Acessibilidade / Reportar erro

A Interface entre Desmatamento e Urbanização na Amazônia Brasileira

Resumo

No atual processo global de urbanização, o urbano torna-se elemento central na reconciliação das questões ambientais. Neste estudo, objetivou-se trabalhar diretrizes para subsidiar uma abordagem metodológica que explicite as relações entre desmatamento e urbanização na Amazônia. Considerando intensa transição urbana na região, realizou-se uma revisão sistemática da literatura para compreender o estado de conhecimento e desafios deste escopo. Destacou-se quatro frentes investigativas com relevantes contribuições, mas que poderiam ser melhor articuladas entre si com ajustes no sistema de análise, reformulação conceitual de urbano e indicadores sensíveis às dinâmicas socioespaciais. Através das abordagens da teoria social das mobilidades e do risco refletiu-se sobre a concepção de uma teoria crítica urbana condizente com a multidimensionalidade e transescalaridade das configurações sociopaisagísticas do tecido urbano. Com a incorporação dos enquadramentos analíticos da demografia espacial, o artigo propõe um conjunto de direcionamentos teórico-metodológicos para abordar a contemporânea interface entre desmatamento e urbanização.

Palavras-chave:
Tecido urbano; uso e cobertura da terra; teoria social crítica

Abstract

The urban becomes fundamental in the reconciliation of environmental issues given the current global urbanization. This study aims to pursue guidelines for developing a methodological approach that enlightens the relations between deforestation and urbanization in the Amazon. Considering the intense urban transition undergoing in the region, a systematic review was conducted to understand the state of knowledge and challenges of this scope. The analysis highlighted four investigative perspectives with relevant contributions, which could be better articulated with adjustments in the analysis system, an urban conceptual reformulation, and also with variables sensitive to socio-spatial dynamics. Approaches to social theory of mobility and risk have supported the design of an urban critical theory in line with the multidimensionality and transscalarity of the urban fabric socio-landscapes. By adding analytical perspectives from the spatial demography field, the study presents a theoretical-methodological framework to approach the contemporary interface between deforestation and urbanization.

Keywords:
Urban fabric; land use and cover; critical social theory

Resumen

Lo urbano se vuelve fundamental en la reconciliación de los problemas ambientales dada la actual urbanización global. Este estudio tiene como objetivo buscar un enfoque metodológico que ilumine las relaciones entre la deforestación y urbanización en la Amazonía. Se realizó una revisión sistemática para comprender el estado del conocimiento y los desafíos de este alcance. El análisis destacó cuatro perspectivas de investigación con contribuciones relevantes, que podrían articularse mejor con ajustes en el sistema de análisis, una reformulación conceptual de lo urbano y con variables sensibles a la dinámica socioespacial. Los enfoques de la teoría social de la movilidad y el riesgo apoyan la concepción de una teoría crítica urbana consistente con la multidimensionalidad y transescalaridad de las configuraciones socio-paisajísticas del tejido urbano. Se presenta un marco teórico-metodológico con la perspectiva analítica de la demografía espacial para comprender la interfaz contemporánea entre la deforestación y la urbanización.

Palabras-clave:
Tejido urbano; uso y cobertura del suelo; teoría social crítica

Introdução

O papel que a Amazônia desempenha na manutenção dos serviços ecológicos projeta este bioma à uma escala de relevância global (ALENCAR et al., 2004ALENCAR, A. et al. Desmatamento na Amazônia: indo além da emergência crônica. Manaus: IPAM, 2004.; BECKER, 2005BECKER, B. Geopolítica da Amazônia. Estudos Avançados, São Paulo, v. 19, n. 53, p. 71-86, abr. 2005.; RAMOS, 2001). No âmbito nacional, sua dinâmica hidrológica influencia no regime de chuvas de outras partes do país, processo descrito pela teoria dos rios voadores (VIANA, 2011VIANA, V. A Amazônia e o interesse nacional. Política Externa, São Paulo, v. 19, n. 4, 2011.). No plano global, assume um papel preponderante no cenário das mudanças climáticas pelo estoque de carbono presente em sua cobertura vegetal e no solo (KISSINGER; HEROLD; DE SY, 2012KISSINGER, G.; HEROLD, M.; DE SY, V. Drivers of deforestation and forest degradation. A synthesis report for REDD+ Policymakers, v. 48, Vancouver: Lexame Consulting, 2012.; NOBRE; SAMPAIO; SALAZAR, 2007NOBRE, C. A.; SAMPAIO, G.; SALAZAR, L. Mudanças climáticas e Amazônia. Ciência e Cultura, Campinas, v. 59, n. 3, p. 22-27, 2007.). Por estas, e outras razões de ordem ambiental e econômica, a Amazônia desperta interesses diversos e ganha espaço proeminente nas discussões mundiais que tangenciam os impactos causados pelas atividades humanas, com destaque o desmatamento florestal.

O desmatamento é, talvez, o desafio de maior relevância e complexidade no debate sobre conciliação entre conservação e desenvolvimento regional na Amazônia. Com a implementação do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento Legal (PPCDAm) pelo Governo Federal1 1 - Programa do Governo Federal que propõe ações concentradas principalmente na região do Arco do Desmatamento e que se articulam em três grandes eixos temáticos: Ordenamento Fundiário e Territorial, Monitoramento e Controle Ambiental e Fomento às Atividades Produtivas Sustentáveis. , em 2004, a taxa de desmatamento na região caiu significativamente, segundo dados do Sistema de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal (PRODES/INPE). A principal redução ocorreu na primeira fase do programa (2004 - 2008) impulsionada pela criação de Unidades de Conservação e Terras Indígenas. Desde 2014, quando o desmatamento atingiu seu menor valor, especula-se uma retomada de crescimento nas taxas anuais, conforme indica os dados do PRODES/INPE ilustrados no gráfico na Figura 1 - e reforçados pelo balanço mensal de alerta de desmatamento pelo sistema Deter do INPE (INPE, 2020).

Assim como a contenção do desmatamento exigiu ações coletivas e em diferentes esferas de atuação, a intensificação das taxas de desmatamento resulta também de um amplo conjunto de forças e de contextos geográficos e históricos (BARRETO; ARAÚJO, 2012BARRETO, P.; ARAÚJO, E. O Brasil atingirá sua meta de redução do desmatamento? Belém: Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, 2012.; BRASIL, 2009). O atual cenário político-governamental, algumas medidas legais (como a chamada lei da grilagem), a baixa atividade econômica geral do país, os preços de commodities (como soja e carne bovina) e a taxa de câmbio da moeda brasileira em relação ao dólar dos EUA foram alguns pontos sugeridos por Fearnside (2019FEARNSIDE, P. M. Os números do desmatamento são reais apesar da negação do presidente Bolsonaro. Amazônia Real, Manaus, 02 ago. 2019, Disponível em: <https://amazoniareal.com.br/os-numeros-do-desmatamento-sao-reais-apesar-da-negacao-do-presidente-bolsonaro/>. Acesso em: 15 ago. 2019.
https://amazoniareal.com.br/os-numeros-d...
) para explicar a recente retomada do desmatamento.

A compreensão sobre os fatores e atores envolvidos no desmatamento e as formas que sinergicamente agem requer distintas abordagens investigativas e fundamentações disciplinares, dada sua transescalaridade e interdisciplinaridade (GEIST; LAMBIN, 2001GEIST, H. J.; LAMBIN, E. F. What drives tropical deforestation? A meta analysis of proximate and underlying causes of deforestation based on subnational case study evidence. Louvain-la-Neuve: LUCC Report Series, v.4, p.116, 2001.; MORAN; BRONDÍZIO, 1998MORAN, E. F.; BRONDÍZIO, E. S. Land use after deforestation in Amazon. In: LIVERMAN, D.; RINDUFUSS, R.; STERN, P. (Eds.). People and Pixel: Liking Remote Sensing and Social Science. Washigton: National Academics Press, 1998. p. 94-120.; TURNER; LAMBIN; REENBERG, 2007TURNER, B. L.; LAMBIN, E. F.; REENBERG, A. The emergence of land change science for global. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, v. 104, n. 52, p. 20666-20672, 2007.). Os estudos científicos tendem a priorizar narrativas regionais pautadas em fatores político-econômicos (CÔRTES; D’ANTONA, 2014CÔRTES, J. C.; D’ANTONA, Á. O. Dinâmicas no uso e cobertura da terra - perspectivas e desafios da Demografia. Revista Brasileira de Estudos de População, Belo Horizonte, v. 31, n. 1, p. 191-210, 2014.), ofuscando diferenças inter e intra regionais, assim como as motivações pessoais (MORAN; BRONDÍZIO; BATISTELLA, 2008). O fomento às ações de conservação florestal e controle do desmatamento requer um olhar abrangente do fenômeno, que seja sensível às questões socioculturais dos agentes envolvidos e que incorpore a percepção local onde as decisões se materializam, sem desconsiderar contextos estruturados pela urbanização.

Figura 1
Série temporal das taxas de desmatamento anual na Amazônia Legal (1994 - 2019), com destaque o período pós implementação do PPCDAm.

A condição urbana é o fator central em qualquer discussão ambiental na atualidade (SASSEN, 2009SASSEN, S. Cities are at the center of our environmental future. SAPI EN S. Surveys and Perspectives Integrating Environment and Society, n. 2.3, 2009.). Observar os processos transformativos rurais a partir de uma concepção autônoma de ruralidade é uma estratégia defasada, consentindo que são construções sociopaisagisticas interligadas às dinâmicas sociais e materiais situadas nos conglomerados urbanos (CÔRTES et al., 2020; SASSEN, 2009). Apesar de ser considerada uma floresta urbanizada (BECKER, 2013BECKER, B. A Urbe Amazônida. Rio de Janeiro: Garamond, 2013.), há pouco consenso sobre as interações entre o processo de urbanização e as mudanças no uso e cobertura da terra na Amazônia.

Reconhecendo esta lacuna, o objetivo do estudo é buscar diretrizes teórico-conceituais que apontem para a construção de uma abordagem metodológica capaz de explicitar a interface entre urbanização e desmatamento. Para isso, realizou-se uma revisão sistemática da literatura para o levantamento do estado de conhecimento do tema, obtendo como resultado os avanços e concordâncias entre os campos de estudo, e destacando os desafios que são originários de uma concepção ainda antagônica do rural-urbano e das premissas nas construções do sistema de análise. A partir de uma reflexão teórica sobre a redefinição desses espaços e suas lógicas relacionais, construiu-se um conjunto de direcionamentos que entrelaça diálogos entre estudos urbanos e a teoria social crítica oferecendo uma orientação para novas investigações empíricas no âmbito do campo das mudanças no uso e cobertura da terra.

