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O PARADIGMA PERIÓDICO NA ARTE: A COMUNIDADE DA ESCRITURA

THE PERIODIC PARADIGM IN ART: THE WRITING COMMUNITY

EL PARADIGMA PERIÓDICO DEL ARTE: LA COMUNIDAD DE LA ESCRITA

RESUMO

O texto parte da natureza comum e contínua entre ensaios de Maurice Blanchot e Jean-Luc Nancy que, a partir da crítica ao fracasso do projeto comunitário do comunismo, conjugam-se na reelaboração de um pensamento de comunidade. Por meio da reflexão sobre o papel que esses ensaios e outras publicações e jornais tiveram na organização de projetos coletivos e na construção de consciências de comunidade e identidade, o intuito é argumentar a respeito de um paradigma periódico que se expande na contemporaneidade, ganhando campo em manifestações de caráter estético-político, estéticas e escrituras urbanas e em dinâmicas digitais, articulando lutas, resistências e insistências.

comunidade; arte; política; periódico; escritura urbana

ABSTRACT

The text begins with the common and continuous nature between essays by Maurice Blanchot and Jean-Luc Nancy, who, based on the critic of the failure of communism’s communitarian project, come together in the re-elaboration of a community thought. Through reflection on the role that these essays and other publications and newspapers played in organizing collective projects and building community and identity awareness, our aim is to argue in favor of a periodic paradigm that expands in contemporary times, gaining ground in manifestations of aesthetic-political character, aesthetics and urban scriptures and in digital dynamics, articulating contentions, resistances and insistences.

Art; Politics; Community; Periodical; Urban writing

RESUMEN

El texto parte de la naturaleza común entre ensayos de Maurice Blanchot y Jean-Luc Nancy que, al criticar el fracaso del proyecto comunitario del comunismo, se conjugan en la reelaboración de un pensamiento de comunidad. Por medio de la reflexión acerca del rol que eses ensayos y otras publicaciones y periódicos tuvieron en la organización de proyectos colectivos y en la construcción de conciencias de comunidad y identidad, intentamos argumentar en favor de un paradigma periódico que se alarga en la contemporaneidad, ganando espacio en manifestaciones de carácter estético-político, estéticas y escritos urbanos y en dinámicas digitales, articulando luchas, resistencias y insistencias.

comunidad; arte; política; periódico; escrita urbana

A comunidade é uma questão reincidente, evocada hoje em debates e ativismos que envolvem consciência e identidade de raça, classe, gênero e lugar. Donna Haraway fala em um “mito político chamado nós”1 1 . “Quais são as identidades que fundamentam esse mito político tão potente chamado nós e o que pode motivar o nosso envolvimento nessa comunidade?” (HARAWAY, 2000, p. 47) , Slavoj Žižek (2020ŽIŽEK, Slavoj. Pandemia – Covid 19 e a Reinvenção do Comunismo. São Paulo: Boitempo, 2020., p. 41) aponta para a reinvenção do comunismo sob a Covid-19, Angela Davis usa o substantivo no plural para se referir à reverberação das causas afro-americanas em comunidades de trabalhadores, imigrantes e LGTBs2 2 . Angela Davis, em palestra online promovida pelo Birmingham Civil Rights Institute, em 19 jun. 2020, declarou que “todo ser humano, toda mulher, todo homem, toda pessoa transexual, toda pessoa não binária do planeta merece ter seus direitos humanos reconhecidos e defendidos. Ninguém pode ser excluído desse abraço humano planetário. Nem brasileiros indígenas, nem muçulmanos na Índia, nem curdos em Rojava, certamente não palestinos na Palestina ocupada por Israel.” Disponível em: https://www.youtube.com/watch?time_continue=25&v=XOWn9zF4XQY&feature=emb_logo. Acesso em: 22 ago 2020. , assim como o movimento Black Lives Matter expande a noção de comunidade à condição de uma global composta de novas identidades grupais.

A reincidência da comunidade no debate contemporâneo remonta a 1983, quando Jean-Luc Nancy e Maurice Blanchot estabeleceram, em um diálogo intertextual, a célula do que poderia ser identificado como uma “comunidade de textos”. Os artigos “La Communauté Désoeuvrée” [A Comunidade Inoperante], de Nancy (1983)3 3 . Publicado na França, em fevereiro de 1983, na revista literária Aléa, dedicada ao tema da comunidade, que reuniu textos de Jean-Christophe Bailly, Jean-Luc Nancy, Jean-Luc Parant, Jean-François Lyotard, Jean-Marie Gibbal, Henri-Alexis Baatsch e Michel Deutsch. , e “La Communauté Inavouable” [A Comunidade Inconfessável], de Blanchot4 4 . Publicado na França pela Éditions de Minuit, Paris, 1983, e, no Brasil, pela Editora Universidade de Brasília, 2003. , estão de tal forma entrelaçados que poderiam ser considerados duas edições sequenciais de um mesmo periódico.

O artigo de Nancy foi objeto de comentário de Blanchot. Este, por sua vez, serviu de estímulo para a reedição de “A Comunidade Inoperante”, acrescido de notas sobre o texto-comentário. Na segunda edição, Nancy aponta para a natureza comum e contínua entre os dois textos, que dissertam sobre a ideia de que o pensamento e o imaginário ocidental se estruturam sobre a promessa de uma “comunidade universal” – perdida na origem ou aguardada no futuro. Em suas arguições sobre a nostalgia da perda da comunidade e do convívio, os autores elaboram um lamento do fracasso do projeto comunitário do comunismo e atualizam a crítica ao fascismo.

