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ESTUDOS SOBRE O PROCESSO DE SÂNDI VOCÁLICO EXTERNO - DESTAQUE PARA A ELISÃO - NO PORTUGUÊS ARCAICO1 1 Neste artigo, retomo as questões discutidas em Cangemi (2014), Cangemi e Massini-Cagliari (2013) e Cangemi e Abreu (2010).

Resumos

Este estudo tem como objetivos principais o mapeamento e análise de processos de sândi vocálico externos nas cantigas religiosas portuguesas (Cantigas de Santa Maria) de Afonso X, o Sábio (século XIII). Os processos de sândi que ocorrem através da junção de palavras constituem elisão, ditongação, crase (MASSINI-CAGLIARI, 2005, para o português arcaico). Por meio deste trabalho e de um corpus não explorado (especialmente quanto aos temas linguísticos - SNOW, 1987; MASSINI-CAGLIARI, 2005), pretende-se contribuir para o alcance de um conhecimento mais profundo da história da prosódia portuguesa no período do seu reconhecimento como língua “independente” em relação ao latim.

Processos Sândi; Português arcaico; cantigas galego-portuguesas medievais; cantigas de Santa Maria


The main objectives of this study are the mapping and analysis of external vocalic sandhi processes in Portuguese religious songs (Cantigas de Santa Maria) by Alfonso X, the Wise (13th century). The sandhi processes that occur through the juxtaposition of words constitute elision, diphthongisation, crasis (MASSINI-CAGLIARI, 2005, for Old Portuguese). Through this work and an unexplored corpus (especially regarding linguistic themes - SNOW, 1987; MASSINI-CAGLIARI, 2005), we intend to contribute to the achievement of deeper knowledge of the history of Portuguese prosody in the period when it was recognised as an “independent” language from Latin.

Sandhi Processes; old Portuguese; medieval Galician-Portuguese cantigas; cantigas de Santa Maria


Introdução

O objetivo principal deste trabalho é explorar as ocorrências dos processos de sândi vocálico externo retiradas de um corpus composto de sessenta Cantigas de Santa Maria (CSM) do Português Arcaico (PA). Para Trask (2004TRASK, R. Dicionário de linguagem e lingüística. Tradução e adaptação de Rodolfo Ilari. São Paulo: Contexto, 2004., p.260), o sândi é uma “modificação de pronúncia numa fronteira gramatical”; para Xavier e Mateus (1990XAVIER, M.; MATEUS, M. (org.). Dicionário de termos linguísticos. Lisboa: Cosmos, 1990. v.1., p.327-328), é um “fenômeno da fonética sintáctica em que um segmento inicial ou final de palavra é afetado pelo contexto em que ocorre, podendo apresentar diferentes realizações que dependem das características do som que antecede ou segue uma fronteira de palavra”.

Massini-Cagliari e Cagliari (1998)MASSINI-CAGLIARI, G.; CAGLIARI, L. C. De sons de poetas ou estudando fonologia através da poesia. Revista da Anpoll, São Paulo, v. 2, n. 5, 1998. refletem que a poesia metrificada é rica em material para o estudo do fenômeno de sândi, uma vez que os poetas construíam versos isossilábicos. Assim, à semelhança do metro, os fenômenos de sândi vocálico externo revelam a não ocorrência de pausa ou de cesura. Além disso, esse fenômeno mostra se houve queda de vogal ou a ocorrência de uma ditongação. No PA, era costume assinalar os casos de sândi com elisões claramente marcadas (através da junção, na escrita, de mais de uma palavra e da queda de vogais).

Corpus: Cantigas de Santa Maria

As CSM do Rei Afonso X de Castela, o Rei Sábio, são uma coleção de 420 cantares em louvor da Virgem Maria.

The Cantigas de Santa Maria is a collection of more than four hundred poems recounting miracles worked through the intercession of the Virgin Mary or songs of praise in her honor. The text of many is illuminated in full-page miniatures. The poems were written in the language of medieval Galicia and Portugal, the medium of expression preferred by the lyric poets of that day. (O’CALLAGHAN, 1998O’CALLAGHAN, J. Alfonso X and the Cantigas de Santa Maria: a poetic biography. Boston: Brill, 1998., p.1).

Em sua maioria, as CSM contêm notação musical e todas são compiladas em português arcaico2 2 Optamos pelo rótulo “português arcaico” em detrimento de “galego-português” porque, na fase trovadoresca, o galego e o português eram reconhecidos pelos falantes como sendo a mesma língua, embora houvesse, muito provavelmente, variações entre esses dois falares. por Afonso X – o rei Sábio. Além da notação musical, as cantigas contêm, também, iluminuras - desenhos miniaturizados que representam o conteúdo que está sendo narrado na respectiva cantiga. Tais cantigas foram mandadas compilar pelo Rei Sábio de Castela, Afonso X, e chegaram até nós através de quatro manuscritos antigos denominados códices3 3 As CSM chegaram até os dias atuais por meio de quatro manuscritos antigos, conhecidos como códices: E: El Escorial, Real Monasterio de san Lorenzo, MS B.I.2 (conhecido como Escorial ou códice dos músicos) – o mais completo de todos; T: El Escorial, Real Monasterio de san Lorenzo, MS T.I.1 (códice rico ou códice das histórias) – considerado o mais rico em conteúdo artístico (sobretudo iconográfico); F: Firenze, Biblioteca Nazionale Centrale, Banco Rari, 20 (códice de Florença) – que forma um conjunto com o códice Escorial rico, uma vez que as cantigas que contém completam o códice T; To: Toledo, Madrid, Biblioteca Nacional, MS 10.069 – o menor e mais antigo de todos, que contém também um índice de cem cantigas. Atualmente, dois desses códices são guardados na Biblioteca do Escorial (E e T), um na Biblioteca Nacional de Madrid (To) e outro na Biblioteca Nacional de Florença (F). .

