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O ácido fólico no tratamento da síndrome nervosa da anemia perniciosa: Estudo do comportamento da sensibilidade vibratória

O ácido fólico no tratamento da síndrome nervosa da anemia perniciosa. Estudo do comportamento da sensibilidade vibratória

Michel Abu JamraI; Horacio Martins CanelasII; J. M. Taques BittencourtII

ITrabalho das Clínicas Terapêutica

II(Prof. C. Moura Campos) e Neurológica

RESUMO E CONCLUSÕES

Sete pacientes, portadores de anemia perniciosa com um quadro de degeneração combinada da medula, foram tratados pelo ácido fólico (pteroilglutâmico). Foi estudado o efeito hematológico. A evolução clínica foi apreciada mediante exames neurológicos repetidos, sendo, porém, dado relevo especial à pesquisa da sensibilidade vibratória; foram utilizados diapasões com freqüências de 32 (C1), 64 (C), 128 (c) e 256 dv/s (c1). Os resultados obtidos permitiram comprovar que: 1 - O efeito hematológico é nítido, porém, menos intenso que o obtido com o uso do extrato hepático. 2 - Em relação ao efeito neurológico, verificaram-se melhoras acentuadas em 2 casos, regressão moderada dos sintomas nervosos em 3 casos, tendo 2 casos persistido inalterados. Em nenhum caso ocorreu agravação do quadro neurológico.

RÉSUMÉ

Les auteurs présentent sept cas d'anémie pernicieuse compliquée par la dégénerescence combinée subaiguë de la moelle, traités par 1'acide folique (ptéroylglutamique). On a étudié 1'effet hématologique du médicament. Le contrôle de l'évolution clinique a été fait par des examens neurologiques répétés, dans lesquels on a envisagé surtout la recherche de la sensibilité vibratoire. On a employé des diapasons de fréquence 32 (C1), 64 (C), 128 (c) et 256 (c1) doubles vibrations par second. Les résultats ont permi de démontrer d'abord que, du point de vue hématologique, 1'amélioration fût nette, cependant moins brillante qu'avec l'emploi de 1'extrait hépatique. On a vérifié, du point de vue neurologique, une amélioration nette dans 2 cas, une rémission modérée des symptômes dans 3 cas et pas de changements de l'état dans 2 malades. On n'a pas vérifié dans tous les cas l'aggravation du tableau neurologique.

SUMMARY

Seven patients, suffering of pernicious anemia complicated by combined degeneration of the spinal cord, were treated with folic (pteroylglutamic) acid. The hematologic effect was studied. The clinical evolution was studied by repeated neurological examinations, but special attention was given to the study of vibratory sensation; tuning forks with frequencies of 32 (C1), 65 (C), 128 (c) and 256 (c1) double vibrations per second were used. The results obtained proved that: 1 - The hematological effect is clear, but less intense than that obtained by the use of liver extract. 2 - In relation to the neurological effect, great improvements were found in 2 cases, slight regression of nervous symptoms were found in 3 cases and, in 2 cases, no changes were shown. In nome of these cases there occurred a set back of the clinical neurological picture.

O ácido fólico, identificado quimicamente ao ácido pteroilglutâmico, é um dos elementos do complexo vitamínico B e se caracteriza por ação eritrocitopoiética definida, seja em anemias experimentais (anemia carencial dos galináceos ou avitaminose Bc e anemia carencial dos macacos ou avitaminose M), seja em anemias humanas carenciais (sprue) e carenciais e constitucionais (anemia perniciosa tipo Addison-Biermer). Exerce, ainda, efeito biológico no sentido de estimular o crescimento de bactérias (Lactobacillus casei. Streptococcus lactis) e de tecidos (glândulas epiteliais) é, pois, verdadeiro metabolito, atuando, talvez, como elemento integrante de sistemas vitais mais complexos. Supôs-se, de início, que estivesse ligado aos fatores hematopoiéticos já reconhecidos, isto é, que fizesse parte do princípio anti-anêmico hepático, como o fator exógeno, alimentar, o chamado fator extrínseco. Com os trabalhos mais recentes, entretanto, ficou demonstrado que o ácido fólico é vitamina que tem efeito hematopoiético como que acidentalmente: o ácido fólico não se identifica aos fatores fisiológicos da hematopoiese normal. Em favor desta noção falam as verificações seguintes: extrato hepático, ácido fólico e carne incubada com suco gástrico (fator extrínseco clássico + fator intrínseco clássico) têm comportamento muito diverso diante do mesmo tipo de anemia; enquanto o extrato hepático (princípio anti-anêmico) e a mistura de carne e suco gástrico somente atuam sobre a anemia perniciosa tipo Addison-Biermer, o ácido fólico age também na anemia acréstica (Waldenstrom1 1 . Waldenstrom, J. - Successful treatment of liver-refractory anemia with synthetic Lactobacillus casei factor. Blood, 2:426-439 (setembro) 1947. ); sobre certas anemias perniciosiformes carenciais (Wills e Naish2, Rodriguez-Molina3 3 . Rodriguez-Molina, R. - Tropical macrocytic anemia in Puerto Rico; report of 2 cases. Puerto Rico J. Publ. Health a. Trop. Med., 15:177-183 (dezembro) 1939. , Trowell4 4 . Trowell, H. C. - Liver extract in treatment of tropical macrocytic anemia. Lancet. 241:303-304 (13 setembro) 1941. , Watson e Castle5 5 . Watson, J. e Castle, W. B. - Nutritional macrocytic anemia, especially in pregnancy; reponse to substance in liver other than that effective in pernicious anemia. Am. J. M. Sc., 211:513-530 (maio) 1946. ) só foi obtido efeito com extrato hepático bruto, não refinado (os autores referidos não dispunham do ácido fólico que, presumivelmente, é o agente do extrato bruto). Ainda, experimentalmente, a deficiência de ácido fólico provocada em ratos e aves, que é prontamente removida pela adição do ácido, não é influenciada pelo tratamento com a mistura de carne e suco gástrico6 6 . Welch, A. D., Jukes, T. H. e col. - Citados por Jukes, T. H. e Stokstadt, E. I,. R. - Pteroylglutamic acid and related compounds. Physiol. Rev., 28:51-107 (janeiro) 1948. . Por fim, ao que parece, já se isolou e cristalizou o princípio anti-anêmico do fígado, com o nome de Vitamina B12: as características7 7 . a) Rickes, E. L„ Brinck, N. G„ Koniuszy, F. R., Wood, T. K. e Folders, K. - Crystalline vitamin B,„. Science, 107:396-397 (16 abril) 1948. b) Shorb, M. S. - Activity of vitamin B 13 for the growth of Lactobacillus casei. Science, 107:397-398 (16 abril) 1948. c) West, R. - Activity of vitamin B 12 in Addisonian pernicious anemia. Science, 107:398. (16 abril) 1048. de agir na potência de 11.000.000 de unidades Lactobacillus casei por mgr. e de 1 micrograma corresponder a 1 unidade anti-anêmica U. S. P., definem este produto cristalino como o próprio princípio anti-anêmico. Suas qualidades biológicas, químicas e físicas são inteiramente distintas das do ácido pteroilglutâmico. O ácido fólico é, portanto, agente autônomo, farmacologicamente ativo, eritrocitopoiético excitante e não constitui elo provável na cadeia de formação do princípio fisiológico (o princípio anti-anêmico do fígado). O modo de ação deste composto é peculiar, quando comparado com o do extrato de fígado. Realmente, Rundles8 8 . Rundles. R. W. - Prognosis in the neurologic manifestations of pernicious anemia. Blood, 1:209-219 (maio) 1946. e Meyer9 9 . Meyer, L. - Folic acid in the treatment of pernicious anemia. Blood, 2:50-62 (janeiro) 1947. assinalam que o ácido fólico não consegue levar eriítócitos e hemoglobina até os níveis normais, no mesmo ritmo que o extrato de fígado.

