes aspectos do conhecimento e uso linguístico (CLARK, 2018CLARK, E. V. Conversation and Language Acquisition: A Pragmatic Approach. Language Learning and Development, n.14, pp.170-185, 2018.; SALAZAR ORVIG, 2017SALAZAR ORVIG, A. Dialogue et interaction au cœur de la réflexion sur l'acquisition du langage. Travaux Neuchâtelois de Linguistique, n. 66, p.5-27, 2017.; VENEZIANO, 2000VENEZIANO, E. Interaction, conversation et acquisition du langage dans les trois premières années. In: FAYOL, M.; KAIL, M. (Eds.). L'acquisition du langage. Vol. I. Paris: Presses Universitaires de France, 2000. p.231-265. ).

Outro ponto central da abordagem bakhtiniana3 3 Há uma controvérsia em andamento em relação à autoria de algumas noções atribuídas a Bakhtin, controvérsia que não é de nosso interesse aqui, mas veja Zenkine (2011) para um tratamento profundo e bem informado sobre o assunto. Nota das Editoras brasileiras: Sobre o mesmo tema, o número 9 (especial), 2014, de Bakhtiniana, em https://revistas.pucsp.br/index.php/bakhtiniana/issue/view/1255/showToc foi mostrar que diferentes gêneros do discurso podem coexistir dentro de um mesmo texto, e o romance literário foi tomado como um objeto particular para esse estudo (BAKHTIN, 1997 [1979]4 4 Para referência, ver nota de rodapé 2. ). Dentro desta abordagem, o romance é um gênero do discurso complexo, no qual vários tipos de discursos, e até mesmo de línguas, estão imbricados e no qual diferentes vozes - do autor, do narrador e dos personagens - encontram expressão dentro de um diálogo dinâmico e não finalizado, a saber, o diálogo em que cada intervenção é vista como uma reação a uma intervenção prévia e é projetada para uma reação subsequente, sem que seja possível encontrar uma palavra inicial ou final. Esta noção de dialogismo envolve todos os aspectos do conhecimento, incluindo a língua, a arte e o próprio processo de aprendizagem.

As diferentes ‘vozes’ que são ouvidas no romance e, mais geralmente, nas narrativas, criam diálogos polifônicos. De acordo com Bakhtin (1997 [1979]5 5 Para referência, ver nota de rodapé 2. ), o discurso indireto ou reportado pode ocorrer em conversas do dia a dia e, portanto, é considerado um gênero de primeira ordem, ou um tipo simples de discurso. Entretanto, ele se torna um gênero de segunda ordem, um tipo de discurso mais complexo, quando inserido em um novo domínio de trocas, tal como o romance ou a narração. O mesmo ocorre com o discurso direto e com a expressão de pensamentos e sentimentos. Quando estes são expressos pelo falante na conversa do dia a dia para transmitir seus próprios sentimentos, crenças e pensamentos, eles são um gênero de primeira ordem, um tipo simples de discurso. Entretanto, quando sentimentos, intenções e pensamentos são expressos para fazer com que as vozes dos personagens sejam ouvidas, estes são considerados de segunda ordem, tipos mais complexos de discurso. Na verdade, nestes casos, o falante/narrador não apenas atribui esses sentimentos e pensamentos aos outros, mas também essas vozes se tornam parte integral do enredo geral da história que eles contribuem para criar.

A complexidade de se articular este tipo de discurso nos romances literários é alta. Apesar de o fazerem em um nível bem menor de sofisticação, as crianças que são levadas a narrar uma história baseada em uma sequência de ilustrações - uma situação de elicitação amplamente utilizada para traçar e entender melhor o desenvolvimento das competências narrativas da criança (BERMAN; SLOBIN, 1994BERMAN, R. A.; SLOBIN, D. I. Relating Events in Narrative: A Crosslinguistic Developmental Study. Hillsdale, NJ: Lawrence Erlbaum, 1994.; STRÖMQVIST; VERHOEVEN, 2004STRÖMQVIST, S.; VERHOEVEN, L. T. Relating Events in Narrative: Typological and Contextual Perspectives. Mahwah, NJ: Lawrence Erlbaum, 2004. , para estudos que utilizam a História do sapo como base ilustrada da história) - estão igualmente envolvidas em uma atividade cognitiva desafiadora, na qual elas não apenas são convidadas a narrar, mas também, ao mesmo tempo, a criar o enredo da história, dentro de um curto espaço de tempo. Na verdade, essa atividade exige que as crianças focalizem e integrem a um discurso estruturado, simultaneamente, diferentes aspectos: a criação de um conteúdo narrativo coerente e comunicativamente claro, a escolha de expressões linguisticamente apropriadas em termos de léxico, estrutura gramatical e tipo de discurso, assim como a expressão das diferentes ‘vozes’ a serem ouvidas na narrativa.

Em estudos anteriores, observamos o desenvolvimento da habilidade das crianças de narrar uma história com base em cinco figuras sem texto, nessa situação complexa, e exploramos se uma Intervenção Conversacional Curta (Short Conversational Intervention, SCI6 6 N.T.: Optamos por manter a sigla SCI, caso o leitor deseje pesquisá-la em outros textos. ) entre a criança e o experimentador promovia as habilidades das crianças em relação ao conteúdo narrativo e à expressão linguística (VENEZIANO et al, 2020VENEZIANO, E.; LENORMAND, M.T; PLUMET, M; H, ELIE DESCHAMPS, J. A Short Conversational Intervention for Improving and Evaluating Narrative Skills: A Study of 5-to-8 years old French Children. First Language, n.40, pp.1-26, 2020.; VENEZIANO; NIR, 2017VENEZIANO, E.; NIR, B. The Effects of Conversation on the Content and the Linguistic Structure of the Narratives of 5-to 8-year-old French-speaking Children. Congress of the International Association for the Study of Child Language, IASCL, 2017, Lyon, France.). Este artigo, inspirado pela noção de dialogismo polifônico da narração de Bakhtin, propõe uma análise original dedicada a observar se e como crianças com idade entre 5 e 8 anos fazem com que diferentes vozes sejam ouvidas em suas histórias e se esta habilidade é afetada pela intervenção conversacional que elas estabelecem com o experimentador sobre os aspectos causais da história (ver abaixo na seção sobre metodologia).

