Acessibilidade / Reportar erro

Gerenciamento de discursos hídricos: A comunicação da crise de abastecimento de água na RMSP (2014-2015)

Resumo

Este artigo investiga a forma como foi discursada a crise de abastecimento hídrico registrada na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), durante o biênio 2014-2015. São enfocados aspectos de monopólio de informações e mobilização da expertise científica pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo e pelo Governo do Estado de São Paulo, e da instrumentação desses aspectos na comunicação massiva dedicada ao episódio. Amparados nos Estudos Sociais de Ciência e Tecnologia e na teoria do enquadramento (framing), foram analisados 63 documentos publicados por esses atores. Os resultados apontam para um plano discursivo que buscou moldar a interpretação da crise, relativizando a condição dos agentes públicos e revigorando determinado modelo de expansão da rede de abastecimento hídrico. A contribuição dessa investigação é a identificação do discurso público como instrumento de ação sobre a infraestrutura urbana de saneamento básico.

Palavras-chave:
Crise hídrica; Região Metropolitana de São Paulo; Comunicação de risco; Sabesp; Análise do discurso

Abstract

The current article is an investigation on how the water supply crisis taking place in the Metropolitan Region of São Paulo (RMSP) was addressed during the 2014-2015 biennium. Aspects of information monopoly and scientific expertise mobilization by São Paulo State’s Sanitation Company and by São Paulo State’s Government were herein addressed, as well as the instrumentation of these aspects through mass communication focused on this event. In total, 63 documents published by these actors were herein analyzed based on the Social Studies of Science and Technology and on the Framing theory. Results pointed towards a discursive plan aimed at shaping the interpretation of the water supply crisis by relativizing public agents’ condition and by reinvigorating a specific water supply network-expansion model. The contribution of this investigation lies on the identification of public discourse as an instrument of action over urban sanitation infrastructures.

Keywords:
Water Crisis; Metropolitan Region of São Paulo; Risk communication; Sabesp; Discourse analysis

Resumen

Este artículo investiga cómo se abordó la crisis del abastecimiento de agua en la Región Metropolitana de São Paulo (RMSP) durante el bienio 2014-2015. Se enfocan aspectos de monopolio de la información y movilización de conocimientos científicos por parte de la Empresa de Saneamiento Básico del Estado de São Paulo y del Gobierno del Estado de São Paulo, así como la instrumentación de estos aspectos en la comunicación masiva dedicada al episodio. Apoyados en los Estudios Sociales en Ciencia y Tecnología y teoría del framing, se analizaron 63 documentos publicados por estos actores. Los resultados apuntan a un plan discursivo que buscó moldear la interpretación de la crisis, relativizando la condición de los agentes públicos y revitalizando un modelo particular de expansión de la red de abastecimiento de agua. El aporte de esta investigación es la identificación del discurso público como instrumento de acción en infraestructura de saneamiento urbano.

Palabras-clave:
Crisis hídrica; Región metropolitana de São Paulo; Comunicación de riesgos; Sabesp; Análisis del discurso

Introdução

Durante o biênio que se iniciava em janeiro de 2014, a sociedade acompanharia a paulatina exaustão dos sistemas produtores de água que então serviam a Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), com destaque para o maior deles, sistema da Serra da Cantareira (doravante sistema Cantareira) (FABHAT, 2019). No ápice da escassez, o sistema Cantareira teve drenado não apenas todo o seu volume útil, como também a maior parte de seu volume morto (PORTO; PORTO; PALERMO, 2014PORTO, R. L.; PORTO, M. F. A.; PALERMO, M. A ressurreição do volume morto do Sistema Cantareira na Quaresma. Revista DAE, v. 62, n. 197, p. 18-25, 2014.). Esse cenário também contou com a hospedagem, pelo Brasil, da 20a copa FIFA de futebol masculino, evento de expressão mundial, e com a corrida eleitoral para o governo paulista, que tinha o então governador Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho - doravante Geraldo Alckmin - concorrendo à reeleição. Especificamente quanto às eleições, a campanha conduzida pelos candidatos ao poder executivo paulista ocorreu no segundo semestre daquele ano, quando o sistema Cantareira atingiu seus níveis mais baixos (figura 1).

Nesse contexto, argumentamos que a análise das formas de discursividade da crise de abastecimento hídrico ilumina de forma relevante as controvérsias que marcaram o período, assim como permite entender o papel que a expertise científica desempenhou nessas disputas. Essas controvérsias envolveram política, conhecimento experto e formas de pensar a cidade e sua infraestrutura hidráulica. Arguimos que houve uma disputa envolvendo, principalmente, o papel da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) e do Governo do Estado de São Paulo (Gesp) na resolução da crise, dividida entre duas formas principais de entendimento: a) a crise como derivada de erros humanos, com consequências para a disputa política em curso naquele momento; b) a crise como derivada de variáveis climáticas, isentando, assim, a estatal e o governo paulista de responsabilidades.

Demostramos que a controvérsia em torno das causas da crise e da atribuição de responsabilidades envolveu de maneira central a mobilização de expertise, nesse caso monopolizada pela Sabesp, em padrão já descrito em casos anteriores (VIGLIO; MONTEIRO; DA COSTA FERREIRA, 2018VIGLIO, J. E.; MONTEIRO, M.; DA COSTA FERREIRA, L. Ciência e processo decisório: A influência dos experts no licenciamento ambiental de um empreendimento petrolífero no litoral paulista. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 33, n. 98, p. 1-22, 2018.). Esse monopólio do conhecimento perito condicionou de forma relevante as capacidades de diferentes atores em intervir nos processos de enquadramento da crise nas discursividades analisadas, influenciando a percepção pública sobre os eventos em pauta.

Além desta introdução, este artigo traz a seção ‘Contexto hídrico’, em que são mapeados os atores e as circunstâncias envolvidas no caso analisado; depois, em ‘Racionamento retórico’, discutimos o problema que direcionou a pesquisa aqui apresentada; na seção ‘Discursos hídricos’, os argumentos e a contribuição deste trabalho são apresentados; em ‘Fluidez narrativa’, as escolhas metodológicas são detalhadas, e a seção ‘Paralaxe hídrica’ traz as instâncias empíricas envolvidas no processo de investigação. As análises empíricas compõem a seção ‘Determinismo climático na comunicação da crise’. O artigo então conclui que o discurso público, aliado ao conhecimento científico, foi instrumento de ação não apenas sobre a interpretação da crise de abastecimento na RMSP durante o biênio 2014-2015, mas também sobre o modelo paulista de gestão do saneamento, bem como sobre a conformação da infraestrutura e das tecnologias de abastecimento hídrico que a integram.

Contexto hídrico

No Brasil, o abastecimento hídrico urbano é abarcado pelo setor econômico do saneamento básico, que também engloba o esgotamento sanitário, o manejo de águas pluviais, a limpeza urbana e o trato dos resíduos sólidos (BRASIL, 2007). Interpretando dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), a Sabesp afirma ser responsável por 30% do total de investimentos em saneamento básico no país (BRASIL, 2023; SABESP, 2023b).

Criada em 1973, a estatal paulista é uma empresa de economia mista que tem o Gesp como maior acionista, com a manutenção de 50,3% das ações em seu poder. Do restante, 36% das ações da concessionária estão ofertadas na B3 - bolsa de valores brasileira - e 12,41% na NYSE - bolsa de Nova Iorque (SABESP, 2023b). No relatório financeiro declarado pela Companhia em 2022, constam lucro de R$ 3,1 bilhões e valor de mercado de R$ 39,2 bilhões (SABESP, 2023a).

Para a Sabesp, a RMSP responde por 70,73% da receita de todos os 375 municípios com os quais a companhia tem concessão para a prestação de serviços de saneamento básifco (SABESP, 2021a). Especificamente naquela região, a estatal opera em 37 dos 39 municípios que a compõem, além de ser a empresa responsável por fornecer água ‘por atacado’ para as outras duas cidades da conurbação - São Caetano do Sul e Mogi das Cruzes (SABESP, 2021a) -, perfazendo, em termos de abastecimento hídrico, 100% de seus municípios.

O controle absoluto da Sabesp e do Gesp - seu principal acionista - sobre a quantidade e qualidade da água que flui pela RMSP possibilita a esses agentes influenciar a maneira como a água urbana é narrada, vista, gestada e explorada. Dessa maneira, a tendência natural ao monopólio, ‘falha de mercado’ (CANDIDO, 2013CANDIDO, J. L. Falhas de mercado e regulação no saneamento básico. Revista Informe Econômico, v. 1, n. 1, 2013.) característica do setor econômico de saneamento básico (CARVALHO; SAMPAIO, 2015CARVALHO, A. E. C.; SAMPAIO, L. M. B. Paths to universalize water and sewage services in Brazil: The role of regulatory authorities in promoting efficient service. Utilities Policy, v. 34, p. 1-10, 2015.; CRUZ; RAMOS, 2016CRUZ, K. A. D.; RAMOS, F. D. S. Evidências de subsídio cruzado no setor de saneamento básico nacional e suas consequências. Nova Economia, v. 26, p. 623-651, 2016.), estende-se aos campos simbólico, político e tecnológico.