Um disparador da reflexão é a relação entre as palavras comunidade e comunismo5 5 . O luto pela derrocada do comunismo e dos movimentos de contestação política e social dos anos 1960 pauta o diálogo entre Nancy e Blanchot, assim como de outros autores, como Félix Guattari e Antonio Negri, que, na escritura partilhada de As Verdades Nômades (1985), empenham-se em resgatar o comunismo da condição de infâmia que os regimes coletivistas que se reportam ao socialismo lhe impingiram, devolvendo-lhe a condição de “liberação das singularidades individuais e coletivas, ou seja, o exato oposto da arregimentação dos pensamentos e desejos” (NEGRI; GUATTARI, 2017, p, p. 5). – mais especificamente, o “defeito de linguagem que as palavras comunismo e comunidade parecem conter, se pressentimos que trazem algo inteiramente diferente do que pode ser comum entre aqueles que pretenderiam pertencer a um conjunto, a um grupo” (NANCY, 2000NANCY, Jean-Luc. La Comunidad Inoperante. Santiago: Escuela de Filosofia Universidad ARCIS, 2000., p. 54). Em sua crítica ao uso feito da palavra comunismo por autores e lideranças ao longo da história recente, Nancy afirma que estes teriam logrado “se comunicar com um pensamento da arte, da literatura e do pensamento [...], mas não puderam se comunicar verdadeiramente, explicitamente e tematicamente [...] com um pensamento de comunidade” (NANCY, 2000, p. 19).

Às escritas comunistas, inscrições proletárias e revoluções culturais, portanto, teria faltado essa capacidade básica de comunicar um pensamento de comunidade. E a derrocada das esquerdas, tanto nos anos 1980 quanto neste início dos anos 2020, vem confirmar esse diagnóstico. Colocando-se como insistência e resistência em reconstituir a comunidade perdida, o diálogo Blanchot-Nancy assume seu ponto de origem nas ideias de Georges Bataille sobre a comunidade negativa, ou “a comunidade dos que não têm comunidade” (BLANCHOT, 2031, pp. 38-39), e na revista Acéphale (Paris, 1936-1939), identificada por eles como um lugar que logrou comunicar um pensamento de comunidade e onde Bataille teria chegado mais perto da experiência comunitária, comum, ou comunista.

No afã de reconstruir a comunidade perdida, Nancy e Blanchot propõem o início de uma “comunidade de textos”, à qual outros autores são convidados a se agregar, publicando “...textos intercalados, alternados, compartilhados, como os textos que oferecem o que não pertence a ninguém e que remete a todos: a comunidade da escritura, a escritura da comunidade. Incluídos aqueles que não escrevem nem leem, e aqueles que não têm nada em comum” (NANCY, op. cit., p. 54)6 6 . A essa “comunidade de textos” que os autores afirmam ter origem na ideia de “exigência comunitária”, de Georges Bataille, podem ser associados A Comunidade Que Vem (1990), de Giorgio Agamben; Comunidades Imaginadas, de Benedict Anderson; Communitas-immunitas, de Roberto Esposito; A Hospitalidade Incondicional, de Jacques Derrida; A Comunidade e a Segurança, de Zygmunt Bauman; A Partilha do Sensível, de Jacques Rancière; e Multidão, de Antonio Negri e Michael Hardt. .

No mesmo ano de 1983, Benedict Anderson produziu o ensaio “Comunidades Imaginadas”, em que analisa a “condição nacional” – a nação, nacionalismo, nacionalidade – como o valor de maior legitimidade na vida política dos séculos 19 e 20 e sua incorporação a uma vasta variedade de terrenos sociais, produtos culturais e constelações ideológicas (ANDERSON, 2008, p. 30). Em recentes anos, o debate vem ganhando adesão de movi-mentos culturais, na forma de exposições artísticas, simpósios e publicações. Em 2019, uma curadoria de arte contemporânea realizada em São Paulo propôs uma articulação conceitual in-versa à condição de “comunidade política imaginada”, formulada por Anderson.

Uma comunidade política imaginada – e imaginada como sendo intrinsecamente limitada e, ao mesmo tempo, soberana. Ela é imaginada porque mesmo os membros da mais minúscula das nações jamais conhecerão, encontrarão ou sequer ouvirão falar da maioria de seus companheiros, embora todos tenham em mente a imagem viva da comunhão entre eles (Ibidem, p. 32).

Em contraposição aos nacionalismos e ultranacionalismos emergentes neste início de século, o statement curatorial propunha “uma utopia de reconstrução do mundo que parte de novas articulações e coletividades, relacionadas a identidade, afeto e afinidade” (COMUNIDADES Imaginadas, 2019). O tema também tangencia as discussões propostas na publicação Saturation – Race, Art, and the Circulation of Value, coeditada pelo New Museum e MIT Press (LOWE, 2020LOWE, Lisa. Metaphors of Globalization and Dilemas of Excess. In SNORTON, Riley; YAPP, Hentyle. Saturation – Race, Art, and the Circulation of Value. Massachusetts: The MIT Press, 2020., p. 30), que recoloca a questão a partir de um questionamento da soberania do Estado-nação, em um mundo redefinido politicamente por movimentos decoloniais e pela coexistência entre diásporas transnacionais, culturas indígenas e comunidades fronteiriças, aproximando imaginários pautados não pela soberania nacional, mas por renovadas identidades grupais e afinidades sobrepostas.

O presente artigo soma-se a essa comunidade de textos e teses curatoriais, refletindo sobre as experiências estético-políticas de caráter contínuo e/ou periódico que vêm acontecendo na forma de atos e manifestações no espaço público urbano. O intuito é investigar de que forma a antiga retórica dos jornais de partidos e jornais comunitários se traduz hoje em estéticas urbanas e dinâmicas digitais, articulando lutas, resistências e insistências.

O QUE NÃO PERTENCE A NINGUÉM, REMETE A TODOS

De acordo com pesquisas publicadas pelo The New York Times, os participantes de protestos pela morte de George Floyd, em Minneapolis, somaram, entre 4 e 22 de junho de 2020, nos Estados Unidos, algo entre 15 e 26 milhões de pessoas (BUCHANAN, 2020, não paginado). A extensão das manifestações alçou a organização Black Lives Matter à condição de maior movimento da história dos Estados Unidos. Com entrevistas com pesquisadores de movimentos sociais, a reportagem aponta para um volume de produção e disseminação de autorrelatos (self-reports) sem precedentes. A rápida disseminação nas redes da imagem do policial branco ajoelhado sobre o pescoço de George Floyd, que morreu asfixiado, deu-se concomitantemente à vertiginosa propagação de um vírus de letalidade também assombrosa.