Na elicitação e configuração dos procedimentos utilizados aqui, as crianças podiam fazer várias vozes serem ouvidas: a voz da criança que interage com o experimentador e a voz da criança como autora, que pode expressar suas incertezas e suas próprias crenças. Estas pertencem à primeira ordem, aos tipos de ‘discurso simples’, nos quais a criança fala em ‘primeira pessoa’ e expressa sua própria subjetividade. Há ainda a voz de base do narrador, que é ouvida quando a criança toma o ponto de vista de um observador sobre o que acontece e o relata de uma maneira objetiva e descritiva. Aqui, a criança entra no discurso narrativo, uma vez que ela fala sobre os personagens e os eventos a partir de sua própria perspectiva. As vozes mais interessantes que a criança faz ouvir são aquelas de um ou de ambos os personagens, e não apenas quando essas vozes são ouvidas por meio de formas do discurso direto ou indireto, mas também quando suas ‘vozes’ são ouvidas por meio de expressões de seus estados interiores, tais como crenças, intenções e sentimentos. Quando as crianças fazem as vozes dos personagens serem ouvidas em quaisquer dessas formas, elas falam sobre os eventos que compõem o enredo por meio da subjetividade dos personagens e dos pontos de vista deles.

A análise se concentra na discussão sobre a existência ou não de um desenvolvimento da habilidade das crianças em fazer com que essas vozes sejam ouvidas em suas histórias e se a SCI tem algum efeito nesta habilidade. A presença prematura da polifonia em narrativas orais dá suporte ao lugar central que os pontos de vista expressos dialogicamente ocupam na abordagem bakhtiniana.

1 Metodologia

1.1 Participantes 7 7 Esta pesquisa e os dados foram parcialmente financiados por uma bolsa do Conseil Franco-Québécois de Coopération Universitaire (CFQCU. Programa 185) para E. Veneziano (França) e H. Makdissi (Québec), de 2009 a 2013. Na França, o Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD) (https://www.cnil.fr/fr/reglement-europeen-protection-donnees/chapitre1#Article4) entrou em vigor em 25 de maio de 2018. Os dados apresentados neste artigo foram coletados e analisados antes da entrada em vigor desta lei. Além disso, é importante ressaltar que essas coletas foram realizadas com a autorização expressa das pessoas e / ou de seus pais quando se tratava de menores. A apresentação dos dados obedece, ademais, ao artigo 4º do RGPD na medida em que não fornece qualquer informação que permita identificar direta ou indiretamente as pessoas cujos discursos são apresentados.

Os participantes foram 30 crianças falantes de francês (15 meninos e 15 meninas), com idades entre 5;6 e 8;8 anos. As crianças frequentavam o jardim de infância, a primeira e a segunda séries em uma escola pública na região de Paris. Havia 10 crianças em cada sala de aula/faixa etária: 5 anos de idade (jardim de infância), 6-7 anos de idade (primeira série) e 8 anos de idade (segunda série). O quadro 1 apresenta a faixa etária geral, a idade média e o desvio padrão (DP) para cada grupo de série/idade. De acordo com os professores, as crianças estavam se desenvolvendo de uma maneira típica.

Quadro 1
Faixa etária dos participantes, idade média e DP de acordo com a série

1.2 Material

Utilizamos a História da pedra, uma sequência de cinco figuras sem texto escrito que busca representar a história de um mal-entendido entre dois personagens8 8 As imagens foram adaptadas pelo autor a partir de Furnari (1980) e publicadas em vários artigos, incluindo Veneziano, E. & Hudelot, C, 2006, onde podem ser conferidas: https://halshs.archives-ouvertes.fr/halshs-00133376/document . A história, já utilizada em estudos anteriores (VENEZIANO; HUDELOT, 2006VENEZIANO, E.; HUDELOT, C. Etats internes, fausse croyance et explications dans les récits: effets de l’étayage chez les enfants de 4 à 12 ans. Langage et l'Homme, n.41 (2), p.119-140, 2006. , 2009VENEZIANO, E.; HUDELOT, C. Explaining Events in Narratives: the Impact of Scaffolding in 4 to 12 old-year Children. Psychology of Language and Communication, n.13 (1), pp.3-20, 2009. ), é a adaptação de uma história originalmente publicada em um livro para crianças pequenas (FURNARI, 1980FURNARI, E. (1980). Esconde-esconde para crianças de 3 a 5 anos. São Paulo, Brasil: Editora Ática, 1980.).

A primeira figura ‘define o cenário’ mostrando dois garotos (de agora em diante P1 e P2) acenando oi um para o outro, de longe (o ‘cumprimento’). A segunda figura mostra o tropeço acidental de P1 em uma pedra, levando P1 a empurrar P2. A terceira figura mostra P2, que empurra P1 de volta. A quarta figura mostra P1 chorando e apontando para a pedra, enquanto a quinta figura representa ‘a resolução’, mostrando P2, que ajuda P1 a se levantar.

Uma provável interpretação desta sequência de imagens é de que P2 interpretou que o empurrão fisicamente causado por P1 (advindo de seu tropeço na pedra) tinha sido intencional - a fonte do mal-entendido de P2 sobre o comportamento de P1 - e reage empurrando P1 de volta. P1, que entende que P2 interpretou seu comportamento erroneamente, explica para ele a razão real para o empurrão inicial e, depois do esclarecimento, os dois personagens fazem as pazes.

1.3 Procedimento

Todas as crianças foram entrevistadas individualmente em uma sala silenciosa, na escola. O procedimento utilizado aqui é muito parecido com aquele usado em estudos anteriores (VENEZIANO; HUDELOT, 2006VENEZIANO, E.; HUDELOT, C. Etats internes, fausse croyance et explications dans les récits: effets de l’étayage chez les enfants de 4 à 12 ans. Langage et l'Homme, n.41 (2), p.119-140, 2006. , 2009VENEZIANO, E.; HUDELOT, C. Explaining Events in Narratives: the Impact of Scaffolding in 4 to 12 old-year Children. Psychology of Language and Communication, n.13 (1), pp.3-20, 2009. ; VENEZIANO et al., 2020VENEZIANO, E.; LENORMAND, M.T; PLUMET, M; H, ELIE DESCHAMPS, J. A Short Conversational Intervention for Improving and Evaluating Narrative Skills: A Study of 5-to-8 years old French Children. First Language, n.40, pp.1-26, 2020.). É um modelo intrassujeitos, desenvolvido para comparar narrativas produzidas pela mesma criança antes e depois de uma conversa curta. Primeiro, as crianças olharam as cinco figuras da História da pedra, apresentadas em sequência, uma por vez, na ordem correta. Assim que a criança estivesse pronta para contar a história, as figuras eram retiradas e a criança narrava a história9 9 A razão para remover as figuras era maximizar as chances de as crianças se concentrarem na construção do enredo e não se distraírem com os detalhes das imagens. . Após esta primeira narrativa, iniciou-se a Intervenção Conversacional Curta (SCI). A criança participou, então, de uma conversa com o experimentador, com foco nas causas de cada um dos quatro eventos principais da história e no comportamento dos personagens relacionados a esses eventos, enquanto as figuras eram novamente colocadas na frente da criança. “Como é possível?” ou “Por quê?”: 1. P1 empurra P2 (‘o primeiro empurrão’); 2. P2 empurra P1 (‘o segundo empurrão’); 3. P1 mostra a pedra (‘apontando em direção à pedra’); e 4. P2 ajuda P1 a se levantar (‘a reconciliação’). Depois da SCI, foi pedido que a criança contasse a história mais uma vez (a segunda narrativa). Assim como na primeira narrativa, a criança contou a história depois que as figuras foram removidas.