Nesse contexto, adotamos a perspectiva do saneamento e de seus componentes como um sistema sociotécnico. Essa perspectiva nos possibilita, como afirmam Smith e Stirling (2008SMITH, A.; STIRLING, A. Social-ecological resilience and socio-technical transitions: critical issues for sustainability governance. Brighton STEPS centre working paper, v. 8, n. 8, p. 1-25, 2008., p. 6), abordar e entender o desenvolvimento e o uso das tecnologias a partir dos complexos processos adaptativos que constituem as interdependências entre o material e o social. A crise de abastecimento do biênio 2014-2015 ofereceu condições ímpares para analisar esse fenômeno.

Racionamento retórico

Como protagonistas técnicos e políticos do saneamento paulista, a forma como a Sabesp e o Gesp comunicam publicamente suas decisões durante uma crise de abastecimento hídrico tem agência sob diversos aspectos do campo social. Sob o enfoque dos Estudos Sociais de Ciência e Tecnologia (SISMONDO, 2010SISMONDO, S. An Introduction to Science and Technology Studies. Sussex, United Kingdom: Wiley-Blackmell, 2010.; PREMEBIDA; NEVES; ALMEIDA, 2011PREMEBIDA, A.; NEVES, F. M.; ALMEIDA, J. Estudos sociais em ciência e tecnologia e suas distintas abordagens. Sociologias, v. 13, n. 26, p. 22-42, 2011.), o tópico principal deste artigo está situado na relação de poder entre os dirigentes da água citadina e os cidadãos, dependentes de uma infraestrutura sobre cuja operação e controle têm escasso conhecimento e agência.

Tem-se, assim, a união de um agente de poder político-representativo (Gesp) com um agente técnico-científico (Sabesp), controlando uma infraestrutura de abastecimento hídrico, cravada sob chãos e paredes, intensa em conhecimento experto, informações e tecnologias aplicadas, e, do outro lado, o usuário da infraestrutura, adstrito a essa rede sociotécnica (EDWARDS, 2003EDWARDS, P. N. Infrastructure and Modernity: Force, Time, and Social Organization in the History of Sociotechnical Systems. In: Misa, T. J.; Brey, P.; Feenberg, A. (Orgs.). Modernity and Technology. Cambridge, MA: MIT Press, 2003. p.185 - 226.) constituída por tubulações, engenheiros, bombas, cálculos, leis, fórmulas e torneiras, para que tenha acesso à água, elemento essencial para toda e qualquer atividade.

Discursos hídricos

Há de se pontuar que os discursos do Gesp e da Sabesp não foram abordados estritamente sob a perspectiva da crítica linguística. O que se propõe aqui é, de forma interdisciplinar, examinar o discurso público influenciado por diversos fatores externos à linguagem, que assume caráter de instrumento de ação sobre o campo social (BOURDIEU, 1989BOURDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989.; FAIRCLOUGH, 1992FAIRCLOUGH, N. L. Discourse and Social Change. Cambridge, MA: Polity Press, 1992.; TRACY, 2001TRACY, K. Discourse analysis in communication. In: (Orgs.). The Handbook of Discourse Analysis. Malden, Massachusetts, USA: Blackwell Publishers Ltd, 2001. p.725-749.; DA SILVA, 2005DA SILVA, J. O. A produção de discursos políticos na visão de Pierre Bourdieu. Tempo da ciência, v. 12, n. 23, p. 187-200, 2005.; MOREIRA; FRAGALE, 2018MOREIRA, R. S.; FRAGALE, R. Discursos judiciais sobre favelas: impacto em políticas públicas e nos agentes sociais. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 33, n. 96, 2018.).

Essa abordagem assume recursos intradiscursivos, que imbuem dispositivos linguísticos de forma (morfologia), de combinação entre palavras (sintaxe) e de relações de significação (semântica), além de contar com recursos extradiscursivos, que compreendem diversas circunstâncias da comunicação, como, principalmente, o enquadramento (framing), o meio (impresso, visual, sonoro), a forma (texto, filme, música, gráfico), a identidade dos interlocutores, a intencionalidade da comunicação e os artifícios de retórica, relacionados, sobretudo, à argumentação persuasiva (CHARAUDEAU, 2015CHARAUDEAU, P. Discurso das mídias. São Paulo: Contexto, 2015.). Ainda, para completar o sentido do discurso como instrumento de ação, ele deve assumir aspectos do contexto social no qual está inserida a sua aplicação, como valores, ideologias e culturas envolvidas (HERRERA, 1980HERRERA, A. A América Latina necessita de um modelo alternativo de desenvolvimento tecnológico. In: DAGNINO, R. S., ROGÉRIO BEZERRA (Orgs.). Amilcar Herrera: Um intelectual latino-americano. Florianópolis: Insular, 1980. p.29 - 42.; BOURDIEU, 1989BOURDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989.; PETERS, 2013PETERS, G. Habitus, reflexividade e neo-objetivismo na teoria da prática de Pierre Bourdieu. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 28, p. 47-71, 2013.).

Outra perspectiva presente na análise desta pesquisa está fundamentada nos Estudos Sociais de Ciência e Tecnologia (ESCT), que abordam as infraestruturas e suas transformações como processos sociotécnicos (EDWARDS, 2003EDWARDS, P. N. Infrastructure and Modernity: Force, Time, and Social Organization in the History of Sociotechnical Systems. In: Misa, T. J.; Brey, P.; Feenberg, A. (Orgs.). Modernity and Technology. Cambridge, MA: MIT Press, 2003. p.185 - 226.; BOLTON; FOXON, 2015BOLTON, R.; FOXON, T. J. Infrastructure transformation as a socio-technical process - Implications for the governance of energy distribution networks in the UK. Technological Forecasting and Social Change, v. 90, p. 538-550, 2015.) e artefatos de larga escala física e temporal (EDWARDS, 2003). O sistema de abastecimento de água é conformado por fatores como a disponibilidade de água em uma região, densidade demográfica, características das habitações, e o grau de avanço tecnológico empregado nos equipamentos necessários para a instalação e funcionamento do sistema. Ao mesmo tempo, a relação cultural daquela sociedade com a água, o arranjo legal sobre o uso e ocupação do solo e os interesses dos atores que controlam o sistema de abastecimento hídrico, igualmente, são responsáveis pela forma como aquela rede de artefatos é constituída, adequada, e de que modo evolui.

O conceito de sistema sociotécnico (SMITH; STIRLING; BERKHOUT, 2005SMITH, A.; STIRLING, A.; BERKHOUT, F. The governance of sustainable socio-technical transitions. Research Policy, v. 34, n. 10, p. 1491-1510, 2005.; SMITH; STIRLING, 2008) torna-se adequado para a infraestrutura de abastecimento hídrico quando examinamos processos e componentes presentes nesse contexto. Sob a perspectiva do sistema de distribuição de água tratada, a sociedade urbana encontra-se aninhada por uma rede submersa, um sistema venoso intenso em ciência e tecnologia aplicada, sob seus pés e dentro das paredes das edificações que a abriga. Essa (intra e infra) estrutura é enraizada fisicamente e internalizada culturalmente, integrando rotinas como uma ubíqua segunda natureza (STAR, 1999STAR, S. L. The Ethnography of Infrastructure. Journal of Composite Materials, v. 33, n. 10, p. 928-940, 1999.; ANAND, 2017ANAND, N. Hydraulic City. Durham: Duke University Press, 2017.; 2018; ANAND; GUPTA; APPEL, 2018).

Nesse contexto, Felgenhauer (2012FELGENHAUER, T. Geographies of infrastructure systems: The user’s lifeworld and interface design. Tijdschrift voor Economische en Sociale Geografie, v. 103, n. 4, p. 385-395, 2012.) atenta para a alienação do usuário da infraestrutura, na medida em que a linguagem e o entendimento do funcionamento dos sistemas que as compõem demandam conhecimento específico e aprofundado, levando a uma condição de ‘confiança cega’ por parte do usuário. Nessa lógica, a laicidade dos cidadãos para com o funcionamento da infraestrutura apresenta-se como aspecto central. Gesp e Sabesp, desenvolvedores, conhecedores e controladores do sistema de abastecimento da RMSP, regulam tanto a vazão hídrica como de dados; tratam tanto a água como as informações a serem distribuídas.