Com as populações mundiais confinadas em casa, grande parte dessa revolução deu-se efetivamente diante de telas, via disseminação de linguagem, em compartilhamentos de imagens, textos, memes, áudios e vídeos. Já os manifestantes que foram para as ruas frequentemente replicaram, com seus corpos, a imagem do policial ajoelhado, acrescentando à coreografia o braço direito erguido com o punho cerrado, símbolo do movimento black power, consagrado pelo Partido dos Panteras Negras.

A replicação desse gesto é um fator-chave para a tese deste texto, pois o procedimento de repetição é determinante na definição e estruturação de um periódico, ou jornal. A repetição que se observou nas coreografias de manifestações antirracismo é comparável àquela a que Agamben se refere ao tratar o cinema situacionista: “Quando Debord diz que deveria construir situações, ele está sempre se referindo a algo que pode ser repetido, mas que também é único”. Agamben afirma que a repetição não é o retorno do idêntico. A repetição reinstaura a possibilidade, quando, no final de In Girum Imus Nocte et Consumimur Igni (1978), em vez da tradicional palavra “fim”, o realizador sentencia: “A reprendre depuis le début” [voltar ao princípio] (AGAMBEN, 2020, p. 318).

A retomada cíclica de levantes contra o racismo – e o sexismo, homofobia, xenofobia e violência de gênero, entre outros extremismos – faz-se diante da permanência de desigualdades históricas7 7 . No Brasil, a violência policial contra negros não respeitou o isolamento social. De acordo com levantamento da plataforma Fogo Cruzado, a cada 84 minutos a polícia mata uma pessoa, em uma escalada da violência policial desde 2015. Segundo dados da Corregedoria da PM, de janeiro a maio de 2020, durante a quarentena, o número de mortos por policiais subiu 38% na região metropolitana de São Paulo e 30% na capital em relação a 2019. . Nas semanas seguintes ao evento em Minneapolis, o brasileiro assistiu à repetição do gesto de sufocamento praticado pelo policial em casos no Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo, em um ciclo macabro que Vladimir Safatle define como “rituais periódicos de destruição de corpos”: “O fim da Nova República terminará em um macabro ritual de emergência de uma nova forma de violência estatal e de rituais periódicos de destruição de corpos” (SAFATLE, 2020, não paginado).

Análises arriscam explicações sobre por que esse novo ciclo de manifestações do Black Lives Matter foi diferente. As pesquisas publicadas no NYT apontaram que, diferentemente de protestos anteriores, quase três quartos dos participantes eram brancos, com sensível expansão da comunidade envolvida em torno da organização criada em 2013. A escala do alcance mundial é impossível de ser estabelecida, mas a indignação com a violência policial e social às comunidades negras tem hoje maior adesão de populações engajadas em lutas migratórias, ecológicas e políticas. No contexto brasileiro, a revolta é agravada diante da necropolítica exercida pelo governo Bolsonaro, na forma como ignorou a gravidade da pandemia da Covid-19, conduzindo o país ao agravamento de seu quadro de desigualdade social8 8 . No ensaio “Necropolítica”, o filósofo e pensador camaronês Achille Mbembe, estudioso da escravidão, da descolonização e da negritude, parte do pressuposto de “que a expressão máxima da soberania reside, em grande medida, no poder e na capacidade de ditar quem pode viver e quem deve morrer”, razão pela qual “matar ou deixar viver constituem os limites da soberania, seus atributos fundamentais” (MBEMBE, 2018, não paginado). .

Em texto sobre a obra da filósofa e ativista Angela Davis, publicado meses antes da pandemia, a pesquisadora Maria Cristina Longo Cardoso Dias aponta que, “se fizermos uma análise concreta da sociedade, veremos que as formas de opressão estão interligadas e relacionadas à forma como o capitalismo se reproduz a cada novo ciclo” (DIAS, 2020, pp. 152-153). Baseada em Marx, para quem o capital é uma relação social entre pessoas intermediada por coisas (MARX, 2013, p. 836 apud ibidem, p. 152), Angela Davis ressalta como racismo e sexismo estão ligados à opressão classista, retroalimentados em prol de lucros capitalistas. A resposta a essas opressões interligadas, segundo ela, deve ser formulada na mesma moeda: em campanhas relacionadas, protagonizadas por todas as pessoas tornadas excedentes pelo capitalismo global: “O feminismo envolve muito mais do que a igualdade de gênero. E envolve muito mais do que gênero. O feminismo deve envolver a consciência em relação ao capitalismo” (DAVIS, 2018).

Segundo a autora, embora o movimento sufragista dos Estados Unidos tenha nascido no seio do movimento antiescravagista, ele falhou em não incorporar às demandas feministas as causas das mulheres negras e das mulheres trabalhadoras, que, nos anos 1840, eram as líderes da militância operária naquele país.

Se o reconhecimento concedido às mulheres da classe trabalhadora no encontro de Seneca Falls foi praticamente irrisório, não houve nem mesmo uma menção aos direitos de outro grupo de mulheres que também ‘se rebelou contra a vida em que nasceu’. No Sul, elas se revoltaram contra a escravidão e, no Norte, contra uma ambígua condição de liberdade chamada racismo. (DAVIS, 2016DAVIS, Angela. Classe e Raça no Início da Campanha pelos Direitos das Mulheres. In DAVIS, Angela. Mulheres, Raça e Classe. São Paulo: Boitempo, 2016, pp. 66-69., pp. 66-69)

Além do apontado viés classista e racista do movimento sufragista, não havia a compreensão de quanto o capitalismo que avançava no Norte também era um sistema opressivo, que criava impeditivos para que as classes trabalhadoras se organizassem sob a bandeira de partidos políticos, ou em torno de publicações periódicas9 9 . Em agosto, a prefeitura de Nova York inaugurou, no Central Park, um monumento em homenagem às pioneiras na luta pelos direitos das mulheres, reunindo em torno da mesma mesa a ativista negra Sojourner Truth e Susan B. Anthony e Elizabeth Cady Stanton. .