Todas as entrevistas foram registradas em áudio e vídeo e depois transcritas literalmente (verbatim), no formato CHAT, e alinhadas com os vídeos (MACWHINNEY, 2000MACWHINNEY, B. The CHILDES Project, 3rd ed. Mahwah, NJ: Lawrence Erlbaum, 2000.).

1.4 Análise dos Dados

Em cada narrativa, produzida antes e depois da SCI, identificamos tipos diferentes de ‘vozes’ que as crianças fizeram ouvir. Nós distinguimos: 1. A voz do autor; 2. A voz do narrador-como-observador e 3. A voz dos personagens. Estas foram ainda divididas em mais cinco subcategorias, refletindo as diferentes maneiras pelas quais as vozes dos personagens foram ouvidas: 1. Discurso direto; 2. Discurso indireto ou reportado; 3. Os pensamentos e crenças dos personagens; 4. As intenções dos personagens, e 5. As emoções e percepções dos personagens. Nós também identificamos um sexto caso - para o efeito de ‘eles dizem oi’. Este foi considerado um caso ambíguo, entre o discurso direto e a voz do narrador e, por isso, foi mantido separado dos outros cinco tipos de vozes. Todas estas vozes são descritas e ilustradas na seção ‘Resultados’ abaixo, na qual também forneceremos resultados descritivos a respeito do número de crianças que fazem essas vozes serem ouvidas pelo menos uma vez, comparando os três grupos de classes/idades, assim como com as narrativas produzidas antes e depois da SCI. Além disso, também contabilizamos todas as ocorrências das vozes dos personagens (identificadas nas subcategorias de 1 a 5) que se fizeram ouvir por cada criança em toda a narrativa. Foi atribuída uma pontuação de 1 quando a voz de um personagem era ouvida individualmente, e uma pontuação de 0.5 quando as vozes de dois personagens eram ouvidas de uma forma indiferenciada (por exemplo, ils veulent plus se bagarrer, ‘eles não querem mais brigar’). Dessa forma, pudemos criar medidas variadas repetíveis ANOVA (Analysis of Variance) para determinar se há um desenvolvimento da habilidade da criança de fazer com que essas vozes sejam ouvidas ao longo da história, se a interação conversacional da qual a criança participou antes de produzir a segunda narrativa tem um efeito positivo nesta habilidade e/ou se há interação entre essas duas variáveis.

2 Resultados

Como mencionado acima, a configuração permite que as crianças façam diferentes vozes serem ouvidas. Como especificado, na seção ‘análise de dados’, daremos foco, aqui, à voz do autor, à voz do narrador-como-observador e às vozes dos personagens. Na seção 3.1, descrevemos e exemplificamos como cada uma das vozes identificadas são expressas pelas crianças, assim como fornecemos resultados descritivos relacionados ao número de crianças que fizeram cada uma das vozes identificadas serem ouvidas pelo menos uma vez nas duas narrativas combinadas e, comparativamente, para cada uma das duas narrativas (antes e depois da SCI). Na seção 3.2, apresentamos resultados quantitativos sobre o número total de vozes dos personagens que foram ouvidas em cada narrativa, considerando os grupos de faixas etárias e as narrativas produzidas antes e depois da SCI.

2.1 As ‘vozes’ nas narrativas das crianças

2.1.1 A voz do autor

Como mencionado, neste contexto de contação de história, as crianças tiveram que construir e narrar a história ao mesmo tempo. Como Bakhtin apontou, há diferenças importantes entre esses papéis e, no romance literário, eles são clara e habilidosamente diferenciados. Assim, o autor pode expressar seu próprio ponto de vista ou julgamento sobre os eventos narrados, comportamentos dos personagens, seus discursos e sua linguagem. No presente estudo, isto nunca acontece exatamente desta forma. Entretanto, em alguns casos, as crianças fazem com que a voz do autor seja ouvida como uma voz diferente da do narrador, ao expressar a ignorância do autor (exemplo 1) ou a incerteza sobre o que acontece na história (exemplo 2), ou ainda ao especificar que aquilo que é narrado é a crença do próprio autor (exemplo 3):

Exemplo 1: Expressando a ignorância do Autor

Aí tem um menino que eu não sei por que ele empurra o outro10 10 No original: “Après y a un garçon je sais pas pourquoi il pousse l’autre”. .

Exemplo 2: Expressando a incerteza do Autor

E aí o menininho disse # talvez ele tenha dito uma maldade para o outro menino11 11 No original: “Et puis après le petit garçon il avait # peut-être qu’il avait dit une méchanceté sur l’autre garçon”. .

Exemplo 3: Expressando a crença do próprio Autor

E aí # eu acho # que tem um que disse alguma maldade para o outro12 12 No original: “Et puis après # je crois # qu’ y en a un qui a dit quelque chose de méchant à l’autre”. .

Uma outra maneira pela qual as crianças fizeram a voz do autor ser ouvida foi ao anunciar espontaneamente que a história tinha terminado (exemplo 4):

Exemplo 4: Anunciando o final da história

E aí é isso13 13 No original: “et après c'est tout!”. .

A voz do autor foi ouvida de uma das maneiras apresentadas acima, na história de 7 crianças (23% da amostragem), na primeira ou na segunda narrativa, sendo apenas uma delas no grupo das crianças mais velhas. Em todos os outros casos, as vozes do autor e do narrador não foram claramente distinguidas.

3.1.2 A voz do narrador-como-observador

Todas as crianças, de todas as faixas etárias, tanto na primeira como na segunda narrativa, fizeram com que a voz do narrador fosse ouvida, isto é, elas falaram sobre os eventos e as ações dos personagens de um ponto de vista externo, como deve ser o de um observador. Quando apenas a voz do narrador foi ouvida ao longo da história, as crianças falaram sobre eventos de uma maneira descritiva, referindo-se a um ou a ambos os personagens e relacionando os eventos de maneira majoritariamente temporal (exemplo 5) e, às vezes, também de maneira causal (exemplo 6):

Exemplo 5: A voz do narrador-como-observador: Relações temporais

O menino de macacão empurra o garoto de shorts; depois o outro o empurra de volta; depois ele chora; e depois o outro o ajuda a se levantar14 14 No original: “Le garçon avec la salopette pousse le garçon avec le short; après l’autre il le repousse; après il pleure; et après l’autre il l’aide à se relever”. .