Assim, o uso do discurso como instrumento de gerenciamento da crise de abastecimento hídrico e de atuação sobre a infraestrutura que atende a RMSP aparece desde a classificação do episódio como uma crise (RIBEIRO, 2014RIBEIRO, B. Sabesp compra 20 bombas para o fundo da Cantareira. O Estado de São Paulo. Metrópole, p. A18, 28 de fevereiro de 2014.). O termo, carregado de valores como subitaneidade, imprevisibilidade, abrupta ruptura do sistema vigente e duração limitada (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998BOBBIO, N.; MATTEUCCI, N.; PASQUINO, G. Dicionário de política. Brasília: Editora UNB, 1998.), surgiu no discurso da Sabesp e do Gesp como um recurso que possibilitou (i) colocar em cheque as razões e a responsabilidade prévia sobre as causas do episódio, (ii) priorizar decisões e recursos emergenciais para sua mitigação, de acordo com seus conceitos e projetos de governo, e (iii) valorar e potencializar seu gerenciamento e solução, transformando a superação do evento crítico em uma conquista vitoriosa.

Fluidez narrativa

O material analisado aqui resulta da leitura de todos os comunicados publicados pela Sabesp e pelo Gesp em seus respectivos endereços eletrônicos destinados à imprensa (SABESP, 2021b; SÃO PAULO, 2021), entre 1 de janeiro de 2014 e 31 de dezembro de 2015. A Sabesp, além do relatório CHESS - acrônimo para ‘Crise Hídrica, Estratégia e Soluções da Sabesp’ (SABESP, 2015b) -, publicou 30 documentos sobre a crise de abastecimento na RMSP, enquanto o Gesp foi responsável por 32 comunicados, totalizando 63 documentos.

A análise de conteúdo desse material centrou-se no enquadramento do clima como fator crítico para a ocorrência da crise de abastecimento de água. Em seguida observou-se, a partir desse enquadramento, como a argumentação usada pela Sabesp e pelo Gesp foi construída. Desse processo analítico, foi possível traçar a seguinte sequência lógico-discursiva:

  1. Determinismo climático: Esse argumento apresentou a falta de chuvas e as altas temperaturas como únicos pilares para a deflagração e perduração da crise de abastecimento.

  2. Consumo individual como fator mitigador: A partir do determinismo climático, o consumo individual foi salientado como o primeiro e principal fator a ser atacado. Essa narrativa trouxe o consumidor da água para o centro da arena, obrigando-o a participar, junto com a Sabesp e o Gesp, da responsabilidade pela mitigação da crise.

  3. As obras como solução ótima: Apesar dos altos custos, impactos ambientais, longa duração e protocolos de publicização envolvidos nas contratações de empreendimentos públicos (BRASIL, 1993; 1997; SÃO PAULO, 2012), as obras de intervenção e exploração de novos mananciais foram discursadas pela Sabesp e pelo Gesp como as melhores soluções possíveis para a crise de abastecimento hídrico, e suas execuções foram narradas como ágeis e meritosas, reforçando assim, por meio do discurso público, o corrente modelo de expansão e desenvolvimento da infraestrutura de abastecimento hídrico para a RMSP, centrado na drenagem de novas fontes de água.

  4. Vitimização: Ao longo do episódio a Sabesp e o Gesp se colocaram, discursivamente, como vítimas do clima, daqueles consumidores que se recusavam a economizar a água, e dos consumidores que executavam ligações irregulares no sistema de abastecimento.

  5. Glorificação: A fase da narrativa de glorificação pode ser encontrada nos momentos em que a Sabesp e o Gesp creditaram a superação da crise principalmente às suas ações, encampadas para enfrentamento do evento crítico, apesar do retorno das chuvas. Quando usada em torno do nome do então governador Geraldo Alckmin, no contexto da corrida eleitoral de 2014, a glorificação das ações ganhou, ainda, contornos de ‘produção discursiva da figuratividade heróica’ (MAGALHÃES; DA SILVA; BATISTA, 2007MAGALHÃES, H. G. D.; DA SILVA, L. H. O.; BATISTA, D. J. Do herói ficcional ao herói político. Ciências & Cognição, v. 12, 2007. ISSN 1806-5821., p. 18), retratando alguém que liderou a população da RMSP na travessia pelo momento crítico motivado pela escassez de água.

De maneira a estabelecer a ação e reação dos discursos do Gesp e da Sabesp sobre a infraestrutura de abastecimento hídrico, a análise dos comunicados à imprensa (press releases) foi feita em conjunto com a variação mensal do nível do sistema Cantareira (figura 1). Essa disposição é justificada pelo fato de aquele sistema ter sido adotado, pelos órgãos de imprensa, como símbolo da crise de abastecimento na RMSP, devido ao rápido esgotamento de suas reservas, responsáveis, no início de 2014, pelo abastecimento de 57% da população da RMSP (SABESP, 2015b).

Figura 1
O discurso dos controladores da crise de abastecimento de 2014-2015 na RMSP

A figura 1 oferece a possibilidade de visualização dos discursos na mesma conjuntura do nível do reservatório, dado este gerado por instrumentos sociotécnicos de medição de dados e, posteriormente, traduzido para a forma gráfica. Os números atrelados ao rótulo ‘%’, correspondentes ao primeiro dia de cada mês, expressam o percentual de reservação ainda disponível naquela ocasião; as cores aliadas a esses dados trazem o grau de emergência do abastecimento. Nesse retrato gráfico, os assertos destacados somam o tom discursivo usado pelos atores de modo a atuar sobre os dados, conferindo-lhes determinadas interpretações, atenuando os níveis negativos ou salientando os positivos.

Paralaxe hídrica

O discurso da Sabesp e do Gesp, durante o biênio 2014-2015, apresentou um enquadramento da crise baseado no determinismo climático. Contudo, estudos mostram que a adequada governança do abastecimento hídrico requer planejamento integrado e ação constante sobre fatores como a ocupação do solo urbano, políticas públicas de educação ambiental, de limpeza urbana, de conservação de áreas de mananciais e outras que contribuem para a recarga dos lençóis freáticos, bem como a aderência desses aspectos aos planos diretores dos municípios que integram a metrópole (MARCONDES, 1999MARCONDES, M. J. A. Cidade e natureza: proteção dos mananciais e exclusão social. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1999.; BUSTOS, 2003BUSTOS, M. R. L. A educação ambiental sob a ótica da gestão dos recursos hídricos. 2003. Tese de doutorado, Universidade de São Paulo.; BARRAQUÉ; FORMIGA JOHNSSON; BRITTO, 2008BARRAQUÉ, B.; FORMIGA JOHNSSON, R. M.; BRITTO, A. L. N. P. The development of water services and their interaction with water resources in European and Brazilian cities. Hydrology and Earth System Sciences, v. 12, p. 1153-1164, 2008.; DINIZ, 2016DINIZ, M. F. A. Governança da água: uma avaliação dos serviços brasileiros de abastecimento de água e esgotamento sanitário nos anos de 2002, 2007 e 2012. 2016. Tese de Doutorado, Universidade Federal do Rio Grande do Norte).

Nessa lógica, a ciência como um ator relevante aparece na apropriação, pela Sabesp e pelo Gesp, do valor de verdade versado sobre um conjunto de dados e fatos gerados por instrumentos tecnológicos, desenvolvidos e calibrados por métodos e cientistas, e culturalmente reconhecidos dentro de um conjunto de valores comuns, construído ao longo do tempo. Esses componentes são instrumentalizados no discurso, estipulando-se a interpretação do fenômeno diante de circunstâncias argumentadas sob determinado enquadramento, resultando em rede sintática e semântica onde dados, instrumentos, riscos e valores são dispostos de forma a neutralizar argumentos contrários ou controversos.

Ocorre, assim, o empoderamento da Sabesp e do Gesp, no papel de portadores do discurso embasado por expertise científica, ampliado pelo fato de controlarem a operação e a geração de dados e informações produzidas pela infraestrutura de abastecimento hídrico da RMSP, oferecendo ao público receptor de sua argumentação um produto supostamente acurado, isento de influências externas à esfera científica, objetivo, exato e apolítico.

Determinismo climático na comunicação da crise

A seguir é traçada a narrativa do determinismo climático discursada pela Sabesp e pelo Gesp entre janeiro de 2014 e dezembro de 2015. Junto à data de publicação dos press releases, são dispostos os índices de reservação do sistema Cantareira, de forma a estabelecer a relação entre o discurso público e a infraestrutura de abastecimento de água para a RMSP durante o evento crítico (figura 1).

O índice de reservação do maior sistema de reservação de água controlado pela Sabesp e pelo Gesp naquela ocasião (FABHAT, 2019) concentrou os diversos elementos que explicitam o efeito do monopólio técnico e científico no discurso público, e que orientaram a pesquisa apresentada neste artigo. Composto por 6 reservatórios (ibid.) o cálculo do índice de reservação do sistema Cantareira tem em sua complexidade um fator limitante para compreensão e consequente crítica pública (figura 2).