Segundo Parkinson (1998)PARKINSON, S. As Cantigas de Santa Maria: estado das cuestións textuais. Anuario de estudios literarios galegos, Vigo, p. 179-205, 1998., as CSM constituem um monumento literário, musical e artístico da mais elevada importância. É preciso salientar, ainda, que a maioria dos estudiosos das CSM, como Parkinson (1998)PARKINSON, S. As Cantigas de Santa Maria: estado das cuestións textuais. Anuario de estudios literarios galegos, Vigo, p. 179-205, 1998., acredita que nem todas elas são de autoria exclusiva do rei, pois o valor artístico muito desigual das cantigas aponta para uma multiplicidade de autores. Contudo, como reflete Parkinson (1998)PARKINSON, S. As Cantigas de Santa Maria: estado das cuestións textuais. Anuario de estudios literarios galegos, Vigo, p. 179-205, 1998., não é impossível que Dom Afonso X tenha composto algumas delas, sendo ele próprio um poeta e estando “empenhadíssimo na estruturação e na composição da obra” (MASSINI-CAGLIARI, 2005MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: estudos de prosódia do português arcaico, a partir das cantigas profanas e religiosas. Tese (Livre docência em Linguística) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2005., p. 61).

[...] é de suponer que o rei tería acompañado de cerca a estructuración e a composición da obra. Mais en realidad resulta estraño que se teña pensado durante bastante tempo que unha colección de semellante tamaño fose unicamente do Rei Sabio (que tería moitas outras cousas en qué se ocupar). A lóxica indícamos, xa que logo, que non podería o rei ter composto todas as 420 Cantigas e, o mesmo tempo, que sendo el poeta non podería non ter composto ningunha delas. (PARKINSON, 1998PARKINSON, S. As Cantigas de Santa Maria: estado das cuestións textuais. Anuario de estudios literarios galegos, Vigo, p. 179-205, 1998., p. 183, grifo do autor).

Dessa forma, refletindo a posição de Parkinson (1998)PARKINSON, S. As Cantigas de Santa Maria: estado das cuestións textuais. Anuario de estudios literarios galegos, Vigo, p. 179-205, 1998. referida acima, é possível considerar Afonso X como o grande compilador, organizador das cantigas, com algumas delas que foram compostas por ele e outras não. Assim pode-se pensar que, dada a sua grandiosidade, o projeto das CSM implica a intervenção de várias pessoas, tanto no aspecto criativo dos textos poéticos, quanto da própria confecção dos manuscritos complexos que os contém (PARKINSON, 1998PARKINSON, S. As Cantigas de Santa Maria: estado das cuestións textuais. Anuario de estudios literarios galegos, Vigo, p. 179-205, 1998.). Segundo Leão (2007LEÃO, Â. Cantigas de Santa Maria, de Afonso X, o Sábio: aspectos culturais e literários. Belo Horizonte: Veredas & Cenários, 2007., p.3), “D. Afonso, que é o principal trovador daquele scriptorium, ou, para usar uma terminologia medieval, é o mestre daquela corporação de poetas, planeja, escreve ele próprio, supervisiona e revê a obra que levará o seu nome”.

Metodologia

Para a escansão dos versos e consequentemente o mapeamento dos processos intervocabulares é utilizada uma metodologia que se baseia no mapeamento de todas as soluções para os encontros vocálicos em junção de palavras, a partir da notação que receberam nos testemunhos manuscritos das CSM. A presente metodologia busca abstrair da escansão dos versos em sílabas poéticas os limites entre as sílabas fonéticas.

A metodologia foi inaugurada, no Brasil, por Massini-Cagliari (1995)MASSINI-CAGLIARI, G. Cantigas de amigo: do ritmo poético ao linguístico: um estudo do percurso histórico da acentuação em Português. 1995. Tese (Doutorado em Linguística) – Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1995. e busca as características prosódicas de línguas de períodos passados de línguas vivas através da estrutura métrico-poética da poesia. A escansão e a contagem das sílabas poéticas dos versos podem elucidar dúvidas sobre a consideração de uma sequência de vogais pertencentes a duas palavras em uma única ou em sílabas diferentes. Sendo assim, a escrita dos manuscritos medievais aqui considerados como fonte é particularmente reveladora do fenômeno da elisão, já que não costumavam ser grafadas as vogais apagadas no processo de elisão. Uma introdução à aplicação da metodologia acima descrita à análise dos dados das cantigas medievais religiosas, com vistas ao mapeamento dos processos de sândi, está exemplificada em (1), em que há as duas primeiras estrofes da CSM 294 4 As letras maiúsculas A e B representam o padrão de rima do refrão; já as minúsculas b, c, d, e, f representam o padrão das estrofes. Ao final do verso, as letras são seguidas de um algarismo, que representa a quantidade de sílabas poéticas do verso. As sílabas em negrito correspondem ao processo de elisão da última vogal da primeira palavra com a primeira vogal da segunda palavra, já as sublinhadas correspondem à formação do hiato da última vogal da primeira palavra com a primeira vogal da segunda palavra. .

(1)

1.Esta é como Santa Maria fez parecer nas pedras

2.omagẽes a ssa semellança.