Assim como partidos políticos, os jornais sempre se configuraram como um lugar em que as comunidades afirmaram suas lutas, colocando em prática a vontade coletiva de organização em torno de identidades – fossem elas de classe, raça, gênero ou lugar. Cabe lembrar a centralidade que o jornal teve para a organização política durante o comunismo leninista e para a comunicação do que Nancy definiu como um “pensamento de comunidade”. Para Lenin:

O papel de um jornal não se limita, no entanto, apenas à difusão de ideias, apenas à educação política e à atração de aliados políticos. Um jornal não é apenas um propagandista coletivo e um agitador coletivo, mas também um organizador coletivo. A esse respeito, pode ser comparado aos andaimes montados em torno de um edifício em construção, que marca os contornos da estrutura, facilita a comunicação entre os construtores e permite que eles distribuam o trabalho e visualizem os resultados comuns alcançados pelo trabalho organizado. (LENIN, 1901, não paginado)

A associação entre imprensa e ativismo político tem longa história nas diásporas negras dos Estados Unidos e do Brasil. O abolicionista norte-americano Frederick Douglass (1818-1895), precursor de várias frentes de luta e ícone na história dos movimentos pelos direitos civis, foi um dos pioneiros no entendimento do jornal como ferramenta de autorrepresentação e emancipação, tendo fundado, aos 29 anos, seu próprio jornal, The North Star (Rochester, 1847), no qual defendia a luta abolicionista e o sufrágio feminino10 10 . Em 1851, o jornal The North Star seria rebatizado como Frederick Douglass’ Paper e publicado até 1861. Cf. PRIMEIROS Ensaios, (2020). .

Uma década antes, o jornal O Homem de Cor (Rio de Janeiro, 1833) surgiu como marco zero da imprensa negra no Brasil, criado apenas 13 anos após a liberdade de imprensa outorgada por dom João VI no país. Mesmo que de circulação restrita às comunidades negras, veículos como O Homem de Cor, Quilombo (Rio de Janeiro, 1950) ou A Voz da Raça (1933-1937), este, de propriedade da Frente Negra Brasileira (FNB) – reconhecida como o mais destacado movimento negro do país na primeira metade do século 20 e convertida em partido político, em 193611 11 . Antes de ser extinto pelo Estado Novo de Getúlio Vargas, juntamente com todas as organizações políticas brasileiras, a FNB criou um significativo trabalho socioeducativo e cultural, com escola, um grupo musical e teatral, um time de futebol e suprindo as comunidades afrodescendentes com assistência jurídica para combater o racismo. (LEITE, 2017, n, não paginado) –, tiveram papel central da construção de uma consciência de comunidade.

Surgido durante a redemocratização e a consolidação do regime de direito, com a derrocada do Estado Novo, o jornal Quilombo destaca-se por tecer um elo entre ativismos de naturezas politica, social, artística e cultural. Embora não fosse diretamente relacionado a um partido político – apesar de seu diretor, o economista, professor universitário, artista e dramaturgo Abdias do Nascimento (1914-2011), ter se tornado o primeiro deputado federal do Brasil a lutar pelos direitos dos afrodescendentes –, o Quilombo era publicado pelo Teatro Experimental do Negro (TEN), o que lhe conferia uma identidade fortemente ativista12 12 . O Teatro Experimental do Negro foi um grupo de artistas afrodescendentes atuantes entre as décadas de 1940 e 1960, no Rio de Janeiro e em São Paulo, com ramificações em outras cidades brasileiras. Criado por Abdias do Nascimento e Aguinaldo Camargo, o TEN tinha como metodologia a criação de alternativas de “alfabetização cultural” e valorização étnico racial, buscando a sensibilização da comunidade negra e o apoio da classe média intelectual branca. .

Como braço impresso do TEN, o Quilombo introduziu o direito de acesso à cultura na pauta das reinvindicações políticas. Em seu primeiro editorial, Abdias do Nascimento demarcava que o diagnóstico do jornal seria “criar um problema para o País”, desmascarando o mito da democracia racial, e anunciava que a “tomada de posição” do negro brasileiro “nada mais é do que uma resposta do Brasil a um apelo do mundo que reclama a participação das minorias no grande jogo democrático da cultura”. Colaborador da primeira edição, o dramaturgo Nelson Rodrigues (que escreveu O Anjo Negro especialmente para o TEN) reforçava a tese: “É preciso uma ingenuidade perfeitamente obtusa ou uma má-fé cínica para se negar a existência do preconceito racial”13 13 . Citado por Abdias Nascimento em texto sobre O Quilombo publicado no jornal Folha de S.Paulo, em outubro de 2002. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/livrariadafolha/920231-leia-texto-de-abdias-do-nascimento-sobre-o-jornal-quilombo.shtml. Acesso em: 22 ago. 2020. .

Quilombo foi, no Brasil, uma fração do que The Black Panther Newspaper de fato representou para a comunidade negra norte-americana e de países da diáspora africana. A integrante Angela Davis aponta que o programa do Partido dos Panteras Negras, fundado pelos estudantes Bobby Seale e Huey P. Newton, em Oakland, na Califórnia, em 1966, recapitula as pautas abolicionistas do século 19 e continua a ecoar essas pautas no século 21. Seu manifesto de dez pontos reivindica terra, pão, moradia, educação, vestimenta, justiça, paz, liberdade, emprego e o fim da violência policial. Tudo pelo que o movimento Black Lives Matter luta até hoje.