Figura 2
Cálculo do índice de reservação do sistema Cantareira

Durante a crise de abastecimento de 2014-2015, buscando evitar informar um nível negativo do principal reservatório da RMSP, a Sabesp considerou o chamado “volume morto” (PORTO; PORTO; PALERMO, 2014PORTO, R. L.; PORTO, M. F. A.; PALERMO, M. A ressurreição do volume morto do Sistema Cantareira na Quaresma. Revista DAE, v. 62, n. 197, p. 18-25, 2014.) como “reserva técnica” (figura 2), mesmo estando o nível abaixo do zero operacional. Ou seja, quando o volume útil de água foi esgotado, a estatal usou o volume morto, cuja função original é manter as características físicas do leito do reservatório (PORTO; PORTO; PALERMO, 2014), para abastecimento, e a nomeou como reserva técnica, com o fim de desatrelar daquela porção de água a associação ao termo ‘morto’, que possibilita a interpretação de um líquido putrefato, inerte (LEITE; MONTEIRO, 2016LEITE, D. A.; MONTEIRO, M. Racionamento retórico na Região Metropolitana de São Paulo: Seca sem precedentes ou má gestão dos recursos hídricos? Anais das XI Jornadas Latinoamericanas de Estudos Sociais da Ciência e da Tecnologia - ESOCITE 2016, 2016.).

28 de janeiro de 2014. Índice de reservação do Sistema Cantareira (SC): 22,9%

No primeiro comunicado sobre o período adverso que se avizinhava, a Sabesp apresentou o tom do discurso que permearia toda a sua comunicação ao longo daquele biênio. O documento intitulado ‘Principal sistema de abastecimento da Grande SP registra o menor nível em 10 anos’ (SABESP, 2014c) apresentava o clima como o único fator responsável pelo acontecimento. Segundo a empresa,

“As causas para essa situação preocupante [eram] as seguintes:

  • O ano de 2013 registrou apenas 1.090 milímetros de chuva nas quatro represas que formam o Sistema Cantareira. A média histórica anual é de 1.566 milímetros. Ou seja, não choveu nem 70% do esperado. Em 9 dos 12 meses a precipitação foi inferior ao que deveria;

  • O mês de dezembro de 2013 foi especialmente ruim: teve 62 milímetros de chuva, quando a média histórica é de 226 milímetros. Foi o pior mês de dezembro, desde que a medição começou a ser feita, há 84 anos;

  • Janeiro de 2014 segue o mesmo caminho; normalmente as chuvas chegam a 300 milímetros, mas o índice estava em 81 milímetros no dia 22;

  • O período chuvoso, que enche as represas, vai de outubro a março; mas de outubro de 2013 para cá, a chuva tem ficado 50% abaixo do esperado e as previsões de que os temporais chegariam não têm se confirmado;

  • As temperaturas estão 5% acima da média histórica em janeiro, e como não chove (o que ajudaria a baixar a temperatura), o consumo de água acaba se mantendo em nível elevado o dia todo.” (SABESP, 2014c).

Essa argumentação, contudo, não era novidade. A Sabesp já passara por situações semelhantes - risco de problemas de abastecimento na RMSP -, e a postura discursiva iniciada em 2014 obedeceu a um padrão argumentativo verificado anteriormente. Quatro momentos distintos demonstram essa padronização:

  1. Em 12 de outubro de 1994, quase vinte anos antes do início do evento crítico analisado neste artigo, matéria do jornal O Estado de São Paulo trazia declaração do então secretário de Recursos Hídricos, Saneamento e Obras do Estado de São Paulo, Antônio Felix, de que, ‘se não chovesse em quinze dias’, o abastecimento de água para a zona Leste da capital seria racionado (O ESTADO DE SÃO PAULO, 1994);

  2. Em 2000, o racionamento do fornecimento de água entre os meses de junho e setembro afetou a vida de três milhões de pessoas na cidade de São Paulo, de acordo com a Sabesp, devido ao ‘baixo índice de chuvas’ nos primeiros meses daquele outono (FOLHA DE SÃO PAULO, 2001a);

  3. Em 17 de abril de 2001, o jornal Folha de São Paulo trazia as razões dadas pela Sabesp para o racionamento do abastecimento de água que teria início naquele dia para 300 mil habitantes da RMSP: segundo a estatal, o Sistema Alto Cotia, um dos oito que abasteciam o aglomerado urbano, sofria então as consequências da estiagem do ano anterior, ‘considerada a maior dos últimos cem anos, e das chuvas abaixo da média histórica de janeiro e fevereiro’ (FOLHA DE SÃO PAULO, 2001b);

  4. Em 5 de julho de 2001, ao ser questionado sobre as razões para o gasto de R$ 4 milhões em campanhas publicitárias incentivando a população a economizar água, o então presidente da Sabesp, Ariovaldo Carmignani, justificara tal quantia por estar enfrentando “a pior estiagem dos últimos 70 anos” (GONÇALVES, 2001GONÇALVES, G. Sabesp investe R$ 4 milhões em propaganda por corte de água. Folha Online. Cotidiano, Folha de São Paulo, 5 de julho de 2001. Disponível em: https://www.google.com/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=&cad=rja&uact=8&ved=2ahUKEwjWssqLrqeBAxU5AbkGHaUZA2AQFnoECBIQAQ&url=https%3A%2F%2Fwww1.folha.uol.com.br%2Ffolha%2Fcotidiano%2Fult95u32330.shtml&usg=AOvVaw2jiR9vl_QbJ_6CzemdpHH4&opi=89978449. Acesso em: 13 set. 2023.
    https://www.google.com/url?sa=t&rct=j&q=...
    ).

Esse agenciamento discursivo do clima, verificado nas décadas anteriores ao biênio 2014-2015, coloca em xeque o argumento de que não seria possível estruturar-se para a gravidade apresentada por aquela crise, como afirmam os comunicados da Sabesp e do Gesp analisados ao longo deste artigo. Colocada a ressalva, seguimos para o segundo press release publicado pela concessionária.

1 de fevereiro de 2014. SC: 21,9%

No primeiro dia de fevereiro de 2014, - portanto quatro dias depois do primeiro comunicado -, a Sabesp anunciava programa de bonificação para aqueles consumidores atendidos pelo Sistema Cantareira que economizassem água (SABESP, 2014d), a primeira medida de mobilização da população adotada pela estatal para lidar diretamente com o evento que mais tarde ela trataria pela alcunha de ‘crise hídrica’. Entre outros dados, esse comunicado informava que o sistema Cantareira havia registrado naquele dia ‘o nível mais baixo na história1 1 - Ao contrário do que afirma a Sabesp, esse não fora o nível mais baixo já registrado no sistema Cantareira até então. Em 1° de dezembro de 2003, a Sabesp indicava 1,6% de reservação para aquele manancial (SABESP, 2023c). ’; que o ano de 2013 registrara apenas 1.090 milímetros de chuva, enquanto que ‘a média histórica anual é de 1.566 milímetros’, e que o mês de janeiro de 2014 superara o recorde histórico de calor registrado na capital (SABESP, 2014d).

A partir daquele comunicado, a abordagem do evento sob o enquadramento do comportamento climático passou a ser adotado também pelo Gesp.

10 de fevereiro de 2014. SC: 19,6%

O primeiro comunicado publicado pelo governo estadual sobre a questão do abastecimento na RMSP, intitulado ‘Alckmin expande programa de redução do consumo de água para mais de 1.500 escolas’ (SÃO PAULO, 2014c), trazia pronunciamento do governador, enfatizando a raridade daquele momento, bem como reafirmando a relação entre a escassez de chuvas e o abastecimento de água.

‘O calor está muito forte. É o verão mais intenso das últimas décadas. Normalmente, no verão, faz muito calor e chove bastante. Mas estamos tendo um verão muito quente e sem chuva. Por isso é preciso economizar água.’ (SÃO PAULO, 2014c).

18 de fevereiro de 2014. SC: 18,4%

De modo semelhante, em documento que trazia como enunciado ‘Bônus para quem reduzir o consumo faz sobrar água para abastecer 600 mil pessoas’ (SÃO PAULO, 2014d), Geraldo Alckmin afirmava:

‘É a maior seca dos últimos 84 anos na região do Cantareira. As chuvas ocorridas de quinta a domingo ajudaram o sistema a estabilizar. Teremos alguns dias secos agora, mas a partir do fim de semana teremos chuvas intensas, segundo a previsão meteorológica. É importante, porém, que chova no local certo’ (SÃO PAULO, 2014d).