Exemplo 6: A voz do narrador-como-observador: Relações temporais e causais

Tem um menino que tropeça em uma pedra; depois ele empurra a garota15 15 No original: “Y a un garçon qui trébuche à cause d’une pierre ; après il pousse la fille”. .

Apesar de todas as crianças terem feito a voz do narrador ser ouvida em pelo menos um dos eventos da história, apenas 30% das crianças fizeram a voz do narrador ser ouvida durante toda a narrativa. Destes, 23% o fizeram na primeira narrativa, uma percentagem que diminui para 7% na segunda narrativa, com nenhuma coincidência entre as duas narrativas. Isto significa que as crianças que o fizeram na primeira narrativa não são as mesmas que o fizeram na segunda narrativa. A porcentagem de crianças que fez apenas a voz do narrador ser ouvida foi maior no jardim de infância (50%), seguida pela primeira série (20%), enquanto nenhuma das crianças da segunda série fez apenas a voz do narrador ser ouvida ao longo de toda a história. As crianças do jardim de infância mostraram uma diminuição acentuada entre a primeira e a segunda narrativa: enquanto 50% delas fizeram apenas a voz do narrador ser ouvida na primeira narrativa, nenhuma delas o fez na segunda narrativa.

3.1.3 As vozes dos personagens

Ao contar sua história, as crianças podem fazer a voz de um ou de ambos os personagens serem ouvidas. Como discutido acima, na seção de análise de dados, há várias maneiras de as crianças fazerem isso. Algumas formas são bastante claras e fáceis de se identificar, como quando as crianças fazem os personagens conversarem utilizando o discurso direto ou indireto reportado. Em outros casos, a voz dos personagens é ouvida por meio de expressões do estado interior dos personagens, como seus pensamentos e crenças, ou suas intenções e emoções. Como mencionado acima, as vozes dos personagens foram diferenciadas em cinco subcategorias, apresentadas em detalhes a seguir.

3.1.3.1 Discurso direto

Aqui, a voz do personagem é ouvida diretamente, já que ele conversa em discurso direto. No exemplo 7, a criança faz com que P1 se dirija a P2 diretamente, precedendo a fala de P1 com a marcação explícita ‘ele disse’:

Exemplo 7: A voz do personagem em discurso direto

E depois ele disse: “Não é minha culpa, foi a pedra que me fez cair”16 16 No original: “Et après il dit: ‘c’est pas de ma faute c’est le caillou qui m’a fait tomber’”. .

Apenas 17% desta amostra (5 crianças) fez uso do discurso direto para fazer a voz dos personagens ser ouvida, 4 delas eram da segunda série e 1 criança era do jardim de infância. No total, essas crianças produziram 9 ocorrências de discurso direto, 6 em que se tratava de P1 esclarecendo à P2 a razão do primeiro empurrão, enquanto as outras 3 ocorrências eram relacionadas à P2. Uma criança da segunda série fez P2 dizer “d’accord”, aceitando a explicação inicial de P1 sobre o primeiro empurrão, enquanto a criança do jardim de infância usou o discurso direto para fazer P2 dizer a P1 que ele estava mentindo. Nenhuma diferença no uso do discurso direto foi observada entre as duas narrativas: um aluno da segunda série usou o discurso direto apenas na primeira narrativa, outro apenas na segunda narrativa, e outros dois também da segunda série, assim como um do jardim de infância, o usaram nas duas narrativas.

3.1.3.2 Discurso indireto ou reportado

Aqui, é ainda por meio de sua fala que as vozes dos personagens são ouvidas, mas, ao invés de colocar as palavras em suas bocas com o discurso direto, é no discurso indireto que suas vozes aparecem. Isso é ilustrado no exemplo 8, no qual a criança explica o choro de P1 com o que P1 havia dito:

Exemplo 8: A voz do personagem no discurso indireto

E depois ele chora porque ele ele diz que é por causa da pedra17 17 No original: “Et après il pleure parce que il il dit qu’c’est à cause de la pierre”. .

Assim como no discurso direto, igualmente apenas 17% da amostra (5 crianças) usou esse tipo de discurso para fazer as vozes dos personagens serem ouvidas; três delas estava na segunda série e, das outras duas, uma era da primeira série e a outra, do jardim de infância. No total, essas crianças produziram 6 ocorrências de discurso indireto, das quais 5 eram sobre P1 explicando o mal-entendido e uma sobre P2 respondendo à explicação de P1 a respeito do primeiro empurrão e dizendo que ele o ajudaria a se levantar. Apesar de haver muito poucas ocorrências para afirmar algo significativo, notamos que o uso do discurso indireto é maior na segunda do que na primeira narrativa (4 vs. 2 ocorrências) e que as 2 ocorrências na primeira narrativa foram feitas por crianças da segunda série.

3.1.3.3 Os pensamentos e crenças dos personagens

Nos discursos direto e indireto, as vozes dos personagens são clara e explicitamente ouvidas por meio do que eles dizem. Neste e nos próximos dois usos, as vozes dos personagens são ouvidas mais indiretamente, mas ainda de maneira clara, por meio da expressão de seus estados interiores. A criança revela, desta forma, o mundo interior dos personagens e suas próprias visões do mundo exterior. O caso mais interessante é o da expressão dos pensamentos e das crenças dos personagens. Eles estão na base do mal-entendido entre os dois personagens e suas expressões revelam seus próprios pontos de vistas sobre os eventos, e, ao mesmo tempo, fornecem a explicação para seus comportamentos. Todas as referências encontradas na presente amostra são sobre a crença de P2 em relação às intenções que estão por trás do primeiro empurrão de P1, e que fornece, ao mesmo tempo, o motivo para seu comportamento de empurrar de volta, como no exemplo 9:

Exemplo 9: A crença do personagem sobre as intenções de seu colega

A menina acha que ele fez isso de propósito, então ela o empurra de volta18 18 No original: “La fille croit qu’il a fait exprès alors elle le repousse”. .

Sete crianças (23% da amostra) fizeram com que as crenças de P2 fossem ouvidas. Destas crianças, 57% (4 crianças) eram da segunda série e, entre as outras três, uma era da primeira série e duas do jardim de infância. Apenas 2 crianças, ambas da segunda série, fizeram as crenças de P2 serem ouvidas na primeira narrativa, enquanto todas as sete o fizeram na segunda narrativa.

3.1.3.4 As intenções e desejos dos personagens

Atribuir e expressar intenções e desejos dos personagens é uma outra maneira de fazer com que suas vozes sejam ouvidas. Na maioria das vezes, são as intenções de P2 que são mostradas, como no exemplo 10:

Exemplo 10: As intenções do personagem

O menino cai na pedra # e faz a menina cair mas ele não fez isso de propósito19 19 No original: “le garçon il tombe sur une pierre # et il fait tomber la fille mais il a pas fait exprès”. .

