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Narrativas de Política Pública e Governança da Energia Distribuída no Brasil

Resumo

Com base no método de análise de documentos de política e a abordagem da teoria dos Estudos da Ciência e a Tecnologia, analisamos neste artigo a construção de formas institucionalmente legitimadas de limitação discursiva da energia distribuída no Brasil. No artigo analisa-se um subconjunto de documentos centrais para a definição da política energética da energia distribuída, entre aqueles produzidos por órgãos reguladores, como a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e a Agência de Pesquisa Energética (EPE). Como contribuição para pesquisas futuras sobre a governança da política energética trazemos à tona a relevância de reformular todo o processo de regulação da energia distribuída em termos de uma tentativa de construir uma narrativa de controle sobre as inovações técnicas com potencial para democratizar o acesso e uso dos serviços de energia. O objetivo tácito dessa narrativa política é manter o controle e a centralização

Palavras-chave:
Energia distribuída; governança; conflitos sociotécnicos; Brasil; transição energética

Abstract

Based on the policy document analysis method and a conceptual framework derived from Science and Technology Studies, this paper analyses the construction of institutionally legitimated forms of discursive limitation of energy governance in Brazil. The paper analyzes a subset of selected vital policy documents produced by regulatory bodies such as the National Energy Agency (ANEEL) and the Energy Research Office (EPE). As an insight for further research on the governance of energy policy, the paper’s contribution to the debate is to bring to the fore the relevance of recasting the whole process of regulation of distributed energy in terms of an attempt to build a narrative of control over socio-technical innovation with the potential to democratize access to and use of energy services. This policy narrative’s unspoken goal is to retain control of the Brazilian energy transition at the central level.

Keywords:
Distributed Energy Resources; governance; socio-technical conflicts; Brazil; energy transition

Resumen

Con base en el método de análisis de documentos de política y el enfoque teórico de los Estudios Sociales de la Ciencia y la Tecnología (STS por el acrónimo en inglés), este artículo analiza la construcción de formas institucionalmente legítimas de normalización discursiva de la energía distribuida en Brasil. El artículo analiza un subconjunto de documentos que se destacan como fundamentales para la definición de la política energética para de energía distribuida, incluidos aquellos elaborados por organismos reguladores como la Agencia Nacional de Energía Eléctrica (ANEEL) y la Agencia de Investigación Energética (EPE). Como contribución a la investigación futura sobre la gobernanza de la política energética, el artículo destaca la relevancia de reformular todo el proceso de regulación de la energía distribuida en términos de un intento de construir una narrativa de control sobre las innovaciones técnicas y su potencial de democratizar el acceso y el uso de los servicios energéticos. El objetivo tácito de esta narrativa política es mantener el control centralizado de la transición energética brasileña.

Palabras-clave:
Energía distribuida; gobernanza; conflictos sociotécnicos; Brasil; transición energética

Introdução

Neste artigo analisamos as narrativas institucionais emergentes relativas a uma configuração sociotécnica de energia em evolução no Brasil, a Energia Distribuída (ED)1 1 - Esta forma de energia é conhecida em inglês como Distributed Energy Resources (DER). . Em um documento-chave, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) descreve a crescente presença de ED:

O crescimento recente, aliado à característica da ED, indica que a difusão dessas tecnologias apresenta um alto potencial disruptivo, capaz de transformar profundamente os sistemas elétricos que hoje são operados predominantemente com geradores de maior porte e gerenciados de forma centralizada. (EPE - MME, 2018, p.2).

A natureza objetiva, material e técnica da inovação do ED é objeto de severo confronto de poder no âmbito da governança da energia no Brasil. Na verdade, por que uma nova modalidade de geração de energia é definida como “disruptiva”? Que tipo de arranjo institucional a autoridade de energia (o Ministério de Minas e Energia e seu principal escritório científico) está tentando defender? Por que essa “incerteza” movida pela demanda é colocada em uma posição tão central pela narrativa produzida pelas instituições que desempenham um papel central na governança de energia no Brasil? Este artigo é uma tentativa de lançar luz sobre essas questões como uma contribuição para a compreensão da governança das configurações sociotécnicas em transformação, adotando uma perspectiva dos Estudos de Ciência e Tecnologia (STS pelo acrônimo em inglês2 2 - Science and Technology Studies (STS). ) / ciências sociais.

O artigo está estruturado da seguinte forma. Após a introdução, a seção metodológica (material e métodos) justifica a adoção da análise de documentos de política (PDA pelo acrônimo em inglês3 3 - Policy Document Analysis (PDA). ) como a abordagem principal, guiada pelas contribuições principais do STS (seção 3). Além disso, a seção enquadra o PDA no contexto mais amplo de pesquisa de referência para contextualizar o leitor e esclarecer ainda mais o escopo do artigo. Conforme antecipado, a terceira seção apresenta o embasamento conceitual da pesquisa da área interdisciplinar de Estudos em Ciência e Tecnologia (STS). A partir do STS, este trabalho tira proveito de elaborações que abordam a questão da política energética e dos serviços públicos, respectivamente; a saber, Jasanoff e Kim (2013JASANOFF, S.; KIM, S. H. Sociotechnical Imaginaries and National Energy Policies. Science as Culture, v. 22, n. 2, p. 189-196, 2013.a), e Jaglin (2014JAGLIN, S. Regulating Service Delivery in Southern Cities. In: PARNELL, SUSAN; OLDFIELD, S. (Ed.). The Routledge Handbook on Cities of the Global South. 1. ed. London & New York: Routledge, 2014. p. 434-447.) cujo extenso trabalho tem enfatizado a centralidade das configurações sociotécnicas para a análise da política energética, bem como as dimensões culturais e narrativas incorporadas. A seção quatro contextualiza a ED tanto nos debates reais sobre os desafios ambientais e, em geral, sistêmicos globais, como as mudanças climáticas, e ilustra para um público mais amplo e não especializado a relevância de ED na transição até uma adoção mais amplamente difundida de recursos renováveis. Os aspectos econômicos dessa transição, em particular aqueles relacionados com a regulamentação institucional e técnica do sistema (as questões de tarifas e medidores, por exemplo) são não apenas relevantes, mas, claro, absolutamente centrais; no entanto, por extravasarem o escopo do artigo, não serão abordadas neste trabalho, que adota substancialmente uma lente sociológica para analisar a transformação da paisagem energética, mais uma vez, de um ângulo específico e sem pretensão de ser exaustivo, mas sim para abrir um espaço maior para esse tipo de discussão. A quinta seção apresenta uma contextualização da governança energética e define o cenário para um debate sobre a governança da ED e suas implicações em termos de uma agenda potencial de pesquisa onde a democratização do acesso a tecnologias inovadoras na geração de energia renovável possa ser discutida mais detalhadamente. A sexta seção (A governança da Energia Distribuída) discute as conclusões do método DPA, e a sétima e última seção apresenta algumas reflexões finais sobre as implicações do que foi discutido anteriormente.