Ao situar a ocorrência de 2014 como a mais grave dentro dos últimos 84 anos, Alckmin aciona a expertise científica das medições meteorológicas, e dos dados gerados por dispositivos tecnológicos, atrelando ao seu argumento um efeito de verdade (CHARAUDEAU, 2015CHARAUDEAU, P. Discurso das mídias. São Paulo: Contexto, 2015.) que buscou reduzir a possibilidade de disputa em torno das causas do evento. Se a ciência socialmente aceita foi instrumento para sustentar o argumento do clima como fator incontrolável, o chefe do poder executivo paulista, ainda, aliou ao fator climático a necessidade de localização específica das chuvas, outra variável que intensifica a alegação de um evento indômito. Dentro desse esforço comunicacional, a alteração do termo ‘estiagem’ para ‘seca’, no discurso do governador, é significativa para a acentuação da entonação argumentativa usada na comunicação da crise.

Ribeiro (1999RIBEIRO, R. W. Seca e Determinismo: a Gênese do Discurso do Semi-árido Nordestino. Anuário do Instituto de Geociências - UFRJ, v. 22, p. 60-91, 1999.) demonstra como o termo ‘seca’ está intimamente ligado ao determinismo geográfico nordestino. Presente no imaginário social brasileiro, a apropriação discursiva da escassez de água como mazela, como uma chaga que impõe a miséria sobre a população do semiárido teve no uso do substantivo ‘seca’ sua instrumentação. Enquanto a estiagem oferece contornos linguísticos presentes no discurso científico, a seca oferece um impacto semântico que remete às narrativas literárias, políticas e jornalísticas que retratam o sofrimento constante de populações que habitam o semiárido brasileiro. Nesse retrato, o aspecto mais relevante é a inevitabilidade da condição miserável imposta àquelas pessoas (RIBEIRO, 1999RIBEIRO, R. W. Seca e Determinismo: a Gênese do Discurso do Semi-árido Nordestino. Anuário do Instituto de Geociências - UFRJ, v. 22, p. 60-91, 1999.).

Nesse contexto, ao afirmar que aquela era ‘a maior seca dos últimos 84 anos na região do Cantareira’ (SÃO PAULO, 2014d), Alckmin agencia a expertise científica presente nos instrumentos de medição pluviométrica e na hidrologia, ao mesmo tempo em que se apoia em dois aspectos conceituais: a filosofia herderiana, do século XVII, segundo a qual ‘o plano divino poderia ser lido no mundo e o destino do homem estaria marcado no ambiente em que este vive’ (RIBEIRO, 1999RIBEIRO, R. W. Seca e Determinismo: a Gênese do Discurso do Semi-árido Nordestino. Anuário do Instituto de Geociências - UFRJ, v. 22, p. 60-91, 1999., p. 65), e a simbologia carregada pelo termo ‘seca’ no imaginário social brasileiro (id.).

31 de março de 2014. SC: 13,4%

Naquele 31 de março o Gesp publicou comunicado em que o governador anunciava a ampliação de programa de bonificação para os imóveis de toda a RMSP cujos moradores economizassem água, novamente ‘[e]m razão da maior estiagem dos últimos 84 anos’ (SÃO PAULO, 2014b).

15 de maio de 2014. SC: 8,2%

Em discurso proferido durante evento de acionamento do sistema de bombeamento para captação do volume morto da represa Jaguari, Alckmin afirmara:

‘O Governo de São Paulo não está esperando São Pedro para resolver o problema da seca. Nós estamos trabalhando 24 horas por dia com todo o empenho, engenharia e técnica para garantir o abastecimento de água à população.’ (SÃO PAULO, 2014g).

Em outro trecho, do mesmo comunicado, enunciado sobre a questão do ineditismo do comportamento climático voltaria a ser redigido:

‘O ano hidrológico 2013-2014 apresentou índices pluviométricos fortemente desfavoráveis na bacia de contribuição do Cantareira. Foi a pior seca desde que as medições dos institutos de meteorologia começaram, há 84 anos. (...) Por sua vez, a estiagem veio associada a temperaturas médias elevadas, as mais altas registradas nos últimos 70 anos.’ (SÃO PAULO, 2014g).

2 de junho de 2014. SC: 6,1%

Um último press release seria publicado pela Sabesp antes do período pré-eleitoral, em que agentes públicos candidatos à reeleição são impedidos de usar canais oficiais para anúncios (BRASIL, 2016b). Ao comunicar a imprensa sobre ação de conscientização em que os empregados da empresa circulariam por São Paulo, distribuindo folhetos informativos aos cidadãos, a Sabesp aproveitava para alertar sobre a criticidade do momento: ‘A região metropolitana passa pela mais importante crise hídrica desde os anos 1930.’ (SABESP, 2014a).

5 de novembro de 2014. SC: -17,5%

A outra ênfase no determinismo climático discursada pelo Gesp viria em anúncio de inauguração de reservatórios de água tratada no sul da capital paulista. Nele, o Gesp afirmava que ‘[aquele] conjunto de obras [era] mais uma ação no plano estratégico de combate aos efeitos da seca’ (SÃO PAULO, 2014a).

2 de dezembro de 2014. SC: -20,7%

Na mesma linha do comunicado publicado em 5 de novembro, o Gesp afirmou naquele início de dezembro que ‘[aquelas] obras comp[unham] o plano estratégico da Sabesp no combate aos efeitos da seca’ (SÃO PAULO, 2014f).

18 de dezembro de 2014. SC: -22,4%

Naquele ano, dois comunicados encerravam o reforço discursivo do determinismo climático para a crise de abastecimento. Em conjunto, Gesp e Sabesp anunciavam a implantação de cobrança de sobretaxa para aqueles consumidores que aumentassem seu consumo de água. Enquanto aquele afirmava que ‘[o] Governo do Estado [havia] anunci[ado] quatro novas medidas para combater a maior seca da história’ (SÃO PAULO, 2014e), esta escrevia que ‘[o] Governo do Estado de São Paulo e a Sabesp [haviam] anuncia[do naquele dia] novas medidas para combater a maior seca da história’ (SABESP, 2014b).

Em 2015, apesar de mais chuvoso, o determinismo climático ainda guiou o discurso da Sabesp e do Gesp

Enquanto o ano de 2014 foi notadamente seco, registrando uma média de chuvas 13% abaixo da série histórica iniciada em 1933 (IAG/USP, 2014b), 2015 foi o oitavo mais chuvoso (IAG/USP, 2015a). Contudo, devido ao modelo de abastecimento de água adotado pela Sabesp, que exige profunda e constante drenagem dos mananciais, as chuvas trariam a recuperação dos mananciais apenas no segundo semestre. Por isso, a centralização da crise de abastecimento nos fatores climáticos teve sequência na argumentação do Gesp e, mais fortemente, da Sabesp: enquanto aquele disparou ao longo do ano dois press releases destacando a escassez de chuvas e o calor como justificativas para o cenário crítico, a estatal publicou dez documentos com esse teor. O primeiro a se pronunciar, todavia, foi o governo paulista.

27 de janeiro de 2015. SC: -24,2%

Naquele ano, o Gesp inaugurou a sequência de comunicados afirmando que ‘Governador Alckmin entrega[va] obra que aumenta[va] a captação de água no Sistema Alto Tietê’ (SÃO PAULO, 2015d). Segundo o Gesp, a referida obra viria a garantir o abastecimento da população ‘mesmo diante da pior seca da história da região Sudeste’ (SÃO PAULO, 2015d).

1 e 2 de fevereiro de 2015. SC: -24,3%

Cinco dias depois, a Sabesp anunciava a chamada pública para a execução da obra de interligação entre as represas Jaguari (bacia do Paraíba do Sul) e Atibainha (bacia do Sistema Cantareira). Ao fazê-lo, a estatal ecoou o discurso do Gesp, afirmando que a obra era importante “para enfrentar a pior seca da história do Sudeste” (SABESP, 2015h).

De maneira semelhante, no dia seguinte, anunciando ações de combate às ligações irregulares que desviavam água do sistema de distribuição, às quais o comunicado trazia sob a denominação de ‘fraudes’ (SABESP, 2015d), a Sabesp afirmava serem ainda mais graves ‘diante da pior seca da história da Região Metropolitana de São Paulo’ (id.).

25 de junho de 2015. SC: -9,3%

O Gesp anunciava nova etapa da obra inicialmente noticiada pela Sabesp em 1o de fevereiro, que interligaria as represas Jaguari e Atibainha. Naquele 25 de junho o governador Geraldo Alckmin assinara com o governo federal o termo de financiamento para a referida empreitada. No press release, a obra foi descrita pelo Gesp como ‘uma medida importante para enfrentar a pior seca da história do Sudeste’ (SÃO PAULO, 2015b).