3.Nas/ men/tes/ sen/pre/ tẽ/er A7

4.de/ve/mo/-las/ sas/ fei/tu/ras B7

5.da/ Vir/gen/, pois/ re/ce/ber A7

6.as/ fo/ron/ as/ pe/dras/du/ras. B7

7.Per/ quan/t’ eu/ di/zer/ o/ý c7

8.a/ mui/tos/ que/ fo/ron/ y, c7

9.na/ san/ta/ Ge/sse/ma/ni c7

10.fo/ron/ a/cha/das/ fi/gu/ras b7

11.da/ Ma/dre/ de/ Deus/, a/ssi c7

12.que/ non/ fo/ron/ de/ pin/tu/ras. b7

13.Nas mentes sempre tẽer...

14.Nen/ ar/ en/ta/lla/das/ non d7

15.fo/ron/, se/ Deus/ me/ per/don, d7

16.e /a/vi/a/ y/ fa/y/çon d7

17.da/ Se/nnor/ das/ a/pos/tu/ras b7

18.con/ sseu/ Fi/ll’, e/ per/ ra/zon d7

19.fei/tas/ ben/ per/ sas/ me/su/ras. b7

20.Nas mentes sempre tẽer

No exemplo (1), os versos contêm 7 sílabas poéticas5 5 O poeta trovador conta as sílabas poéticas e localiza os acentos em cada verso podem ser observados os padrões acentuais e rítmicos da língua na qual os poemas foram compostos. Existem duas maneiras de contagem de sílabas dos versos em língua portuguesa: o primeiro modo considera que as sílabas poéticas podem ser contadas até a última sílaba tônica do verso, desprezando-se as átonas finais, e no segundo modo, a contagem considera sempre uma sílaba átona após a sílaba tônica, mesmo que esta não exista. Tem-se como produto do primeiro tipo de contagem o verso agudo, característico do português e do francês, e como produto do segundo tipo o verso grave, característico do italiano e do espanhol (MASSINI-CAGLIARI, 1999). . É possível estabelecer o caráter das elisões presente da(s) = de+a(s) (linhas 5, 11 e 17); quant’eu = quanto + eu (linha 7); Fill’e = Fillo + e (linha 18). Além disso, devem ser consideradas como hiatos as sequências E-A (linha 16); A-I (linha 16). No exemplo (1) a solução de ditongação não foi encontrada.

Sândi vocálico externo

O termo sândi, proveniente da antiga gramática sânscrita, designa as alterações mórficas e fonológicas causadas pelo contato entre formas da língua (TRASK, 2004TRASK, R. Dicionário de linguagem e lingüística. Tradução e adaptação de Rodolfo Ilari. São Paulo: Contexto, 2004.). De acordo com Crystal (2000CRYSTAL, D. Dicionário de lingüística e fonética. Tradução e adaptação: Maria Carmelita Pádua Dias. Rio de Janeiro: Zahar, 2000., p. 196), o sândi é um

Termo usado na SINTAXE e na MORFOLOGIA para indicar uma MODIFICAÇÃO FONOLÓGICA de FORMAS GRAMATICAIS que ficaram justapostas. O termo deriva de uma palavra do sânscrito que significa “junção”. As formas de sândi passaram por modificações específicas em circunstâncias específicas (isto é, várias regras de sândi foram aplicadas) [...]. Nas línguas em que as formas sândi são complexas, existe às vezes a distinção entre “sândi externa” (REGRAS de sândi que operam no limite da palavra) e “sândi interna” (regras que operam dentro das palavras). (CRYSTAL, 2000CRYSTAL, D. Dicionário de lingüística e fonética. Tradução e adaptação: Maria Carmelita Pádua Dias. Rio de Janeiro: Zahar, 2000., p. 196, grifo do autor).

Bechara (1964)BECHARA, E. Moderna Gramática Portuguêsa. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1964. observa que na leitura de versos poéticos ocorrem junções e pausas no ato de fala. Essa ocorrência pode acontecer dentro de um mesmo vocábulo ou pela junção de dois vocábulos: sândi vocálico externo. O sândi pode, então, ser caracterizado como interno e externo. Um exemplo de sândi vocálico interno é o que ocorre quando pronunciamos a palavra cooperar como coperar, ou então, quando pronunciamos a vogal /i/ do nome Tiago (Ti.a.go) como uma semivogal (Tia.go). Para o sândi externo, na literatura do PA e PB, recorrentemente consideram-se i) elisão, ii) ditongação, iii) degeminação e iv) crase6 6 A literatura – Bisol (1989, 1992a, 1996, 2000, 2002, 2003); Abaurre (1996); Abaurre, Galves e Scarpa (1999); Tenani (2002, 2003, 2004); Brescancini e Barbosa (2005); Collischoon (2005, 2011, 2012) – sobre o sândi traz de forma unânime e sem controvérsias três processos fonológicos que operam em juntura vocálica intervocabular no PB: elisão, degeminação e ditongação. Para o PA, Massini-Cagliari (1995) e Cangemi (2014) indicam, como processos: elisão, crase e ditongação. :

i)meni[no a]legre —> meni[na]legre

ii)ca[rro a]zul —> ca[rrwa]zul

iii)ca[sa a]marela —> ca[sa]marela

iv)ami[ga a]ssi —> ami[ga]ssi7 7 Massini-Cagliari (2005) preferiu denominar o processo de sândi ocorrente entre dois as como crase – e não como degeminação –, já que é, por sua natureza, um pouco diverso do processo descrito por Bisol (1992a) para o PB. A degeminação não pressupõe a simplificação da sílaba, considerando que as duas moras, correspondentes a cada uma das vogais /a/ que se fundem, mantêm-se. Verificar o exemplo (7), neste artigo, em relação aos mecanismos formais de diferenciação dos processos.