Embora fundado como “Partido dos Panteras Negras para a Autodefesa”, com o projeto de formar patrulhas comunitárias para monitorar e confrontar o abuso e a repressão policial às comunidades afrodescendentes, amparando-se na legislação que permitia o porte de armas14 14 . Os assassinatos dos líderes Malcolm X, em 1965, e de Martin Luther King, em 1968, acabam demonstrando para muitos ativistas que o caminho da não violência não levaria ao fim da segregação racial e aos direitos civis da comunidade afro-americana. (FAJARDO, 2017, p, p. 27) , o partido teve a argúcia de entender que o racismo extravasava o âmbito policial e se alastrava de forma estrutural no desamparo social e educacional.

O braço impresso do movimento nasceu concomitantemente ao partido com o título BLACK PANTHER Community News Service e constituiu arma tão ou mais potente do que os rifles usados para enfrentar o aparato repressivo estatal. Com a função educacional de fomentar a consciência política entre as comunidades afro-americanas e de construir uma contrainformação às campanhas de invisibilização e difamação promovidas por poderes políticos e corporações midiáticas, o jornal centralizava a forma com que o movimento se organizava e se fazia visível.

Desenhado pelo artista Emory Douglas, ministro da Cultura do Black Panther Party, The Black Panther Newspaper foi o principal braço gráfico do movimento, formado também por cartazes e panfletos. O poder comunicacional do jornal e do partido seria equivalente à expansão que o Black Lives Matter alcança hoje, ganhando terreno em mais de 50 cidades dos Estados Unidos e com forte influência além-mar15 15 . As ações do BPP alinharam-se, por exemplo, às lutas de libertação do American Indian Movement, da União Nacional Africana do Zimbabwe, da Frente de Libertação Nacional da Argélia, da República da China, da República Democrática da Coreia, dos movimentos revolucionários com prática de guerrilha de Cuba, Peru, Uruguai, Israel, Europa, Escandinávia etc. . Sua relevância era tanta que o jornal ganhou a alcunha de intercommunal [entre comunidades], e o movimento realizou o que viria a ser preconizado uma década depois por Blanchot e Nancy: a ideia de que “aquilo que não pertence a ninguém, remete a todos”16 16 . “O jornal do partido, finalmente chamado Black Panther Intercommunal News Service, tornou-se não apenas a fonte primária de informação sobre o partido, relatando nossa ideologia, história e desenvolvimento, mas também se tornou a voz das pessoas, articulando a luta do povo negro e outros povos oprimidos dentro dos EUA e ao redor do mundo. Além disso, o jornal cresceu e tornou-se a nossa principal fonte de recursos para a manutenção de nossas oficinas (bases, offices) e nossa escola, o Oakland Community Learning Center e de programas de sobrevivência como o Free Breakfast for Children.” (HILLIARD, 2007, p, p. VII , tradução minha) .

Há divergências se o partido chegou a assumir as lutas por direitos de mulheres e comunidades LGBTs. A pesquisadora Carol Wells, do Center for the Study of Political Graphics, de Los Angeles, aponta que o BBP foi um dos primeiros movimentos negros a convidar homossexuais a participar da cena política e a defender seus direitos (FAJARDO, 2017FAJARDO, Juan Pablo. Todo Poder ao Povo!. In Todo poder ao povo! Emory Douglas e os Panteras Negras. São Paulo: SESC, 2017., p. 26), mas a respeito do apoio às lutas das mulheres não há unanimidade. Angela Davis defende que o grupo não tinha uma abordagem machista junto às militantes, diferentemente de outras organizações afro-americanas, mas Elaine Brown, membro do Partido e candidata à Câmara Municipal de Oakland em 1973 conta em um livro várias histórias sobre o caráter machista do movimento (BROWN, 1992BROWN, Elaine. A Taste of Power: A Black Woman Story. Nova York: Parthenon Books, 1992.). Ainda assim, poucos veículos de imprensa comunitária promoveram a articulação entre comunidades com a potência alcançada pelo jornal dos Panteras Negras.

Atualmente, a sociedade segue desafiada a integrar e comunicar suas causas, diante da realidade distópica que se coloca com o avanço da extrema-direita e a reedição de discursos fascistas. Reconhece-se aqui que os veículos periódicos com maior capacidade de integração e difusão de causas sociais operam hoje para além do jornalismo comunitário, no âmbito das ruas e das redes, em atos e acontecimentos estético-políticos, que replicam, em imagens e textos, as respostas aos acontecimentos. “Todo dia uma bomba”, estampa o estandarte do Ato 3 do Grupo de Ação em manifesto estético-político.

COMUNICAÇÃO EXPLOSIVA OU A ORDEM DESORDENADA DAS RUAS

A sobreposição de crises sanitária, política e econômica em 2020 é rebatida por uma vigorosa reação de opiniões postadas em telas planas, expostas no asfalto e projetadas na alvenaria das fachadas urbanas. Espaços físicos e virtuais equalizam-se nas ações de rua do movimento Fumaça Antifascista, formado por artistas ligados à Galeria Reocupa, da Ocupação 9 de Julho, em São Paulo, nas postagens de estandartes e palavras de ordem pelo grupo reunido em torno da hashtag #coleraalegria, nos lambes e bandeiras de André Parente, em declarado contra-ataque às guerrilhas cibernéticas que instauram uma guerra cultural nas redes, nas pinturas do artista No Martins, com a representação de pessoas negras e a hashtag #JáBasta, que circulam em estandartes urbanos e no Instagram. “A hashtag é uma apropriação da linguagem das redes sociais, como forma de defender ideias e difundir imagens. A intenção é que se torne repetitivo, como uma maneira dar um grito”17 17 . Depoimento de No Martins para a reportagem “Manifestações: Política e estética em tempo de crise”, de Leandro Muniz, Nina Rahe e Paula Alzugaray, publicada no site da revista seLecT em julho de 2020. Disponível em: https://www.select.art.br/manifestacoes-politica-e-estetica-em-tempo-de-crise/. Acesso em: 22 ago. 2020. .