11 de agosto de 2015. SC: -11,6%

A Sabesp publicou naquele dia o relatório Crise Hídrica, Estratégia e Soluções da Sabesp para a Região Metropolitana de São Paulo (CHESS) (SABESP, 2015b). Na página 9, usando como referência estudo produzido pelo Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (CEMADEN) e pelo Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), vinculados ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), a Sabesp assim descreveu o comportamento climático que impediu a formação de chuvas durante a primavera e o verão de 2013, período do ano historicamente chuvoso na região Sudeste:

‘Neste período do ano hidrológico (outubro/13 a fevereiro/14), ocorreram 444 mm de chuvas na região do Cantareira, quando a média é de 995 mm (-55 %)’ (SABESP, 2015b, p. 9).

Em outro ponto, o quarto capítulo do relatório CHESS foi aberto por enunciado reforçando a condição climática como fator exclusivo para o agravamento do quadro crítico:

‘Ao iniciar o Ano Hidrológico 2014/15, entre outubro e dezembro de 2014, as expectativas de que se retomasse o caminho da normalidade hidrológica foram se frustrando mês a mês, pois as chuvas esperadas para a estação não se iniciaram. (...) [D]e outubro/14 a janeiro/15, as chuvas ficaram abaixo das médias esperadas em todos os sistemas e, como consequência, acentuaram as quedas nas vazões afluentes aos sistemas.’ (SABESP, 2015b, p. 26).

Em seguida, no mesmo tom discursivo, a empresa enunciou que a chegada do verão, ao final do ano de 2014, por apresentar um comportamento hidrológico ainda mais crítico, suplantou o cenário vivido ao longo daquele ano.

‘[N]os meses de fevereiro e março de 2015, as chuvas finalmente ocorreram (..), mas ainda muito abaixo das médias esperadas para os respectivos meses (...). Ou seja, a recuperação dos mananciais neste período não foi suficiente para trazer o abastecimento à normalidade.’ (SABESP, 2015b, p. 27).

14 de setembro de 2015. SC: -12,8%

A Sabesp voltava a afirmar que as fraudes que desviavam água da rede de abastecimento tinham sua gravidade intensificada ‘diante da pior seca da história da Grande São Paulo’ (SABESP, 2015c), ao publicar press release com balanço de ações voltadas a combatê-las.

30 de setembro de 2015. SC: -13%

Dezesseis dias depois o Gesp anunciava a inauguração da obra de interligação entre os sistemas Rio Grande e Alto Tietê, ambos integrantes do Sistema Integrado Metropolitano, atrelando-a ao nome do governador: “Alckmin inaugura a principal obra de combate à crise hídrica da Grande São Paulo” (SÃO PAULO, 2015c). Nesse mesmo dia a Sabesp publicou cinco comunicados. Em um deles, a estatal ressoava a inauguração da ‘principal obra de combate à crise hídrica da Grande São Paulo’ (SABESP, 2015g), inaugurada num momento em que os sistemas de reservação de água da RMSP apresentavam sinais de melhora.

Em outro press release, a empresa afirmou que “apesar da melhora, a situação ainda é preocupante. A falta recorde de chuvas, que transformou 2014 no pior ano da história, não teve grande evolução em 2015” (SABESP, 2015a); em outro documento, a empresa convidava o leitor para conhecer as obras encampadas ‘para enfrentar a pior seca da história’ (SABESP, 2015e); outro comunicado, denotando por parte da empresa um discurso voltado para o retrospecto da crise, trazia a assertiva de que a ‘pior seca da história do Sistema Cantareira e a falta de chuvas que também afetou outros sistemas da Grande São Paulo fizeram com que a Sabesp adotasse uma série de medidas rápidas para garantir o abastecimento da população’ (SABESP, 2015f).

2 de outubro de 2015. SC: -12,8

O último comunicado em que a tese do determinismo climático foi reforçada, no início de outubro de 2015, se deu em razão de nova etapa de divulgação da obra de interligação entre as represas Jaguari e Atibainha - desta vez anunciando a assinatura da autorização para início da operação. Nele, o Gesp reforçava a mensagem de que ‘a interligação é uma medida importante para enfrentar a pior seca da história do Sudeste’ (SÃO PAULO, 2015a).

Ao concentrar o enquadramento de sua estratégia discursiva em um único fator causal, qual seja o comportamento climático, recheando-o com enunciados que creditam o motivo para a crise exclusivamente à falta de chuvas e ao intenso calor, a Sabesp e o Gesp centralizam sua racionalidade nos riscos inerentes à operação de uma infraestrutura que depende, por essa perspectiva, unicamente de um fator incontrolável, neutralizando discursivamente os demais coeficientes relacionados à gestão da água metropolitana, moldando a crise de abastecimento na RMSP como um “acidente de sistema” (PERROW, 1999PERROW, C. Normal accidents: living with high-risk technologies. Princeton: Princeton University Press, 1999.).

O discurso emerge, assim, como um instrumento de ação sobre as causas do evento crítico, aparelhado por riscos associados à indeterminação do fator climático, dados e informações que, dispostos sob determinado enquadramento, produzem valor e efeito de verdade para a interpretação dos agentes portadores do instrumento discursivo.

Outros atores sociais posicionaram seus discursos no campo controverso aberto pela crise de abastecimento na RMSP durante o biênio 2014-2015. A imprensa foi o mais incisivo na disputa pela interpretação do evento crítico, acionando especialistas em áreas diversas como engenheiros, químicos, climatologistas e sociólogos, explicitando a interdisciplinaridade da água urban(izad)a (LEITE, 2018LEITE, D. A. Gerenciamento de discursos hídricos: A comunicação da crise de abastecimento de água na Região Metropolitana de São Paulo (2014-2015). 2018. Dissertação de mestrado, Universidade Estadual de Campinas.). A sociedade civil teve seus discursos representados pela Organização Não Governamental (ONG) Artigo 19, entidade norte-americana fundada em 1987, que divulgou relatório em outubro de 2014, com o título ‘Sistema Cantareira e a crise da água em São Paulo: a falta de transparência no acesso à informação’(MARTINS, 2014MARTINS, A. Sistema Cantareira e da crise da água em São Paulo: a falta de transparência no acesso à informação. São Paulo: Artigo 19, 2014), e pela Aliança pela Água, conjunto de ONGs formado pelo Coletivo de Luta pela Água, Greenpeace e pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), que veiculou relatório intitulado Crise hídrica e direitos humanos - Relatório de violação de direitos na gestão hídrica do estado de São Paulo’ (MARTINS et al., 2015).

Considerações finais

As circunstâncias apresentadas pela crise de abastecimento hídrico de 2014-2015 na RMSP oferecem condições singulares de análise para a relação entre o discurso público e a gestão da infraestrutura de abastecimento hídrico, artefato sociotécnico basilar para a sociedade urbana moderna.

Por meio da racionalidade científica e da acepção desta como uma entidade de caráter impessoal e despolitizado, os portadores do discurso, ao agenciá-la com o uso de dados gerados por instrumentos tecnológicos consensuados, manejaram a interpretação do episódio de forma conveniente à gestão adotada para a rede de abastecimento de água da grande São Paulo.

Classificar o evento como uma crise, inicialmente, possibilitou à Sabesp e ao Gesp neutralizar a responsabilidade prévia sobre medidas de prevenção que poderiam atenuá-lo. A instauração discursiva de uma crise possibilitou também priorizar decisões e recursos emergenciais para sua mitigação, e valorar seu gerenciamento e solução, transformando a conclusão do evento crítico em uma conquista vitoriosa.

A partir do enquadramento do determinismo climático, cujo valor e efeito de verdade foram exercidos principalmente por dados estatísticos, a Sabesp e o Gesp narraram o consumo individual como fator mitigador da crise de abastecimento, e as obras civis como soluções ótimas, relatadas de modo a neutralizar opiniões contrárias ou questionadoras quanto à eficácia dos empreendimentos para a crise em curso, bem como seus impactos ambientais, sociais e futuras consequências. Apesar do efetivo papel da excepcionalidade climática para o quase colapso do sistema de abastecimento da RMSP, o discurso da Sabesp e do Gesp foi regado por um arranjo adjetivo que relativizou a posição dos controladores da infraestrutura de abastecimento hídrico da RMSP, glorificando-se como autores da superação do episódio no momento da normalização das chuvas em 2015.

A expertise relativa à operação do sistema de abastecimento estende-se também à estratégia adotada para fazer com que um episódio como esse seja entendido, registrado, e futuramente lembrado de acordo com um plano argumentativo determinado, que resulta em um produto conceitual que pode ser usado de diversas outras formas, direcionando decisões e agendas políticas.

Dessa forma, o discurso conduzido pela Sabesp e pelo governo do Estado de São Paulo sobre a crise de abastecimento na RMSP, durante os anos de 2014 e 2015, demonstrou planejamento e estratégia para sua conformação interpretativa. Dentro dessa deliberada enunciação sobre o evento crítico está a disputa pelo poder de controlar e expandir uma infraestrutura urbana fundamentada na onipresença da água nos moldes que conceituam a vida moderna, acessível não em estado bruto, em rios e poços, mas por meio de uma segunda natureza, formada por tubulações e dispositivos cuja dependência de seus usuários é completa e manente.