O ácido fólico tem sido amplamente utilizado no tratamento das anemias perniciosas; entretanto, de maneira geral, os autores9 9 . Meyer, L. - Folic acid in the treatment of pernicious anemia. Blood, 2:50-62 (janeiro) 1947. e 10 10 . a) Vilter, C. F., Vilter, R. W. e Spines, T. D. - Treatment of pernicious anemia and relatd anemias with synthetic folic acid. I: Observations on maintenance of normal hematologic status and on occurrence of combined system disease at end of one year. J. Lab. a. Clin. Med. 32:262-273 (março) 1947. b) Heinle, R. W. e Welch, A. D. - Folic acid in perpicious anemia: failure to prevent neurologic relapse. J. A. M. A. 133:739-741 (15 março) 1947. c) Hall, B. E., Palmer, W. L. e Heinle, R. W. - Discussão das comunicaçõ-s sobre ácido fólico lidas na Décima-nona Reunião Anual da Central Society for Clinical Research. J. Lab. a. Clin. Med. 32:338-340 (março) 1947. d) Hall. B. E. e Watkins, C. H. - Experience with pteroylglutamic (svnthetic folic) acid in the treatment of pernicious anemia. .T. Lab. a. Clin. Med. 32:622-634 (junho) 1947. e) Castle, W. B. e Berk, L. - Citados por Sargent 11, f) Ross. J. F., Belding, H. e Paegel, B. L. - The development and progression of subacute combined degeneration of spinal cord in patients with pernicious anemia treated with synthetic nteroylelutamic (folic) acid. Blood 3:68-90 (janeiro) 1948. g) Bethell, F. H. e Sturgis, C. C. - The relation of therapy in pernicious anemia to changes in the nervous system; early and late results in a series of cases observed for periods of not less than ten years, and early results of treatment with folic acid. Blood 3:57-67 (janeiro) 1948. h) Hfden. R. S. - Hematology. J. A. M. A. 136:308-310 (31 janeiro) 1948. afirmam que, em relação ao efeito sobre as lesões nervosas, esta droga é, até certo ponto, nociva e contraproducente, não só agravando as lesões pré-existentes, como as criando ex-novo. Em recente revisão, Sargent11 11 . Sargent. F. - Folic acid: pteroylglutamic acid and related substances. New England J. Med. 237:667-672 (30 outubro) 1947 e 237:703-707 (6 novembro) 1947. acentuou este fato e, num editorial12 12 . Editorial - A warning regarding the use of folic acid. New Englan J. Med, 237:713-714 (6 novembro) 1947. , é feita uma advertência sobre os inconvenientes do emprego do ácido fólico no tratamento das síndromes neuranêmicas.

A importância deste fato levou-nos a realizar o presente trabalho, no sentido de apurar o significado real dos resultados referidos na literatura. Além de procurar obter dados sobre o efeito hematológico do ácido fólico, foi nossa preocupação primordial avaliar a ação da droga sobre as manifestações nervosas da anemia perniciosa, através de métodos mais delicados e sensíveis do que os utilizados nos exames neurológicos de rotina.

A SENSIBILIDADE VIBRATÓRIA NAS SÍNDROMES NEURANÊMICAS

A lesão nervosa da anemia perniciosa é predominantemente medular e, neste setor do neuraxe, como já fora reconhecido por Lichtheim13 13 . Lichtheim, L. - Zur Kenntnis der perniciösen Anämie. Münch. Med. Wchnschr. 34:3 0 0, 1887. , prefere os funiculus laterais (tractos corticospinais laterais) e dorsais (fibras radiculares longas). Daí a denominação de degeneração combinada subaguda da medula14 ou mielose funicular15 15 . Austregésilo, A. - Mieloses funiculares. Arq. Brasil. Neuriat. e Psiquiat., 17:299-319 (setembro-outubro) 1934. . Da sede da lesão decorre o quadro neurológico, no qual avultam os sinais piramidais e as desordens da sensibilidade profunda, com sua conseqüência direta, a ataxia. Tal intensidade assumem os distúrbios proprioceptivos, que Dejerine16 16 . Dejerine, J. - L,e syndrome des fibres radiculaires longues des cordons postérieurs. Compt. rend. Soe. de Biol., 75:554-556 (13 dezembro) 1913. denominou o quadro clínico da neuranemia, de síndrome das fibras radiculares longas.

Ao lado do exame neurológico habitual, propusemo-nos a estudar, em particular, um sinal dentre a constelação sintomatológica da neuranemia. Atendendo ao realce que tomam, nesse quadro clínico, as perturbações da sensibilidade vibratória (fato reconhecido por Mathieu17 17 . Mathieu, P. - Étude clinique et anatomo-pathologique des syndromes neuro-anémiques. Octave Doin, Paris, 1925, pág. 28. e Roger e Olmer18 18 . Roger, H. e Olmer, J. - Les syndromes neuro-hématiques. Masson et Cie, Paris, 1936, pág. 21. ), dirigimos nossa atenção para este ponto. E, através de determinações acuradas da palestesia, procuramos demonstrar o valor diagnóstico e prognóstico desse distúrbio. Paralelamente, utilizamos o mesmo método para avaliar o efeito do tratamento pelo ácido fólico sobre a lesão nervosa da anemia perniciosa.

Na grande maioria dos casos de síndromes neuranêmicas, não somente verificamos o intenso comprometimento da sensibilidade ao diapasão, como também, geralmente, é a palestesia aquela cujos distúrbios preponderam entre as várias formas de sensibilidade profunda. Em certos casos, observamos mesmo verdadeira dissociação da sensibilidade profunda: intenso comprometimento da sensibilidade vibratória e normalidade das demais formas de propriocepção (caso 2; casos 1 e 7 após fólico). Aliás, Woltmann19 19 . Woltmann, H. W. - The nervous system in pernicious anemia: an analysis of one hundred and fifty cases. Am. J. M. Sc., 157:400-4 09 (março) 1919. , Hamilton e Nixcn20 20. Hamilton, A. S. e Nixon, Ch. E. - Sensory changes in the subacute combined degeneration of pernicious anemia. Arch. Neurol, a. Psychiat., 6:1-31 (julho) 1921. , Ahrens21 21 . Ahrens, R. S. - A study of the vibratory sensation. Arch. Neurol, a. Psychiat., 14:793-805 (dezembro) 1925. ,

Laruelle e Massion-Verniory22 22 . Laruelle, L. e Massion-Verniory, L. - L'abolition precoce du sens vibratoire au diapason au stade paresthésique du syndrome neuro-anémique de Biermer. Rev. Neurol., 63:222-224 ( 7 fevereiro) 1935. , entre outros autores, já haviam notado que o comprometimento da sensibilidade vibratória pode ser o único achado neurológico, nas síndromes neuranêmicas.

Embora não se conheçam exatamente os receptores periféricos para a sensibilidade vibratória, experiências de Newman e col.23 23 . Newman, H. W., Doupe, J. e Wilkins, R. W. - Some observations on nature of vibratory sensibility. Brain 62:31-40 (março) 1939. e Stopford24 24 . Stopford, J. S. B. - Sensation and the sensory pathways. Longmans, Green & C°, Londres, 1930. vieram demonstrar que esta forma de sensibilidade pode provir da excitação de receptores localizados na pele ou em estruturas profundas (músculos e articulações, especialmente). Segundo Newman e col., é provável que os receptores cutâneos sejam os mesmos que os relacionados ao tacto e que os profundos estejam intimamente ligados aos corpúsculos que provêm à sensibilidade segmentar; estes autores julgam que a sensibilidade vibratória é apenas "o resultado da estimulação rápida e repetida das terminações tácteis ou proprioceptivas". O periósteo pouco papel desempenha na recepção da sensibilidade vibratória, admitindo-se que os ossos atuem somente como transmissores mecânicos.