A fim de observar e analisar esses processos, partimos da escansão e da contagem das sílabas poéticas dos versos para poder elucidar dúvidas acerca da consideração de uma sequência de vogais pertencentes a duas palavras em uma única sílaba – tem-se o caso da elisão - ou em sílabas diferentes - constituindo assim um hiato. Convém reafirmar que a escansão dos poemas em sílabas poéticas é uma aliada no estudo da elisão, já que a não realização fonética da vogal não grafada pode ser confirmada a partir da contagem das sílabas poéticas do verso.

Os processos de elisão e degeminação: um olhar no PB

Com o intuito de tornar mais pedagógica a apresentação da abordagem da elisão, apresentamos os estudos referentes ao português brasileiro (PB)8 8 Convém ressaltar que o sândi vocálico externo é um fenômeno da língua falada, ou seja, oral. Logo, os estudos relacionados a esse tema, no PB, têm, como corpus, a língua oral. No PA, século XIII, não há gravação da produção do falante. Assim, com as devidas metodologias e ponderações, estudamos aspectos segmentais e suprassegmentais de períodos passados de línguas, nos quais não há gravação da produção do falante, por meio do texto escrito. . Os processos de sândi vocálico externo no PB concernem duas ideias principais abordadas por Bisol (1992a)BISOL, L. Sândi vocálico externo: degeminação e elisão. Caderno de estudos linguísticos, Campinas, v. 23, p. 83-101, 1992a.. A primeira ideia define o sândi externo como um processo de ressilabação que envolve duas palavras sob o domínio do mesmo enunciado. A segunda ideia, consequência da primeira, quando essas duas palavras se encontram e a sequência VV se delineia à sílaba que se forma é incorporada à pauta prosódica do vocábulo seguinte. Portanto, a estrutura básica para todos os processos de sândi vocálico é similar à do ditongo – duas vogais sob o domínio da mesma sílaba e seus fenômenos são governados pela ressilabação que ocorre automaticamente quando se encontram palavras que formam em suas fronteiras as sequências VV. As palavras são pronunciadas sem pausa, como parte de uma unidade prosódica maior.

Em PB, os processos de sândi - elisão, ditongação e degeminação - são frequentes quando duas palavras se combinam para constituir frases. Para Bisol (1992b)BISOL, L. Sândi vocálico externo. In: ILARI, R. (org.). Gramática do português falado: Níveis da análise lingüística. Campinas: Ed. da Unicamp. 1992b. v.II. p.21-38., esses processos são favorecidos por duas vogais em sequência. Na ressilabação, esses ficam sob o domínio da mesma sílaba. Ademais, Bisol (1992b)BISOL, L. Sândi vocálico externo. In: ILARI, R. (org.). Gramática do português falado: Níveis da análise lingüística. Campinas: Ed. da Unicamp. 1992b. v.II. p.21-38. observa que as vogais átonas são favoráveis à aplicação do processo de sândi e a frase fonológica é o domínio preferencial para o processo de sândi.

Quando ocorre uma ressilabação, os processos de sândi têm em comum, segundo Collischonn (2005)COLLISCHONN, G. A sílaba em português. In: BISOL, L. (org.). Introdução a estudos de fonologia do português brasileiro. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2005. p. 101-129., o fato de ocorrerem entre dois núcleos silábicos que entraram em contato. No caso da elisão a autora reflete:

O português rejeita esta configuração e, em consequência, ocorre o desaparecimento de um deles, daquele que é prosodicamente mais fraco. Normalmente, este é o caso da primeira vogal, pois sendo átona final, é mais fraca do que a átona pretônica da palavra seguinte. (COLLISCHONN, 2005COLLISCHONN, G. A sílaba em português. In: BISOL, L. (org.). Introdução a estudos de fonologia do português brasileiro. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2005. p. 101-129., p.128).

A elisão somente se aplica, no PB, na fronteira de uma palavra, mas não no interior desta – restrição de domínio. Além desse aspecto, para a ocorrência da elisão no PB, podemos chamar atenção para outra restrição: a elisão ocorre somente quando se tem uma vogal baixa /a/ diante de outra vogal. As ocorrências acontecem em maior número diante de uma vogal posterior e em menor número diante de uma vogal frontal.

A elisão tem como domínio maior o enunciado e como menor o vocábulo fonológico. Na elisão, ocorre um apagamento de uma das vogais: “A vogal elidida é sempre átona e fica à esquerda” (BISOL, 1992aBISOL, L. Sândi vocálico externo: degeminação e elisão. Caderno de estudos linguísticos, Campinas, v. 23, p. 83-101, 1992a., p. 96).

Figura 1
Silabação

De acordo com Bisol (1992a)BISOL, L. Sândi vocálico externo: degeminação e elisão. Caderno de estudos linguísticos, Campinas, v. 23, p. 83-101, 1992a., uma restrição à elisão é encontrada quando diz respeito ao seu encontro com um morfema9 9 A preservação do morfema é importante, pois é uma entidade portadora de significado. Se, porventura, for apagado, há a perda de valores semânticos. (menor parte com significado). Quando estiver sozinho ou em formas contraídas - (3) -, esse é preservado.

(3)

moro na esquina - *moro [nisquina]

cuida da entrada - *cuida [dentrada]

mora na Holanda - *mora [nolanda]

(BISOL, 2000BISOL, L. A elisão, uma regra variável. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 35, n. 1, p. 319-330, 2000., p. 326).