Materiais e métodos

Os resultados apresentados neste documento são o desfecho da aplicação do método de análise de documentos de políticas. A categoria documentos refere-se não apenas ao material escrito, mas também às informações que servem para registrar fatos sociais, acontecimentos ou mesmo representações, seja por meio de códigos culturais ou de convenções literárias (ATKINSON; COFFEY, 2010ATKINSON, P.; COFFEY, A. Analysing documentary realities. In: SILVERMAN, D. (Ed.). Qualitative Research. London: SAGE Publications, 2010. p. 77-92.). Para além da sua tipologia, os documentos são meios de comunicação e, como tais, não são “neutros” nem “transparentes”. Pelo contrário, muitas vezes servem a um propósito e, voluntariamente ou não, criam uma versão particular da realidade. Como muitas outras formas de discurso ou narrativa, os documentos são ferramentas poderosas (FOUCAULT, 2008FOUCAULT, M. The birth of biopolitics. Lectures at the College de France, 1978‐79. London: Palgrave Macmillan, 2008.), e podem desempenhar um papel significativo no apoio a formas de autoridade e legitimidade, ao mesmo tempo que abrem ou fecham possibilidades e oportunidades (HALLIDAY; ​​MARTIN, 1993HALLIDAY, M. A. K.; MARTIN, J. R. Writing Science: Literacy and Discursive Power. London: Falner Press, 1993.). Neste artigo, argumentamos que este também é o caso quando se analisam as políticas de transição energética.

A pergunta de pesquisa do artigo refere-se a como a ED é conceituada institucionalmente no Brasil. Isso, por sua vez, leva a uma questão de segunda ordem: qual é a narrativa técnico-científica que as instituições na vanguarda da governança energética no Brasil estão adotando para incorporar a ED na arena política. Ao longo de toda a nossa análise, tentaremos destacar as implicações que as respostas a essas perguntas podem ter para a formação de futuras configurações sociotécnicas no Brasil a partir de uma perspectiva inspirada nos STS. Em outras palavras, esta pesquisa pertence à tradição que considera o discurso da política tão importante quanto as leis, decretos e dimensões mais materiais da implementação da política, como será elaborado em maior profundidade na próxima seção dedicada à apresentação do quadro conceitual de referência.

Ao analisar textos produzidos por influentes meios de comunicação ou agências governamentais, como é o caso de documentos de política energética, a literatura sugere que os seus formuladores têm desempenhado um papel hegemônico na construção social de aspectos ou dimensões que precisam de intervenção, bem como na orientação deles. Ao apresentar o debate sobre a mitigação e adaptação às mudanças climáticas, bem como para as transições energéticas (DE FREITAS; DIAS, 2017DE FREITAS, J. G.; DIAS, J. A. Climate change research and policy in Portugal. Environment and History, v. 24, n. 2, p. 217-252, 2017.; HULME; TOYE, 2006HULME, D.; TOYE, J. The case for cross-disciplinary social science research on poverty, inequality and well-being. Journal of Development Studies, v. 42, n. 7, p. 1085-1107, 2006.), a mídia muitas vezes reproduz discursos oficiais (especialmente de governos) e raramente analisa alternativas de políticas ou o impacto de um portfólio mais diversificado opções políticas.

Para uma seção sobre métodos, definir o atributo que define a classe de documentos em análise é uma etapa essencial a ser realizada. Neste trabalho de pesquisa, esse atributo é a política. Uma política é uma declaração de intenções e, como tal, está intimamente ligada à ação de planejamento para a ação. Os documentos de política são textos de classes diferentes (PRIOR, 2004PRIOR, L. Doing things with documents. In: SILVERMAN, D. (Ed.). Qualitative research: theory, method and practice. London: SAGE Publications, 2004. p. 76-94.). Podem ser textos impressos ou disponíveis virtualmente ou, como acontece cada vez mais nos dias de hoje, materiais visuais e multimídia. Os documentos de política também têm gêneros, como livros brancos, atos do parlamento ou, como neste artigo, documentos de planejamento. Com base em Prior (2004PRIOR, L. Doing things with documents. In: SILVERMAN, D. (Ed.). Qualitative research: theory, method and practice. London: SAGE Publications, 2004. p. 76-94.), a análise concentrou-se em duas dimensões principais, o conteúdo do documento e seu uso e função, bem como em duas categorias, a saber, o documento como recurso e o documento como assunto (quadro 1).

Quadro 1
A categorização do conteúdo, uso e função dos documentos

Os materiais apresentados foram selecionados com base na seguinte lógica: revelar os conflitos políticos e sociotécnicos subjacentes ao que a literatura institucional apresenta como sendo principalmente problemas técnicos no campo do planejamento energético, geralmente urbano. Consequentemente, selecionamos em primeiro lugar um tópico de alta pontuação no debate político contemporâneo sobre a governança da energia e a transição energética no Brasil, ou seja, a introdução da ED na rede interconectada nacional. Em segundo lugar, foi identificado um pequeno, mas crítico conjunto de documentos políticos que representam os conflitos políticos e sociotécnicos que selecionamos como principal ponto de entrada analítico para o debate; são eles: Balanço Energético Nacional 2018 do Ministério de Minas e Energia (EPE-MME, 2018); o documento Recursos Energéticos Distribuídos: Impactos no Planejamento Energético da Gerência de Pesquisas Energéticas do MME; e o documento da Agência Nacional de Regulamentação da Energia Elétrica (EPE - MME, 2018), regulamentação nacional 482, promulgada inicialmente em 2012 para regulamentar a ED (ANEEL, 2018a).