Em relação às vias seguidas no neuraxe pelos estímulos vibratórios, a opinião geral é a de que transitam pelos funículos dorsais. A artrestesia, para alguns autores, teria dupla via: funículos dorsais (principalmente o fascículo cuneiforme) e feixes espinocerebelares; o fascículo cuneiforme, mais evidente nas porções altas da medula, envia importante contingente ao núcleo cuneiforme lateral de von Monakow (homólogo à coluna de Clarke), donde parte o segundo neurônio para o vermis cerebelar, através das fibras arqueadas externas dorsais. Em favor deste modo de ver estão as experiências de Putnam25 25 . Putnam, T. J. - Myelotomy of the commissure. Arch. Neurol, a. Psychiat., 32:1189-1193 (dezembro) 1934. , sobre a secção dos fascículos gráceis na região cervical, obtendo abolição da palestesia e conservação da sensibilidade segmentar nos membros inferiores. Em conclusão, a sensibilidade vibratória, pelos fascículos gráceis, alcançaria os núcleos de Goll e Burdach, servindo-se do lemnisco medial para ganhar o tálamo; a sensibilidade segmentar, através dos feixes de Flechsig e Gowers (relacionados com os membros inferiores) e do fascículo cuneiforme (membros superiores), alcançaria o cerebelo, utilizando depois a via cerebelo-talâmica no seu decurso ascendente. Esta hipótese, aceita por Weinstein e Bender26 26 . Weinstein, E. A. e Bender, M. B. - Dissociation of deep sensibility at different levels of the central nervous system. Arch. Neurol, a. Psychiat., 43:488-497 (março) 1940. , explicaria as dissociações que se verificam entre essas duas formas de sensibilidade nos diferentes níveis do neuraxe, concordando com o fato27 27 . Moura Campos, C. - Alguns aspectos das formas neuro-anêmicas da anemia perniciosa. Rev. Med. Brasil., 18:313-334 (março) 1945. de que a lesão medular da anemia perniciosa tende a ocupar, nos funículos dorsais, a porção mediana, correspondente aos fascículos gráceis e à porção medial dos fascículos cuneiformes.

Cremos, porém, que a dissociação verificada na neuranemia comporta explicação fisiopatológica, e não anatômica, exclusivamente. A palestesia consiste, essencialmente, na diferenciação de estímulos que se sucedem em frações de segundo. Deduz-se que esta forma de sensibilidade deve trafegar pelas fibras de condução rápida, isto é, as grossas fibras mielínicas. Poderíamos, então, admitir que, quando se lesam estas fibras, sofra em primeiro lugar a sensibilidade vibratória. E isto porque a apalestesia resulta do atraso na transmissão dos impulsos ou do aumento do período refratário, de tal forma que se fundem as excitações sucessivas: os estímulos vibratórios passam a traduzir-se unicamente por sensibilidade táctil. Por outro lado, a noção das atitudes segmentares ainda perdura nos casos iniciais, porquanto, na apreciação da artrestesia, a rapidez de condução dos estímulos não tem a importância que possui em relação à palestesia.

MÉTODOS

O primeiro autor a estudar a sensibilidade vibratória foi Rumpf

28 28 . Rumpf, A. - Über einen Fall von Syringomyelle nebst Beitrãgen zur Untersuchung der Sensibilität. Neurol. Centralbl., 8:185 (1 abril) 1889 e 8:222 (15 abril) 1889. , que utilizou diapasões de freqüências diversas, mas considerava o método como destinado a estudar a sensibilidade cutânea. Treitel

29 29 . Treitel - Über das Vibrationsgefühl der Haut. Arch. f. Psychiat., 29:633-640, 1897. procedeu a uma investigação mais acurada da palestesia, observando o tempo durante o qual a vibração era percebida e, das variações notadas entre as sensibilidades táctil e vibratória, concluiu serem formas distintas, ao contrário do que supusera Rumpf. Em 1903, Rydel e Seiffer

30 denominaram palestesia à sensibilidade vibratória, o que constitui mais um passo no sentido de separá-la das sensibilidades táctil e outras. Head

31 33 31. Citado por Wood. estudava a sensibilidade vibratória colocando o diapasão em um ponto do corpo, até que a vibração deixasse de ser percebida e, nesse momento, transferia o aparelho para um ponto simétrico, verificando durante quanto tempo a vibração ainda era apreciada. Gordon Holmes

31 33 31. Citado por Wood. utilizava um diapasão simples, sem padronização de intensidade, efetuando especialmente determinações qualitativas. Outros autores preferiam empregar um diapasão provido de um triângulo de Gradenigo, que permitia a aplicação de vibrações de freqüências diferentes. Entretanto, devemos lembrar aqui que os diapasões comuns sempre vibram numa freqüência fixa e que o golpe inicial somente faz variar a amplitude da vibração

.

Numerosos estudos sobre a palestesia têm sido feitos com um diapasão do tipo ideado por Symns32 pelo qual se consegue padronizar a amplitude das vibrações, o que permite o estudo quantitativo mais ou menos exato. Utilizando esse aparelho, Wood33 33 . Wood, F. L. - A further study of the quantitative variations in the vibration sensation. Am. J. M. Sc. 163:19-30 (janeiro) 1922. estabeleceu um gráfico no qual registrou os tempos de percepção da palestesia, em 100 indivíduos neurologicamente normais. Esse autor pesquisava a sensibilidade vibratória nos maléolos, tíbia, espinha ilíaca ântero-superior, sacro, esterno, rádio e cúbito. Wood e, depois, Ahrens20 20. Hamilton, A. S. e Nixon, Ch. E. - Sensory changes in the subacute combined degeneration of pernicious anemia. Arch. Neurol, a. Psychiat., 6:1-31 (julho) 1921. e Barach34 34. Barach, J. H. - Test for quantitative vibratory sensation in diabetes, pernicious anemia and tabes dorsalis. Arch. Int. Med., 79:602-613(junho) 1947. . verificaram que, em certas moléstias nas quais se verifica lesão dos funículos posteriores, é possível surpreender variações na curva de percepção vibratória, antes que outros sintomas mais flagrantes atestem a evidência da lesão nervosa. Em relação à síndrome de Lichtheim, Wood verificou que, em 4 casos, havia absoluta apalestesia abaixo do sacro e apenas em 1 paciente obteve uma curva ascendente, desde a apalestesia nos maléolos até a normalidade, acima do esterno. Barach, utilizando o mesmo método, assinala que, tanto em indivíduos normais, como em doentes, a sensibilidade vibratória é melhor reconhecida nos membros superiores, descrescendo à medida que os pontos pesquisados se aproximam do sacro.

Infelizmente, nós não pudemos dispor de um diapasão do tipo Symns. Procuramos utilizar um diapasão elétrico* de 100 vibrações, de fabricação francesa (Ch. Verdin-G. Boullitte Succ), cujos ramos vibram sob a ação de um eletro-ímã; entretanto, o aparelho não se adaptava ao uso clínico e sua vibração era muito fraca. Não pudemos dispor de aparelhos mais aperfeiçoados, como o de Gray35, ou de osciladores eletrônicos36 36 . Pollock, L. J. - Vibration sense. Arch. Neurol, a. Psychiat., 37:1383-1386 (junho) 1937. , ou de um palestesiômetro de Henney37 37 . Tilney, F. - A comparative sensory analysis of Helen Keller and Laura Bridgman. Arch. Neurol, a. Psychiat., 21:1227-1269 (junho) 1929. . Este fato nos levou a não estudar, em nossos casos, o tempo de percepção vibratória (método, aliás, já tentado entre nós, com diapasões comuns38 38 . Abu Jamra, M. - Anemia perniciosa; hematologia e clinica. Tese de docência. Empr. Gráf. da "Rev. dos Tribunais", São Paulo, 1947, pág. 243. ), pois que os diapasões de que dispúnhamos não permitiam fixar a amplitude. Outro motivo que nos conduziu a não praticar a determinação do tempo de percepção vibratória foi o fato de que esse método exige cooperação e inteligência por parte do paciente, condições difíceis de conseguir no material humano de que dispúnhamos, num hospital para indigentes. Julgamos, entretanto, que nosso trabalho, por visar difundir entre os clínicos um processo de utilidade prática, terá a vantagem de empregar instrumental simples (escala de diapasões), encontrado em qualquer clínica.