No caso da degeminação, o que ocorre não é o apagamento10 10 Quando há a combinação de qualquer timbre de vogais átonas que pertencem à mesma categoria na subjacência, seja [ɐ, a], seja [I,i] e outras resulta a vogal de timbre mais forte. Esses casos são interpretados como apagamento da vogal mais fraca (BISOL, 1992a, p.88). de uma das vogais como na elisão, mas sim, a fusão11 11 Quando a ressilabação acontece, em se tratando de vogais de mesma categoria, as diferenças fonéticas provenientes das diferentes posições que ocupavam, na palavra, as sílabas em que estavam anexadas desaparecem. Perdido o limite entre as duas palavras, perdem-se as variantes “posicionalmente condicionadas” (BISOL,1992a, p.88). A esses fatos, Bisol (1992a) permite a interpretação de um processo em que a fusão das vogais ocorre. das duas (BISOL, 1992aBISOL, L. Sândi vocálico externo: degeminação e elisão. Caderno de estudos linguísticos, Campinas, v. 23, p. 83-101, 1992a.). Segundo Bisol (1992a)BISOL, L. Sândi vocálico externo: degeminação e elisão. Caderno de estudos linguísticos, Campinas, v. 23, p. 83-101, 1992a., no PB, vogais idênticas degeminam (4). A degeminação atua sobre uma sequência de vogais idênticas e como produto da fusão das vogais tem-se o desaparecimento de uma sílaba, quando se considera a relação entre a silabação inicial e a não inicial, por um processo de ressilabificação - (5).

Figura 2
Domínios prosódicos

Figura 3
Processo de degeminação

Há, portanto, uma simplificação (encurtamento) de duas sílabas que se convertem em uma só: “A degeminação ocorre quando as duas vogais que se encontram são semelhantes (restrição segmental) [...], desde que a segunda vogal não tenha acento primário (restrição rítmica)” (COLLISCHONN, 2005COLLISCHONN, G. A sílaba em português. In: BISOL, L. (org.). Introdução a estudos de fonologia do português brasileiro. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2005. p. 101-129., p.127).

A degeminação pode ocorrer em qualquer ponto de uma sentença: na combinação de dois vocábulos dentro de orações, entre orações ou sentenças. Segundo Nespor (1987)NESPOR, M. Vowel Degeminantion and Fast Speech Rules. Phonology Yearbook, Amsterdan, v. 4, p. 61-85, 1987., para a ocorrência da degeminação as duas sentenças devem ser pronunciadas pelo mesmo falante e devem ser dirigidas ao mesmo interlocutor – condições pragmáticas de estruturação do enunciado. Como condições fonológicas de reestruturação de enunciados, Bisol (1992a)BISOL, L. Sândi vocálico externo: degeminação e elisão. Caderno de estudos linguísticos, Campinas, v. 23, p. 83-101, 1992a. reflete que as duas sentenças devem ser relativamente curtas e não devem ter pausas entre elas.

A degeminação ainda acontece quando: ambas as vogais das palavras são acentuadas, se a vogal da segunda palavra leva acento, se ambas as vogais não levam acento ou se somente a vogal da primeira palavra for acentuada. Todavia, há restrições rítmicas à ocorrência da degeminação. Bisol (1992aBISOL, L. Sândi vocálico externo: degeminação e elisão. Caderno de estudos linguísticos, Campinas, v. 23, p. 83-101, 1992a., p. 87) observa que não há, no PB, caso quando degeminação quando i) a primeira vogal da segunda palavra porta o acento primário a não ser que este acento “venha a ser enfraquecido por razões prosódicas ou rítmicas” e quando ii) há duração ou alongamento da vogal equivalendo à presença temporal de duas vogais. Na degeminação, a sílaba inteira muda de lugar, submetendo-se ao domínio do acento primário do segundo vocábulo.

Em suma, a degeminação compreende duas regras: ressilabação e encurtamento. Todavia, na elisão há o apagamento; na degeminação, a fusão. A ressilabação é consequência do Princípio do Contorno Obrigatório12 12 O PCO (Princípio do Contorno Obrigatório – de OCP, Obligatory Contour Principle) foi formulado por Leben (1973) e é um dos princípios fundamentais para a análise fonológica de segmentos geminados. Sequências idênticas de autossegmentos são proibidas pelo PCO. Exemplo: a sequência de segmentos (aa) que contém duas unidades se reduz a uma unidade (a) através de um processo derivacional. Esse segmento (a) que vale por dois (aa) recebe o nome de geminado. As sequências de unidades idênticas são proibidas nas representações fonológicas. e o encurtamento é um processo de simplificação temporal, ou seja, dois tempos na linha prosódica são substituídos por um só, pois no português vogais longas inexistem.

Por fim, a elisão, assim como a degeminação, no PB, para Bisol (1992aBISOL, L. Sândi vocálico externo: degeminação e elisão. Caderno de estudos linguísticos, Campinas, v. 23, p. 83-101, 1992a., p. 100), são “decorrentes de mecanismos relacionados à ressilabação” e têm consequências prosódicas. A elisão só se aplica em sílaba átona, já a degeminação faz restrição à segunda V acentuada.