A floresta urbanizada: transição urbana na Amazônia

O Fundo de População das Nações Unidas, a agência de desenvolvimento internacional da ONU que trata de questões populacionais, tem reforçado que a urbanização é o componente de maior influência no desenvolvimento dos países atualmente (ONU, 2014). Segundo a teoria da transição urbana (SKELDON, 1990SKELDON, R. Population Mobility in Developing Countries. London and New York: Belhaven Press, 1990.), a urbanização se processa pela passagem gradual da população de predominantemente rural para urbana, um fenômeno intrínseco das sociedades em desenvolvimento econômico e, portanto, previsto a ocorrer inexoravelmente de forma global (MARTINE; MCGRANAHAN, 2013MARTINE, G.; MCGRANAHAN, G. The legacy of inequality and negligence in Brazil’s unfinished urban transition: lessons for other developing regions. International Journal of Urban Sustainable Development, v. 5, n. 1, p. 7-24, 2013.; MONTGOMERY et al., 2003MONTGOMERY, M. R. et al. Cities Transformed : Demographic Change and Its Implications in the Developing World. Washigton DC: National Academics Press, 2003.).

A análise nos diferentes contextos históricos e geográficos comprova que a urbanização se intensifica ao longo do tempo, encurtando o período de transição da sociedade rural-agrícola para urbana-industrial (ALPHAN, 2003ALPHAN, H. Land-use Change and Urbanization of Adana, Turkey. Land Degradation & Development, v. 14, n. September, p. 575-586, 2003.; COHEN, 2004COHEN, B. Urban Growth in Developing Countries: A Review of Current Trends and a Caution Regarding Existing Forecasts. World Development, v. 32, n. 1, p. 23-51, 2004.; MARTINE; MCGRANAHAN, 2010aMARTINE, G.; MCGRANAHAN, G. Brazil’s early urban transition: what can it teach urbanizing countries? Londres: IIED, 2010a.; ONU, 2014). Ponderando as especificidades de cada país, a população mundial já é majoritariamente urbana desde 2007 (MARTINE; MCGRANAHAN, 2010a, 2010b). No Brasil, essa transição ocorreu durante a década de 1960 e conforme mostra os dados de 2017, 85% da população brasileira vive em áreas urbanas (PNAD, 2017). O país é reconhecido por uma transição urbana precoce e uma das mais aceleradas da história mundial (MARTINE; MCGRANAHAN, 2010a).

Na região Norte do país, a transição urbana iniciou-se mais tardiamente em comparação com o eixo sul-sudeste do país. Enquanto o Brasil atingiu o grau de urbanização superior à 50% ao longo da década de 1960 (impulsionada pela região Sudeste), a região em que se insere o bioma amazônico só se tornou majoritariamente urbana no fim da década de 1970 (Figura 2). Em 2010, a população urbana na região Norte representava 73% do total, a menor proporção no país ao lado da região Nordeste, entretanto, com a maior taxa de crescimento da população urbana (IBGE 2010). Este panorama evidencia a intensidade da urbanização na região e sugere haver uma trajetória significativa ainda a percorrer, fortalecendo a necessidade do planejamento urbano regional.

Para Corrêa (1987CORRÊA, R. L. A periodização da rede urbana da Amazônia. Revista Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro, v. 49, n. 3, p. 39-68, 1987.), a rede urbana na Amazônia pode ser descrita em sete momentos, tendo como caráter discriminatório as formações econômicas do contexto. São elas: 1) a fundação de Belém em 1616 pelos portugueses como início do controle defensivo do território; 2) a criação das aldeias missionários e o extrativismo das drogas do sertão com exploração do trabalho indígena (1655 a 1750); 3) introdução da agricultura comercial e a transformação de aldeia em vilas, como por exemplo Aveiro e Santarém (1755 a 1778); 4) estagnação econômica da região e da vida urbana (1778 a 1850); 5) o “boom” econômico da borracha e valorização da economia regional com introdução da navegação a vapor e migração nordestina (1850 a 1920); 6) crise da produção da borracha e consequente estagnação econômica da região (1920 a 1960); 7) redefinição do papel da região na divisão territorial do trabalho e sua incorporação ao processo geral de expansão capitalista no país (a partir de 1960).

Figura 2
Série temporal do grau de urbanização e do crescimento da população urbana segundo as Grandes Regiões do Brasil, 1950 - 2010

Até 1960 a urbanização se estruturava em uma rede dentrítica orientada por uma lógica fluvial, com cidades estrategicamente localizadas para conquista e defesa - remetendo ao processo de colonização. Neste período, a região continha duas importantes referências urbanas, Manaus e Belém, um elevado número de pequenos núcleos e a ausência de centros intermediários (KAMPEL; CAMARA; MONTEIRO, 2001KAMPEL, S. A.; CAMARA, G.; MONTEIRO, A. M. V. Análise espacial do processo de urbanização na Amazônia. Relatório Técnico Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, São José dos Campos: INPE, v.15, 2001.; PEREIRA, 2006PEREIRA, J. C. M. P. A urbanização da Amazônia e o papel das cidades médias na rede urbana regional. In: CARDOSO, J. C. M. (Ed.). O rural e o urbano na Amazônia: diferentes olhares em perspectivas. Belém: EDUFPA, 2006. p. 23-52.). A transição para uma rede complexa regional ocorreu após 1960, acompanhada por uma mudança de natureza e significado da rede urbana sendo, portanto, um marco temporal da urbanização amazônica (BECKER, 1985BECKER, B. Fronteira e urbanização repensadas. Revista Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro, n. 3/4, p. 357-372, 1985., 1995; BROWDER, 2003BROWDER, J. O. The urban-rural interface: Urbanization and tropical forest cover change. Urban Ecosystems, v. 6, p. 21-41, 2003.; BROWDER; GODFREY, 1997; HOGAN; D’ANTONA; CARMO, 2008HOGAN, D. J.; D’ANTONA, Á. O.; CARMO, R. DO. Dinâmica demográfica recente da Amazônia. In: BATISTELLA, M.; MORAN, E. F.; ALVES, D. (Eds.). Amazônia natureza: sociedade em transformação. São Paulo: Edusp, 2008. p. 71-116.; KAMPEL; CAMARA; MONTEIRO, 2001).

A urbanização foi parte dos planos de ocupação da fronteira agrícola na década de 1960, considerada uma das vertentes estratégicas para a rápida ocupação da região almejada pelo governo militar em vigência (BECKER, 2001BECKER, B. Revisão das políticas de ocupação da Amazônia: é possível identificar modelos para projetar cenários? Parcerias estratégicas, Brasília, v. 6, n. 12, p. 135-159, 2001., 2013). A presença definitiva do Estado através de um conjunto de intervenções, instituições e ideologias, compunham políticas de migração, atraindo pessoas principalmente da região Nordeste do país. Os projetos de colonização tinham como propósito promover os lotes individuais aos pequenos produtores, mas também a formação de agrovilas considerados núcleos urbanos (MELLO, 2006MELLO, N. Políticas territoriais da Amazônia. São Paulo: Editora Annablume, 2006.) - muitas assumindo posteriormente a função de centros regionais (HOGAN; D’ANTONA; CARMO, 2008HOGAN, D. J.; D’ANTONA, Á. O.; CARMO, R. DO. Dinâmica demográfica recente da Amazônia. In: BATISTELLA, M.; MORAN, E. F.; ALVES, D. (Eds.). Amazônia natureza: sociedade em transformação. São Paulo: Edusp, 2008. p. 71-116.; MELLO, 2006; MORAN, 1981MORAN, E.F. Developing the Amazon. Indiana: Indiana University Press, 1981.).

Assim, a fronteira urbana promoveu inicialmente a dispersão de pequenas aglomerações e o isolamento destas da vida urbana nas capitais estaduais, e posteriormente, ao longo da década de 70, a formação das regiões metropolitanas e aparecimento de novos adensamentos populacionais (CASTRO, 2006CASTRO, E. Prefácio. In: CARDOSO, A. C. (Ed.). O rural e o urbano na Amazônia: diferentes olhares em perspectivas. Belém: EDUFPA, 2006. p. 215.; KAMPEL; CAMARA; MONTEIRO, 2001KAMPEL, S. A.; CAMARA, G.; MONTEIRO, A. M. V. Análise espacial do processo de urbanização na Amazônia. Relatório Técnico Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, São José dos Campos: INPE, v.15, 2001.; MELLO, 2006MELLO, N. Políticas territoriais da Amazônia. São Paulo: Editora Annablume, 2006.; PEREIRA, 2006PEREIRA, J. C. M. P. A urbanização da Amazônia e o papel das cidades médias na rede urbana regional. In: CARDOSO, J. C. M. (Ed.). O rural e o urbano na Amazônia: diferentes olhares em perspectivas. Belém: EDUFPA, 2006. p. 23-52.). De um lado, grandes centros antigos, como Manaus e Belém, cresceram em termos de volume populacional pelo adensamento e espraiamento do centro urbano, por outro, surgiram pequenos municípios em áreas antes com floresta ou vilas rurais isoladas, como Brasil Novo e Medicilândia (BECKER, 1985BECKER, B. Fronteira e urbanização repensadas. Revista Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro, n. 3/4, p. 357-372, 1985.; HOGAN; D’ANTONA; CARMO, 2008HOGAN, D. J.; D’ANTONA, Á. O.; CARMO, R. DO. Dinâmica demográfica recente da Amazônia. In: BATISTELLA, M.; MORAN, E. F.; ALVES, D. (Eds.). Amazônia natureza: sociedade em transformação. São Paulo: Edusp, 2008. p. 71-116.).