Às vezes, é o desejo dos personagens que é ouvido, como no exemplo 11:

Exemplo 11: Os desejos dos personagens

E aí eles não querem mais brigar # porque eles já estão sentindo dor20 20 No original: “Et après ils veulent plus se bagarrer # parce qu’ils ont déjà mal”.

Onze crianças (37% da amostra) fizeram os desejos ou intenções dos personagens serem ouvidos. Destas crianças, 55% (6 crianças) eram da segunda série, três eram da primeira série e duas do jardim de infância. Intenções e desejos foram ouvidos na primeira e na segunda narrativas por praticamente o mesmo número de crianças, respectivamente 72% e 83% das que os expressaram.

3.1.3.5 As emoções, sentimentos e as percepções dos personagens

Finalmente, as vozes dos personagens foram também ouvidas quando as crianças falaram sobre seus estados emocional e perceptivo.

As emoções e sentimentos dos personagens foram ouvidos por meio da expressão de seu contentamento, descontentamento, sua raiva ou por ter caído sobre o outro personagem, como no exemplo 12:

Exemplo 12: As emoções do personagem

E aí ele não está feliz porque ele o empurrou21 21 No original: “Et après il est pas content parce qu’il l’a poussé”.

Vinte e uma crianças (70% da amostra) fizeram com que as emoções internas dos personagens fossem ouvidas. 80% delas eram da primeira e da segunda séries, enquanto apenas 50% das crianças do jardim da infância fizeram isso. As emoções foram ouvidas na primeira e na segunda narrativas por aproximadamente o mesmo número de alunos da primeira e da segunda séries, enquanto os do jardim da infância fizeram as emoções serem mais ouvidas na segunda narrativa do que na primeira (80% vs. 20% dos alunos de jardim de infância que as expressaram).

Considerando os sentimentos e percepções dos personagens, estes se concentram especialmente em sua sensação de se machucar (como no exemplo 13) ou em relação ao que os personagens veem (exemplo 14):

Exemplo 13: Os sentimentos do personagem

E ele mostra a pedra porque ela o machucou22 22 No original: “Et il montre la pierre parce que ça lui a fait mal”. .

Exemplo 14: As percepções dos personagens

São dois meninos # eles se veem23 23 No original: “C’est deux garçons # ils se voient”.

Quinze crianças (50% da amostra) fizeram com que as sensações dos personagens fossem ouvidas. Destas, 60% eram do jardim de infância e da primeira série, enquanto apenas 30% das crianças da segunda série o fizeram. Os sentimentos internos e as percepções foram ouvidas tanto na primeira quanto na segunda narrativas, mas, no total, elas foram mais expressas na segunda do que na primeira narrativa.

3.1.3.6 Um caso especial: ‘dizer oi’, ‘se cumprimentar’

A narração das crianças do contexto inicial geralmente incluía dizer que os dois personagens “diziam oi” um para o outro ils se disent bonjour. Se dire bonjour é um caso muito especial. Por um lado, podemos considerar o cumprimento como próximo a uma forma de discurso direto, se interpretado como “eles dizem: oi”. Por outro lado, podemos interpretá-lo enquanto a voz do narrador-como-observador que descreve, de um ponto de vista exterior, o que os personagens estão fazendo, ou seja, cumprimentando-se. E, de fato, as crianças podem usar se saluent [Elas se cumprimentam], se disent bonjour [Elas dizem oi um para o outro], ou ainda se voient [Elas se veem], alternativamente ou conjuntamente: se voient et ils se disent bonjour de loin [elas se veem e dizem oi de longe]. Assim, consideramos essas expressões, neste contexto inicial, como ambíguas: elas podem ser uma maneira das vozes dos personagens serem ouvidas, mas elas também podem refletir a voz do narrador descrevendo, de um ponto de vista exterior, o evento do cumprimento que acontece entre os dois personagens. Consequentemente, na análise quantitativa - que será descrita abaixo, na seção 3.2 - estas ocorrências não são incluídas no valor total de ocorrências nas quais as vozes dos personagens são ouvidas (i.e., todos os outros casos descritos no item 3.1.3).

3.2 Fazendo as vozes dos personagens serem ouvidas: resultados quantitativos

As crianças que fizeram a voz de um ou de ambos os personagens serem ouvidas podem ter feito isso pelo menos uma vez em suas histórias, mas também podem ter usado esse recurso diversas vezes, fazendo com que a voz dos personagens fossem ouvidas várias vezes e de diferentes maneiras ao longo de suas narrativas. O quadro 2 apresenta o total de vezes em que as vozes dos personagens foram ouvidas durante toda a narrativa, divididas por série/idade e por narrativa. Incluímos aqui todas as ocorrências dos casos descritos nos itens 3.1.3.1 até o item 3.1.3.5, isto é, as vozes ouvidas por meio do discurso direto e indireto e por meio de expressões de seus estados interiores: crenças e pensamentos, intenções e desejos, emoções, sentimentos e percepções.

Quadro 2
Número de ocorrências nas quais as vozes dos personagens ouvidas ao longo de toda a narrativa, por série/idade e ordem da narrativa

Como podemos ver no Quadro 2, os alunos da segunda série fizeram ouvir a maioria das vozes ouvidas nas narrativas (56%), seguidos pelos da primeira série (27%) e então pelos alunos do jardim de infância (17% do total de ocorrências). Além disso, também podemos observar que as vozes dos personagens foram ouvidas muito mais na segunda do que na primeira narrativa (63% vs. 37%).

Para confirmar estes resultados descritivos, misturamos as medidas repetidas ANOVA, com um fator intrassujeitos - a narrativa, com duas modalidades: primeira e segunda narrativa - e um fator intersujeitos - a série/idade, com três modalidades: alunos do jardim de infância, da primeira série e da segunda série. A ANOVA mostrou um efeito principal para série/idade (F (2,27) = 6,52, p = 0,005), e para as narrativas (F(1,28) = 5,30, p = 0,029), sem interação significante entre os dois fatores (F (2,27) = 1,677, p = 0,20). As comparações post-hoc mostraram que os alunos da segunda série fizeram as vozes dos personagens serem ouvidas mais frequentemente do que os da primeira série (t = 2,62, p <,05) e os do jardim de infância (t = 3,46, p <,01), mas não há uma diferença significativa neste aspecto quanto aos dois primeiros grupos (t = 0,85, ns). Além disso, a comparação post-hoc mostrou que as crianças fizeram as vozes dos personagens serem ouvidas com mais frequência na segunda do que na primeira narrativa (t=2,25, p <,05).