O processo de elisão no PA

Foram mapeadas no âmbito de sessenta CSM todas as soluções para o encontro de vogais em junção de palavras. Os resultados encontrados foram 4308 ocorrências de encontros vocálicos intervocabulares. Desses, 2073 (48,1%) são referentes aos processos de elisão13 13 Como foi visto, a elisão ocorre, no PB, quando a vogal átona final da primeira palavra é apagada, e uma nova sílaba é formada, a partir da junção do onset da sílaba átona final da primeira palavra com a vogal inicial da segunda palavra. , 1894 (44,0%) referentes ao processo de hiato14 14 A ocorrência de hiato segue o caminho contrário à ocorrência de elisão, isto é, para que ocorra o hiato deve-se primeiramente ter o encontro da vogal final da primeira palavra com a vogal inicial da segunda palavra, sem que aquela – vogal final da primeira palavra - se apague. , 310 (7,2%) de encontros de ditongos decrescentes com vogal15 15 São considerados ditongos decrescentes uma sequência CVV, em que a segunda V seja uma semivogal, i.e., um glide. Então, para a ocorrência de encontros de ditongos decrescentes com vogal ter-se-ia o seguinte contexto: a sílaba da primeira palavra seria CVV, sendo a segunda V um glide, e está entraria em contado com a V inicial da segunda palavra. , 5 (0,1%) de encontros de ditongos16 16 São considerados ditongos crescentes uma sequência CVV, em que a primeira V seja uma semivogal, i.e., um glide. Então, para a ocorrência de encontros de ditongos crescentes com vogal ter-se-ia o seguinte contexto: a sílaba da primeira palavra seria CVV, sendo a primeira V um glide, e está entraria em contado com a V inicial da segunda palavra. Ressalta-se que tanto o encontro de ditongos crescentes com vogal quanto ditongos decrescentes com vogal levam ao hiato. crescentes com vogal, 5 (0,1%) processos ainda não nomeados pela literatura especializada e 21 (0,5%) processos de ditongação17 17 Para ocorrência de ditongação como sândi vocálico externo há o seguinte contexto: a primeira palavra, CV encontra-se com o início da segunda palavra, portadora de uma V. A V da primeira palavra converte-se em glide quando entra em contrato com a V inicial da segunda palavra. Assim coma a elisão, a ditongação é o resultado de um mecanismo de ressilabação. . Nota-se que há 179 casos a mais de elisão se comparado ao processo de hiato, o que corresponde a uma diferença de 4,1%.

Gráfico 1
Processos intervocabulares nas sessenta CSM

Observamos que, enquanto quase todas as sequências vocálicas podem formar hiato, há restrições quanto à ocorrência dos demais processos de sândi. Para que ocorra a elisão, no PA, é necessário que a vogal final da primeira palavra seja /a/, /e/ ou /o/.

Visualizando o Quadro 1, que traz a quantificação dos processos de elisão presentes nas CSM, podemos comprovar que há uma diferença quantitativa de comportamento, se compararmos os casos de elisão quando a vogal átona final da primeira palavra é /a/ e quando a vogal elidida é /e/ ou /o/. Percentualmente, há 3,91% (81 dos 2073 casos) para o apagamento da vogal /a/, enquanto os de /e/ equivalem a 64,93% (1346 dos 2073 casos) e os de /o/ 31,16% (646 dos 2073 casos). Portanto, a ocorrência de elisão com palavras cuja vogal átona é /a/ é mais restrita do que com /e/ ou /o/. Ainda a respeito da elisão de /a/, é possível notar que enquanto o processo de elisão de /e/ ou /o/ pode acontecer diante de todas as vogais, a elisão /a/ acontece mais diante de /a/ mesmo.

Quadro 1
Elisão

Quadro 2
Hiato

Os casos mais típicos de elisão ocorrem quando a vogal átona da primeira palavra é /e/ - 1346 casos (64,93%) – ou /o/ - 646 casos (31,16%) - (6):

(6) E os judeus, que sem[pr’ a]costuma[d’ an] (CSM 27; verso 70)

sempr’ acostumad’ an = sempre + acostumado + an

A partir dos resultados quantitativos alcançados no mapeamento das sessenta primeiras CSM, constatou-se que há a supressão das vogais a, e18 18 Assim como fez Massini-Cagliari (2005), de acordo com os estudos de Maia (1997), adotamos, durante a pesquisa, as abreviaturas “e+” como referência à grafia usual do fonema ausente /e/, embora não se possa especificar com certeza a sua realização fonética como [e] ou [i]. Da mesma forma, usamos a abreviatura “o+” referindo-se à grafia mais usual na época da vogal ausente, que no caso, refere-se ao fonema /o/, que possivelmente teria como realizações fonéticas [o] e [u]. , e o átonos finais diante de vogal inicial de outra palavra; após esse movimento, ocorre a ressilabificação do onset das sílabas em juntura vocabular. O onset da sílaba final da primeira palavra é ligado ao núcleo da primeira sílaba da palavra seguinte - (7).

Figura 4
Onset19 19 Sequência de palavras retirada da CSM 28, verso 39.

Ao refletir sobre os dados de elisão de seu corpus, Massini-Cagliari (2005)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: estudos de prosódia do português arcaico, a partir das cantigas profanas e religiosas. Tese (Livre docência em Linguística) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2005., elaborados a partir de dados coletados nas cantigas de amigo do Cancioneiro da Biblioteca Nacional de Lisboa e a partir do corpus de cem cantigas de amigo e de amor, apontou para a diferenciação dos processos de sândi vocálico externo que acontecem no PA de acordo com a qualidade da vogal átona da primeira palavra. Segundo a autora, há uma diferença - da queda da vogal átona - quando esta é /a/ e quando não – e concluiu estar diante de dois processos diferentes de sândi vocálico externo: aqueles cuja vogal átona final da primeira palavra é /a/ e os outros em que a vogal átona da palavra é /e/ e /o/.

No primeiro caso, cuja vogal /a/ átona final da primeira palavra é suprimida, Massini-Cagliari (2005)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: estudos de prosódia do português arcaico, a partir das cantigas profanas e religiosas. Tese (Livre docência em Linguística) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2005. notou que esta é mais suprimida quando a vogal inicial da segunda palavra também é /a/, não há nenhuma ocorrência de sua supressão diante de /ɛ/, /i/ e /u/ e poucas ocorrências envolvendo as vogais /o/ e /ɔ/. Para a pesquisadora, a supressão de vogais de mesma qualidade, no PA, deve ser entendida como crase. No segundo caso, cujas vogais átonas /e/ e /o/ se elidem diante de vogais de qualquer qualidade, há a elisão.