Atualmente a estrutura urbana na Amazônia já é caracterizada pela predominância dos municípios médios, mas ainda mantêm a baixa conectividade e distribuição dispersa (PEREIRA, 2006PEREIRA, J. C. M. P. A urbanização da Amazônia e o papel das cidades médias na rede urbana regional. In: CARDOSO, J. C. M. (Ed.). O rural e o urbano na Amazônia: diferentes olhares em perspectivas. Belém: EDUFPA, 2006. p. 23-52.). Num processo de convergência com os padrões nacionais, a região da Amazônia se torna cada vez mais um território urbano com predominância do tipo migratório urbano-urbano (HOGAN; D’ANTONA; CARMO, 2008HOGAN, D. J.; D’ANTONA, Á. O.; CARMO, R. DO. Dinâmica demográfica recente da Amazônia. In: BATISTELLA, M.; MORAN, E. F.; ALVES, D. (Eds.). Amazônia natureza: sociedade em transformação. São Paulo: Edusp, 2008. p. 71-116.). Apesar de expressiva característica, a compreensão do que a transição urbana significa no âmbito do desmatamento ainda é pouco esclarecida (CÔRTES; D’ANTONA, 2014CÔRTES, J. C.; D’ANTONA, Á. O. Dinâmicas no uso e cobertura da terra - perspectivas e desafios da Demografia. Revista Brasileira de Estudos de População, Belo Horizonte, v. 31, n. 1, p. 191-210, 2014.; DEFRIES et al., 2010DEFRIES, R. S. et al. Deforestation driven by urban population growth and agricultural trade in the twenty-first century. Nature Geoscience, v. 3, n. 3, p. 178-181, 2010.).

Desmatamento e urbanização: uma revisão sistemática da literatura

As áreas urbanas ainda são pouco abarcadas nos estudos de mudança no uso e na cobertura da terra, o que colabora com a compreensão ainda limitada das relações entre urbanização e desmatamento nas discussões no âmbito da Land Change Science (MORAN, 2010MORAN, E. F. Environmental social science: human-environment interactions and sustainability. New Jersey: John Wiley & Sons, 2010.; CÔRTES, D’ANTONA, 2014CÔRTES, J. C.; D’ANTONA, Á. O. Dinâmicas no uso e cobertura da terra - perspectivas e desafios da Demografia. Revista Brasileira de Estudos de População, Belo Horizonte, v. 31, n. 1, p. 191-210, 2014.). Com o propósito de apresentar o estado de conhecimento empírico deste escopo científico e identificar as lacunas e desafios inerentes à essas pesquisas, realizou-se uma análise qualitativa do assunto a partir de uma revisão sistemática da literatura.

O levantamento dos artigos científicos e trabalhos acadêmicos foi realizado na ferramenta de busca do Google Acadêmico, tendo como recorte temporal o período de 2000 a 2019. O critério primário de seleção foi a inserção no campo científico da Land Change Science, o que resultou na inclusão não só de estudos sobre a relação entre urbanização e desmatamento, mas também outros inseridos no escopo de mudança no uso e cobertura da terra que empregaram o “urbano” em algum componente analítico de sua metodologia. Ao final, foram selecionados 20 artigos publicados em revistas científicas indexadas, quatro trabalhos completos publicados em anais de eventos científicos e duas teses de doutorado, totalizando 26 estudos nacionais e internacionais.

O mecanismo de busca de palavras foi sequencial, em um primeiro momento utilizou-se como raiz de procura o sequenciamento de caracteres urban*, alternando o conjunto de palavras adicionais, por exemplo, desmatamento, floresta, Amazônia, uso da terra; e num segundo momento, a raiz de busca foram palavras do campo da Land Change Science, como uso da terra e desmatamento, tendo como conjunto adicional palavras pertencentes ao campo de estudos urbanos, como cidade, centro urbano e urbanidade - no idioma português e inglês. Em ambas as etapas, a definição para inclusão não foi restrita ao título do trabalho, sendo recorrente a pré-leitura do trabalho para avaliação de elegibilidade. A sistematização das informações decorreu da leitura dirigida desses trabalhos tendo como enfoque os seguintes parâmetros: campo disciplinar, objetivo da pesquisa, abordagem do tema urbano, fonte de dados, variáveis aplicadas e resultados. A análise resultou no agrupamento em quatro grandes grupos de estudos.

Um primeiro ponto observado deste exercício foi a multiplicidade de campos disciplinares. Esta constatação reforça a complexidade da dinâmica do uso e cobertura da terra, um fenômeno essencialmente interdisciplinar. A contribuição dessas frentes é profundamente valiosa na medida em que expõe o fenômeno sobre diferentes óticas, aportes teóricos e métodos de pesquisa específicos de cada disciplina (URIARTE; SCHNEIDER; RUDEL, 2010URIARTE, M.; SCHNEIDER, L.; RUDEL, K. Land transition in the tropics: going beyond the case studies. Biotropica, v. 42, n. 1, p. 1-2, 2010.). No entanto, há pouca integração ou diálogo entre os campos, e quando elementos de outras disciplinas são empregados tem seu potencial de compreensão ou aplicação limitado (CÔRTES; D’ANTONA, 2014CÔRTES, J. C.; D’ANTONA, Á. O. Dinâmicas no uso e cobertura da terra - perspectivas e desafios da Demografia. Revista Brasileira de Estudos de População, Belo Horizonte, v. 31, n. 1, p. 191-210, 2014.). Ainda nesta perspectiva, observou-se o interesse reduzido do campo dos estudos urbanos quanto à temática de uso e cobertura da terra. Quando se debruçam na questão ambiental, estes estudiosos costumam abordar a urbanização do ponto de vista da sustentabilidade e mudanças climáticas - ainda que o desmatamento e uso da terra estejam diretamente associados a estas dimensões.

A análise qualitativa final dos 26 estudos mostrou dois grandes grupos que divergem na tratativa do fenômeno urbano nos seus objetivos de investigação. O primeiro grupo estuda os efeitos das mudanças demográficas no uso e cobertura da terra na propriedade, na qual a urbanização é apenas um elemento secundário no sistema de análise para o ajuste dos modelos testados. Já o segundo grupo trabalha a urbanização como o objeto de estudo da pesquisa, explicitamente buscando estabelecer a relação entre urbanização e o uso e cobertura da terra na região de análise.

Com relação ao primeiro grupo, uma característica marcante refere-se ao nível micro da escala da análise. Estes trabalhos são resultados de pesquisas com aplicação de questionários na região da Pan-Amazônia e são conduzidos por pesquisadores inseridos principalmente na Demografia, variando suas formações de base. Por meio de levantamentos sociodemográficos, as mudanças ambientais que ocorrem no nível da propriedade rural são analisadas a partir de fatores correlatos ao ciclo de vida pessoal e domiciliar, que ajustados aos fatores contextuais político-econômicos, permitem abordar as tomadas de decisões do indivíduo e suas motivações pessoais e familiares.

Parte destes estudos propõe compreender como as mudanças na composição e estrutura populacional no domicílio afetam os padrões de uso e cobertura da terra na propriedade - Modelo do Ciclo de Vida Domiciliar2 2 - O fundamento teórico do modelo é a relação trabalho x consumo e sua variação ao longo do tempo em resposta ao número de crianças, adultos e idosos. Cada estágio da trajetória domiciliar teria uma disponibilidade de força laboral e uma demanda de consumo influenciando na área cultivada da propriedade e no tipo de cultura (WALKER et al., 2002). . Buscando atender as múltiplas dimensões que se imbricam neste sistema, os modelos estatísticos são compostos pelas variáveis endógenas (características populacionais do domicílio) e as variáveis exógenas (contexto político e econômico). Uma das variáveis exógenas aplicadas é a integração com o mercado, sendo que o indicador construído para esta dimensão é “distância do centro urbano mais próximo”. Os resultados encontrados são bastante consistentes, todos os estudos que aplicaram essa variável mostraram que a proporção de floresta na propriedade aumenta quanto mais distante estiverem do centro urbano. Outras classes de uso da terra também indicaram relação significativa: positiva com as culturas anuais e negativa com as culturas perenes e pastagem (CALDAS et al., 2003CALDAS, M. M. et al. Ciclo de vida da família e desmatamento na Amazônia: combinando informações de sensoriamento remoto com dados primários. Revista Brasileira de Economia, São Paulo, v. 57, n. 4, p. 683-711, 2003.; CÔRTES, 2017CÔRTES, J. C. Ciclo de vida familiar e distribuição populacional na dinâmica do desmatamento e uso da terra na Amazônia paraense. 2017. Tese (Doutorado em Demografia) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 2017.; GUEDES, 2010GUEDES, G. R. Ciclo de vida domiciliar , ciclo do lote e mudança no uso da terra na Amazônia Rural Brasileira - um estudo de caso para Altamira , Pará. 2010. Tese (Doutorado em Demografia) - Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 2010.; GUEDES et al., 2011; PERZ, 2003PERZ, S. G.; SKOLE, D. L. Secondary forest expansion in the Brazilian Amazon and the refinement of forest transition theory. Society and Natural Resources, v. 16, p. 277-294, 2003.; PERZ; WALKER; CALDAS, 2006; WALKER et al., 2002)

O outro segmento dos estudos microescalares busca compreender os efeitos das migrações na configuração paisagística da propriedade - para o propósito deste trabalho, apresentou-se os resultados correlatos ao tipo migratório rural-urbano apenas. Nestas abordagens investigativas a urbanização é uma narrativa que circunstância as motivações pessoais e familiares, sendo, portanto, tratada como uma zona de absorção populacional na qual os indivíduos ou grupos são aliciados pelo conjunto de fatores de atratividade migratória, como mercado de trabalho, acesso à educação e serviços, outros.

O trabalho na Amazônia peruana mostrou que a migração feminina para os centros urbanos estaria associada à redução de floresta na propriedade, enquanto que para os homens este tipo migratório estaria relacionado com a expansão da pastagem (BARBIERI; CARR, 2004BARBIERI, A. F.; CARR, D. L. Gender-specific out-migration, deforestation and urbanization in the Ecuadorian Amazon. Global and Planetary Change, v. 47, n. 2, p. 99-110, 1 jul. 2004.). Na Amazônia brasileira, por sua vez, o estudo obteve relação significativa da migração rural-urbana com o sistema de produção de alto valor, como culturas perenes e pastagem (VANWEY; GUEDES; D’ANTONA, 2011VANWEY, L. K.; GUEDES, G. R.; D’ANTONA, A. O. Out-migration and land-use change in agricultural frontiers: insights from Altamira settlement project. Population and Environment, v. 34, p. 44-69, 2011.). Em ambos estudos, há hipóteses quanto as forças de causalidade, que reforçam a existência de relação entre decisões migratórias e padrões paisagísticos da propriedade. Outros estudos, de maior interface com as Ciências Naturais, investigam a capacidade de regeneração florestal após o abandono da propriedade ou das atividades em detrimento da migração do grupo familiar para centros urbanos. Tendo como arcabouço teórico a Teoria da Transição Florestal3 3 - A teoria prevê a recuperação da cobertura florestal à medida em que as sociedades passam por um desenvolvimento econômico caracterizado pela industrialização e urbanização - uma transição da econômica com base o setor primário (extrativismo, agropecuária e mineração) para a industrial com predomínio do setor de serviços (RUDEL et al., 2005). , a regeneração florestal não mostrou estar associada com a migração do tipo rural-urbana, mas relacionada com as características sociodemográficas e ambientais da própria propriedade (BARBIERI; CARR; BILSBORROW, 2009; GRAY; BILSBORROW, 2014GRAY, C. L.; BILSBORROW, R. E. Land use policy consequences of out-migration for land use in rural Ecuador. Land Use Policy, v. 36, p. 182-191, 2014.; PERZ; SKOLE, 2003PERZ, S. G.; SKOLE, D. L. Secondary forest expansion in the Brazilian Amazon and the refinement of forest transition theory. Society and Natural Resources, v. 16, p. 277-294, 2003.; RUDEL et al., 2005RUDEL, T. K. et al. Forest transitions: towards a global understanding of land use change. Global Environmental Change, v. 15, n. 1, p. 23-31, 2005.; RUDEL; BATES; MACHINGUIASHI, 2002).