Reportamo-nos, pois, às investigações de Sales Vazquez39 39 . Sales Vazquez, R. - Contribución al estudio de la sensibilidad vibratoria. Med. Clín. (Barcelona) 6:408-419 (junho) 1946. . Considerando que o distúrbio da sensibilidade vibratória consiste, como vimos, num atraso na transmissão das sensações, ocasionando a fusão dos estímulos oscilatórios, este autor estudou as variações da palestesia em relação com as várias freqüências dos diapasões. Concluiu que a intensidade das lesões está na razão inversa da freqüência percebida. Sales Vasquez pesquisou a palestesia em 100 indivíduos normais, com diapasões cuja freqüência variava entre 32 e 4096 duplas vibrações por segundo. Verificou que as freqüências normalmente percebidas estão compreendidas entre 32 e 512 dv/s.

Baseados nestes dados, utilizamos diapasões cujas freqüências variavam entre 32 (C1) e 256 dv/s (c3), tendo afastado o diapasão de 512 dv/s, em virtude das dificuldades técnicas de seu emprego: pequena intensidade e grande brevidade no tempo de vibração. Para evitar flutuações muito grandes na intensidade, as determinações foram todas realizadas por um de nós, uniformizando a intensidade do golpe inicial sobre os diapasões. Escolhemos como níveis de exame as apófises espinhosa da coluna vertebral, as espinhas ilíacas ântero-superiores, as tíbias, os maléolos e o hálux.

MATERIAL CLÍNICO

O material clínico manipulado consistiu de 7 doentes selecionados no sentido de apresentarem lesão nervosa perfeitamente identificada como causada pela anemia perniciosa e de terem sua evolução, até certo ponto, avaliada quantitativamente por exames repetidos e minuciosos da palestesia, o que possibilitou mensurar o grau, a extensão e o comportamento das lesões no decurso do tratamento pelo ácido fólico.

Caso 1 - F. M., 42 anos, sexo masculino, branco, registro 77163. Examinado em Ambulatório em 4-7-1947 e internado, em 2-9-47, na Clínica Neurológica (Prof. A. Tolosa). Alta em 1-11-47. Em 1945, começou a sentir formigamento na ponta dos dedos e falta de firmeza na preensão dos objetos de trabalho e talheres, bem como dificuldade na execução de movimentos delicados, como abotoar-se. Nesse estado permaneceu um ano, no fim do qual acentuou-se o enfraquecimento e foram acometidos os membros inferiores: sentia as pernas fracas, não tinha equilíbrio, tendendo a cair, especialmente para a esquerda. Indivíduo longilíneo, pele pálida, mucosas descoradas, língua com papilas hipotróficas. Exame neurológico (no 1.° dia de internação) - Psiquismo íntegro; discreto sinal de Romberg; marcha em pequenos passos, com desvios, alargamento da base e ligeiro calcaneamento; pequena diminuição da força muscular nos membros inferiores, onde havia, também, ataxia de tipo sensitivo; hipotonia muscular; hiperreflexia osteotendinosa, com clono e automatísmo medular; sinal de Babinski bilateral e sinais de Rossolimo e Mendel-Bechterew nos pés. Sensibilidade: hipoartrestesia nos grandes artelhos; em relação à palestesia, foram encontrados os níveis representados na fig. 1.


O diagnóstico de anemia perniciosa foi confirmado pelos seguintes exames complementares: a) Hematológico - Anemia de 2.900.000 Eo/mm3, com macrocitose e hipercromia. b) Mielograma - Transformação megaloblástica total, c) Suco gástrico - Aquilía à histamína. Outros exames: Coprológico - Fibras musculares mal digeridas; amoníaco na taxa de 6 cms por 10 grs. de fezes. Líqüido cefalorraqueano normal. Reações de Wassermann e Kahn no sangue negativas.

Tratamento e evolução - O paciente foi medicado com 20 mgrs. de ácido fólico (via oral), do 15.° ao 56.° dia após a internação. O exame da palestesia revelou, no 80.° dia, acentuadas melhoras (fig. 2); normalizou-se a artrestesia; os demais sintomas não sofreram modificação. O quadro neurológico não sofreu a influência das injeções de Reticulógeno (2 cm3), administradas, semanalmente, após a alta. Evolução representada nos gráficos 1 (hematológica) e 8 (palestésica), e no quadro geral de evolução clínico-neurológica.


Caso 2 - L. F., 54 anos, sexo masculino, branco, registro 56472. Internado, em 27-9-47, na Clínica Neurológica (Prof. Adherbal Tolosa). Alta em 1-11-47. Moléstia iniciada em 1942, por fraqueza nas mãos. Pouco tempo depois, os membros inferiores também se enfraqueceram e a marcha passou a se fazer com dificuldade; entretanto, nunca ficou incapaz de locomover-se, embora sentisse o selo como se fosse de borracha. Sentia queimação nos membros inferiores. Apresentava prisão de ventre. Nos últimos três meses, seu estado melhorou com o tratamento anti-anêmico (extrato hepático) a que se submeteu. Em setembro de 1947, apresentou edema nos tornozelos, escroto, prepúcio e pálpebras, e dispnéia. Brevilíneo, pele intensamente pálida, mucosas descoradas, canície, abundante panículo adiposo, edema generalizado, língua com apagamento das papilas, sopro sistólico nos focos mitral e aórtico, pressão arterial de 180-90, fígado aumentado de volume e ligeiramente doloroso. Exame neurológico (no 1.° dia de internação) - Psiquismo íntegro; sinal de Romberg; marcha ataxo-calcaneante; pequena diminuição da força muscular nas mãos; arreflexia osteotendinosa e esboço do sinal de Babinski, bilateralmente. Sensibilidade visceral (testicular) diminuída, artrestesia normal; em relação à palestesia, foram encontrados os níveis representados na fig. 3.


O diagnóstico de anemia perniciosa foi confirmado pelos seguintes exames complementares: a) Hematológico - Anemia de 3.100.000 Eo/mm*, com macrocitose e hipercromia. b) Mielograma - Série vermelha com transformação megaloblástica parcial, c) Suco gásrtico - Aquilia com resistência à histamina. Outros exames: Coprológico - Regular número de fibras musculares mal digeridas; 7,2 cm* de amoníaco por 10 grs. de fezes. Liqüido cefalorraqueano normal. Reações de Wassermann e Kahn no sangue negativas.

Tratamento e evolução - O paciente foi medicado com 20 mgrs. de ácido fólico (via oral), do 6.° ao 32.° dia após a internação. O exame da palestesia, no 103.° dia, revelou grande melhora (fig. 4), embora os demais sintomas neurológicos não tivessem sofrido alterações. O quadro neurológico não sofreu a influência das injeções de Reticulógeno (2 cm3), administradas, semanalmente, após a alta. Evolução representada nos gráficos 2 (hematológica) e 9 (palestésica), e no quadro geral de evolução clínico-neurológica.


Caso 3 - R. B. F., 46 anos, sexo feminino, branca, registro 85755. Internada, em 1-10-47, na Clínica Neurológica (Prof. Adherbal Tolosa). Alta em 19-12-47. Moléstia iniciada em 1944, de modo insidioso, por sensação de formigamento nos membros inferiores, seguida de edema, fraqueza geral e anemia. Passou a guardar o leito desde o ano seguinte, quando as parestesias, agravadas, afetaram os membros superiores, surgindo, também, dores nos joelhos e panturrilhas. Paciente com mucosas muito descoradas, pele acentuadamente pálida, língua com atrofia das papilas, taquicardia, ritmo cardíaco em três tempos, audível em toda a área; edema nas pernas e região lombo-sacra. Exame neurológico (no 1.° dia de internação) - Psiquismo normal; a paciente move-se no leito com dificuldade, apresentando ataxia de tipo sensitivo; hipotonia muscular; retração dos tendões de Aquiles; força muscular muito diminuída nos membros inferiores; reflexos osteotendinosos vivos nos membros superiores; patelares diminuídos e aquilianos abolidos; sinal de Babinski bilateral; sinais de Rossolimo nos pés e mãos, e de Mendel-Bechterew nas mãos; automatismo medular nos membros inferiores. Sensibilidade: anartrestesia nos grandes artelhos e discreta hipoastesia táctil nos membros inferiores; níveis de apalestesia representados na fig. 5.