De fato, a consideração de que ocorreria somente a crase (e não a elisão) quando a vogal átona final da primeira palavra é /a/ explicaria o fato de o hiato ser a solução preferida para encontros vocálicos formados pela vogal /a/ seguida de outras vogais. (MASSINI-CAGLIARI, 2006MASSINI-CAGLIARI, G. Sândi vocálico externo em Português Arcaico: condicionamentos lingüísticos e usos estilísticos. Estudos Linguísticos, São Paulo, v.35, p.76-94, 2006. Disponível em: http://www.gel.hospedagemdesites.ws/estudoslinguisticos/edicoesanteriores/4publica-estudos-2006/sistema06/gcm.pdf. Acesso em: 10 jun. 2022.
http://www.gel.hospedagemdesites.ws/estu...
, p. 81).

Segundo Massini-Cagliari (2005)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: estudos de prosódia do português arcaico, a partir das cantigas profanas e religiosas. Tese (Livre docência em Linguística) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2005., as duas moras, correspondentes a cada uma das vogais /a/ que se fundem, mantêm-se - (7). A autora considera que, diferentemente do que acontece com as palavras terminadas em /e/ e /o/ átonos finais, a vogal /a/ átona final não pode cair, pois do contrário, o processo de elisão poderia ser aplicado.

Figura 5
Processo de elisão

Com o intuito de melhor visualização, Massini-Cagliari (1999MASSINI-CAGLIARI, G. Sândi Vocálico Externo nas Cantigas Medievais Portuguesas. Araraquara: FCL – UNESP, 1999. Trabalho inédito., 2000MASSINI-CAGLIARI, G. O sândi vocálico externo no português arcaico visto pela teoria da otimidade. In: CASTRO, R.; BARBOSA, P. (org.). Encontro Nacional da Associação Portuguesa de Linguística. Braga: APL, 2000. v. II. p. 59-75.) descreve o processo de crase no PA como o desligamento do núcleo da sílaba inicial da segunda palavra, seguido da sua reassociação ao núcleo sílaba precedente, representando uma ressilabificação da estrutura inicial - (8). Por restrições impostas pelo Princípio do Contorno Obrigatório (PCO), as duas vogais acabam se fundindo, embora as moras às quais estavam inicialmente associadas se mantenham (MASSINI-CAGLIARI, 2005MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: estudos de prosódia do português arcaico, a partir das cantigas profanas e religiosas. Tese (Livre docência em Linguística) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2005.).

Massini-Cagliari (2005)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: estudos de prosódia do português arcaico, a partir das cantigas profanas e religiosas. Tese (Livre docência em Linguística) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2005. diz que, em uma perspectiva derivacional não-linear, a diferenciação do processo de elisão com relação à crase,

[...] está nos níveis de desassociação da primeira vogal e de associação da vogal inicial da palavra seguinte, que ocorrem logo abaixo da rima, para que a mora correspondente à vogal final da primeira palavra seja eliminada (na crase, esta mora se mantinha) e apenas a mora da vogal inicial da segunda palavra se mantenha. (MASSINI-CAGLIARI, 2005MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: estudos de prosódia do português arcaico, a partir das cantigas profanas e religiosas. Tese (Livre docência em Linguística) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2005., p. 233).

Por meio do mapeamento do corpus deste estudo e dos resultados quantitativamente obtidos, confirma-se a diferença de comportamento da elisão quando há a supressão da vogal /a/ átona final da primeira palavra seguida da vogal /a/ inicial da segunda palavra.

É importante ressaltar, também, que há um processo diferente do apagamento da primeira vogal (elisão) ou junção (crase) das vogais, no PA. Trata-se do apagamento ou não realização da vogal inicial da segunda palavra:

(9)

a. aos tres Reis en Ultramar / ouv’ a strela mostrada, (CSM 1-38,39)

b. que a terra toda ‘sclareceu, (CSM 15-91)

c. do demo, que sterreces. (CSM 20-39)

d. nen d’ aguillon a ‘scodudas. (CSM 31-68)

e. del, a Reynna nobre spirital. (CSM 58-53)

O processo, ainda não nomeado, ocorre em 5 (0,1%) dos casos de sândi. Portanto, é um processo marginal na lírica trovadoresca. No entanto, deve-se observar o contexto em que esse processo ocorre, ou seja, a vogal apagada é /e/ seguida fricativa alveolar surda - /s/. Massini Cagliari (2005)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: estudos de prosódia do português arcaico, a partir das cantigas profanas e religiosas. Tese (Livre docência em Linguística) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2005., havia mapeado, em seu corpus, dados como esse. Segundo a autora, a vogal apagada /e/ é a vogal epentética por natureza do PA e se encontra, como dito acima, no contexto inicial da segunda palavra. Massini-Cagliari (2005MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: estudos de prosódia do português arcaico, a partir das cantigas profanas e religiosas. Tese (Livre docência em Linguística) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2005., p. 235) reflete que

[...] é justamente este um dos contextos em que, necessariamente, há epêntese de uma vogal para “corrigir” a estrutura silábica, em nível lexical. [...] há a possibilidade de a vogal da palavra anterior preencher o núcleo dessa sílaba irregular, se não houver a epêntese.

Deparamo-nos, também, no corpus de sessenta CSM, com esse processo de apagamento da vogal inicial da segunda palavra, porém ainda não nomeado pela literatura especializada.

Conclusão

Por meio do estudo realizado foi possível dar, com relação aos elementos de sândi no corpus investigado, uma contribuição inicial ao estudo dos aspectos segmentais e suprassegmentais do PA, através da observação da notação escrita dos trovadores de setecentos anos atrás.