STS e configurações sociotécnicas: uma estrutura conceitual para compreender as narrativas energéticas institucionais

Um princípio central do STS diz respeito à relevância atribuída aos processos pelos quais as sociedades modernas moldam sua compreensão epistêmica e normativa do mundo. A noção de coprodução, entendida não tanto no sentido empírico de um processo participativo de baixo para cima que molda a política, mas sim como uma dinâmica, é central enquanto a política e a ciência são montadas com base em forças materiais, políticas, simbólicas e culturais (LATOUR, 2005LATOUR, B. Reassembling the Social. An Introduction to Actor-Network Theory. 1. ed. Oxford and New York: Oxford University Press, 2005.). Na perspectiva do STS, o social é mais um resultado do que uma premissa e seus fios (como política ou política, por exemplo) são comparáveis ​​a um agenciamento. O poder político e o controle que sempre exerce sobre o significado das coisas e as mudanças sociais dão forma ao que comumente é considerado verdade (JASANOFF, 2004JASANOFF, S. Ordering knowledge, ordering society. In: JASANOFF, S. (Ed.). States of Knowledge: The Co-Production of Science and the Social Order. London: Routledge, 2004. p. 336.). Portanto, adotar uma perspectiva STS implica ler a tentativa de definir a ED como desestabilizadora nos termos de um exercício de poder sobre o significado e a implicação da transformação energética em curso. Para esclarecer ainda mais essas premissas conceituais, recorremos à obra de Jasanoff, para quem, em um mundo marcado por uma forte dinâmica de padronização ligada à ciência e tecnologia, o pluralismo é essencial do ponto de vista epistêmico e normativo. Aqui, para deixar bem claro, estamos propondo que toda a tentativa de direcionar o significado da ED como algo desestabilizador, portanto, perigoso e que precisa ser controlado, é também uma tentativa de domar e “domesticar” o debate. Comungamos a preocupação de Sheila Jasanoff sobre o pluralismo nos debates técnico-científicos, e de Sylvie Jaglin com a forma como as configurações sociotécnicas dos serviços públicos são conduzidas por processos de tomada de decisões de cima para baixo. É a partir dessas duas principais contribuições que buscaremos traçar um percurso até então pouco explorado, qual seja, o debate sobre os imaginários sociotécnicos da energia no Brasil.

Imaginários, na definição de Jasanoff e Kim, é um termo que define “formas imaginadas coletivamente de vida social e ordem social refletidas na concepção e realização de projetos científicos e / ou tecnológicos específicos de uma nação” e “(t) embora nunca seja estritamente determinante dos resultados das políticas, os imaginários sociotécnicos são recursos culturais poderosos que ajudam a moldar as respostas sociais à inovação” (JASANOFF; KIM, 2013JASANOFF, S.; KIM, S. H. Sociotechnical Imaginaries and National Energy Policies. Science as Culture, v. 22, n. 2, p. 189-196, 2013.a, p. 190). Por exemplo, a característica bem conhecida da imaginação sociotécnica norte-americana é que os benefícios da tecnologia são vistos como ilimitados, enquanto os riscos são enquadrados como limitados e administráveis.

Outra questão-chave colocada por Jasanoff para aqueles preocupados com o estudo do poder é a seguinte: se faz mais sentido supor que o conhecimento científico possa existir independente do pensamento e da ação política (JASANOFF, 2004JASANOFF, S. Ordering knowledge, ordering society. In: JASANOFF, S. (Ed.). States of Knowledge: The Co-Production of Science and the Social Order. London: Routledge, 2004. p. 336.). A ciência e a mudança tecnológica não são neutras enquanto à energia quando olhamos para elas através de uma lente STS. Ordenar o conhecimento significa ordenar a sociedade e, com Jasanoff, este artigo se baseia na tradição de STS nesta linha de análise (KREIMER, 2007KREIMER, P. Estudios sociales de la ciencia y la tecnología en América Latina: ¿para qué?, ¿para quién? Redes, v. 13, p. 55-64, 2007.; SALTELLI; GIAMPIETRO, 2017SALTELLI, A.; GIAMPIETRO, M. What is wrong with evidence based policy, and how can it be improved? Futures, v. 91, p. 62-71, 2017.). Este último também quer dizer que todos os novos objetos sociotécnicos, como mudanças climáticas, espécies ameaçadas de extinção, Covid-19 ou a transição energética, precisam da comunidade científica para produzir um esforço renovado com o objetivo de aprofundar nossa compreensão de como o conhecimento é absorvido nas sociedades. Quem governa o conhecimento e seus processos de produção factuais governa a ciência e a mudança tecnológica (ou seja, a produção de documentos que orientam as decisões políticas, tem uma influência sobre o que engenheiros e planejadores pensam de uma inovação específica). Além disso, o saber dominante também afeta às identidades individuais e coletivas (sou a favor ou contra o uso de painel solar ou moinhos, estou disposto a pagar ou não para promover transformações ecologicamente sustentáveis), legitimando como socialmente aceitas as formas de conhecimento produzidas por especialistas (JASANOFF, 2004).