Com relação ao segundo tipo de frente investigativa, que busca a compreensão dos efeitos da urbanização nas florestas, as fontes de dados são secundárias e agregadas em nível municipal, regional ou continental. Com maior interface nas Ciências Naturais, os estudos correlacionais trabalham a associação entre o desmatamento e alguns indicadores sintéticos de urbanização, como grau de urbanização e taxa de crescimento populacional. Os resultados encontrados não são generalistas pelas variações no contexto regional, além de estatisticamente frágil, o que evidencia a complexidade eminente desta relação (ALPHAN, 2003ALPHAN, H. Land-use Change and Urbanization of Adana, Turkey. Land Degradation & Development, v. 14, n. September, p. 575-586, 2003.; DAL´ASTA et al., 2012DAL´ASTA, A. P. et al. Evolução recente da população urbana comparada à evolução do desmatamento nos municípios do Distrito Florestal Sustentável da BR-163. In: XVIII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, 2012, Aguas de Lindóia.. Anais...Águas de Lindóia: ABEP, 2012.; DEFRIES et al., 2010DEFRIES, R. S. et al. Deforestation driven by urban population growth and agricultural trade in the twenty-first century. Nature Geoscience, v. 3, n. 3, p. 178-181, 2010.; DENG et al., 2009DENG, J. S. et al. Spatio-temporal dynamics and evolution of land use change and landscape pattern in response to rapid urbanization. Landscape and Urban Planning, v. 92, n. 3-4, p. 187-198, 2009.; HIRYE; DAL´ASTA; MOREIRA, 2013HIRYE, M. C. DE M.; DAL´ASTA, A. P.; MOREIRA, M. A. Análise da cobertura da terra no entorno da sede municipal de Altamira e de Santarem, no período de 1990 a 2010, através de imagens TM/Landsat. In: XVI Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, 2013, Foz do Iguaçu. Anais...Foz do Iguaçu: INPE, 2013.; JORGENSON; BURNS, 2007JORGENSON, A. K.; BURNS, T. J. Effects of Rural and Urban Population Dynamics and National Development on Deforestation in Less-Developed Countries, 1990-2000. Sociological Inquiry, v. 77, n. 3, p. 460-482, 2007.; KALNAY; CAI, 2003KALNAY, E.; CAI, M. Impact of urbanization and land-use change on climate. Nature, v. 423, p. 528-531, 2003.).

O trabalho de DeFries e colegas (2010) analisou o efeito do crescimento da população urbana nos blocos continentais dos países em desenvolvimento. Embora tenham encontrado uma associação positiva entre a taxa de crescimento da população urbana e o desmatamento anual, há significativa variação entre as regiões de análise. Especificamente nos países latino-americanos, a associação mostra que o grupo de países que cresceu na faixa de 2 a 3,5% ao ano teve variação de 85% nos valores de desmatamento anual. Na discussão conclusiva, sugerem que o desmatamento estaria mais associado às demandas por agricultura no urbano e no mercado internacional do que pela dinâmica da população urbana.

Especificamente para a Amazônia brasileira, um estudo interdisciplinar confirmou que a relação entre desmatamento e urbanização não está bem definida (KAMPEL; CAMARA; MONTEIRO, 2001KAMPEL, S. A.; CAMARA, G.; MONTEIRO, A. M. V. Análise espacial do processo de urbanização na Amazônia. Relatório Técnico Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, São José dos Campos: INPE, v.15, 2001.). A análise do desmatamento nos municípios Distrito Florestal Sustentável da BR1634 4 - Complexo geoeconômico e social determinado em 2006 pelo Governo Federal com a finalidade de implantação de políticas públicas de estímulo ao desenvolvimento integrado com a atividade de base florestal. A área, localizada no oeste do Estado do Pará, abrange 190 mil km2, compreendendo integralmente ou parcialmente 13 municípios. mostrou que dinâmica urbana reflete diretamente nas taxas de desmatamento, mas dada a heterogeneidade da área de estudo não é possível estabelecer uma relação causal (DAL´ASTA et al., 2012DAL´ASTA, A. P. et al. Evolução recente da população urbana comparada à evolução do desmatamento nos municípios do Distrito Florestal Sustentável da BR-163. In: XVIII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, 2012, Aguas de Lindóia.. Anais...Águas de Lindóia: ABEP, 2012.). Buscando padrões espaço-temporais da urbanização e do desmatamento no estado do Pará, um estudo multiescalar reafirmou a complexidade de se estabelecer relações conclusivas entre estes dois fenômenos (RIBEIRO et al., 2019RIBEIRO, R. M. et al. Os processos de urbanização e conversão florestal na Amazônia paraense - um estudo multiescalar. Revista Brasileira de Estudos de População, Belo Horizonte, v. 35, n. 3, p. 1-3, 2019.).

Enquanto os estudos correlacionais com ênfase nos indicadores agregados buscam a relação causal entre urbanização e desmatamento, os estudos geoespaciais utilizam ferramentas computacionais para analisar as dinâmicas espaciais da expansão urbana, portanto, enfocando nos atributos físicos da caracterização do espaço urbano. Na comunidade de sensoriamento remoto a grande maioria das abordagens urbanas volta-se para uma discussão de planejamento urbano, abstendo do debate sobre desmatamento propriamente (MORAN, 2010MORAN, E. F. Environmental social science: human-environment interactions and sustainability. New Jersey: John Wiley & Sons, 2010.). Um dos pontos trazidos para discussão é a constatação de que as zonas urbanas avançam nas áreas prioritárias para produção de alimentos (ALPHAN, 2003ALPHAN, H. Land-use Change and Urbanization of Adana, Turkey. Land Degradation & Development, v. 14, n. September, p. 575-586, 2003.; DENG et al., 2009DENG, J. S. et al. Spatio-temporal dynamics and evolution of land use change and landscape pattern in response to rapid urbanization. Landscape and Urban Planning, v. 92, n. 3-4, p. 187-198, 2009.; HEROLD; GOLDSTEIN; CLARKE, 2003HEROLD, M.; GOLDSTEIN, N. C.; CLARKE, K. C. The spatiotemporal form of urban growth: measurement, analysis and modeling. Remote Sensing of Environment, v. 86, n. 3, p. 286-302, 2003.; TANG; WANG; YAO, 2007TANG, J.; WANG, L.; YAO, Z. Spatio‐temporal urban landscape change analysis using the Markov chain model and a modified genetic algorithm. International Journal of Remote Sensing, v. 28, n. 15, p. 3255-3271, 2007.). Há uma associação entre aumento da área urbana e redução das áreas de agricultura e pastagem no seu entorno (HEROLD; GOLDSTEIN; CLARKE, 2003).

Na Amazônia brasileira, os estudos geoespaciais reforçam que a expansão urbana não tem um efeito significativo na cobertura florestal - mas sim em outros usos da terra. Em Altamira, a expansão urbana promoveu a fragmentação florestal e definiu o padrão espacial dos remanescentes ao longo das rodovias. Em Santarém, onde a urbanização é mais consolidada e antiga, o aumento da área urbana ocorreu pelo surgimento de adensamentos populacionais associados à expansão da soja em outras localidades do município - decorrência do rearranjo espacial interno da população (CÔRTES, 2012CÔRTES, J. C. Mobilidade e redistribuição populacional em Santarém, Pará: recente reconfiguração do meio rural na Amazônia. 2012. Dissertação (Mestrado em Demografia) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 2012.; DAL´ASTA et al., 2013DAL´ASTA, A. P. et al. Evolução do arranjo espacial urbano e das terras agrícolas no entorno de Santarém (Pará) no período de 1990 a 2010: Uma análise integrada baseada em sensoriamento remoto e espaços celulares. In: XVI Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, 2013, Foz do Iguaçu. Anais...Foz do Iguaçu: INPE, 2013.; HIRYE; DAL´ASTA; MOREIRA, 2013HIRYE, M. C. DE M.; DAL´ASTA, A. P.; MOREIRA, M. A. Análise da cobertura da terra no entorno da sede municipal de Altamira e de Santarem, no período de 1990 a 2010, através de imagens TM/Landsat. In: XVI Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, 2013, Foz do Iguaçu. Anais...Foz do Iguaçu: INPE, 2013.). Outra análise realizada na região oeste do Pará reforçou que a proporção de floresta convertida em área urbana é baixa, e que a expansão da urbanização ocorre sobretudo em áreas de pastagem (CÔRTES, 2017).

A Figura 3 sintetiza como o urbano é tratado nos componentes teóricos e analíticos dos grupos de estudo considerados na revisão sistemática. Os estudos geoespaciais mostram-se importantes por realçar o urbano como uma classe de uso da terra, portanto, situando a urbanização também como um produto do sistema da mudança no uso e cobertura da terra. Ao mesmo tempo, mostra que o avanço desta classe não explica o desmatamento, tendo em vista que a urbanização avança sobretudo em áreas já desmatadas. Essas constatações revelam como a relação entre os dois fenômenos é complexa e impraticável de se compreender pela via do nexo causal. E por isso a dificuldade em se obter resultados satisfatórios nos estudos correlacionais, que buscam responder como a dinâmica populacional da urbanização promove o desmatamento, ao invés de concebê-los como resultantes de um único panorama demográfico, compartilhando dos mesmos fatores e processos.