A dimensão do espaço público virtual potencializa-se ainda nas ações do coletivo @projetemos, rede de projecionistas independentes que irrompeu em mais de 40 pontos em todo o Brasil, trabalhando em sincronismo conceitual e temático. Refletindo pautas urgentes, o coletivo projeta diariamente no espaço público denúncias de ações criminosas, informações de saúde pública, prevenção à Covid-19, combate ao racismo, ajuda aos povos indígenas, feminismo e outras lutas, fazendo sua crônica cotidiana e periódica a partir de uma base de fotos e vídeos compartilhados on-line, em linguagem breve e rápida como a dos memes. A cada dia, um tema é escolhido, projetado e então disseminado nas redes, com hashtags. Os conteúdos renovam-se a partir de fatos de relevância nacional, mas também de vivências, pesquisas e singularidades dos integrantes.

Também em formato periódico de atuação, o Grupo de Ação, formado por ativistas, trabalhadores da arte e profissionais da cultura, do direito, da saúde e da comunicação, responde à crise política e social com sucessivos atos estéticos-políticos no espaço urbano, acompanhados de manifestos e videoprotestos postados nas redes. O Ato 1 promoveu uma liturgia do luto às vítimas de violência do Estado – assassinados pela Polícia Militar, pela ditadura militar ou pela Covid-19 –, mortos sem direito ao ritual de despedida. O Ato 2 homenageou indígenas e animais ameaçados de extinção pelas queimadas amazônicas. O Ato 3 reproduziu a tese, já apontada neste texto, de que a opressão se relaciona ao neoliberalismo. “Quem lucra com a reforma da Previdência? Quem lucra com o coronavírus? Quem lucra com o desmatamento? Quem lucra com as nossas mortes?”, são perguntas lançadas nos videoprotestos, que animam a fauna brasileira das notas de real.

Ao longo de junho, a frase “eu não posso respirar” – a última dita por George Floyd antes de morrer sob o peso do policial branco – foi repetida por manifestantes de todo o mundo, e a decapitação de símbolos do passado colonial foi replicada em cidades dos Estados Unidos e da Europa. Com o pescoço amarrado por cordas e arrancada do pedestal onde se apoiava há 125 anos, a estátua do traficante de escravos rolou pelas ruas de Bristol, no Reino Unido, foi atirada ao rio e substituída, por algumas horas, pelo monumento de uma ativista do movimento Black Lives Matter.

A fúria iconoclasta que fez com que cabeças históricas rolassem é um ato equiparável à ação subversiva e subterrânea que a revista Acéphale – a “grande comunidade” praticada por Georges Bataille, segundo Jean-Luc Nancy – impetrou contra o fascismo histórico, cem anos atrás18 18 . As edições nº 3 e nº 4 da Acéphale se propuseram a resgatar Nietzsche das garras do fascismo. . Na decapitação indicada no título da revista publicada por um grupo de intelectuais ligados a Bataille, entre 1936 e 1939, se reconhece a ação implacável de destruição do poder soberano e da primazia do Estado-nação sobre outras categorias comunitárias.19 19 . A revista surge em 24 de junho de 1936 e tem seus membros bem definidos. É publicada por Georges Ambrosino, Georges Bataille, Pierre Klossowski e André Masson. Seus cinco números se distribuem ao longo de quatro anos, entre 1936 e 1939, quando a revista termina anunciando a inevitabilidade da Guerra.

A privação da Cabeça não excluía, portanto, somente o primado daquilo que a cabeça simbolizava, o chefe, a razão razoável, o cálculo, a medida e o poder – inclusive o poder do simbólico –, mas a exclusão, ela mesma entendida como um ato deliberado e soberano, que teria restaurado a primazia sob a forma de sua decadência. A decapitação que devia tornar possível ‘o desencadeamento sem fim (sem lei) das paixões’, só podia se cumprir pelas paixões já desencadeadas, elas mesmas se afirmando na inconfessável comunidade que sua própria dissolução sancionava. (BLANCHOT, 2013BLANCHOT, Maurice. A Comunidade Inconfessável. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2013., p. 29)

Aos atos impetrados por Bataille, Acéphale e sua comunidade de textos contra a lógica fascista do século 20 equiparam-se as ações estéticas e políticas que combatem hoje os “rituais periódicos de destruição de corpos”. Eles são praticados repetida e desordenadamente por torcidas organizadas de times de futebol, estudantes, artistas e profissionais da cultura. As ações periódicas que jornais, revistas políticas e diversas “comunidades de textos” organizaram no século 20 dão lugar à poesia cotidiana das bandeiras urbanas e virtuais.