O diagnóstico de anemia perniciosa foi confirmado pelos seguintes exames complementares: a) Hematológico - Anemia de 2.100.000 Eo/mms, com macro-citose e hipereromia. b) Mielograma - Transformação megaloblástica quase total, c) Suco gástrico - Aquilia à histamina. Outros exames: Coprológico - Fibras musculares mal digeridas e discreto aumento de amoníaco: 6,4 cm3 por 10 grs. de fezes. Liqüido cefalorraqueano normal. Reações de Wassermann e Kahn no sangue negativas. Uròbilinogenúria até 1/200.

Tratamento e evolução - A paciente foi medicada com 10 unidades diárias de extrato hepático durante 4 dias e, em seguida, 10 mgrs. de ácido fólico (via oral), do 5.° ao 24.° dia após a internação. Não houve modificação sensível do quadro neurológico, quer quanto à palestesia (fig. 6), quer no tocante aos demais distúrbios nervosos, mesmo após novas injeções de extrato hepático, nos 62.° e 69.° dias. Evolução representada nos gráficos 3 (hematological e 10 (palestésica), e no quadro geral de evolução clínico-neurológica.


Caso 4 - F. J. M., 55 anos sexo masculino, branco, registro 87537. Examinado no Ambulatório em 3-10-47 e internado, aos cuidados do Dr. J. Correia Porto, na 3.a Clínica Médica (Prof. A. Almeida Prado), em 7-10-1947. Alta em 24-1-48. Em maio de 1946, começou a sentir dormência no membro superior esquerdo, com dificuldade para apanhar objetos; um mês depois, os mesmos sintomas se manifestaram no membro simétrico e, três meses depois, se estenderam aos membros inferiores. Há um ano, inccordenação motora nos membros inferiores e enfraquecimento progressivo, terminando por ficar impossibilitado de locomover-se. Fácies apática. Subicterícia, escaras de decúbito, canície, mucosas descoradas, anorexia e perversão do paladar; bordos linguais sem papilas; bulhas muito abafadas em toda a área cardíaca; polaquiúria. Exame neurológico (no 13.° dia após a internação) - Psiquismo sem anormalidades evidentes; abasia, astasia; força muscular muito diminuída nos membros inferiores, onde há acentuada hipotonia e ataxia do tipo sensitivo; discreta incoordenação cinética nos membros superiores; reflexos osteotendinosos presentes e diminuídos em geral; fracos todos os reflexos superficiais cutâneos, não havendo sinal de Babinski. Sensibilidade: hipoestesia superficial abaixo de T10, anartrestesia até os tornozelos; níveis de apalestesia representados na fig. 7.


O diagnóstico de anemia perniciosa foi confirmado pelos seguintes exames complementares: a) Hematológico - Anemia de 2.300.000 Eo/mm3, com ma-crocitose e hipercromia. b) Mielograma - Transformação megaloblástica total, c) Suco gástrico - Aquilia, com resistência à histamina. Outros exames: Provas funcionais do fígado - Reação de Takata-Ara positiva, R. formol-gel negativa, R. Hanger fortemente positiva, índice ictérico 5. Proteinemia - Total 5,4 grs; albumina 3,2 grs; globulinas 2,2 grs. por 100 cm3; relação A/G 1,5. Bilirrubinc-mia - Direta imediata 0,25 mgrs; direta total 0,25; indireta 0,55 mgrs.; total 0,80 jngrs. por 100 cm3. Colesterol - 101 mgrs. por 100 cm3.

Tratamento e evolução - O paciente foi medicado com 3 doses diárias de 150 mgrs. de ácido fólico (via venosa), a partir do 6.° dia de internação. No 42.° dia, os níveis de apalestesia haviam descido vários segmentos. Ao exame neurológico efetuado no 105.° dia, verificou-se que o paciente já se mantinha de pé e se locomovia com marcha calcaneante; nítido sinal de Romberg; força muscular ainda diminuída nos membros inferiores, onde persistia a ataxia de tipo sensitivo; hipotonia; reflexos rotulianos com caráter pendular; a artrestesia continuava abolida até os tornozelos, apesar da normalização da palestesia (fig. 8). Evolução representada nos gráficos 4 (hematológica) e 11 (palestésica), e no quadro geral de evolução clínico-neurológica.


Caso 5 - J. C. S., 41 anos, masculino, branco, registro 29525. Internado, em 6-11-47, na Clínica de Nutrição e Dietética (Prof. Ulhoa Cintra). Alta em 30-12-47. Moléstia iniciada em setembro de 1945, por adormecimento e sensação de picadas e frio no pé esquerdo, sintomas que se estenderam a todo membro, afetando, posteriormente, o membro inferior direito; ao locomover-se, não sentia bem o solo. Concomitantemente, instalou-se fraqueza progressiva dos membros inferiores, incontinència esporádica de urina, constipação intestinal, advindo, depois, sensação de empachamento e queimação contínua no epigástrio com exacerbação pós-prandial, tonturas e ardor na garganta e língua. Indivíduo subnutrido, pálido, encanecido, mucosas descoradas, língua com papilas hipotróficas. Exame neurológico (no 11.° dia de internação) - Psiquismo integro; franco sinal de Romberg; marcha aláxica e calcaneante, sofrendo piora com a oclusão das pálpebras; força muscular levemente diminuída nos membros inferiores; discreta ataxia de tipo sensitivo nos membros superiores e nítida nos inferiores; acentuada hipotonia muscular; reflexos aquilianos abolidos; sinal de Rose-Hirschberg à direita, com extensão esporádica e irregular do grande artelho. Sensibilidade artrestésica abolida nos artelhos; níveis de apalestesia representados na fig. 9.


O diagnóstico de anemia perniciosa foi confirmado pelos seguintes exames complementares: a) Hcmatológico - Anemia de 2.800.000 Eo/mm3, com macrocitose e hipereromia, b) Mielograma - Megaloblastose. c) Suco gástrico - Aquilia à histamina. Outros exames: Proteinemia - 7,2 grs. por 100 cm3. Líqüido cefalorraqueano normal.

Tratamento e evolução - A evolução hematológica demonstrou remissão espontânea; independentemente de tratamento, houve ascenção de eritrócitos, hemoglobina e reticulócitos e involução da megaloblastose, em 1-12-1947. O ácido fólico foi administrado logo em seguida (150 mgrs. por via venosa), ativando a involução. O quadro neurológico não sofreu modificação (fig. 10). Evolução representada nos gráficos 5 (hematológica) e 12 (palestésica), e no quadro geral de evolução clínico-neurológica.


Caso 6 - M. O. B., 45 anos, sexo feminino, branca, registro 77708. Internada, em 10-12-47, na Clínica Terapêutica (Prof. Cantídio de Moura Campos). Alta em 2-4-48. Moléstia iniciada em julho de 1946, com perda de apetite, vômitos, sensação de formigamento e fraqueza nos membros inferiores. Os sintomas se exacerbaram a ponto, de ter dificuldade no levantar-se. Apresentava edema nos membros infeirores e sensação de dormência na língua. Evacuava 3 a 4 vezes ao dia, fezes semiformadas. Pouco antes de sua internação, apresentou tonturas e irritabilidade. Paciente com mau estado geral, emagrecida, pálida, com mucosas descoradas e papilas linguais atrofiadas. Exame neurológico (no 21.° dia de internação) - Paupérrimo grau de cultura, dificultando o exame acurado da sensibilidade; além disso, puerilidade, hipoprosexia, apragmatismo. Conseguia manter-se de pé, porém logo se queixava de tonturas, não sendo possível pesquisar o sinal de Romberg; quando sentada, a oclusão das pálpebras não modificava o equilíbrio; ataxia de tipo sensitivo nos membros inferiores; movimentos ativos presentes e normais quanto à amplitude, mas diminuídos quanto à energia muscular, especialmente nos membros inferiores (déficit do quadrícipe à manobra de Mingazzini); acentuada hipotonia nos membros inferiores; reflexos osteotendinosos normais nos membros superiores; patelares normais, aquilianos diminuídos; cutaneoplantar direito normal, sendo que, à esquerda, obtinha-se, às vezes, extensão dos dedos; abdominais abolidos. Sensibilidades superficiais normais; artrestesia abolida até os tornozelos; níveis de apalestesia representados na fig. 11. Reflexos pupilares normais.