References

  • ANAND, N. Hydraulic City. Durham: Duke University Press, 2017.
  • ______. A public matter: Water, hydraulics, biopolitics. In: ANAND, N. G., AKHIL; APPEL, HANNAH (Orgs.). The Promise of Infrastructure. London: Duke University Press, 2018. p.155-172.
  • ANAND, N.; GUPTA, A.; APPEL, H. The promise of infrastructure. London: Duke University Press, 2018.
  • BARRAQUÉ, B.; FORMIGA JOHNSSON, R. M.; BRITTO, A. L. N. P. The development of water services and their interaction with water resources in European and Brazilian cities. Hydrology and Earth System Sciences, v. 12, p. 1153-1164, 2008.
  • BOBBIO, N.; MATTEUCCI, N.; PASQUINO, G. Dicionário de política. Brasília: Editora UNB, 1998.
  • BOLTON, R.; FOXON, T. J. Infrastructure transformation as a socio-technical process - Implications for the governance of energy distribution networks in the UK. Technological Forecasting and Social Change, v. 90, p. 538-550, 2015.
  • BOURDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989.
  • BRASIL. Lei 8666, de 21 de junho de 1993.
  • ______. Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007.
  • ______. Resolução nº 237, de 19 de dezembro de 1997.
  • ______. Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento: Diagnóstico Temático Serviços de Água e Esgoto - Visão Geral. Ministério do Desenvolvimento Regional - Secretaria Nacional de Saneamento. Brasília. 2023
  • BUSTOS, M. R. L. A educação ambiental sob a ótica da gestão dos recursos hídricos. 2003. Tese de doutorado, Universidade de São Paulo.
  • CANDIDO, J. L. Falhas de mercado e regulação no saneamento básico. Revista Informe Econômico, v. 1, n. 1, 2013.
  • CARVALHO, A. E. C.; SAMPAIO, L. M. B. Paths to universalize water and sewage services in Brazil: The role of regulatory authorities in promoting efficient service. Utilities Policy, v. 34, p. 1-10, 2015.
  • CHARAUDEAU, P. Discurso das mídias. São Paulo: Contexto, 2015.
  • CRUZ, K. A. D.; RAMOS, F. D. S. Evidências de subsídio cruzado no setor de saneamento básico nacional e suas consequências. Nova Economia, v. 26, p. 623-651, 2016.
  • DA SILVA, J. O. A produção de discursos políticos na visão de Pierre Bourdieu. Tempo da ciência, v. 12, n. 23, p. 187-200, 2005.
  • DINIZ, M. F. A. Governança da água: uma avaliação dos serviços brasileiros de abastecimento de água e esgotamento sanitário nos anos de 2002, 2007 e 2012. 2016. Tese de Doutorado, Universidade Federal do Rio Grande do Norte
  • EDWARDS, P. N. Infrastructure and Modernity: Force, Time, and Social Organization in the History of Sociotechnical Systems. In: Misa, T. J.; Brey, P.; Feenberg, A. (Orgs.). Modernity and Technology. Cambridge, MA: MIT Press, 2003. p.185 - 226.
  • FABHAT. Plano de Bacia Hidrográfica do Alto Tietê - Resumo Executivo. São Paulo: Fundação Agência da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê, 2019. Disponível em: https://comiteat.sp.gov.br/wp-content/uploads/2020/02/Resumo-Executivo-PBH-AT-2018.pdf Acesso em: 14 de setembro de 2023.
    » https://comiteat.sp.gov.br/wp-content/uploads/2020/02/Resumo-Executivo-PBH-AT-2018.pdf
  • FAIRCLOUGH, N. L. Discourse and Social Change. Cambridge, MA: Polity Press, 1992.
  • FELGENHAUER, T. Geographies of infrastructure systems: The user’s lifeworld and interface design. Tijdschrift voor Economische en Sociale Geografie, v. 103, n. 4, p. 385-395, 2012.
  • FOLHA DE SÃO PAULO. 3 milhões foram afetados em 2000. Folha de São Paulo. Cidades, p. C7, 23 de março, 2001a.
  • ______. Racionamento começa para 300 mil pessoas. Folha de São Paulo. Cidades, p. C4, 17 de abril, 2001b.
  • GONÇALVES, G. Sabesp investe R$ 4 milhões em propaganda por corte de água. Folha Online. Cotidiano, Folha de São Paulo, 5 de julho de 2001. Disponível em: https://www.google.com/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=&cad=rja&uact=8&ved=2ahUKEwjWssqLrqeBAxU5AbkGHaUZA2AQFnoECBIQAQ&url=https%3A%2F%2Fwww1.folha.uol.com.br%2Ffolha%2Fcotidiano%2Fult95u32330.shtml&usg=AOvVaw2jiR9vl_QbJ_6CzemdpHH4&opi=89978449 Acesso em: 13 set. 2023.
    » https://www.google.com/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=&cad=rja&uact=8&ved=2ahUKEwjWssqLrqeBAxU5AbkGHaUZA2AQFnoECBIQAQ&url=https%3A%2F%2Fwww1.folha.uol.com.br%2Ffolha%2Fcotidiano%2Fult95u32330.shtml&usg=AOvVaw2jiR9vl_QbJ_6CzemdpHH4&opi=89978449
  • HERRERA, A. A América Latina necessita de um modelo alternativo de desenvolvimento tecnológico. In: DAGNINO, R. S., ROGÉRIO BEZERRA (Orgs.). Amilcar Herrera: Um intelectual latino-americano. Florianópolis: Insular, 1980. p.29 - 42.
  • LEITE, D. A. Gerenciamento de discursos hídricos: A comunicação da crise de abastecimento de água na Região Metropolitana de São Paulo (2014-2015). 2018. Dissertação de mestrado, Universidade Estadual de Campinas.
  • LEITE, D. A.; MONTEIRO, M. Racionamento retórico na Região Metropolitana de São Paulo: Seca sem precedentes ou má gestão dos recursos hídricos? Anais das XI Jornadas Latinoamericanas de Estudos Sociais da Ciência e da Tecnologia - ESOCITE 2016, 2016.
  • MAGALHÃES, H. G. D.; DA SILVA, L. H. O.; BATISTA, D. J. Do herói ficcional ao herói político. Ciências & Cognição, v. 12, 2007. ISSN 1806-5821.
  • MARCONDES, M. J. A. Cidade e natureza: proteção dos mananciais e exclusão social. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1999.
  • MARTINS, A. Sistema Cantareira e da crise da água em São Paulo: a falta de transparência no acesso à informação. São Paulo: Artigo 19, 2014
  • MARTINS, E. et al. Crise hídrica e direitos humanos: relatório de violação de direitos humanos na gestão hídrica do Estado de São Paulo. São Paulo: Aliança pela água, 2015
  • MOREIRA, R. S.; FRAGALE, R. Discursos judiciais sobre favelas: impacto em políticas públicas e nos agentes sociais. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 33, n. 96, 2018.
  • O ESTADO DE SÃO PAULO. Secretário prevê rodízio dentro de 15 dias. O Estado de São Paulo. Cidades, p. C3, 12 de outubro de 1994.
  • PERROW, C. Normal accidents: living with high-risk technologies. Princeton: Princeton University Press, 1999.
  • PETERS, G. Habitus, reflexividade e neo-objetivismo na teoria da prática de Pierre Bourdieu. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 28, p. 47-71, 2013.
  • PORTO, R. L.; PORTO, M. F. A.; PALERMO, M. A ressurreição do volume morto do Sistema Cantareira na Quaresma. Revista DAE, v. 62, n. 197, p. 18-25, 2014.
  • PREMEBIDA, A.; NEVES, F. M.; ALMEIDA, J. Estudos sociais em ciência e tecnologia e suas distintas abordagens. Sociologias, v. 13, n. 26, p. 22-42, 2011.
  • RIBEIRO, B. Sabesp compra 20 bombas para o fundo da Cantareira. O Estado de São Paulo. Metrópole, p. A18, 28 de fevereiro de 2014.
  • RIBEIRO, R. W. Seca e Determinismo: a Gênese do Discurso do Semi-árido Nordestino. Anuário do Instituto de Geociências - UFRJ, v. 22, p. 60-91, 1999.
  • SABESP. Funcionários vão às ruas para estimular população a economizar água. Comunicado à imprensa, São Paulo, 2 de junho de 2014a.
  • ______. Governo anuncia medidas para ampliar redução do consumo de água. Comunicado à imprensa, São Paulo, 18 de dezembro de 2014b.
  • ______. Principal sistema de abastecimento da Grande SP registra o menor nível em 10 anos. Comunicado à imprensa, São Paulo, 28 de janeiro de 2014c.