Figura 3
Análise da revisão sistemática dos estudos sobre urbanização no âmbito da mudança no uso e cobertura da terra destacando como os componentes urbanos são tratados nas pesquisas e os seus resultados

As causas imediatas5 5 - No sistema de análise da Land Change Science as causas imediatas correspondem às ações locais que alteram o ambiente físico, sendo condições concretas de transformação (GEIST; LAMBIN, 2001). majoritárias do desmatamento estão correlatas às atividades agropecuárias - e não ao aumento da classe urbana. A interface entre a urbanização e desmatamento perpassa por este plano, tal que o grau de conexão com o urbano seja o elemento norteador da expansão das atividades agropecuárias - o tipo de cultura agrícola, a área cultivada, a intensidade de incremento. Os estudos do ciclo domiciliar provam que ocorre essa associação de maneira espacial, constatando que a proximidade da propriedade rural com o centro urbano reduz a área de floresta e aumenta o uso das classes agrícolas. Os estudos migratórios, por sua vez, dão complementariedade a este quadro ao explicitar como ocorrem esses fluxos de informação, capital e material. Esse panorama sugere que o urbano se propaga nas áreas rurais por meio de um processo amplo e flexível de urbanização capaz de perpetuar valores e práticas tendo como fio condutor os fluxos migratórios da população.

Nessa perspectiva, o urbano deixa de ser o adensamento de uma população abstrata e um território limitado, para ser compreendido como um espaço referencial de circulação social e material que conecta ruralidades em contextos de urbanidades num único plano sociopaisagístico. Com relação ao desmatamento, a urbanização atua por meio da propagação dos fatores subjacentes6 6 - No sistema de análise da Land Change Science os fatores subjacentes, que operam nas diversas escalas, são as forças contextuais que determinam a direção e intensidade do uso da terra (GEIST; LAMBIN, 2001). , reproduzindo forças motoras que agem sinergicamente na tomada de decisão e, posteriormente, na materialização da ação, o que a médio-longo prazo pode vir a se converter em uma classe urbana de uso da terra. As conexões e dinamismos deste tecido integro de urbanidades é gerido pela mobilidade populacional e vínculos sociais, assim destacando a importância da dimensão socioespacial da urbanização no âmbito da mudança no uso e cobertura da terra.

A revisão sistemática da literatura destacou a contribuição das frentes investigativas e identificou três principais fragilidades metodológicas. Quanto ao sistema de análise, urbanização e desmatamento são tratadas a partir do nexo causa e efeito, o que parece ser incoerente tendo em vista que o espaço urbano é ao mesmo tempo força motora e produto da mudança no uso e cobertura da terra. Com relação as variáveis de referência urbana, os dados e indicadores empregados nos estudos são expressões excludentes dos espaços, reproduzindo a visão antagônica do rural e urbano. Por fim, quanto ao contexto conceitual de urbanização, são descrições que reproduzem o urbano unidimensionalmente, dando ênfase aos aspectos político-econômicos ou aos atributos físicos do espaço. Para o enfrentamento destas problemáticas propõe-se revisitar fundamentações teóricas clássicas e contemporâneas sobre produção do espaço urbano para subsidiar uma reconstrução da urbanização como objeto de análise empírico.

Reflexões teóricas e metodológicas: o urbano como objeto de análise

O arcabouço teórico da Transição Urbana oferece inúmeras vantagens para mensuração da urbanização pela facilidade de cálculo e sua comparabilidade no tempo e espaço. As análises se baseiam no tamanho populacional dos municípios, no crescimento da população urbana e no grau de urbanização, oferecendo um valioso panorama para compreender a evolução urbana, os diferenciais entre regiões e projetar cenários no âmbito da transição urbana (MARTINE; MCGRANAHAN, 2014MARTINE, G.; MCGRANAHAN, G. Brazil’s negligent urban transition and its legacy of divided cities. In: MCGRANAHAN, G.; MARTINE, G. (Eds.). Urban Growth in Emerging Economies: Lessons from the BRICS. New York: Routledge, 2014. p. 15-54.). Entretanto, seus instrumentos analíticos consideram a população de maneira unidimensional e se baseiam em zoneamentos definidos por critérios administrativos. Assim, a concepção do espaço urbano passa a ser uma derivação de interesses político-econômico.

No Brasil, os perímetros urbanos são definidos por leis municipais e parâmetros singulares. A demarcação desses espaços são instrumentos fiscais que se orientam por questões político-administrativos, visando por exemplo a determinação das taxas de imposto sobre propriedade e parâmetros para construção de edificações (MOURA; OLIVEIRA; PÊGO, 2018MOURA, R.; OLIVEIRA, S.; PÊGO, B. Escalas da Urbanização Brasileira. Rio de Janeiro: IPEA, 2018.). Esses critérios reduzem o urbano e rural à adjetivos territoriais (ENDLICH, 2006ENDLICH, A. M. Perspectivas sobre o urbano e o rural. In: SPOSITO, M.; WHITACKER, A. (Eds.). Cidade e Campo: relações entre urbano e rural. São Paulo: Expressão Popular, 2006. p. 11-31.) e simplificam a multidimensionalidade do fenômeno ao adotar somente elementos macroestruturais - renegando outras faces do espaço urbano (CÔRTES, 2017CÔRTES, J. C. Ciclo de vida familiar e distribuição populacional na dinâmica do desmatamento e uso da terra na Amazônia paraense. 2017. Tese (Doutorado em Demografia) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 2017.). Essa construção, além de artificial, fomenta a antagônica percepção de rural versus urbano, reforçando a defasada percepção entre rural-campo e urbano-cidade (CÔRTES et al., 2020). As críticas a este modelo dicotômico são vastas e de diferentes frentes disciplinares, havendo pleno consenso científico de sua limitação na representação da complexidade dos espaços (CAIADO; SANTOS, 2003CAIADO, A. S. C.; SANTOS, S. M. M. Fim da dicotomia rural-urbano? Um olhar sobre os processos socioespaciais. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v.17, n.3-4, p. 115-124, 2003.; CASTRO, 2006CASTRO, E. Prefácio. In: CARDOSO, A. C. (Ed.). O rural e o urbano na Amazônia: diferentes olhares em perspectivas. Belém: EDUFPA, 2006. p. 215.; CHAMPION; HUGO, 2003CHAMPION, T.; HUGO, G. Introduction: Moving beyond the Urban-Rural Dichotomy. In: CHAMPION, T.; HUGO, G. (Eds.). New Forms of Urbanization: Beyond the Urban-Rural Dichotomy. New York: Routledge, 2003. p. 3-24.; SILVA, 2003SILVA, J.G. Velhos e novos mitos do rural brasileiro. Estudos Avançados, São Paulo, v.15, n.3, p.37-50, 2003.; WANDERLEY, 2000WANDERLEY, M. N. B. A emergência de uma nova ruralidade nas sociedades modernas avançadas - o “ rural ” como espaço singular e ator coletivo. Estudos Sociedade e Agricultura, Rio de Janeiro, v. 15, p. 87-145, 2000.; UNFPA, 2007).

A produção do espaço urbano resulta de processos sociais, das formas de organização social e econômica, e dos diferentes padrões culturais. Os conceitos, rural e urbano, são portadores de significados que vão além de uma diferenciação espacial da população, elas indicam modos de vida distintos entrelaçadas por relações identitárias com o espaço (“lugar onde se vive”) e com as esferas mais amplas da sociedade (“lugar onde se vê e vive o mundo”) (LEFEBVRE, 1999LEFEBVRE, H. A revolução urbana. Belo Horizonte: UFMG, 1999.; WIRTH, 1997WIRTH, L. O urbanismo como modo de vida. In: FORTUNA, C. (Ed.). Cidade, Cultura e Globalização. Oeiras: Celta, 1997.). A representação do urbano expressa um modo particular de utilização do espaço e de vida social (KAYSER, 1990KAYSER, B. La renaissance rurale. Sociologie des campagnes du monde occidental. Paris: A. Colin, 1990.), e portanto, o urbano não é uniforme em decorrência das diferentes possibilidades de interações, escolhas, contextos e intensidades. Tampouco é um recorte fixo, bem delimitado e com tipologias constantes, mas sim um espaço em pleno movimento, em contínua transformação (MOURA; OLIVEIRA; PÊGO, 2018MOURA, R.; OLIVEIRA, S.; PÊGO, B. Escalas da Urbanização Brasileira. Rio de Janeiro: IPEA, 2018.).

O processo de urbanização ocorre por um conjunto de vetores que condicionam uma zona de transição entre o urbano e o rural onde se processam as transformações dos aspectos físicos e sociais - dissolvendo a nitidez de seus limites (SPOSITO, 2006SPOSITO, M. E. B. A questão cidade-campo: perspectivas a partir da cidade. In: SPOSITO, M. E. B.; WHITACKER, A. (Eds.). Cidade e campo: relações e contradições entre urbano e rural. São Paulo: Expressão Popular, 2006, p.111 - 130.). Da combinação das morfologias material (no sentido da cidade) e social (no sentido do urbano) surge uma nova configuração socioespacial da população (LEFEBVRE, 1999LEFEBVRE, H. A revolução urbana. Belo Horizonte: UFMG, 1999.). Assim, o rural e o urbano se mesclam num processo de convergência de estilos de vida, que marca uma passagem gradual, sem ruptura e sim continua (CHAMPION; HUGO, 2003CHAMPION, T.; HUGO, G. Introduction: Moving beyond the Urban-Rural Dichotomy. In: CHAMPION, T.; HUGO, G. (Eds.). New Forms of Urbanization: Beyond the Urban-Rural Dichotomy. New York: Routledge, 2003. p. 3-24.; WANDERLEY, 2000WANDERLEY, M. N. B. A emergência de uma nova ruralidade nas sociedades modernas avançadas - o “ rural ” como espaço singular e ator coletivo. Estudos Sociedade e Agricultura, Rio de Janeiro, v. 15, p. 87-145, 2000.). Esta ideia se expressa também no conceito de continuum urbano-rural, na qual o polo urbano assume o papel de dissipador de valores e práticas integrando e conectado os extremos por meio de uma escala de intensidades e não de contrastes (MARQUES, 2002MARQUES, M. I. M. O conceito de espaço rural em questão. Terra Livre, São Paulo, v. 18, n. 19, p. 95-112, 2002.; WANDERLEY, 2003).