O diagnóstico de anemia perniciosa foi confirmado pelos seguintes exames complementares: a) Hematológico - Anemia de 1.200.000 Eo/mm3; caracteres de anemia perniciosa megaloblástica. b) Mielograma - Transformação megaloblás-tica quase total, c) Suco gástrico - Aquilia resistente à histamina. Outros exames: Coptológico - Raríssimas fibras musculares bem digeridas; amoníaco na taxa de 8 cm3 por 10 grs. de fezes. Liqüido cefalorraqueano normal. Proteinemia - Total 5,8 grs.; albumina 3,3 grs.; globulinas 2,5 grs. por 100 cm3; relação A/G 1,3. Provas funcionais do fígado - Reação de Takata-Ara positiva, R. formol-gel fracamente positiva, R. Hanger fortemente positiva.

Tratamento e evolução - A paciente foi medicada com 3 injeções diárias de 150 mgrs. de ácido fólico (via venosa), do 9.° ao 11.° dia de internação. Os distúrbios gástricos continuaram, embora as papilas linguais tivessem crescido, tornando-se normais, assim como a pele. No 85.° dia, a paciente já se locomovia sem auxílio e aumentara a força muscular nos membros; a marcha era atáxica, calcaneante; havia nítido sinal de Romberg. O restante do exame neurológico revelou condições semelhantes ao primeiro, inclusive em relação à sensibilidade vibratória (fig. 12). A partir do 92.° dia, foi medicada com extrato hepático e ferro, sem que resultados apreciáveis fossem obtidos. Evolução representada nos gráficos 6 (hematológica) e 13 (palestésica), e no quadro geral de evolução clínico-neurológica.


Caso 7 - B. P., 54 anos, masculino, branco, registro 71842. Internado, em 9-1-48, na Clínica Terapêutica (Prof. Cantídio de Moura Campos). Alta em 24-4-48. Moléstia iniciada em princípios de 1947, com fraqueza, dores nos membros inferiores e zumbidos nos ouvidos; crises de disenteria com sangue e catarro, sucediam-se a períodos de constipação intestinal. As dores dos membros inferiores expandiram-se para todo o corpo, o paciente emagreceu, apresentou edema nos membros inferiores e dispnéia de esforço. Passou a sofrer de tonturas freqüentes e adveio mudança do humor, tornando-se irritadiço. Em janeiro de 1948, chegou, algumas vezes, a perder a consciência. Numa destas crises, foi levado ao Pronto Socorro do Hospital das Clínicas, apresentando obnubilação mental e agitação psicomotora. Indivíduo com mau estado geral, emagrecido, palidez, petéquias e pequenas sufusões hemorrágicas recentes nos antebraços, pele seca, mucosas descoradas, conjuntivas pálidas, subicterícia, lingua lisa, com papilas ausentes, ligeiro edema pré-tibial, prova do garrote levemente positiva aos 10 minutos. Exame neurológico (no 14.° dia de internação) - A existência de acentuados distúrbios da atenção dificultou o exame pormenorizado, especialmente a determinação da sensibilidade vibratória. Movimentos ativos conservados, porém havia diminuição da força muscular nos quatro membros; ataxia de tipo sensitivo e acentuada hipotonia muscular, especialmente nos membros inferiores; reflexos osteotendinosos diminuídos nos membros superiores e abolidos nos inferiores; cutaneoplantares e cremastéricos normais; abdominais abolidos. Sensibilidades exteroceptivas normais; artrestesia abolida nos tornozelos e pés; a palestesia só pôde ser investigada com o diapasão de 64 dv/s (fig. 13); demais sensibilidades proprioceptivas normais. Reflexos pupilares presentes e normais.


O diagnóstico de anemia perniciosa foi confirmado pelos seguintes exames complementares: a) Hematológico - Anemia grave de 330.000 Eo/mm3, com megaloblastos circulantes, b) Mielograma - Megaloblastose parcial, c) Suco gástrico - Aquilia à histamina. Outros exames: Coprológico - Fibras musculares mal digeridas; amoníaco na taxa de 9,2 cm3 por 10 grs. de fezes. Bilirrubinemia - Direta imediata 0,45 mgrs.; direta total 0,50 mgrs.; indireta 0,70 mgrs.; total 1,20 mgrs. por 100 cm3. Provas funcionais do fígado - Reação de Takata-Ara positiva, R. formol-gel negativa, R. Hanger fortemente positiva. Gastroscopia - Descoramento acentuado da mucosa gástrica, com aspecto atrófico. Líqüido cefalorraqueano normal.

Tratamento e evolução - O paciente foi medicado com injeções diárias de 150 mgrs. de ácido fólico (via venosa), do 1.° ao 6.° dia de internação. Houve rápidas melhoras: a prova do garrote tornou-se negativa no 7.° dia, as petéquias não aumentaram de número, diminuiu a obnubilação mental; no 15.° dia, desapareceram as lesões hemorrágicas e as papilas linguais normalizaram-se no 25.° dia. No 57.° dia, o exame da palestesia acusava acentuadas melhoras. No 63.° dia, novo exame neurológico mostrou boa força muscular, com normalização das manobras deficitárias; coordenação cinética, reflexos osteotendinosos e superficiais normais; tono muscular melhorado; sensibilidade artrestésica normal; palestesia com os caracteres verificados seis dias antes. Foi instituída medicação pelo Reticulógeno (2 cm3 diários durante 6 dias), extrato hepático (4 cm3 diários durante 5 dias) e ácido fólico (150 mgrs. diários durante 14 dias). As melhoras acentuaram-se. A mucosa gástrica tornou-se mais corada, porém continuava ligeira atrofia nas pregas das paredes anterior e posterior (73.° dia). Exame coprológico (75.° dia) - Raríssimas fibras musculares bem digeridas; amoníaco na taxa de 4,4 cm3 por 10 grs. de fezes. Proteinemia - Total 7,3 grs; albumina 3,8 grs.; globulinas 3,5 grs. por 100 cm3; relação A/G 1,1. Bilirrubinemia (101.° dia) - Direta imediata 0,1 mgrs; direta total 0,2 mgrs; indireta 0,1 mgrs; total 0,3 mgrs por 100 cm3. A sensibilidade foi pesquisada no 90.° dia (fig. 13) tendo-se encontrado níveis semelhantes aos do exame realizado no 57.° dia. Evolução representada nos gráficos 7 (hematológica) e 14 (palestésica), e no quadro geral de evolução clínico-neurológica.

RESULTADOS DO TRATAMENTO PELO ÁCIDO FÓLICO

1 - Resultado hematológico:

No caso 1, após 42 tomadas de 20 mgrs. de ácido fólico por dia, o nível de Hb e de Eo não sofreu alterações significativas. O tratamento se iniciou no nível de 3.500.000 de Eo e 13,5 grs de Hb/100 cm3; os reticulócitos alcançaram 4%. Em 4-7-47, a medula era "eritroblástica"; em 9-9-47, exclusivamente "megaloblástica" a série vermelha; em 16-9-47, o era apenas parcialmente; em 22-9-47, após 6 dias de iniciada a terapêutica, esgotou-se a série megaloblástica (vide gráfico 1).