Documentadas, reproduzidas e compartilhadas, elas se tornam atos midiáticos que coexistem na comunicação explosiva e na ordem desordenada das ruas e das redes, reafirmando a nostalgia de uma “comunidade inconfessável, porque demasiado numerosa, mas também porque se desconhece a si mesma, e não tem de se conhecer”, em que “cada membro da comunidade é toda a comunidade” (BLANCHOT, 2013BLANCHOT, Maurice. A Comunidade Inconfessável. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2013., p. 26). Afinal, “como explicar a Lei Rouanet para quem não assimilou a Lei Áurea?”, indaga o #cóleraalegria, tristemente, em sua bandeira.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • AGAMBEN, Giorgio. Difference and Repetition: On Guy Debord’s Films. In MCDONOUGH, Tom. Guy Debord and the situationist international: texts and documents. Cambridge, Mass: MIT Press, 2004.
  • ANDERSON, Benedict. Comunidades Imaginadas: Reflexões sobre a origem e a difusão do nacionalismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.
  • BLANCHOT, Maurice. La Communauté Inavouable. Editora Universidade de Brasília, 2003.
  • BLANCHOT, Maurice. A Comunidade Inconfessável. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2013.
  • BROWN, Elaine. A Taste of Power: A Black Woman Story. Nova York: Parthenon Books, 1992.
  • BUCHANAN, Larry; BUI, Quoctrung; PATEL, Jugal K. Black Lives Matter May Be the Largest Movement in U.S History. The New York Times, 6 jul 2020. Disponível em: https://www.nytimes.com/interactive/2020/07/03/us/george-floyd-protests-crowd-size.html Acesso em: 17 jul 2020.
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  • COMUNIDADES Imaginadas - 21ª Bienal de Arte Contemporânea Sesc_Videobrasil. São Paulo: SESC Edições, 2019.
  • DAVIS, Angela. Ativismo Político e Protesto dos Anos 1960 à Era Obama. In DAVIS, Angela. A Liberdade é uma luta constante. São Paulo: Boitempo, 2018, pp. 99-111.
  • DAVIS, Angela. Classe e Raça no Início da Campanha pelos Direitos das Mulheres. In DAVIS, Angela. Mulheres, Raça e Classe. São Paulo: Boitempo, 2016, pp. 66-69.
  • DIAS, Maria Cristina Longo Cardoso. A Questão da Opressão para Angela Davis. Princípios: Revista de Filosofia, 27(52), Natal, jan-abr 2020.
  • FAJARDO, Juan Pablo. Todo Poder ao Povo!. In Todo poder ao povo! Emory Douglas e os Panteras Negras. São Paulo: SESC, 2017.
  • HARAWAY, Donna J. Manifesto Ciborgue – Ciência, tecnologia e feminismo-socialista no final do século XX. Ponta Grossa: Editora Monstro dos Mares, 2000.
  • HILLIARD, David. The Black Panther Intercommunal News Service 1967-1980. New York: Atria Books, 2007.
  • LEITE, Roberto Saraiva da Costa. A Frente Negra Brasileira. Portal Geledés, 2017. Disponível em: https://www.geledes.org.br/frente-negra-brasileira-2/ Acesso em: 17 jun 2020.
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  • LENIN, Vladimir. Where to Begin?. Publicado originalmente no jornal Iskra, nº 4, maio de 1901. In Lenin Collected Works, Foreign Languages. Vol. 5. Moscou: Progress Publishers,1961, pp. 13-24. Disponível em: https://www.marxists.org/archive/lenin/works/1901/may/04.htm Acesso em: 28 jul 2020.
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  • LOWE, Lisa. Metaphors of Globalization and Dilemas of Excess. In SNORTON, Riley; YAPP, Hentyle. Saturation – Race, Art, and the Circulation of Value. Massachusetts: The MIT Press, 2020.
  • MBEMBE, Achille. Necropolítica. São Paulo: n-1 edições, 2018.
  • NANCY, Jean-Luc. La Communauté Désoeuvrée. Aléa, La communauté, le nombre., nº 4, Paris, 1983.
  • NANCY, Jean-Luc. La Comunidad Inoperante. Santiago: Escuela de Filosofia Universidad ARCIS, 2000.
  • NEGRI, Antonio; GUATTARI, Félix. As Verdades Nômades: Por novos espaços de liberdade. São Paulo: Editora Politéia, 2017.
  • PRIMEIROS Ensaios: publicação educativa da 34ª Bienal de São Paulo / org. Fundação Bienal de São Paulo; curadoria Jacopo Crivelli Visconti. São Paulo: Bienal de São Paulo, 2020, pp. 33-35.
  • SAFATLE, Vladimir. Bem-vindo ao Estado Suicidário. n-1 edições. São Paulo, 2020. Disponível em: https://n-1edicoes.org/004 . Acesso em: 27 jul 2020.
    » https://n-1edicoes.org/004
  • ŽIŽEK, Slavoj. Pandemia – Covid 19 e a Reinvenção do Comunismo. São Paulo: Boitempo, 2020.