4 Discussão

Nossos resultados mostram que as crianças entre 5 e 8 anos de idade podem fazer diferentes vozes serem ouvidas em suas narrativas, utilizando diferentes tipos de discurso, como o discurso direto e indireto e a expressão dos estados interiores dos personagens. Assim, no início de seu desenvolvimento, as crianças podem transpor e inserir tipos de discurso que elas usam em conversas do dia a dia (de acordo com Bakhtin, gêneros de primeira ordem) na narrativa oral dos enredos que elas construíram (de acordo com Bakhtin, fazendo com que o gênero de primeira ordem se torne então um discurso complexo, de segunda ordem). As crianças entre 5 e 6 anos de idade fazem as vozes dos personagens serem ouvidas menos frequentemente em suas narrativas e poucas crianças puderam usar este recurso. A habilidade e a necessidade de usar esses recursos discursivos desenvolvem-se com a idade e com o suposto crescimento das competências cognitivas e linguísticas associadas a eles. Os resultados descritivos, confirmados pelos testes estatísticos, mostram que as crianças de 8 anos de idade da segunda série são mais capazes de fazer as vozes dos personagens serem ouvidas em suas narrativas do que as de 5 a 7 anos: de fato, elas usam esse recurso mais frequentemente ao longo de suas narrativas e um número maior de crianças o fazem. Além disso, o grupo de crianças mais velhas faz com que os pensamentos e crenças dos personagens sejam ouvidos mais frequentemente do que as crianças mais novas, enfatizando seus pontos de vista diferentes em relação ao estado da realidade ficcional.

Os resultados mostram também que as vozes são ouvidas muito mais na segunda do que na primeira narrativa. Podemos supor que a interação conversacional da qual as crianças participaram entre a primeira e a segunda narrativa facilitou a expressão deste aspecto. Este resultado está de acordo com estudos prévios que tinham como objetivo promover o conteúdo orientado para a personagem e a estrutura causal da história utilizando o mesmo (VENEZIANO, 2010VENEZIANO, E. Peut-on aider l’enfant à mieux raconter? Les effets de différentes méthodes d’intervention. In: MAKDISSI, H.; BOISCLAIR, A.; SIROIS, P. (Eds.). La littéracie au préscolaire: Une fenêtre ouverte sur la scolarisation. Quebec, CA: Presses Universitaires du Quebec, 2010. p.107-144., 2016VENEZIANO, E. The Development of Narrative Discourse in French by 5 to 10 years old Children: Some Insights from a Conversational Interaction Method. In: PERERA, J.; APARICI, M.; ROSADO, E.; SALAS, N. (Eds.). Written and Spoken Language Development across the Lifespan: Essays in Honor of Liliana Tolchinsky. Cham, Switzerland: Springer Publishers, 2016. pp.141-160. [Literacy Studies Series]; VENEZIANO et al., 2009VENEZIANO, E.; ALBERT, L.; MARTIN, S. Learning to Tell a Story of False Belief: A Study of French-speaking Children. In: GUO, J.; LIEVEN, E.; BUDWIG, N; ERVIN-TRIPP, S.; NAKAMURA, K.; ÖZÇALISKAN, S. (Eds.). Crosslinguistic Approaches to the Psychology of Language: Research in the Tradition of Dan Isaac Slobin. New York, NY: Psychology Press, 2009. pp.277-289. . 2020VENEZIANO, E.; LENORMAND, M.T; PLUMET, M; H, ELIE DESCHAMPS, J. A Short Conversational Intervention for Improving and Evaluating Narrative Skills: A Study of 5-to-8 years old French Children. First Language, n.40, pp.1-26, 2020.) ou outros tipos de procedimentos conversacionais (SILVA; CAIN, 2019SILVA, M.; CAIN, K. The Use of Questions to Scaffold Narrative Coherence and Cohesion. Journal of Research in Reading, n.42(1), pp.1-17, 2019.; SILVA et al., 2014SILVA, M.; STRASSER, K.; CAIN, K. Early Narrative Skills in Chilean Preschool: Questions Scaffold the Production of Coherent Narratives. Early Childhood Research Quarterly, n.29, pp.205-213, 2014. ). Entretanto, com base apenas no presente estudo, esta relação não pode ser firmemente estabelecida já que, aqui, o efeito da interação conversacional na expressão polifônica das vozes não foi controlado em relação ao efeito que narrar a história uma segunda vez teria tido por si só. Entretanto, em estudos anteriores nos quais este controle foi realizado, mostrou-se que as narrativas com o grupo controle não apresentaram nenhuma diferença significativa em várias medidas do conteúdo narrativo, enquanto as narrativas das crianças que participaram da interação conversacional revelaram que a estrutura causal e os aspectos relacionados à mente do enredo da história eram significativamente mais frequentes na narrativa pós-SCI do que naquelas inicialmente produzidas (VENEZIANO et al., 2009VENEZIANO, E.; ALBERT, L.; MARTIN, S. Learning to Tell a Story of False Belief: A Study of French-speaking Children. In: GUO, J.; LIEVEN, E.; BUDWIG, N; ERVIN-TRIPP, S.; NAKAMURA, K.; ÖZÇALISKAN, S. (Eds.). Crosslinguistic Approaches to the Psychology of Language: Research in the Tradition of Dan Isaac Slobin. New York, NY: Psychology Press, 2009. pp.277-289. ; VENEZIANO, 2016VENEZIANO, E. The Development of Narrative Discourse in French by 5 to 10 years old Children: Some Insights from a Conversational Interaction Method. In: PERERA, J.; APARICI, M.; ROSADO, E.; SALAS, N. (Eds.). Written and Spoken Language Development across the Lifespan: Essays in Honor of Liliana Tolchinsky. Cham, Switzerland: Springer Publishers, 2016. pp.141-160. [Literacy Studies Series]; VENEZIANO et al., 2020VENEZIANO, E.; LENORMAND, M.T; PLUMET, M; H, ELIE DESCHAMPS, J. A Short Conversational Intervention for Improving and Evaluating Narrative Skills: A Study of 5-to-8 years old French Children. First Language, n.40, pp.1-26, 2020.). Extrapolando esses resultados, podemos concluir que a maior expressão das vozes dos personagens na segunda narrativa comparada com a primeira pode estar, de fato, relacionada com a troca conversacional mais do que com o fato de que a criança esteja recontando a sua história. Várias razões foram apresentadas para explicar os efeitos benéficos da SCI nas habilidades narrativas das crianças, tais como, por exemplo, a redução da carga cognitiva através da segmentação da história e do foco na causalidade (veja, por exemplo, VENEZIANO et al., 2020)VENEZIANO, E.; LENORMAND, M.T; PLUMET, M; H, ELIE DESCHAMPS, J. A Short Conversational Intervention for Improving and Evaluating Narrative Skills: A Study of 5-to-8 years old French Children. First Language, n.40, pp.1-26, 2020.. Em relação ao interesse principal deste artigo, ou seja, a habilidade das crianças de fazer com que as vozes dos personagens sejam ouvidas, o foco da SCI nas causas dos comportamentos e eventos pode levar a criança a ver mais facilmente os eventos do ponto de vista dos personagens. De fato, durante a troca, as crianças podem pensar sobre as causas e motivações subjacentes à sucessão de eventos e, fazendo isso, elas têm a oportunidade de contar a perspectiva subjetiva de cada personagem e de ser então confrontada, mais abertamente, com seus diferentes pontos de vista sobre os eventos. As percepções sobre as diferentes subjetividades dos personagens, obtidas na SCI, podem levar as crianças a fazer com que as vozes dos personagens sejam mais ouvidas na segunda narrativa.