Sob um ponto de vista complementar, em seu trabalho sobre a prestação de serviços urbanos em cidades do Sul global, Jaglin aponta como a avaliação crítica institucional desses serviços tende a enfatizar as deficiências em termos de fornecimento racionado, fornecimento não confiável, acesso desigual, dificuldades na prestação de um serviço universal e na sustentação de operadores viáveis. Esta é, a nosso ver, uma contribuição muito útil para compreender o posicionamento das instituições de energia brasileiras sobre a ED como uma crítica tecnocrática da inovação que visa deslegitimar novos entendimentos, usos e práticas inovadoras que desorganizam a ordem de um sistema amplamente reconhecido na literatura nacional brasileira como politicamente concentrado (BERMANN, 2007BERMANN, C. (Ed.). As novas energias no Brasil: Dilemas da inclusão social e programas de Governo. 1a. ed. Rio de Janeiro - RJ - Brasil: FASE, 2007.), técnica e institucionalmente centralizado (PUERTO; SAUER, 2015PUERTO, J. A.; SAUER, I. L. Política energética en Brasil: Implementación del componente renovable. Energética, v. 45, p. 95-106, 2015.) atendendo assim sistematicamente aos interesses do capital multinacional (WERNER, 2019WERNER, D. Estado, capitais privados e planejamento no setor elétrico brasileiro após as reformas setoriais das décadas de 1990 e 2000. Planejamento e Políticas Públicas, v. 52, p. 189-229, 2019.).

Com Jaglin, apoiamos a posição de defesa de uma maior pluralidade na prestação de serviços vitais como água, saneamento e energia. Isso é ainda mais urgente nos dias de hoje, pois a energia não é mais uma questão de ter acesso à eletricidade, mas a um conjunto de serviços energéticos como a informática e a conectividade que se tornaram centrais para as capacidades humanas.

Diz Jaglin (2014JAGLIN, S. Regulating Service Delivery in Southern Cities. In: PARNELL, SUSAN; OLDFIELD, S. (Ed.). The Routledge Handbook on Cities of the Global South. 1. ed. London & New York: Routledge, 2014. p. 434-447., p. 434): “Proponho uma mudança radical de perspectiva, tomando como ponto de partida não a falha dos serviços urbanos e das instituições responsáveis ​​por sua entrega, mas a vitalidade e multiplicidade dos sistemas de entrega reais que, apesar dos anúncios de política e reformas, e não obstante modelos importados, sobrevivem e contribuem para o funcionamento das cidades. O fato é que nas cidades do Sul, os serviços não são prestados no âmbito de um sistema uniforme e integrado, mas de diferentes formas e através de uma série de disposições”.

Segundo Jaglin, nas cidades do Sul global a água potável pode ser abastecida por rede com torneiras privadas ou fontanários, por bombas ou por transportadores de água; tanto quanto a energia pode ser acessada por meio de conexão à rede elétrica, por baterias recarregáveis, ou por meio de serviço de assinatura, por gerador ou por botijão de gás. Cada método de prestação de um serviço essencial é considerado aqui como um dispositivo sociotécnico envolvendo atores dentro de uma dada configuração sociotécnica feita de ferramentas, conhecimentos e valores; em outras palavras, uma combinação de fatores heterogêneos necessários para a produção de bens coletivos que instituições como o Ministério de Minas e Energia e seu bureau técnico-científico, EPE, precisam continuamente influenciar e remodelar na tentativa de exercer a governança de uma realidade antes escorregadia formada por sujeitos e atores indisciplinados do mercado, como os consumidores-produtores (prosumeres) do nosso artigo, em busca de soluções que maximizem seu bem-estar e / ou utilidade econômica.

É também por isso que consideramos que mesmo uma seleção de documentos das instituições chave no campo da política energética, se nesses documentos se encontram elementos com o potencial de transformar as políticas e se neles se vê reflexa a tentativa de domesticar a direção da transformação energética em curso, são sim relevantes. Quando ouvimos o presidente Bolsonaro negar a importância da pandemia Covid-19, não precisamos escrever um artigo científico analisando de 25 a 100 entrevistas do presidente para avaliar a gravidade daquela única intervenção para o futuro da política de saúde no país. Uma entrevista é mais do que suficiente devido ao seu impacto político, e esta, entre outros fatores, é o que conta e constitui a essência da pesquisa qualitativa, a poderosa relevância da unicidade e do significado.

Contextualizando a Energia Distribuída

Nesta seção, apresentamos a relevância da ED em comparação com os principais debates contemporâneos relacionados às mudanças ambientais globais (GEC pelo acrônimo em inglês4 4 - Global Environmental Change (GEC). ), como a adaptação e mitigação das mudanças climáticas. O planeta tudo, e com ele nossas sociedades são chamadas a se confrontar com novas configurações sociotécnicas mais plurais e justas para superar ao GEC de origem antropogênico; portanto, esta seção também define a relevância de nosso artigo para um debate mais amplo que ressoa nos fóruns internacionais e nacionais.

Pelo menos em teoria, existe uma solução tecnicamente simples para os problemas de poluição do ar, aquecimento global e insegurança energética; isso é eletrificar ou fornecer energia direta para tudo; obter eletricidade e aquecimento das fontes eólica, hídrica e solar, armazenar energia e reduzir o uso de energia (JACOBSON, 2021JACOBSON, M. Z. 100% Clean, Renwable Energy and Storage for Everything. Cambridge, New York, Melbourne, New Delhi and Singapore: Cambridge University Press, 2021.). Porém, os atuais modelos centralizados de geração de energia apresentam grandes inseguranças devido a: a) à diminuição das reservas de recursos de combustíveis fósseis, fato que vem com a necessidade imperiosa do uso de tecnologias extrativas mais complexas e ambientalmente prejudiciais que, por sua vez, também impactam a disponibilidade de água e terras com consequências negativas indiretas na segurança alimentar e, b) a dependência de energia centralizada e refinarias de petróleo que afetam a resiliência das áreas urbanas e rurais, com impactos muitas vezes incalculáveis ​​e exposição ao risco, especialmente nas áreas urbanas devido à concentração de pessoas e recursos (JACOBSON, 2021).