A distinção entre os espaços rural e urbano não deve ser eliminada, mas suas funções e conteúdos deixam de ser contraditórios para serem constituintes de um tecido urbano (LEFEBVRE, 1999LEFEBVRE, H. A revolução urbana. Belo Horizonte: UFMG, 1999.). Assim, o urbano assume um caráter extensivo, fruto da dinâmica de explosão/implosão da cidade - sobre si e seu entorno imediato, mas também distante (BRENNER; SCHMID, 2015BRENNER, N.; SCHMID, C. Towards a new epistemology of the urban? City, n. 1, p. 151-182, 2015.; CÔRTES et al., 2020; MONTE-MÓR, 2005MONTE-MÓR, R. L. O que é o urbano no mundo contemporâneo. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.21, n.3, p.942-948, 2005.). A urbanização se estende para além das cidades propagando-se em redes que penetram virtualmente os espaços, responsáveis por constituir o então tecido urbano (BRENNER; SCHMID, 2015; MONTE-MÓR, 1994). A urbanização extensiva, assim denominada (MONTE-MÓR, 1994), permite um retorno frutífero à discussão da urbanização que supera a visão dicotômica e retoma a relevância da temática espacial nos estudos urbanos (SILVA; MONTE-MÓR, 2016SILVA, H.; MONTE-MÓR, R. L. Transições demográficas, transição urbana, urbanização extensiva: um ensaio sobre diálogos possíveis. In: VII Congreso de la Asociación Latinoamericana de Población e XX Encontro Nacional de Estudos Populacionais, 2016, Foz do Iguaçu. Anais...Foz do Iguaçu: ALAP e ABEP, 2016.)

Pela ótica da urbanização extensiva, o urbano contemporâneo emerge como síntese de ambos, rural e urbano, redefinido pelas determinações novas da sociedade da era global, da informação rápida e em rede, do espaço/tempo comprimido (MONTE-MÓR, 2005MONTE-MÓR, R. L. O que é o urbano no mundo contemporâneo. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.21, n.3, p.942-948, 2005.). Não há um trajeto linear sucessivo com escalas urbanas de classificação, com destino ao que seria uma tipologia mais avançada. Cada escala cumpre uma especificidade na totalidade do processo (MOURA; OLIVEIRA; PÊGO, 2018MOURA, R.; OLIVEIRA, S.; PÊGO, B. Escalas da Urbanização Brasileira. Rio de Janeiro: IPEA, 2018.). Desta perspectiva, a urbanização não é um fenômeno de homogeneização espacial e social, e sim um processo que desencadeia novos e distintos contextos urbanos (CÔRTES et al., 2020; MARQUES, 2002MARQUES, M. I. M. O conceito de espaço rural em questão. Terra Livre, São Paulo, v. 18, n. 19, p. 95-112, 2002.; WANDERLEY, 2000WANDERLEY, M. N. B. A emergência de uma nova ruralidade nas sociedades modernas avançadas - o “ rural ” como espaço singular e ator coletivo. Estudos Sociedade e Agricultura, Rio de Janeiro, v. 15, p. 87-145, 2000.). Essas visões reforçam que a urbanização é expressivamente complexa e desigual (SANTOS, 2012SANTOS, M. A urbanização desigual: a especificidade do fenômeno urbano em países subdesenvolvidos. Petrópolis, Editora Vozes, 2012.), não havendo um determinismo parcial ou um saber disciplinar que esgote sua definição, o urbano este é ao mesmo tempo histórico, demográfico, geográfico, econômico, sociológico, psicológico, semiológico (LEFEBVRE, 1999LEFEBVRE, H. A revolução urbana. Belo Horizonte: UFMG, 1999.).

Nesse sentido, há que se construir um novo enquadramento para o entendimento das relações entre urbanização e o desmatamento. Esse escopo passa também por uma reabsorção das diretrizes teórico-sociais modernas, de forma a se alcançar encaminhamentos metodológicos adequados ao desafio. Do ponto de vista teórico-conceitual da discussão urbana, propõe-se trabalhar a articulação entre os estudos urbanos com a teoria social crítica pela construção de uma teoria crítica urbana, como sugere Brenner (2009BRENNER, N. What is critical urban theory? City, v. 13, n. 2-3, p. 198-207, 2009.). O urbano-rural deve ser compreendido sob a relação entre risco e mobilidade da sociedade contemporânea, tendo em vista que os processos multidimensionais de efetivação da globalização passaram a interligar e reger as dinâmicas sociais em função das complexas condições sociomateriais situadas a partir dos conglomerados urbanos (SASSEN, 2009SASSEN, S. Cities are at the center of our environmental future. SAPI EN S. Surveys and Perspectives Integrating Environment and Society, n. 2.3, 2009.).

Nesta estratégia, tanto as diferentes dimensões de mobilidade (URRY, 2012URRY, J. Sociology beyond societies: Mobilities for the twenty-first century. Abingdon: Routledge, 2012.) exercidas nas dinâmicas globais (compressão tempo-espaço, conformação de políticas transnacionais, fluxos econômicos, estruturas materiais de interligação, dentro outras), quanto a produção, reconhecimento e tratamento dos riscos contemporâneos (BECK, 2011BECK, U. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. São Paulo: Editora 34, 2011.) estão vinculados aos fluxos socioespaciais urbanos. Portanto, ao buscar explicitação da relação entre a urbanização e desmatamento no contexto amazônico, seria necessário pensar e mensurar os contextos de urbanidades em associação aos processos locais que coadunam e materializam as expressões concretas da produção urbana, concebendo que estão não apenas articuladas à dinâmica ampla de urbanização, mas também ao grau de articulação dessas dinâmicas às forças globalizantes.

Conclusões

A relevância em explicitar as relações entre urbanização e a mudança no uso e cobertura na Amazônia se insere num momento de retomada das taxas de desmatamento florestal em um cenário regional de intensa urbanização. A revisão sistemática da literatura sobre o assunto apresentou os diferentes esforços disciplinares, a amplitude de questionamentos investigativos e as variadas abordagens metodológicas conduzidos nos últimos anos. Há uma importante contribuição e avanço no conhecimento deste tema que consegue esclarecer determinados processos, embora ainda haja fraca integração dos grupos de estudo e pouca capacidade de amplificar os resultados, culminando na necessidade de novos norteamentos para a plena compreensão da interface entre urbanização e desmatamento.

Os estudos analisados mostraram que o espraiamento urbano ocorre majoritariamente em porções já desmatadas, especificamente em áreas de cultivo. Não sendo uma causa imediata de mudança na cobertura florestal, portanto não havendo nexo causal, a urbanização é ao mesmo tempo uma classe de uso da terra e um espaço propulsor de fatores subjacentes que circunstanciam a tomada de decisão, incitando dinâmicas multiescalares que se estruturam em um sistema cíclico e retroativo. As forças motoras urbanas são orientadas, de alguma forma, por uma relação espacial, diminuindo a intensidade e impacto com o distanciamento dos centros urbanos. Ao expor seu caráter expansivo, percebe-se que o efeito da urbanização não é restrito e delimitado ao núcleo urbano. Os valores e práticas urbanas propagam-se nos espaços rurais por meio dos fluxos de pessoas, que praticam uma mobilidade espacial capaz de estabelecer vínculos rural-urbano e promover a circulação de capital, de material, de conhecimento e de aspectos culturais.

O exercício de buscar pontes e construir um panorama integrado a partir dos resultados analisados traz à luz a complexidade do tema. Foram identificados três principais esforços metodológicos necessários para avançar este escopo, sendo eles a reformulação do sistema de análise como ponto de partida investigativo, a ressignificação conceitual do urbano e a adoção de indicadores e variáveis sensíveis aos processos socioespaciais. A sustentação teórica para o enfrentamento desses desafios foi proposta a partir da articulação dos estudos urbanos com a teoria social crítica em busca da construção de uma teoria crítica urbana.

A teoria crítica urbana equipara a disjunção entre o real e o possível, garantindo reflexividade epistemológica pela conformação de uma teoria transdisciplinar orientada por condições históricas específicas (BRENNER, 2009BRENNER, N. What is critical urban theory? City, v. 13, n. 2-3, p. 198-207, 2009.; BRENNER; SCHMID, 2015). A partir de abordagens da teoria social das mobilidades e do risco (BECK, 2011BECK, U. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. São Paulo: Editora 34, 2011.; URRY, 2012URRY, J. Sociology beyond societies: Mobilities for the twenty-first century. Abingdon: Routledge, 2012.) concebe-se o processo de urbanização como uma articulação entre elementos globais e locais, que se perfazem por um conjunto de componentes redefinidores da lógica urbano-rural destas conexões escalares. Dentro deste escopo teórico são apresentadas cinco proposições fundamentais para refletir sobre as diretrizes de constituição que proporcionariam uma abordagem metodológica capaz de formular um olhar para as relações entre desmatamento e urbanização na Amazônia contemporânea.

Em primeiro lugar, a recusa de toda e qualquer abordagem que disponha “urbano” e “rural” com dimensões socioespaciais autônomas ou em posição dicotômica. Em segundo, pensar a problemática do desmatamento sob uma única configuração sóciopaisagística articulada entre as ruralidades e urbanidades - a constituição do tecido urbano. Em terceiro lugar, o referencial de transição urbana deve continuar como elemento conceitual mas reconsiderando seu sentido vetorial linear (do rural ao urbano) para abrir-se à multivetorialidade, no sentido de se conceber a mobilidade como passíveis de dinâmicas de translocalidade entre espaços urbanos e rurais. Nesse sentido, em quarto lugar, é preciso um adensamento explicativo que busque nas opções socialmente estabelecidas entre desmatamento e conservação um caráter multidimensional e transescalar de pesquisa. Ou seja, levando-se em consideração os processos locais de estímulo e repostas aos riscos e vulnerabilidades proporcionadas pelas dinâmicas de desmatamento. E por fim, em quinto lugar, essa articulação deve ser colocada em perspectiva a partir do destacamento do conjunto de forças econômicas, tecnológicas e políticas nacionais e globais que essas configurações sociopaisagísticas apresentam.