No caso 2, após 27 doses de 20 mgrs. de ácido fólico por dia: reticulócitos até 6%, Eo até próximo de 4.000.000. Efeito persistente (70 dias). As doses fracionadas, ao que parece, fizeram prolongar-se o efeito. A "megalocitopoiese" medular desapareceu após 11 dias de tratamento (220 mgrs.) e manteve-se ausente até 52 dias depois de suspensa a terapêutica (vide gráfico 2).


No caso 3 foi feito tratamento associado: extrato hepático (40 u.) e ácido fólico (20 doses de 10 mgrs. por dia). Os reticulócitos alcançaram 5,5%, os Eo, 4.000.000 e a Hb, 13,5 grs/100 cm3. Não houve ascenção além destas cifras. A megaloblastose desapareceu entre 4 e 23-10-47; em 31-10-47, já despontava, para desaparecer em 9-12-47, sob o efeito do extrato de fígado concentrado (2 cm3 de Reticulógeno). A associação não melhorou sensivelmente a recuperação (vide gráfico 3).


No caso 4, após 450 mgrs. de ácido fólico: reticulócitos até 10%, Eo até 4.000.000, Hb até 12,8 grs/100 cm3. Efeito persistente (cerca de 60 dias), iniciando-se depois seu declínio. O tecido megaloblástico desapareceu em 10 dias. A eritropoiese se exaltou (15-10-47), para, em seguida, sofrer solicitação e hiperplasia a granulocitogênese (2-12-47), ao que correspondeu ascenção de leucócitos (vide gráfico 4).


O caso 5 já vinha em remissão espontânea; em 1-12-47, antes de qualquer terapêutica, a medula só era "megaloblástica" em parte mínima. Após 150 mgrs. de ácido fólico, não houve crise reticulocitária, nem se acentuou o ritmo de recuperação de eritrócitos ou hemoglobina. Estes últimos só retornaram ao nível prévio após 30 dias da injeção (vide gráfico 5).


No caso 6, após 450 mgrs de ácido fólico: reticulócitos até 19%, Eo até 4.000.000 e Hb até 11 grs/100 cm3. Efeito persistente (58 dias). O tecido megaloblástico desapareceu em 6 dias, rápida e duradouramente (vide gráfico 6).


No caso 7, após 900 mgrs. de ácido fólico: reticulócitos até 27%, Eo até 2.300.000. Efeito máximo durando apenas 30 dias: houve, em seguida, lento decréscimo; 30 mgrs. por dia parecem ter sido úteis; não houve acúmulo. Na medula óssea, de 9 a 22-1-48, ainda ocorria eritropoiese "megaloblástica": a dose utilizada não foi suficiente para realizar a integral substituição da "megalopoiese" pela "eritropoiese normal" (vide gráfico 7). A dose empregada neste caso 7 - o dobro da usada no caso 6 - não realizou senão uma regularização parcial da eritropoiese, enquanto que o caso 6 quase alcançou a normalidade. Demonstra-se assim a importância da reatividade particular de cada doente. Este caso 7 ainda mostra como uma dose alta (900 mgrs.) pode não provocar apreciável normalização hematológica, enquanto beneficia pronta e definidamente a síndrome neuropsíquica (vide comentários neurológicos).


De um modo geral, verificamos que o ácido fólico determina a regularização do distúrbio hematopoiético, reduzindo o tecido megaloblástico e despertando a eritrogênese. O ritmo de transformação, as variações entre as proporções de tecido megaloblástico e eritroblástico, os níveis alcançados de hemoglobina, reticulócitos e eritrócitos são, entretanto, muito irregulares (vide mielogramas e evoluções hematológicas). O ácido fólico não segue um "caminho farmacológico" de ação regular.

O paciente F. M. (caso 1) estava doente há 2 anos; nunca se submetera a tratamento anti-anêmico. O exame neurológico revelou um quadro clínico completo de degeneração combinada da medula: a síndrome piramidal era nítida, tanto a deficitária como a de libertação; o comprometimento dos funiculus dorsais era intenso, predominando nitidamente os distúrbios da sensibilidade vibratória sobre os da segmentar. Instituída a terapêutica pelo ácido fólico, a síndrome piramidal conservou-se inalterada, mas houve grande melhora das perturbações sensitivas, com normalização da artrestesia e descida dos níveis de apalestesia, especialmente em relação ao diapasão de 64 dv/s que, a princípio, só era percebido em T11 e passou a sê-lo em L5.

O paciente L. F. (caso 2) iniciara seus males em 1942 e já vinha sendo intensamente tratado com extrato hepático, embora sem que bons resultados fossem conseguidos. O exame neurológico revelou a existência de discreta síndrome piramidal deficitária, com esboço do sinal de Babinski, enquanto que a síndrome cordonal posterior era acentuada: ataxia, arreflexia e intensos distúrbios da sensibilidade vibratória. Note-se que, neste caso, havia também nítida dissociação da sensibilidade proprioceptiva, pois, ao lado de marcado comprometimento da palestesia, havia absoluta normalidade da sensibilidade segmentar. Embora a moléstia fosse antiga, o ácido fólico atuou beneficamente sobre a síndrome cordonal posterior, como se pode verificar pelo gráfico 9 ; houve ligeira melhora em relação aos sinais motores.

No caso 3 (R. B. F.), a moléstia datava de mais de 3 anos; nunca fora feito tratamento anti-anêmico. Ao exame neurológico, comprovou-se nítida síndrome piramidal deficitária, acompanhada pelo sinal de Babinski; a síndrome cordonal posterior era intensa: ataxia, hipotonia, hiporreflexia osteotendinosa e distúrbios concordantes das sensibilidades segmentar e vibratória. Como, nesse período, ainda estivéssemos medindo o tempo de percepção das vibrações e não somente determinando os níveis de apalestesia (este último método só foi aplicado nos casos ulteriormente estudados), e como a paciente não prestasse suficiente atenção ao exame pelo diapasão de 256 dv/s, cujas vibrações são muito mais fracas, resolvemos só empregar os três primeiros diapasões da escala por nós adotada. O ácido fólico não deu resultados satisfatórios nesta doente, mas devemos consignar que o tempo de observação foi excessivamente curto.

No caso 4 (F. J. M.), tratava-se de moléstia bastante recente (1 ano de evolução), embora o quadro clínico-neurológico indicasse graves lesões: grande déficit piramidal - paciente impossibilitado de andar - com ausência de fenômenos de libertação; marcados indícios de comprometimento dos funiculus dorsais (ataxia, hipotonia, hiporreflexia osteotendinosa e desordens da sensibilidade proprioceptiva). Predominavam grandemente, entre estas últimas, as desordens da palestesia. O paciente não havia feito qualquer terapêutica anti-anêmica. O ácido fólico deu resultados altamente satisfatórios: cedeu em grande parte o déficit motor - o paciente passou a locomover-se - e, em relação ao quadro sensitivo, houve absoluta normalização da palestesia (fig. 8). A propósito, é curioso notar que, neste caso, os distúrbios da artrestesia são sofreram influência do tratamento, contrariando o fato verificado em alguns pacientes, de que as melhoras da sensibilidade segmentar precedem e preponderant sobre as da sensibilidade vibratória.

No caso 5 (J. C. S.), a moléstia se iniciara há 2 anos e o paciente não havia feito, até a data da internação, qualquer tratamento anti-anêmico. Neurologicamente, notou-se discreta síndrome piramidal deficitária, acompanhada pelo fenômeno da rotação interna do pé direito à excitação cutaneoplantar (sinal de Rose-Hirschberg), e evidentes sinais de lesão dos funículos dorsais: ataxia, hipotonia, arreflexia osteotendinosa e distúrbios da sensibilidade proprioceptiva, especialmente no concernente à palestesia. O paciente apresentou remissão hematológica espontânea, mas o estado neurológico conservou-se praticamente inalterado, sob os aspectos da motricidade e da sensibilidade.