De acordo com o IPCC, “as reduções de emissões de CO2 que limitam o aquecimento global a 1,5° C com nenhum ou limitada ultrapassagem desse patamar podem envolver diferentes portfólios de medidas de mitigação, atingindo diferentes equilíbrios entre a redução da intensidade de energia e recursos, a taxa de descarbonização e a dependência da remoção de dióxido de carbono” (IPCC, 2018, p.12). No entanto, é claro que, com base na sua importância e a viabilidade potencial, deveria ser dada prioridade a uma transição energética impulsionada pela redução das emissões, visto que os “(m)odelamentos dos caminhos para limitar o aquecimento global a 1,5 ° C sem ou com uma ultrapassagem limitada desse patamar envolvem reduções profundas nas emissões de metano e carbono mineral (35% ou mais de ambos até 2050 em relação aos níveis de 2010). Esses caminhos (ver figura 1) também reduzem a maioria dos aerossóis de resfriamento, o que compensa parcialmente os efeitos de mitigação por duas a três décadas” [...] e [...] Limitar o aquecimento global requer a limitação das emissões antropogênicas globais cumulativas totais de CO2 desde o período pré-industrial , ou seja, ficar dentro de um orçamento total com respeito ao carbono”; conclusão apresentada pelo IPCC com alto grau de confiança (IPCC, 2018, p.12).

Figura 1
Caraterísticas das Trajetórias de Emissões Globais

O acesso às instalações de ED ainda é restrito a quem dispõe de recursos para um investimento inicial (HEFFRON; MCCAULEY, 2014HEFFRON, R. J.; MCCAULEY, D. Achieving sustainable supply chains through energy justice. Applied Energy, v. 123, p. 435-437, 2014.; SCHIRMER SOARES, 2019SCHIRMER SOARES, R. A Expansão da Geração Distribuida no Contexto da Macorometrópole Paulista. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Energia. São Paulo, Universidade de São Paulo, 2019.). Portanto, debater a ED não é apenas uma questão de transição energética sob o ponto de vista técnico, mas substancialmente uma questão de justiça e equidade, já que pelo menos custos financeiros significativos e compensações estão eventualmente envolvidos em sua instalação, manutenção e uso (CASTAÑO-ROSA; SOLÍS-GUZMÁN; MARRERO, 2020CASTAÑO-ROSA, R.; SOLÍS-GUZMÁN, J.; MARRERO, M. Energy poverty goes south? Understanding the costs of energy poverty with the index of vulnerable homes in Spain. Energy Research and Social Science, v. 60, n. October, 2020.; JENKINS et al., 2021JENKINS, K. et al. The methodologies, geographies, and technologies of energy justice: A systematic and comprehensive review. Environmental Research Letters, Authors’ submitted manuscript, p. 1-82, 2021.; KUMAR et al., 2019KUMAR, A. et al. Solar energy for all? Understanding the successes and shortfalls through a critical comparative assessment of Bangladesh, Brazil, India, Mozambique, Sri Lanka and South Africa. Energy Research and Social Science, v. 48, n. March 2018, p. 166-176, 2019.).

De acordo com a figura 2 da SIEMENS, uma característica operacional chave da ED são as microrredes, que - por sua vez - são pequenos sistemas de energia, contendo as fontes de energia, embora sejam operáveis ​​pelos consumidores. Em uma microrrede, a produção e o consumo de energia são amplamente equilibrados. O balanceamento é garantido por um controlador de microrrede, que também aproveita o potencial para modelos de negócios inovadores. As microrredes podem ser conectadas à rede elétrica ou operar fora da rede e podem abranger várias formas de energia (ou seja, energia, resfriamento por calor). Apesar de ser essencialmente um microcosmo de um sistema de energia convencional, as microrredes têm o potencial de reduzir o conteúdo geral de CO2 do fornecimento de energia. Portanto, elas são centrais no debate sobre a relação entre a transição energética e a mitigação das mudanças climáticas. A capacidade social e institucional para manter essas microrredes funcionando de forma eficiente depende de um complexo sistema de receitas para financiar a manutenção técnica especializada; algo quase impensável em uma favela sem conexões de energia legalizadas como as muitas que se encontram nas cidades brasileiras.

Figura 2
Representação Esquemática de uma Microrrede

Quando visto de uma perspectiva mais ampla, este debate se enquadra na discussão sobre o que tem sido denominado como futuro global da energia. Este último será moldado pela taxa e forma de investimento em infraestrutura nos próximos anos, uma vez que estamos testemunhando o início de uma revolução energética, como aprendemos com os estudos tradicionais (AITKEN, 2003AITKEN, D. W. Transitioning to a Renewable Energy Future. International Solar Energy Society: White Paper. Freiburg (Germany), 2003. Disponível em: <http://www.ises.org>. Acesso em: 19 set. 2020.
http://www.ises.org...
; MILLER et al., 2015MILLER, C. A. et al. Narrative futures and the governance of energy transitions. Futures, v. 70, n. 2014, p. 65-74, 2015.; SOVACOOL, 2016SOVACOOL, B. K. How long will it take? Conceptualizing the temporal dynamics of energy transitions. Energy Research and Social Science, v. 13, 2016.). No entanto, uma literatura complementar amplamente produzida a partir ou sobre o Sul global discutiu como a transformação não deve ser vista apenas no sentido comum de uma transição de combustíveis fósseis para renováveis, mas mais em termos de suas implicações para e dentro do capitalismo, regimes de energia altamente centralizados e - em termos de poder político - altamente concentrados (BERMANN, 2007BERMANN, C. (Ed.). As novas energias no Brasil: Dilemas da inclusão social e programas de Governo. 1a. ed. Rio de Janeiro - RJ - Brasil: FASE, 2007.; LUQUE-AYALA, 2014LUQUE-AYALA, A. Reconguring the city in the global South: rationalities, techniques and subjectivities in the local governance of energy. Ph.D. Thesis, Department of Geography, Durham University, 2014.).

De acordo com a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), as estimativas em termos de consumo final de uso residencial indicam que a ED responde por cerca de 60% do consumo total, após a instalação de microgeradores solares fotovoltaicos, quando comparado ao consumo sem tecnologia de microgeração (ANEEL, 2017). Isso ocorre porque a maior parte do consumo ocorre em momentos em que não há geração, como durante a noite por falta de isolamento. A ANEEL também estima em até 55% o percentual da energia injetada na rede por meio de microgeradores em relação ao total trocado; esta última porque a geração supera o consumo no período entre 8h e 16h. No que se refere ao uso comercial, o mesmo documento citado acima estima que o consumo final se aproxime de 27% após a instalação da microgeração solar fotovoltaica quando comparado ao consumo sem essa modalidade (ANEEL, 2017, 2018a, 2018b).