A presença precoce de vozes nas narrativas das crianças e o uso crescente de expressões articuladas dos diferentes pontos de vista dos personagens fornecem suporte para a centralidade da noção bakhtiniana de diálogo polifônico. Sua presença embrionária nas narrativas orais produzidas espontaneamente e autoconstruídas das crianças pequenas sugere a ‘realidade psicológica’ de dois princípios da abordagem. Um deles está relacionado à ideia de que diferentes tipos de discurso coexistem dentro do mesmo gênero do discurso, tais como os romances literários e, mais abrangentemente, o discurso narrativo em geral. O outro princípio está relacionado à expressão polifônica de diferentes pontos de vista, no qual cada voz reage a uma anterior e evoca, ao mesmo tempo, a reação futura e a expressão de outra voz. Na verdade, mesmo nessas manifestações iniciais da expressão das vozes dos personagens, as crianças faziam com que elas fossem ouvidas de uma maneira que seguia implicitamente este princípio. Por exemplo, para o primeiro empurrão expresso como não intencional, o ponto de vista oposto do outro personagem é ouvido, para o qual, por sua vez, o outro personagem responde apontando para a evidência de sua não intencionalidade.

É interessante notar que a noção bakhtiniana de dialogismo encadeado - para Bakhtin, idealmente, ‘não finalizado’ (BAKHTIN, 1997 [1963]24 24 BAKHTIN, M. Problemas da poética de Dostoiévski. 2. ed. Revista. Tradução, notas e prefácio Paulo Bezerra. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997. [1963] ) - é também o centro das abordagens conversacionais mais recentes e tem sido aplicada para descrever a dinâmica da interação precoce mãe-criança e as regras conversacionais implícitas que as crianças pequenas acabam aprendendo para tornarem-se um falante competente. Estes movimentos retroativos e proativos são tão importantes nas análises conversacionais que têm sido considerados subjacentes até mesmo em um par adjacente simples, como os pares de perguntas e respostas (uma unidade básica da conversação, de acordo com SCHEGLOFF; SACKS, 1973SCHEGLOFF, E. A.; SACKS, H. Opening up Closings. Semiotica, n. 8, pp.289-327, 1973.). Dentro desse contexto, uma questão é mais frequentemente feita com base em experiências passadas e com uma visão daquilo que o interlocutor é capaz ou tem mais probabilidade de responder, e é, ela mesma, orientada proativamente em direção à resposta. Da mesma forma, a resposta se relaciona retroativamente à questão, mas é também orientada proativamente para o que o interrogador possa responder de volta. A função dupla dos turnos, que normalmente fica implícita, é bem ilustrada pelos turnos explicitamente marcados, chamados de ‘reviravoltas’ (KAYE; CHARNEY, 1980KAYE, K.; CHARNEY, R. How Mothers Maintain ‘Dialogue’ with Two-year-olds. In: Olson, D. (Ed.). The Social Foundations of Language and Thought: Essays in Honor of Jerome S. Bruner. New York, NY: Norton, 1980.), dos quais a pergunta esclarecedora é um exemplo: a pergunta de esclarecimento reconhece o turno anterior enquanto, ao mesmo tempo, solicita a próxima intervenção do interlocutor.

Eu também gostaria de sugerir que relações interessantes podem ser encontradas entre as noções bakhtinianas de gênero discursivo de primeira e de segunda ordem (BAKHTIN, 1997 [1979]25 25 Para referência, ver nota de rodapé 1. ) e a noção de Piaget de vertical décalage - ou “níveis de funcionamento” - na psicologia desenvolvimentista (PIAGET, 1937/1971PIAGET, J. La construction du réel chez l'enfant. Neuchâtel; Paris: Delachaux et Niestlé, 1971. [1937]). Vertical décalage diz respeito à ideia de que uma dada noção cognitiva adquirida em um certo nível de funcionamento (por exemplo, no nível de ação, como pode ser o caso da organização sensório-motora de espaço através dos deslocamentos da própria criança), não é transposta diretamente, quando surgem necessidades de usá-la, para um nível mais alto de funcionamento, tal como os níveis conceituais ou metacognitivos; ela precisa ser reconstruída nesses níveis mais altos de pensamento e de consciência (KARMILOFF-SMITH, 1992KARMILOFF-SMITH, A. Beyond Modularity: A Developmental Perspective on Cognitive Science. Cambridge, MA: MIT Press, 1992.; PIAGET, 1974PIAGET, J. La prise de conscience. Paris: Presses Universitaires de France, 1974.). A respeito do discurso e da diferença destacada por Bakhtin, os tipos de discurso de primeira ordem podem ser considerados como prontamente disponíveis para as crianças quando elas conversam sobre suas próprias subjetividades e, com frequência, sobre suas próprias experiências, intenções, sentimentos e crenças, particularmente para atingir seus próprios objetivos. Esta “habilidade” de primeira ordem precisa, entretanto, ser reconstruída e retrabalhada quando níveis mais altos de pensamento e consciência são requisitados. Este pode ser o caso quando as crianças, fazendo as vozes de seus personagens serem ouvidas nas narrativas, são obrigadas a lidar com a subjetividade do outro, falar sobre estados interiores não experienciados por elas mesmas naquele momento e desconectados de seus próprios objetivos, e integrar estes e outros aspectos a eles relacionados na construção de um enredo narrativo geral para ser expressado por meio de restrições formais e pragmáticas específicas do gênero narrativo (BRUNER, 199726 26 BRUNER, Jerome. Realidade mental, mundos possíveis. Artes Médicas, 1997. ; STEIN, 1988STEIN, N. L. The Development of Children’s Storytelling Skill. In: Franklin, M.; Barten, S. (Eds.), Child Language: A Reader. Oxford, UK: Oxford University Press, 1988, pp.282-297.). O nível mais alto de funcionamento requerido pela expressão das vozes dos personagens nas narrativas construídas pelas crianças pode ser responsável pelos resultados obtidos aqui, mostrando que as vozes dos personagens são significativamente menos expressas pelas crianças de 5 a 7 anos de idade do que por aquelas da segunda série, uma tendência do desenvolvimento que respalda a hipótese de que a reconstrução de tipos de discurso pode, de fato, acontecer em um novo nível de consciência conceitual.