NOTAS

  • 1
    . “Quais são as identidades que fundamentam esse mito político tão potente chamado nós e o que pode motivar o nosso envolvimento nessa comunidade?” (HARAWAY, 2000HARAWAY, Donna J. Manifesto Ciborgue – Ciência, tecnologia e feminismo-socialista no final do século XX. Ponta Grossa: Editora Monstro dos Mares, 2000., p. 47)
  • 2
    . Angela Davis, em palestra online promovida pelo Birmingham Civil Rights Institute, em 19 jun. 2020, declarou que “todo ser humano, toda mulher, todo homem, toda pessoa transexual, toda pessoa não binária do planeta merece ter seus direitos humanos reconhecidos e defendidos. Ninguém pode ser excluído desse abraço humano planetário. Nem brasileiros indígenas, nem muçulmanos na Índia, nem curdos em Rojava, certamente não palestinos na Palestina ocupada por Israel.” Disponível em: https://www.youtube.com/watch?time_continue=25&v=XOWn9zF4XQY&feature=emb_logo. Acesso em: 22 ago 2020.
  • 3
    . Publicado na França, em fevereiro de 1983, na revista literária Aléa, dedicada ao tema da comunidade, que reuniu textos de Jean-Christophe Bailly, Jean-Luc Nancy, Jean-Luc Parant, Jean-François Lyotard, Jean-Marie Gibbal, Henri-Alexis Baatsch e Michel Deutsch.
  • 4
    . Publicado na França pela Éditions de Minuit, Paris, 1983, e, no Brasil, pela Editora Universidade de Brasília, 2003.
  • 5
    . O luto pela derrocada do comunismo e dos movimentos de contestação política e social dos anos 1960 pauta o diálogo entre Nancy e Blanchot, assim como de outros autores, como Félix Guattari e Antonio Negri, que, na escritura partilhada de As Verdades Nômades (1985), empenham-se em resgatar o comunismo da condição de infâmia que os regimes coletivistas que se reportam ao socialismo lhe impingiram, devolvendo-lhe a condição de “liberação das singularidades individuais e coletivas, ou seja, o exato oposto da arregimentação dos pensamentos e desejos” (NEGRI; GUATTARI, 2017, pNEGRI, Antonio; GUATTARI, Félix. As Verdades Nômades: Por novos espaços de liberdade. São Paulo: Editora Politéia, 2017., p. 5).
  • 6
    . A essa “comunidade de textos” que os autores afirmam ter origem na ideia de “exigência comunitária”, de Georges Bataille, podem ser associados A Comunidade Que Vem (1990), de Giorgio Agamben; Comunidades Imaginadas, de Benedict Anderson; Communitas-immunitas, de Roberto Esposito; A Hospitalidade Incondicional, de Jacques Derrida; A Comunidade e a Segurança, de Zygmunt Bauman; A Partilha do Sensível, de Jacques Rancière; e Multidão, de Antonio Negri e Michael Hardt.
  • 7
    . No Brasil, a violência policial contra negros não respeitou o isolamento social. De acordo com levantamento da plataforma Fogo Cruzado, a cada 84 minutos a polícia mata uma pessoa, em uma escalada da violência policial desde 2015. Segundo dados da Corregedoria da PM, de janeiro a maio de 2020, durante a quarentena, o número de mortos por policiais subiu 38% na região metropolitana de São Paulo e 30% na capital em relação a 2019.
  • 8
    . No ensaio “Necropolítica”, o filósofo e pensador camaronês Achille Mbembe, estudioso da escravidão, da descolonização e da negritude, parte do pressuposto de “que a expressão máxima da soberania reside, em grande medida, no poder e na capacidade de ditar quem pode viver e quem deve morrer”, razão pela qual “matar ou deixar viver constituem os limites da soberania, seus atributos fundamentais” (MBEMBE, 2018, não paginado).
  • 9
    . Em agosto, a prefeitura de Nova York inaugurou, no Central Park, um monumento em homenagem às pioneiras na luta pelos direitos das mulheres, reunindo em torno da mesma mesa a ativista negra Sojourner Truth e Susan B. Anthony e Elizabeth Cady Stanton.
  • 10
    . Em 1851, o jornal The North Star seria rebatizado como Frederick Douglass’ Paper e publicado até 1861. Cf. PRIMEIROS Ensaios, (2020).
  • 11
    . Antes de ser extinto pelo Estado Novo de Getúlio Vargas, juntamente com todas as organizações políticas brasileiras, a FNB criou um significativo trabalho socioeducativo e cultural, com escola, um grupo musical e teatral, um time de futebol e suprindo as comunidades afrodescendentes com assistência jurídica para combater o racismo. (LEITE, 2017, nLEITE, Roberto Saraiva da Costa. A Frente Negra Brasileira. Portal Geledés, 2017. Disponível em: https://www.geledes.org.br/frente-negra-brasileira-2/. Acesso em: 17 jun 2020.
    https://www.geledes.org.br/frente-negra-...
    , não paginado)
  • 12
    . O Teatro Experimental do Negro foi um grupo de artistas afrodescendentes atuantes entre as décadas de 1940 e 1960, no Rio de Janeiro e em São Paulo, com ramificações em outras cidades brasileiras. Criado por Abdias do Nascimento e Aguinaldo Camargo, o TEN tinha como metodologia a criação de alternativas de “alfabetização cultural” e valorização étnico racial, buscando a sensibilização da comunidade negra e o apoio da classe média intelectual branca.
  • 13
    . Citado por Abdias Nascimento em texto sobre O Quilombo publicado no jornal Folha de S.Paulo, em outubro de 2002. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/livrariadafolha/920231-leia-texto-de-abdias-do-nascimento-sobre-o-jornal-quilombo.shtml. Acesso em: 22 ago. 2020.
  • 14
    . Os assassinatos dos líderes Malcolm X, em 1965, e de Martin Luther King, em 1968, acabam demonstrando para muitos ativistas que o caminho da não violência não levaria ao fim da segregação racial e aos direitos civis da comunidade afro-americana. (FAJARDO, 2017, pFAJARDO, Juan Pablo. Todo Poder ao Povo!. In Todo poder ao povo! Emory Douglas e os Panteras Negras. São Paulo: SESC, 2017., p. 27)
  • 15
    . As ações do BPP alinharam-se, por exemplo, às lutas de libertação do American Indian Movement, da União Nacional Africana do Zimbabwe, da Frente de Libertação Nacional da Argélia, da República da China, da República Democrática da Coreia, dos movimentos revolucionários com prática de guerrilha de Cuba, Peru, Uruguai, Israel, Europa, Escandinávia etc.
  • 16
    . “O jornal do partido, finalmente chamado Black Panther Intercommunal News Service, tornou-se não apenas a fonte primária de informação sobre o partido, relatando nossa ideologia, história e desenvolvimento, mas também se tornou a voz das pessoas, articulando a luta do povo negro e outros povos oprimidos dentro dos EUA e ao redor do mundo. Além disso, o jornal cresceu e tornou-se a nossa principal fonte de recursos para a manutenção de nossas oficinas (bases, offices) e nossa escola, o Oakland Community Learning Center e de programas de sobrevivência como o Free Breakfast for Children.” (HILLIARD, 2007, pHILLIARD, David. The Black Panther Intercommunal News Service 1967-1980. New York: Atria Books, 2007., p. VII , tradução minha)
  • 17
    . Depoimento de No Martins para a reportagem “Manifestações: Política e estética em tempo de crise”, de Leandro Muniz, Nina Rahe e Paula Alzugaray, publicada no site da revista seLecT em julho de 2020. Disponível em: https://www.select.art.br/manifestacoes-politica-e-estetica-em-tempo-de-crise/. Acesso em: 22 ago. 2020.
  • 18
    . As edições nº 3 e nº 4 da Acéphale se propuseram a resgatar Nietzsche das garras do fascismo.
  • 19
    . A revista surge em 24 de junho de 1936 e tem seus membros bem definidos. É publicada por Georges Ambrosino, Georges Bataille, Pierre Klossowski e André Masson. Seus cinco números se distribuem ao longo de quatro anos, entre 1936 e 1939, quando a revista termina anunciando a inevitabilidade da Guerra.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Dez 2020
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    5 Set 2020
  • Aceito
    13 Nov 2020
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