Os dados da ED revelam uma nova configuração sociotécnica em formação. O seu potencial inovador desdobra-se na possibilidade de famílias e indivíduos transformarem o seu papel de “consumidores” em “prosumidores” e na própria lógica de governança energética. Os impactos da ED na rede elétrica, principalmente de fontes fotovoltaicas (FV), não são mais desprezíveis para o sistema misto público-privado de governança energética do país devido ao impacto da ED nos custos que compõem a tarifa de energia. Os elementos levados em consideração para elaborar a tarifa de energia elétrica no Brasil (composta pelos custos totais de operação e manutenção da rede elétrica divididos igualmente entre todos os consumidores) não considera a imprevisibilidade do isolamento (ROSAS LUNA et al., 2019ROSAS LUNA, M. A. et al. Solar Photovoltaic Distributed Generation in Brazil: The Case of Resolution 482/2012. Energy Procedia, n. 159, p.484-490, 2019.), na medida em que, como toda fonte renovável de energia apresenta caráter intermitente e estocástico (NOTTON et al., 2018NOTTON, G. et al. Intermittent and stochastic character of renewable energy sources: Consequences, cost of intermittence and benefit of forecasting. Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 87, n. February, p. 96-105, 2018.).

A governança da Energia Distribuída

Conforme apontado por Fernández (2014FERNÁNDEZ, J. E. Urban Metabolism of the Global South. In: PARNELL, S.; OLDFIELD, S. (Eds.). The Routledge Handbook on Cities of the Global South. London & New York: Routledge, 2014. p. 597-612., p.607), “a transição para combustíveis fósseis a partir da biomassa e a contínua transição sócio-metabólica caracterizarão uma grande mudança no uso de energia urbana nos países em desenvolvimento. Hoje, 40% da população dos países em desenvolvimento queima madeira como sua principal fonte de combustível”.

A atual matriz energética brasileira é resultado, principalmente, de um processo de reforma para reduzir a dependência da importação de petróleo (PUERTO; SAUER, 2015PUERTO, J. A.; SAUER, I. L. Política energética en Brasil: Implementación del componente renovable. Energética, v. 45, p. 95-106, 2015.). O sistema elétrico brasileiro é de longe o maior da América Latina, e em 2019 a capacidade total instalada de geração de energia elétrica no Brasil (centrais de serviço público e autoprodutores) atingiu 170.118MW (MME-EPE, 2020). De acordo com o Balanço Energético Nacional 2020 (ano base 2019- (MME-EPE, 2020), mais de 80% da eletricidade do país é proveniente de fontes renováveis ​​(83%) e, principalmente, de grandes hidrelétricas (64, 9 %), componente em que o país é o segundo maior produtor mundial, com 389TWh, o que representa 9% da produção mundial. O quadro abaixo ilustra o extraordinário crescimento da oferta eólica e solar como fontes de energia no balanço energético brasileiro, fornecendo uma base quantitativa complementar para apoiar nosso argumento.

Quadro 2:
Capacidade instalada de energia elétrica, Brasil 2015-2019 (GWh)

A Resolução Normativa (RN) 482-2012 (atualizada pela RN 687-2015) representa um divisor de águas no Brasil, pois reflete o interesse do Estado em dar espaço às preocupações dos atores do mercado envolvidos na produção, transmissão e distribuição de energia ao regulamentar a nova modalidade. A ED avançou bastante, tanto em termos de distribuição de instalações em território brasileiro quanto em termos de potência total instalada. Rosas Luna et al. (2019, p.489) concluem que “(a) projeção oficial de crescimento da GD no Brasil até 2050, elaborada pela EPE em 2014, é relativamente modesta e conservadora em vista do potencial de crescimento da energia solar fotovoltaica”.

O dado precedente reflete o impacto que as instalações de ED estão tendo, conforme, a potência instalada e a necessidade de regulação que se faz sentir no nível institucional. Como é especialmente o caso da energia fotovoltaica, os lares são responsáveis ​​pela maioria das instalações. Essa peculiaridade reflete dois processos em andamento que exigem mais pesquisas. Por um lado, um processo econômico relacionado com a transformação de um nicho de mercado específico e, por outro, uma transformação socioantropológica mais ampla em que os indivíduos e os agregados familiares passam a ser unidades de decisão na produção e distribuição de energia. O último provavelmente desencadeará um potencial para uma transformação sociotécnica levando a uma maior independência dessas unidades (e das pessoas reais que as compõem) nas decisões sobre o consumo e o uso da energia.

Apesar de parecer apenas mais uma inovação técnica, a ED representa uma transformação sociotécnica politicamente orientada; na medida em que acarreta vários fatores-chave de mudança no equilíbrio de poder: “o nascimento do prosumidor” e “o desaparecimento do planejamento racional”. Isso produz uma contrarreação baseada na narrativa legitimadora do homo oeconomicus que minimiza ou até mesmo ignora abertamente as implicações das reformas e inovações energéticas em termos de desigualdade social e justiça energética, propiciando assim uma “estratégia de domesticação” destinada a domar e normalizar todos os fatores desestabilizadores. A figura 3 apresenta graficamente a conceituação proposta pela ANEEL em 2018 na mesma época do que está mencionado no documento da EPE.

Figure 3
Configurações Elétricas - Presente e Futuro na Visão do MME-EPE

  • 1) O nascimento do Prosumidor: ao optar por instalações de geração micro ou mini-fotovoltaica e se tornar um prosumidor, os indivíduos que antes eram consumidores (e compradores) do que outros produziam, transportavam e eventualmente distribuíam através da rede elétrica começam a desempenhar um papel diferente. Agora, eles colaboram ativamente para a produção de energia elétrica, que não é apenas uma questão técnica, uma novidade que potencialmente desonera os custos de geração de eletricidade e demais gastos de gestão para o país. Em vez disso, a apropriação da tecnologia da ED pelos cidadãos é uma questão verdadeiramente política porque essas pessoas (tecnicamente, os prosumidores!) alteram o equilíbrio de poder entre a acumulação econômica e o lucro. Uma vez habilitados, eles podem representar uma ameaça potencial para a configuração mista público-privada de poderes que tem dominado a governança energética no Brasil desde o início dos anos 1990 (PUERTO; SAUER, 2015PUERTO, J. A.; SAUER, I. L. Política energética en Brasil: Implementación del componente renovable. Energética, v. 45, p. 95-106, 2015.).