A paciente M. O. B. (caso 6) referia que sua moléstia se iniciara há pouco mais de 1 ano, sem que qualquer tratamento anti-anêmico tivesse sido feito. O quadro neurológico era grave: além de desordens psíquicas, havia acentuado déficit piramidal e sinal de Babinski inconstante; a lesão dos funículos dorsais traduzia-se por ataxia, hipotonia, hiporreflexia osteotendinosa e desordens da sensibilidade profunda. Havia nítida desproporção entre o comprometimento da sensibilidade vibratória (cujos níveis de anestesia alcançavam T3, pela pesquisa com diapasão de 256 d v/s) e da sensibilidade segmentar, que estava abolida apenas até os tornozelos. O ácido fólico trouxe benefícios acentuados em relação à síndrome motora, mas, no tocante à síndrome cordonal posterior, não foram obtidos efeitos apreciáveis.

O paciente B. P. (caso 7), portador de moléstia muito recente (menos de 1 ano de evolução), sem ter sido submetido a tratamento anti-anêmico prévio, apresentava, além de distúrbios psíquicos, sinais de graves lesões medulares: síndrome piramidal deficitária, desacompanhada de fenômenos de libertação, e marcada síndrome cordonal posterior: ataxia, hipotonia, arreflexia osteotendinosa e acentuadas desordens da sensibilidade profunda. Também neste caso predominava intensamente a apalestesia sobre a anartrestesia. O ácido fólico possibilitou recuperação motora, com normalização das manobras deficitárias, e verificaram-se nítidas melhoras da síndrome cordonal posterior: desapareceu a ataxia, retornaram os reflexos osteotendinosos e normalizou-se a artrestesia, embora ainda se verificasse comprometimento da sensibilidade vibratória, pois, no último exame, o nível de anestesia ao diapasão de 256 dv/s se encontrava em Tg (gráfico 14 ). Entretanto, a evolução da palestesia, apreciada mediante o diapasão de 64 dv/s, revelava nítida melhora. Neste paciente, nos últimos dias de internação, foi associado o extrato hepático ao ácido fólico, sem que novas melhoras surgissem.

A associação de sintomas psíquicos aos sinais hematológicos e nervosos permite enquadrar os casos 6 e 7 entre as síndromes neuropsicanêmicas40 40 . Vampré, E. e Tolosa, A. - Síndromes neuro-psico-anêmicos. Bol. Soc. Med. e Cir. São Paulo,13:253-266 (agosto) 1929. . O efeito favorável do ácido fólico sobre os distúrbios mentais foi pronto e seguro.

COMENTÁRIOS

Os resultados que obtivemos concordam, em linhas gerais, com os referidos pelos autores que estudaram as alterações da palestesia na anemia perniciosa. Os distúrbios se intensificam, tomando as freqüências mais baixas, à medida que se exploram territórios correspondentes a segmentos medulares mais caudais. Este fato, de acordo com a lei de Kahler, permite supor que as fibras mais longas (pertencentes ao fascículo grácil) sejam as mais afetadas pelo processo degenerativo.

Um fato posto em evidência neste trabalho é o de que, em certos casos de neuranemia, só se verificam distúrbios da sensibilidade vibratória mediante a pesquisa com diapasões de 128 ou 256 dv/s, permanecendo normal a percepção com o diapasão de 64 dv/s. Sendo este último o instrumento usualmente empregado em semiologia nervosa, pode-se concluir que, em determinadas eventualidades, poderão passar despercebidas as alterações da palestesia, se o estudo for realizado apenas mediante a utilização do diapasão de 64 dv/s.

Devemos consignar que, em geral, pudemos observar correspondência entre os níveis vertebrais e apendiculares, de acordo com a distribuição metamérica. Há, pois, interrelação das vértebras com os respectivos segmentos medulares, como já fora assinalado por Jarkowski41 41 . Jarkowski, J. - Sur les réflexes vertébraux. Rev. Neurol., 51:628-631 (10 abril) 1929. . De fato, no caso 2, por ocasião dos 2.° e 3.° exames com diapasão de 128 dv/s, a percepção no sacro era muito reduzida, mas, nos membros, eram sentidas normalmente as vibrações até os maléolos; no caso 3, no 1.° exame com diapasão de 64 dv/s, a palestesia se encontrava diminuída no sacro, mas ocorria normalmente nos membros, até os maléolos; no caso 5, o 1.° exame com diapasão de 128 dv/s revelou apalestesia no sacro, mas, nas espinhas ilíacas e tíbias, ainda eram notadas as vibrações, embora muito debilmente; no caso 6, quando do 2.° exame com diapasão de 128 dv/s, o nível de apalestesia na raque alcançava Tu, mas a paciente ainda percebia, fracamente, na e. i. a. s. direta; o mesmo observamos no 3.° exame com diapasão de 128 dv/s, no caso 7, embora o nível raqueano inferior de apalestesia atingisse L3. Em regra, portanto, a anestesia vibratória no hálux ou maléolos era acompanhada de apalestesia no sacro. Este fato levou Barach34 a colocar, em seus gráficos, o sacro depois dos maléolos. O estudo do tempo de percepção vibratória, fornecendo dados mais sensíveis, tornaria, certamente, mais estreita essa concordância de observação.

Poderíamos, pois, prescindir dos níveis apendiculares e só reputar valiosos os raqueanos. Entretanto, fizemos a representação gráfica dos pontos ósseos dos membros, pelos seguintes motivos: 1) Os fatos assinalados - se bem que ocorridos na maioria dos casos - comportam exceções. O exame dos gráficos 8 a 14 evidencia que, em alguns casos, apesar de apalestesia nos níveis apendiculares mais inferiores, a sensibilidade persistia no sacro; noutras eventualidades, as vibrações eram percebidas em todas as vertebras lombares, mas havia anestesia nas tíbias e, mesmo, nas espinhas ilíacas. 2) A inclusão dos níveis apendiculares permite que se tenha uma idéia mais objetiva para o estudo evolutivo dos pacientes.

Em relação ao ácido fólico, nossos resultados permitiram comprovar: 1 - O efeito hematológico, patente e nítido, é, no entanto, menos intenso que o obtido pelo emprego do extrato hepático. 2 - Não verificamos agravação do quadro neurológico pré-existente em nenhum dos pacientes. Este resultado discorda da opinião da maioria dos autores americanos, embora devamos reconhecer que nossos casos foram observados durante períodos relativamente curtos, que variaram de 71 dias (caso 3) a 114 dias (caso 5). Consignando esta ressalva, nossos resultados demonstraram melhoras acentuadas em 2 casos (casos 4 e 7), melhoras moderadas em 3 (casos 1, 2 e 6), sendo que 2 casos se mantiveram inalterados (casos 3 e 5). Devemos salientar ainda que, em geral, as melhoras não se manifestaram da mesma forma em relação à síndrome piramidal e à síndrome cordonal posterior. O exame do quadro geral de evolução clínico-neurológica e dos gráficos 8 a 14 revela que, somente em 2 casos, o tratamento atuou beneficamente sobre ambas as síndromes; estes casos foram por nós considerados como acentuadamente melhorados. Em 3 casos, houve melhora apenas de uma das síndromes (somente da síndrome cordonal posterior nos casos 1 e 2 e unicamente da síndrome piramidal, no caso 6); reputamos estes pacientes como moderadamente melhorados. Em 2 casos, o ácido fólico não trouxe benefícios para qualquer das síndromes.

(Prof. Adherbal Tolosa) da Fac. Med. Univ. São Paulo, e do Laboratório Central do Hospital das Clínicas de São Paulo (Dr. G. Fleury da Silveira). Apresentado à Secção de Medicina Geral da Soc. Med. e Cir. de São Paulo em 17 maio 1948.

Nota dos autores - O ácido fólico utilizado foi gentilmente fornecido pela Lederle Laboratories Division.

Hospital das Clínicas, Avenida Rebouças - São Paulo

  • *
    Agradecemos ao Prof. F. Moura Campos e Dr. J. Lacaz de Morais (Depart, de Fisiologia da Fac. Med. Univ. São Paulo) a gentileza com que puseram à nossa disposição este diapasão elétrico.
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Fev 2015
    • Data do Fascículo
      Dez 1948
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