Destes novos norteamentos da fundamentação teórica emergem os desafios analíticos para que a empiria da relação urbanização e desmatamento seja praticável. Reconhecendo que o tecido urbano é determinado por uma reestruturação espacial e viabilizado pelos processos de mobilidade populacional, recorre-se as incursões da Demografia Espacial (VOSS, 2007VOSS, P. R. Demography as a Spatial Social Science. Population Research and Policy Review, v. 26, n. 5-6, p. 457-476, 2007.; VOSS; WHITE; HAMMER, 2006; WACHTER, 2005WACHTER, K. W. Spatial demography. PNAS, v. 102, n. 43, p. 15299-15300, 2005.) para consolidação de um método de pesquisa adequado com as questões e desafios apresentados neste trabalho. Ao considerar a mobilidade populacional como um complexo fenômeno social que ultrapassa dimensões físicas e econômicas para envolver dimensões culturais, afetiva, imaginária e individual (URRY, 2007URRY, John. Mobilities. London: Polity, 2007. 335p), o olhar para configurações espaciais da população passa a ser uma perspectiva multidimensional do fenômeno urbano. Assim, a abordagem por via da dimensão socioespacial pode ser uma estratégia metodológica promissora para o enquadramento analíticao com pleno respaldo aos fundamentos teóricos da teoria crítica urbana.

Agradecimentos

Os autores agradecem o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) no desenvolvimento deste trabalho, através da concessão de bolsa de pesquisa de pós-doutoramento.