  • ______. Sabesp cria incentivo econômico à redução no consumo de água. Comunicado à imprensa, São Paulo, 1 de fevereiro de 2014d.
  • ______. Ações da Sabesp fazem a Grande SP ter mais água hoje do que em 2014. Comunicado à imprensa, São Paulo, 30 de setembro de 2015a.
  • ______. CHESS - Crise Hídrica, Estratégia e Soluções da Sabesp. São Paulo: Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo, 2015b
  • ______. Com aumento de denúncias, Sabesp flagra 11.168 furtos de água em 2015. Comunicado à imprensa, São Paulo, 14 de setembro de 2015c.
  • ______. Combate a fraudes da Sabesp em 2014 recupera 2,6 bilhões de litros de água na Grande SP. Comunicado à imprensa, São Paulo, 2 de fevereiro de 2015d.
  • ______. Conheça as obras da Sabesp para enfrentar a pior seca da história. Comunicado à imprensa, São Paulo, 30 de setembro de 2015e.
  • ______. Entenda como a Sabesp reduziu o consumo de água e permitiu a recuperação das represas. Comunicado à imprensa, São Paulo, 30 de setembro de 2015f.
  • ______. Governo de SP inaugura principal obra de combate à crise hídrica da Grande São Paulo. Comunicado à imprensa, São Paulo, 30 de setembro de 2015g.
  • ______. Governo de SP lança licitação de obra que interliga Sistema Cantareira à bacia do Paraíba. Comunicado à imprensa, São Paulo, 1 de fevereiro de 2015h.
  • ______. Demonstrações Financeiras em 31 de dezembro de 2020 e 2019. São Paulo: Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo - Sabesp. 25 de março de 2021a. Disponível em: https://api.mziq.com/mzfilemanager/v2/d/9e47ee51-f833-4a23-af98-2bac9e54e0b3/08ff3285-8d3e-77ea-9442-00ceb0baf650?origin=1 Acesso em: 14 de setembro de 2023
    » https://api.mziq.com/mzfilemanager/v2/d/9e47ee51-f833-4a23-af98-2bac9e54e0b3/08ff3285-8d3e-77ea-9442-00ceb0baf650?origin=1
  • ______. Imprensa. 2021b. Disponível em: http://site.sabesp.com.br/site/imprensa Acesso em: 14 de setembro de 2023.
    » http://site.sabesp.com.br/site/imprensa
  • ______. Infográfico Cantareira. 2021c.
  • ______. Divulgação de resultados 2022. Comunicado à imprensa, 23 de março de 2023a. Disponível em: https://api.mziq.com/mzfilemanager/v2/d/9e47ee51-f833-4a23-af98-2bac9e54e0b3/605acc12-47af-e32a-9429-7e770045e2d9?origin=1 Acesso em: 14 de set. 2023
    » https://api.mziq.com/mzfilemanager/v2/d/9e47ee51-f833-4a23-af98-2bac9e54e0b3/605acc12-47af-e32a-9429-7e770045e2d9?origin=1
  • ______. Relatório de sustentabilidade 2022. São Paulo: Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo - Sabesp, 2023b. Disponível em: https://api.mziq.com/mzfilemanager/v2/d/9e47ee51-f833-4a23-af98-2bac9e54e0b3/c69974d8-f3f1-d037-f5de-b5e509f74560?origin=1 Acesso em: 14 de setembro de 2023.
    » https://api.mziq.com/mzfilemanager/v2/d/9e47ee51-f833-4a23-af98-2bac9e54e0b3/c69974d8-f3f1-d037-f5de-b5e509f74560?origin=1
  • ______. Situação dos mananciais. Página virtual mantida pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo - Sabesp, 2023c. Disponível em: https://mananciais.sabesp.com.br/Situacao Acesso em: 14 de setembro de 2023.
    » https://mananciais.sabesp.com.br/Situacao
  • SÃO PAULO (Estado). Resolução conjunta SMA/SSRH nº 02, de 17 de agosto de 2012. São Paulo, 17 de agosto de 2012. Disponível em: http://arquivos.ambiente.sp.gov.br/legislacao/2012/11/Resolu%C3%A7%C3%A3o-Conjunta-SMA-SSRH-002-2012-Processo-SSRH-195-2011-SMA-e-SSRH-para-estabelecer-procedimentos-relacionados-%C3%A0s-licita%C3%A7%C3%B5es-e-contrata%C3%A7%C3%B5es-p%C3%BAblicas-sustent%C3%A1veis.pdf Acesso em: 14 de setembro de 2023.
    » http://arquivos.ambiente.sp.gov.br/legislacao/2012/11/Resolu%C3%A7%C3%A3o-Conjunta-SMA-SSRH-002-2012-Processo-SSRH-195-2011-SMA-e-SSRH-para-estabelecer-procedimentos-relacionados-%C3%A0s-licita%C3%A7%C3%B5es-e-contrata%C3%A7%C3%B5es-p%C3%BAblicas-sustent%C3%A1veis.pdf
  • ______. Alckmin anuncia 29 reservatórios e estações de produção de água de reúso. Comunicado à imprensa, São Paulo, 5 de novembro de 2014a.
  • ______. Alckmin anuncia ampliação do bônus na conta de água para 31 municípios. Comunicado à imprensa, São Paulo, 31 de março de 2014b.
  • ______. Alckmin expande programa de redução do consumo de água para mais de 1.500 escolas. Comunicado à imprensa, São Paulo, 10 de fevereiro de 2014c.
  • ______. Bônus para quem reduzir o consumo faz sobrar água para abastecer 600 mil pessoas. Comunicado à imprensa, São Paulo, 18 de fevereiro de 2014d.
  • ______. Governo amplia ações de incentivo à economia de água. Comunicado à imprensa, São Paulo, 18 de dezembro de 2014e.
  • ______. Governo do Estado amplia em 1 mil litros por segundo a produção de água do Sistema Guarapiranga. Comunicado à imprensa, São Paulo, 2 de dezembro de 2014f.
  • ______. Governo do Estado e Sabesp iniciam captação de água da reserva técnica do Cantareira. Comunicado à imprensa, São Paulo, 15 de maio de 2014g.
  • ______. Alckmin assina autorização para obra de interligação Jaguari-Atibainha. Comunicado à imprensa, São Paulo, 2 de outubro de 2015a.
  • ______. Alckmin assina financiamento para obras de interligação entre as represas Jaguari e Atibainha. Comunicado à imprensa, São Paulo, 25 de junho de 2015b.
  • ______. Alckmin inaugura a principal obra de combate à crise hídrica da Grande São Paulo. Comunicado à imprensa, São Paulo, 30 de setembro de 2015c.
  • ______. Governador Alckmin entrega obra que aumenta a captação de água no Sistema Alto Tietê. Comunicado à imprensa, São Paulo, 27 de janeiro de 2015d.
  • ______. Releases. 2021. Disponível em: < http://www.saopaulo.sp.gov.br/sala-de-imprensa/release/ >. Acesso em: 14 de setembro de 2023.
    » http://www.saopaulo.sp.gov.br/sala-de-imprensa/release/
  • SISMONDO, S. An Introduction to Science and Technology Studies. Sussex, United Kingdom: Wiley-Blackmell, 2010.
  • SMITH, A.; STIRLING, A. Social-ecological resilience and socio-technical transitions: critical issues for sustainability governance. Brighton STEPS centre working paper, v. 8, n. 8, p. 1-25, 2008.
  • SMITH, A.; STIRLING, A.; BERKHOUT, F. The governance of sustainable socio-technical transitions. Research Policy, v. 34, n. 10, p. 1491-1510, 2005.
  • STAR, S. L. The Ethnography of Infrastructure. Journal of Composite Materials, v. 33, n. 10, p. 928-940, 1999.
  • TRACY, K. Discourse analysis in communication. In: (Orgs.). The Handbook of Discourse Analysis. Malden, Massachusetts, USA: Blackwell Publishers Ltd, 2001. p.725-749.
  • VIGLIO, J. E.; MONTEIRO, M.; DA COSTA FERREIRA, L. Ciência e processo decisório: A influência dos experts no licenciamento ambiental de um empreendimento petrolífero no litoral paulista. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 33, n. 98, p. 1-22, 2018.
  • 1
    - Ao contrário do que afirma a Sabesp, esse não fora o nível mais baixo já registrado no sistema Cantareira até então. Em 1° de dezembro de 2003, a Sabesp indicava 1,6% de reservação para aquele manancial (SABESP, 2023c).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    09 Jun 2021
  • Aceito
    20 Jul 2023
ANPPAS - Revista Ambiente e Sociedade Anppas / Revista Ambiente e Sociedade - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revistaambienteesociedade@gmail.com