  • 2) O esmaecimento do planejamento racional: no quadro brasileiro de regulação energética, um dos maiores custos do funcionamento do sistema elétrico interligado em escala nacional está relacionado ao desafio de garantir um abastecimento constante diante de uma demanda crescente. Por sua vez, isso implica custos crescentes em termos de manutenção da infraestrutura fixa necessária, bem como do subsídio de toda a operação no dia a dia, especialmente nos horários em que a oferta supera a procura e, portanto, não é atendida por uma demanda igual. No regime de energia real (lado esquerdo da figura 3), o sistema usa seu poder regulatório político para impor aos consumidores o preço que considera suficiente e socialmente aceitável a fim de recuperar suas perdas e manter sua receita. No novo cenário representado por uma configuração mais aberta (lado direito da figura 3) surge uma questão de regulação, controle e disciplina comportamental econômica do novo ator (o prosumidor). Como a lógica atual de fornecimento de energia no país não é social, mas de mercado, o problema para atores como Ministério de Minas e Energia, EPE e ANEEL passa a ser como induzir os prosumidores a uma lógica plena de preço - demanda e oferta centradas e orientadas pelo mercado: (1) domesticar, (2) controlar e (3) disciplinar são, na perspectiva da EPE, o principal desafio para a introdução eficiente da ED no Brasil está relacionado ao sistema de tarifa de energia elétrica atualmente em vigor no país (1). Isso porque as tarifas volumétricas (baseadas exclusivamente no consumo de kWh, no caso de consumidores de baixa tensão), sem granularidade de tempo e sem os sinais de localização adequados não dão sinais econômicos (2,3) para que a difusão da ED seja devidamente avaliada e revertido para benefícios sistêmicos (MME-EPE, 2018, p.4).

  • 3) A conceptualização do homo oeconomicus: de acordo com Foucault (2008FOUCAULT, M. The birth of biopolitics. Lectures at the College de France, 1978‐79. London: Palgrave Macmillan, 2008.), a noção particular de homo oeconomicus corresponde a uma versão narrativa da verdadeira natureza do indivíduo como impulsionado pelo interesse próprio e pela maximização da utilidade econômica. A razão pela qual esse indivíduo egoísta é um ator-chave nas narrativas neoliberais contemporâneas está em seu potencial para possibilitar um conjunto de mecanismos e dispositivos entrelaçados relacionados à biopolítica como forma de controle político. O homo oeconomicus opera como um mecanismo para aproveitar a força que move sua operação. A ideia foucaultiana de governamentalidade, ou seja, o conjunto de mecanismos, estratégias e políticas implantados para domesticar e dominar se aplica à narrativa política que estamos analisando por meio da análise documental, pois ajuda a compreendê-la como uma narrativa que transforma a complexidade do engajamento das pessoas. Com a sociedade em uma representação quase unidimensional, a do homo oeconomicus, é funcional ao objetivo político de regulação e controle perseguido pelas instituições brasileiras que regem a política energética. Na verdade, é uma representação do indivíduo como um agente substancialmente impulsionado pelo interesse próprio (facilmente operacionalizado no prático conceito de utilidade econômica) que permite suprimir qualquer correspondência potencial entre o novo sujeito social emergente, o prosumidor e a ideia de soberania no domínio da governança energética. Reduzir o prosumidor a um (mero) homo oeconomicus ajuda um arranjo centralizado e substancialmente de cima para baixo de governança energética no Brasil a perpetuar seu poder. Isso se dá por meio da institucionalização de um fundamento metafísico (o fato de que a ED é uma questão de regulação administrativa e econômica e não de direitos, justiça e prerrogativas sociais). Esse fundamento é a verdade inquestionável que norteará o legítimo exercício da política a partir de um discurso aparentemente politicamente neutro e hipertécnico, aquele falado pela linguagem da engenharia e da economia.

  • 4) A lógica econômica da governança: um problema substancial com a lógica de governança de agências como a EPE e a ANEEL é que sua conceituação do indivíduo reduz a complexidade humana a uma dimensão econômica estreita, uma abordagem derivada da economia neoclássica, ao passo que a noção central não é a de uma pessoa, mas de” homo oeconomicus”, cujo objetivo - normativamente assumido - é maximizar a eficiência do sistema através da adoção do comportamento correto. A teoria da escolha do consumidor, a teoria da empresa, da organização industrial e os teoremas do bem-estar, todos requerem a suposição de que os agentes agem de acordo com o esquema de otimização racional individualista (URBINA; RUIZ-VALVERDE, 2019URBINA, D. A.; RUIZ-VALVERDE, A. A Critical Review of Homo Economicus from Five Approaches. The American Journal of Economics and Sociology, v. 78, n. 1, p. 63-93, 2019.).

  • 5) Normalizar e domesticar a desestabilização: todas as narrativas, não apenas aquela sobre os futuros possíveis, mas aquelas que têm a esses futuros possíveis como seu elemento constitutivo, são o fator que possibilita e justifica a mesma narrativa e sem a qual essa nem teria sentido (mudança climática, transição energética ou pandemia), representam um dos componentes centrais do planejamento contemporâneo (ABRAM; WESZKALNYS, 2013ABRAM, S.; WESZKALNYS, G. Elusive Promises: Planning in the Contemporary World. New York and Oxford: Berghahn Books, 2013.). Diante de uma necessidade ética de transparência e rigor, o fato de que as abordagens baseadas em evidências podem levar a uma situação em que os cientistas fazem afirmações excessivas, não é uma crítica nova e, no entanto, os mitos gêmeos da racionalidade perduram: “1. a ação política pode ser baseada no acúmulo de fatos e no controle da incerteza; e 2. a ciência tem o poder de fornecer fatos imparciais para julgar controvérsias” (SALTELLI; GIAMPIETRO, 2017SALTELLI, A.; GIAMPIETRO, M. What is wrong with evidence based policy, and how can it be improved? Futures, v. 91, p. 62-71, 2017., p.63). A fim de legitimar em bases técnicas um novo paradigma regulatório, a ANEEL (2018b) abriu uma consulta pública sobre a RN nº 482 de 2012 (doravante 482/2012), para respaldar academicamente sua operação política a agência apresentou alguma experiência internacional com geração da ED.