References

  • ALENCAR, A. et al. Desmatamento na Amazônia: indo além da emergência crônica. Manaus: IPAM, 2004.
  • ALPHAN, H. Land-use Change and Urbanization of Adana, Turkey. Land Degradation & Development, v. 14, n. September, p. 575-586, 2003.
  • BARBIERI, A. F.; CARR, D. L. Gender-specific out-migration, deforestation and urbanization in the Ecuadorian Amazon. Global and Planetary Change, v. 47, n. 2, p. 99-110, 1 jul. 2004.
  • BARBIERI, A. F.; CARR, D. L.; BILSBORROW, R. E. Migration Within the Frontier: The Second Generation Colonization in the Ecuadorian Amazon. Population Research and Policy Review , v. 28, n. 3, p. 291-320, 2009.
  • BARRETO, P.; ARAÚJO, E. O Brasil atingirá sua meta de redução do desmatamento? Belém: Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, 2012.
  • BECK, U. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. São Paulo: Editora 34, 2011.
  • BECKER, B. Fronteira e urbanização repensadas. Revista Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro, n. 3/4, p. 357-372, 1985.
  • BECKER, B.K. Undoing myths: The Amazon - An Urbanized Forest. In: Man and Biosphere Series; Sachs, G.M.C.I. Ed. Brazilian Perspectives on Sustainable Development of the Amazon Region. Paris: UNESCO e Pathernon Publish Group Limited, 1995. p. 53-89.
  • BECKER, B. Revisão das políticas de ocupação da Amazônia: é possível identificar modelos para projetar cenários? Parcerias estratégicas, Brasília, v. 6, n. 12, p. 135-159, 2001.
  • BECKER, B. Geopolítica da Amazônia. Estudos Avançados, São Paulo, v. 19, n. 53, p. 71-86, abr. 2005.
  • BECKER, B. A Urbe Amazônida. Rio de Janeiro: Garamond, 2013.
  • BRASIL. Plano de ação para prevenção e o controle do desmatamento na Amazônia Legal - 2a fase. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, 2009.
  • BRENNER, N. What is critical urban theory? City, v. 13, n. 2-3, p. 198-207, 2009.
  • BRENNER, N.; SCHMID, C. Towards a new epistemology of the urban? City, n. 1, p. 151-182, 2015.
  • BROWDER, J. O. The urban-rural interface: Urbanization and tropical forest cover change. Urban Ecosystems, v. 6, p. 21-41, 2003.
  • BROWDER, J. O.; GODFREY, B. J. Rainforest cities: urbanization, development and globalization of the Brazilian Amazon. New York: Columbia University Press, 1997.
  • CAIADO, A. S. C.; SANTOS, S. M. M. Fim da dicotomia rural-urbano? Um olhar sobre os processos socioespaciais. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v.17, n.3-4, p. 115-124, 2003.
  • CALDAS, M. M. et al. Ciclo de vida da família e desmatamento na Amazônia: combinando informações de sensoriamento remoto com dados primários. Revista Brasileira de Economia, São Paulo, v. 57, n. 4, p. 683-711, 2003.
  • CASTRO, E. Prefácio. In: CARDOSO, A. C. (Ed.). O rural e o urbano na Amazônia: diferentes olhares em perspectivas. Belém: EDUFPA, 2006. p. 215.
  • CHAMPION, T.; HUGO, G. Introduction: Moving beyond the Urban-Rural Dichotomy. In: CHAMPION, T.; HUGO, G. (Eds.). New Forms of Urbanization: Beyond the Urban-Rural Dichotomy. New York: Routledge, 2003. p. 3-24.
  • COHEN, B. Urban Growth in Developing Countries: A Review of Current Trends and a Caution Regarding Existing Forecasts. World Development, v. 32, n. 1, p. 23-51, 2004.
  • CORRÊA, R. L. A periodização da rede urbana da Amazônia. Revista Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro, v. 49, n. 3, p. 39-68, 1987.
  • CÔRTES, J. C. Mobilidade e redistribuição populacional em Santarém, Pará: recente reconfiguração do meio rural na Amazônia. 2012. Dissertação (Mestrado em Demografia) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 2012.
  • CÔRTES, J. C. Ciclo de vida familiar e distribuição populacional na dinâmica do desmatamento e uso da terra na Amazônia paraense. 2017. Tese (Doutorado em Demografia) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 2017.
  • CÔRTES, J. C.; D’ANTONA, Á. O. Dinâmicas no uso e cobertura da terra - perspectivas e desafios da Demografia. Revista Brasileira de Estudos de População, Belo Horizonte, v. 31, n. 1, p. 191-210, 2014.
  • DAL´ASTA, A. P. et al. Evolução recente da população urbana comparada à evolução do desmatamento nos municípios do Distrito Florestal Sustentável da BR-163. In: XVIII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, 2012, Aguas de Lindóia.. Anais...Águas de Lindóia: ABEP, 2012.
  • DAL´ASTA, A. P. et al. Evolução do arranjo espacial urbano e das terras agrícolas no entorno de Santarém (Pará) no período de 1990 a 2010: Uma análise integrada baseada em sensoriamento remoto e espaços celulares. In: XVI Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, 2013, Foz do Iguaçu. Anais...Foz do Iguaçu: INPE, 2013.
  • DEFRIES, R. S. et al. Deforestation driven by urban population growth and agricultural trade in the twenty-first century. Nature Geoscience, v. 3, n. 3, p. 178-181, 2010.
  • DENG, J. S. et al. Spatio-temporal dynamics and evolution of land use change and landscape pattern in response to rapid urbanization. Landscape and Urban Planning, v. 92, n. 3-4, p. 187-198, 2009.
  • ENDLICH, A. M. Perspectivas sobre o urbano e o rural. In: SPOSITO, M.; WHITACKER, A. (Eds.). Cidade e Campo: relações entre urbano e rural. São Paulo: Expressão Popular, 2006. p. 11-31.
  • FEARNSIDE, P. M. Os números do desmatamento são reais apesar da negação do presidente Bolsonaro. Amazônia Real, Manaus, 02 ago. 2019, Disponível em: <https://amazoniareal.com.br/os-numeros-do-desmatamento-sao-reais-apesar-da-negacao-do-presidente-bolsonaro/>. Acesso em: 15 ago. 2019.
    » https://amazoniareal.com.br/os-numeros-do-desmatamento-sao-reais-apesar-da-negacao-do-presidente-bolsonaro
  • GEIST, H. J.; LAMBIN, E. F. What drives tropical deforestation? A meta analysis of proximate and underlying causes of deforestation based on subnational case study evidence. Louvain-la-Neuve: LUCC Report Series, v.4, p.116, 2001.
  • GRAY, C. L.; BILSBORROW, R. E. Land use policy consequences of out-migration for land use in rural Ecuador. Land Use Policy, v. 36, p. 182-191, 2014.
  • GUEDES, G. R. Ciclo de vida domiciliar , ciclo do lote e mudança no uso da terra na Amazônia Rural Brasileira - um estudo de caso para Altamira , Pará. 2010. Tese (Doutorado em Demografia) - Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 2010.
  • GUEDES, G. R. et al. Ciclo de vida domiciliar, ciclo do lote e mudança no uso da terra na Amazônia brasileira: revisão crítica da literatura. Revista Brasileira de Estudos de População, Belo Horizonte, v. 28, n. 1, p. 231-240, 2011.
  • HEROLD, M.; GOLDSTEIN, N. C.; CLARKE, K. C. The spatiotemporal form of urban growth: measurement, analysis and modeling. Remote Sensing of Environment, v. 86, n. 3, p. 286-302, 2003.
  • HIRYE, M. C. DE M.; DAL´ASTA, A. P.; MOREIRA, M. A. Análise da cobertura da terra no entorno da sede municipal de Altamira e de Santarem, no período de 1990 a 2010, através de imagens TM/Landsat. In: XVI Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, 2013, Foz do Iguaçu. Anais...Foz do Iguaçu: INPE, 2013.
  • HOGAN, D. J.; D’ANTONA, Á. O.; CARMO, R. DO. Dinâmica demográfica recente da Amazônia. In: BATISTELLA, M.; MORAN, E. F.; ALVES, D. (Eds.). Amazônia natureza: sociedade em transformação. São Paulo: Edusp, 2008. p. 71-116.
  • IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Base de informações do Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro,, 2010.
  • IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Base de informações da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) 2017. Rio de Janeiro,, 2010.
  • JORGENSON, A. K.; BURNS, T. J. Effects of Rural and Urban Population Dynamics and National Development on Deforestation in Less-Developed Countries, 1990-2000. Sociological Inquiry, v. 77, n. 3, p. 460-482, 2007.
  • KALNAY, E.; CAI, M. Impact of urbanization and land-use change on climate. Nature, v. 423, p. 528-531, 2003.
  • KAMPEL, S. A.; CAMARA, G.; MONTEIRO, A. M. V. Análise espacial do processo de urbanização na Amazônia. Relatório Técnico Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, São José dos Campos: INPE, v.15, 2001.
  • KAYSER, B. La renaissance rurale. Sociologie des campagnes du monde occidental. Paris: A. Colin, 1990.
  • KISSINGER, G.; HEROLD, M.; DE SY, V. Drivers of deforestation and forest degradation. A synthesis report for REDD+ Policymakers, v. 48, Vancouver: Lexame Consulting, 2012.
  • LEFEBVRE, H. A revolução urbana. Belo Horizonte: UFMG, 1999.
  • MARQUES, M. I. M. O conceito de espaço rural em questão. Terra Livre, São Paulo, v. 18, n. 19, p. 95-112, 2002.
  • MARTINE, G.; MCGRANAHAN, G. Brazil’s early urban transition: what can it teach urbanizing countries? Londres: IIED, 2010a.
  • MARTINE, G.; MCGRANAHAN, G. A transição urbana brasileira: trajetória, dificuldades e lições aprendidas. In: BAENINGER, R (Org). População e Cidades: subsídios para o planejamento e para as políticas sociais. Campinas e Brasília: NEPO e UFNPA, 2010b.
  • MARTINE, G.; MCGRANAHAN, G. The legacy of inequality and negligence in Brazil’s unfinished urban transition: lessons for other developing regions. International Journal of Urban Sustainable Development, v. 5, n. 1, p. 7-24, 2013.
  • MARTINE, G.; MCGRANAHAN, G. Brazil’s negligent urban transition and its legacy of divided cities. In: MCGRANAHAN, G.; MARTINE, G. (Eds.). Urban Growth in Emerging Economies: Lessons from the BRICS. New York: Routledge, 2014. p. 15-54.
  • MELLO, N. Políticas territoriais da Amazônia. São Paulo: Editora Annablume, 2006.
  • MONTE-MÓR, R. L. O que é o urbano no mundo contemporâneo. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.21, n.3, p.942-948, 2005.
  • MONTE-MÓR, R. L. D. M. Urbanização extensiva e lógicas de povoamento: um olhar ambiental. In: SANTOS, M.; SOUZA, M. A. DE; SILVEIRA, M. L. (Eds.). Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec/Anpur, 1994, p.169-181.
  • MONTGOMERY, M. R. et al. Cities Transformed : Demographic Change and Its Implications in the Developing World. Washigton DC: National Academics Press, 2003.
  • MORAN, E. F. Environmental social science: human-environment interactions and sustainability. New Jersey: John Wiley & Sons, 2010.
  • MORAN, E.F. Developing the Amazon. Indiana: Indiana University Press, 1981.
  • MORAN, E. F.; BRONDÍZIO, E. S. Land use after deforestation in Amazon. In: LIVERMAN, D.; RINDUFUSS, R.; STERN, P. (Eds.). People and Pixel: Liking Remote Sensing and Social Science. Washigton: National Academics Press, 1998. p. 94-120.
  • MORAN, E. F.; BRONDÍZIO, E. S.; BATISTELLA, M. Trajetórias de desmatamento e uso da terra na Amazônia Brasileira: uma análise multiescalar. In: BATISTELLA, M.; MORAN, E.; ALVES, D. (Eds.). Amazônia natureza: sociedade em transformação. São Paulo: Edusp, 2008. p. 55-70.
  • MOURA, R.; OLIVEIRA, S.; PÊGO, B. Escalas da Urbanização Brasileira. Rio de Janeiro: IPEA, 2018.
  • NOBRE, C. A.; SAMPAIO, G.; SALAZAR, L. Mudanças climáticas e Amazônia. Ciência e Cultura, Campinas, v. 59, n. 3, p. 22-27, 2007.
  • ONU - ORGANIZAÇÕES DAS NAÇÕES UNIDAS. World Urbanization Prospects. New York: United Nation, 2014.
  • PEREIRA, J. C. M. P. A urbanização da Amazônia e o papel das cidades médias na rede urbana regional. In: CARDOSO, J. C. M. (Ed.). O rural e o urbano na Amazônia: diferentes olhares em perspectivas. Belém: EDUFPA, 2006. p. 23-52.
  • PERZ, S. G. Social Determinants and Land Use Correlates of Agricultural Technology Adoption in a Forest Frontier : A Case Study in the Brazilian Amazon. Human Ecology, v. 31, n. 1, p. 133-165, 2003.
  • PERZ, S. G.; SKOLE, D. L. Secondary forest expansion in the Brazilian Amazon and the refinement of forest transition theory. Society and Natural Resources, v. 16, p. 277-294, 2003.
  • PERZ, S. G.; WALKER, R.; CALDAS, M. M. Beyond Population and Environment: Household Demographic Life Cycles and Land Use Allocation Among Small Farms in the Amazon. Human Ecology, v. 34, n. 6, p. 829-849, 2006.
  • RIBEIRO, R. M. et al. Os processos de urbanização e conversão florestal na Amazônia paraense - um estudo multiescalar. Revista Brasileira de Estudos de População, Belo Horizonte, v. 35, n. 3, p. 1-3, 2019.
  • RUDEL, T. K. et al. Forest transitions: towards a global understanding of land use change. Global Environmental Change, v. 15, n. 1, p. 23-31, 2005.
  • RUDEL, T. K.; BATES, D.; MACHINGUIASHI, R. A Tropical Forest Transition? Agricultural Change, Out-migration, and Secondary Forests in the Ecuadorian Amazon. Annals of the Association of American Geographers, v. 92, n. 1, p. 87-102, 2002.
  • SANTOS, M. A urbanização desigual: a especificidade do fenômeno urbano em países subdesenvolvidos. Petrópolis, Editora Vozes, 2012.
  • SASSEN, S. Cities are at the center of our environmental future. SAPI EN S. Surveys and Perspectives Integrating Environment and Society, n. 2.3, 2009.
  • SILVA, J.G. Velhos e novos mitos do rural brasileiro. Estudos Avançados, São Paulo, v.15, n.3, p.37-50, 2003.
  • SILVA, H.; MONTE-MÓR, R. L. Transições demográficas, transição urbana, urbanização extensiva: um ensaio sobre diálogos possíveis. In: VII Congreso de la Asociación Latinoamericana de Población e XX Encontro Nacional de Estudos Populacionais, 2016, Foz do Iguaçu. Anais...Foz do Iguaçu: ALAP e ABEP, 2016.
  • SKELDON, R. Population Mobility in Developing Countries. London and New York: Belhaven Press, 1990.
  • SPOSITO, M. E. B. A questão cidade-campo: perspectivas a partir da cidade. In: SPOSITO, M. E. B.; WHITACKER, A. (Eds.). Cidade e campo: relações e contradições entre urbano e rural. São Paulo: Expressão Popular, 2006, p.111 - 130.
  • TANG, J.; WANG, L.; YAO, Z. Spatio‐temporal urban landscape change analysis using the Markov chain model and a modified genetic algorithm. International Journal of Remote Sensing, v. 28, n. 15, p. 3255-3271, 2007.
  • TURNER, B. L.; LAMBIN, E. F.; REENBERG, A. The emergence of land change science for global. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, v. 104, n. 52, p. 20666-20672, 2007.
  • UNFPA - UNITED NATIONS POPULATION FUND. The state of world population 2007: Unleashing the potential of urban growth. New York: UNFPA, 2007.
  • URIARTE, M.; SCHNEIDER, L.; RUDEL, K. Land transition in the tropics: going beyond the case studies. Biotropica, v. 42, n. 1, p. 1-2, 2010.
  • URRY, J. Sociology beyond societies: Mobilities for the twenty-first century. Abingdon: Routledge, 2012.
  • URRY, John. Mobilities. London: Polity, 2007. 335p
  • VANWEY, L. K.; GUEDES, G. R.; D’ANTONA, A. O. Out-migration and land-use change in agricultural frontiers: insights from Altamira settlement project. Population and Environment, v. 34, p. 44-69, 2011.
  • VIANA, V. A Amazônia e o interesse nacional. Política Externa, São Paulo, v. 19, n. 4, 2011.
  • VOSS, P. R. Demography as a Spatial Social Science. Population Research and Policy Review, v. 26, n. 5-6, p. 457-476, 2007.
  • VOSS, P.; WHITE, K. J. C.; HAMMER, R. B. Explorations in spatial demography. In: KANDEL, W.; BROWN, D. (Eds.). Population Change and Rural Society. Berlin:Springer Science & Business Media, 2006.
  • WACHTER, K. W. Spatial demography. PNAS, v. 102, n. 43, p. 15299-15300, 2005.
  • WALKER, R. et al. Land use and land cover change in forest frontiers: the role of household life cycles. International Regional Science Review, v. 25, n. 2, p. 169-199, 2002.
  • WANDERLEY, M. N. B. A emergência de uma nova ruralidade nas sociedades modernas avançadas - o “ rural ” como espaço singular e ator coletivo. Estudos Sociedade e Agricultura, Rio de Janeiro, v. 15, p. 87-145, 2000.
  • WANDERLEY, M. N. B. Agricultura familiar e campesinato. Estudos Sociedade e Agricultura, Rio de Janeiro, v. 1, p. 42-61, 2003.
  • WIRTH, L. O urbanismo como modo de vida. In: FORTUNA, C. (Ed.). Cidade, Cultura e Globalização. Oeiras: Celta, 1997.
  • 1
    - Programa do Governo Federal que propõe ações concentradas principalmente na região do Arco do Desmatamento e que se articulam em três grandes eixos temáticos: Ordenamento Fundiário e Territorial, Monitoramento e Controle Ambiental e Fomento às Atividades Produtivas Sustentáveis.
  • 2
    - O fundamento teórico do modelo é a relação trabalho x consumo e sua variação ao longo do tempo em resposta ao número de crianças, adultos e idosos. Cada estágio da trajetória domiciliar teria uma disponibilidade de força laboral e uma demanda de consumo influenciando na área cultivada da propriedade e no tipo de cultura (WALKER et al., 2002).
  • 3
    - A teoria prevê a recuperação da cobertura florestal à medida em que as sociedades passam por um desenvolvimento econômico caracterizado pela industrialização e urbanização - uma transição da econômica com base o setor primário (extrativismo, agropecuária e mineração) para a industrial com predomínio do setor de serviços (RUDEL et al., 2005).
  • 4
    - Complexo geoeconômico e social determinado em 2006 pelo Governo Federal com a finalidade de implantação de políticas públicas de estímulo ao desenvolvimento integrado com a atividade de base florestal. A área, localizada no oeste do Estado do Pará, abrange 190 mil km2, compreendendo integralmente ou parcialmente 13 municípios.
  • 5
    - No sistema de análise da Land Change Science as causas imediatas correspondem às ações locais que alteram o ambiente físico, sendo condições concretas de transformação (GEIST; LAMBIN, 2001).
  • 6
    - No sistema de análise da Land Change Science os fatores subjacentes, que operam nas diversas escalas, são as forças contextuais que determinam a direção e intensidade do uso da terra (GEIST; LAMBIN, 2001).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Abr 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    15 Out 2019
  • Aceito
    07 Out 2020
ANPPAS - Revista Ambiente e Sociedade Anppas / Revista Ambiente e Sociedade - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revistaambienteesociedade@gmail.com