Os resultados a respeito do suposto papel facilitador da troca conversacional na expressão das vozes dos personagens pelas crianças e seu papel facilitador verificado na expressão da estrutura causal e dos aspectos do enredo da narrativa relacionados à mente, dão suporte à noção bakhtiniana de que os diálogos - particularmente na forma de dialogismo dialético, no qual diferentes pontos de vista entre e dentro dos indivíduos podem coexistir - são centrais para o avanço do conhecimento em diferentes domínios (BAKHTIN, 1998 [1934-35]27 27 Para referência, ver nota de rodapé 2. ). Apesar de o método dialógico usado em nosso contexto ser bastante limitado em tempo e tipo, ele enfatiza, de qualquer forma, sua importância ao fazer com que as crianças mudem sua visão inicial do mundo, uma mudança que ocorre quando o pensamento é estimulado a se estender por meio da troca com os outros, assim como pela troca dialógica dentro de nós mesmos (veja também VENEZIANO, 2019VENEZIANO, E. Conversationally and Monologically-Produced Narratives: A Complex Story of Horizontal Décalages. Psychology of Language and Communication, n. 23 (1), pp.81-104, 2019.).

  • Tradução de Paula Cristina Bullio - pcbullio@gmail.com
  • Revisão técnica de Alessandra Del Ré - del.re@unesp.br; Rosângela Nogarini Hilário - ronogarini@gmail.com E Patrícia Falasca - patrícia.falasca@gmail.com
  • 1
    BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In: BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. Tradução de Maria Ermantina Galvão Gomes Pereira. São Paulo: Martins Fontes, 1997. p.277-326. [1979]
  • 2
    BAKHTIN, M. O discurso no romance. [1934-1935]. In: BAKHTIN, M. Questões de literatura e de estética: a teoria do romance. Tradução Autora Bernadini et al. 4. ed. São Paulo: Unesp/Hucitec,1998. p.71-210.
  • 3
    Há uma controvérsia em andamento em relação à autoria de algumas noções atribuídas a Bakhtin, controvérsia que não é de nosso interesse aqui, mas veja Zenkine (2011)ZENKINE, S. Jean-Paul Bronckart, Cristian Bota, Bakhtine démasqué. Cahiers du monde russe: Varia, Paris, v.4, n.52, p.845-853, 2011. Available at: http://journals.openedition.org/monderusse/7509. Access on: 06 April 2020.
    http://journals.openedition.org/monderus...
    para um tratamento profundo e bem informado sobre o assunto. Nota das Editoras brasileiras: Sobre o mesmo tema, o número 9 (especial), 2014, de Bakhtiniana, em https://revistas.pucsp.br/index.php/bakhtiniana/issue/view/1255/showToc
  • 4
    Para referência, ver nota de rodapé 2.
  • 5
    Para referência, ver nota de rodapé 2.
  • 6
    N.T.: Optamos por manter a sigla SCI, caso o leitor deseje pesquisá-la em outros textos.
  • 7
    Esta pesquisa e os dados foram parcialmente financiados por uma bolsa do Conseil Franco-Québécois de Coopération Universitaire (CFQCU. Programa 185) para E. Veneziano (França) e H. Makdissi (Québec), de 2009 a 2013. Na França, o Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD) (https://www.cnil.fr/fr/reglement-europeen-protection-donnees/chapitre1#Article4) entrou em vigor em 25 de maio de 2018. Os dados apresentados neste artigo foram coletados e analisados antes da entrada em vigor desta lei. Além disso, é importante ressaltar que essas coletas foram realizadas com a autorização expressa das pessoas e / ou de seus pais quando se tratava de menores. A apresentação dos dados obedece, ademais, ao artigo 4º do RGPD na medida em que não fornece qualquer informação que permita identificar direta ou indiretamente as pessoas cujos discursos são apresentados.
  • 8
    As imagens foram adaptadas pelo autor a partir de Furnari (1980)FURNARI, E. (1980). Esconde-esconde para crianças de 3 a 5 anos. São Paulo, Brasil: Editora Ática, 1980. e publicadas em vários artigos, incluindo Veneziano, E. & Hudelot, C, 2006, onde podem ser conferidas: https://halshs.archives-ouvertes.fr/halshs-00133376/document
  • 9
    A razão para remover as figuras era maximizar as chances de as crianças se concentrarem na construção do enredo e não se distraírem com os detalhes das imagens.
  • 10
    No original: “Après y a un garçon je sais pas pourquoi il pousse l’autre”.
  • 11
    No original: “Et puis après le petit garçon il avait # peut-être qu’il avait dit une méchanceté sur l’autre garçon”.
  • 12
    No original: “Et puis après # je crois # qu’ y en a un qui a dit quelque chose de méchant à l’autre”.
  • 13
    No original: “et après c'est tout!”.
  • 14
    No original: “Le garçon avec la salopette pousse le garçon avec le short; après l’autre il le repousse; après il pleure; et après l’autre il l’aide à se relever”.
  • 15
    No original: “Y a un garçon qui trébuche à cause d’une pierre ; après il pousse la fille”.
  • 16
    No original: “Et après il dit: ‘c’est pas de ma faute c’est le caillou qui m’a fait tomber’”.
  • 17
    No original: “Et après il pleure parce que il il dit qu’c’est à cause de la pierre”.
  • 18
    No original: “La fille croit qu’il a fait exprès alors elle le repousse”.
  • 19
    No original: “le garçon il tombe sur une pierre # et il fait tomber la fille mais il a pas fait exprès”.
  • 20
    No original: “Et après ils veulent plus se bagarrer # parce qu’ils ont déjà mal”.
  • 21
    No original: “Et après il est pas content parce qu’il l’a poussé”.
  • 22
    No original: “Et il montre la pierre parce que ça lui a fait mal”.
  • 23
    No original: “C’est deux garçons # ils se voient”.
  • 24
    BAKHTIN, M. Problemas da poética de Dostoiévski. 2. ed. Revista. Tradução, notas e prefácio Paulo Bezerra. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997. [1963]
  • 25
    Para referência, ver nota de rodapé 1.
  • 26
    BRUNER, Jerome. Realidade mental, mundos possíveis. Artes Médicas, 1997.
  • 27
    Para referência, ver nota de rodapé 2.

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    » http://journals.openedition.org/monderusse/7509

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Dez 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2021

Histórico

  • Recebido
    14 Jun 2020
  • Aceito
    14 Out 2020
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