Discutindo a governança dos territórios da energia

A análise documental das principais narrativas institucionais sobre a política de ED no Brasil até agora destacou a prevalência dos aspectos econômicos e técnicos da energia sobre a dimensão social desta. O objetivo desta seção é contribuir para ilustrar a relevância de outras narrativas construídas sobre premissas que colocam as dimensões sociais da energia no centro. Energia não é apenas uma questão técnica ou um bem comercializável. Ela tem vida própria no sentido em que é produzida e usada para transformar nossa qualidade de vida. O acesso à energia e serviços energéticos confiáveis e de boa qualidade permite que as pessoas realizem seu próprio potencial como seres humanos. Essa dimensão social ou vida social da energia é amplamente determinada pela materialidade da infraestrutura necessária para produzi-la, transportá-la e consumi-la e pelos arranjos políticos que moldam a política energética. Esses determinantes são geralmente resumidos pelo uso do termo “território da energia” (Energy Landscape).

Um território de energia é uma configuração de (i) materialidades, como infraestrutura, redes inteligentes e conexões e (ii) práticas sociais que tendem a ser recorrentes e reiterativas em relação a essas materialidades, como viajar, tomar banho ou conectar-se e relações de poder para governar e que regem a paisagem, e (iii) as relações que exercem uma pressão centrípeta, como as instituições regulatórias formais e informais e as práticas culturais, todas relacionadas à geração, distribuição e consumo de energia. Conforme apontado por Jaglin (2014JAGLIN, S. Regulating Service Delivery in Southern Cities. In: PARNELL, SUSAN; OLDFIELD, S. (Ed.). The Routledge Handbook on Cities of the Global South. 1. ed. London & New York: Routledge, 2014. p. 434-447.), o imaginário sociotécnico de tamanho único, a heterogeneidade da demanda de serviços e a pluralidade de opções potencialmente disponíveis é reduzida, como no nosso caso da ED, a quase uma única opção: o Estado decide, o mercado aloca e os consumidores utilizam os serviços de acordo com sua capacidade de pagamento. Como no caso da ANEEL e da EPE-MME, isso produz um território da energia (e um regímen), enquanto a governança da energia é domínio de um ou poucos atores orientados de cima para baixo.

Diante de uma transformação em termos de distribuição e acesso à energia elétrica, por exemplo, como no caso do surgimento progressivo de ligações de ED (como na RN 482/2012, de 17 de abril de 2012, da ANEEL), são os imaginários produzidos centralmente que definem a necessidade e a obrigação de cumprir um conjunto de requisitos dificilmente atingíveis ao nível microsocial de comunidades marginais ou pequenos consumidores-consumidores. Os consumidores brasileiros de eletricidade que podem se tornar prosumidores gerando sua própria eletricidade a partir de fontes renováveis ​​ou que podem se associar em comunidades de baixa renda para produzir formas qualificadas de cogeração e até mesmo fornecimento de energia elétrica com a possibilidade de gerar um excedente econômico a ser redistribuído localmente são simplesmente impedidos de fazê-lo por um regulamento rígido.

Reflexões finais

O debate político analisado neste artigo contribui para repensar a governança dos cenários energéticos no Brasil e reformula todo o processo de regulação da energia distribuída como uma tentativa de manter o controle político e sociotécnico sobre a questão estratégica da transição energética no Brasil.

Por meio da análise das narrativas de políticas usando a análise de políticas de documentos, o artigo ilustra o duplo efeito desestabilizador representado por (i) a irrupção da inovação tecnológica representada pela ED e (ii) o “nascimento” de um novo sujeito, o prosumidor. Sua aparição não planejada no estágio de governança política revela um novo tipo de configuração sociotécnica em formação. Este último pode representar um fator de empoderamento para a conquista de um novo papel para famílias e indivíduos como atores ativos na transição energética.

Nesse sentido, o artigo abre uma nova linha de pesquisa sobre a dimensão social da energia no Brasil, conceituando indivíduos e grupos socialmente organizados não mais apenas como consumidores, mas também como produtores capacitados de energia. As implicações das novas categorizações são potencialmente vastas e significativas para uma agenda de pesquisa que vai da economia da energia à regulamentação de suas políticas, bem como para discussões já estabelecidas sobre cidadania social, direitos sociais, regulamentações, jurisdições e, em geral, para a proposta, após Bevir (2013) da governança como um domínio multijurisdicional.

    Acrônimos
  • ANEEL   (Agência Nacional de Energia Elétrica)
  • EPE   (Empresa de Pesquisa Energética)
  • FV   (Fotovoltaico)
  • GD   (Geração Distribuída)
  • MME   (Ministerio de Minas e Energia)
  • RN   (Resolução Nacional)
  • STS   (Science and Technology Studies)

Agradecimentos

Andrea Lampis agradece o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) (processos n.2018/17626-3) pelo apoio ao longo da pesquisa de pós-doutorado. O trabalho é parte das atividades do projeto temático, em andamento, “Governança ambiental na Macrometrópole Paulista, face à variabilidade climática”, processo nº 15/03804-9, financiado pela FAPESP e vinculado ao Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais.

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  • 1
    - Esta forma de energia é conhecida em inglês como Distributed Energy Resources (DER).
  • 2
    - Science and Technology Studies (STS).
  • 3
    - Policy Document Analysis (PDA).
  • 4
    - Global Environmental Change (GEC).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    20 Maio 2020
  • Aceito
    07 Out 2021
ANPPAS - Revista Ambiente e Sociedade Anppas / Revista Ambiente e Sociedade - São Paulo - SP - Brazil
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