Por meio do mapeamento das sessenta CSM, em relação ao processo de elisão – 1726 casos (47,9%) -, no PA, é possível afirmar que esse constituía o mais recorrente processo de sândi na língua da época no discurso poético. No entanto, a diferença de recorrência desse processo se comparado ao processo de hiato - 1579 casos (43,8%) - (ou seja, à contraparte do processo da elisão, sua não realização) não é muita – 147 casos (4,1%), uma vez que, como vimos, quase todas as sequências vocálicas poderiam formar hiato.

Há também de ressaltar o comportamento dos casos de elisão quando a vogal átona final da primeira palavra é /a/ e quando a vogal elidida é /e/ ou /o/. Por meio das análises feitas, mostramos que a ocorrência de elisão com palavras cuja vogal átona é /a/ é mais restrita, acontece mais diante de /a/ mesmo e, assim como Massini-Cagliari (2005)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: estudos de prosódia do português arcaico, a partir das cantigas profanas e religiosas. Tese (Livre docência em Linguística) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2005., acreditamos se tratar de crase. Com /e/ ou /o/, o processo de elisão pode acontecer diante de todas as vogais.

Por fim, outro processo verificado no corpus mapeado, em frequência minoritária, é aquele em que a vogal inicial da segunda palavra é apagada ou não-realizada - 4 casos (0,1%).

Agradecimentos

Agradecemos à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP - Processos 2011/23104-0 e 2012/20947-0) pelo financiamento da pesquisa intitulada.

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  • XAVIER, M.; MATEUS, M. (org.). Dicionário de termos linguísticos. Lisboa: Cosmos, 1990. v.1.
  • 1
    Neste artigo, retomo as questões discutidas em Cangemi (2014)CANGEMI, A. Sândi vocálico externo no Português Arcaico. 2014. 208 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2014. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/handle/11449/123907. Acesso em: 01 ago. 2019.
    https://repositorio.unesp.br/handle/1144...
    , Cangemi e Massini-Cagliari (2013)CANGEMI, A.; MASSINI-CAGLIARI, G. Um olhar sobre a vogal epentética no Português Arcaico. In: MAGALHÃES, J. (org.). Linguística in Focus: Fonologia. Uberlândia: EDUFU, 2013. v. 10. p. 181-204. e Cangemi e Abreu (2010)CANGEMI, A.; ABREU, T. A utilização de uma metodologia em textos poéticos para estudos fonológicohistoriograficos do português. Eutomia, Recife, v. 1, n.6, 2010. Disponível em: https://periodicos.ufpe.br/revistas/EUTOMIA/article/view/1721. Acesso em: 20 jun. 2020.
    https://periodicos.ufpe.br/revistas/EUTO...
    .
  • 2
    Optamos pelo rótulo “português arcaico” em detrimento de “galego-português” porque, na fase trovadoresca, o galego e o português eram reconhecidos pelos falantes como sendo a mesma língua, embora houvesse, muito provavelmente, variações entre esses dois falares.
  • 3
    As CSM chegaram até os dias atuais por meio de quatro manuscritos antigos, conhecidos como códices: E: El Escorial, Real Monasterio de san Lorenzo, MS B.I.2 (conhecido como Escorial ou códice dos músicos) – o mais completo de todos; T: El Escorial, Real Monasterio de san Lorenzo, MS T.I.1 (códice rico ou códice das histórias) – considerado o mais rico em conteúdo artístico (sobretudo iconográfico); F: Firenze, Biblioteca Nazionale Centrale, Banco Rari, 20 (códice de Florença) – que forma um conjunto com o códice Escorial rico, uma vez que as cantigas que contém completam o códice T; To: Toledo, Madrid, Biblioteca Nacional, MS 10.069 – o menor e mais antigo de todos, que contém também um índice de cem cantigas. Atualmente, dois desses códices são guardados na Biblioteca do Escorial (E e T), um na Biblioteca Nacional de Madrid (To) e outro na Biblioteca Nacional de Florença (F).
  • 4
    As letras maiúsculas A e B representam o padrão de rima do refrão; já as minúsculas b, c, d, e, f representam o padrão das estrofes. Ao final do verso, as letras são seguidas de um algarismo, que representa a quantidade de sílabas poéticas do verso. As sílabas em negrito correspondem ao processo de elisão da última vogal da primeira palavra com a primeira vogal da segunda palavra, já as sublinhadas correspondem à formação do hiato da última vogal da primeira palavra com a primeira vogal da segunda palavra.
  • 5
    O poeta trovador conta as sílabas poéticas e localiza os acentos em cada verso podem ser observados os padrões acentuais e rítmicos da língua na qual os poemas foram compostos. Existem duas maneiras de contagem de sílabas dos versos em língua portuguesa: o primeiro modo considera que as sílabas poéticas podem ser contadas até a última sílaba tônica do verso, desprezando-se as átonas finais, e no segundo modo, a contagem considera sempre uma sílaba átona após a sílaba tônica, mesmo que esta não exista. Tem-se como produto do primeiro tipo de contagem o verso agudo, característico do português e do francês, e como produto do segundo tipo o verso grave, característico do italiano e do espanhol (MASSINI-CAGLIARI, 1999MASSINI-CAGLIARI, G. Sândi Vocálico Externo nas Cantigas Medievais Portuguesas. Araraquara: FCL – UNESP, 1999. Trabalho inédito.).
  • 6
    A literatura – Bisol (1989BISOL, L. O ditongo na perspectiva da fonologia atual. D.E.L.T.A., São Paulo, v. 5, n. 2, p. 185-224, 1989., 1992aBISOL, L. Sândi vocálico externo: degeminação e elisão. Caderno de estudos linguísticos, Campinas, v. 23, p. 83-101, 1992a., 1996BISOL, L. Constituintes prosódicos. In: BISOL, L. (org.). Introdução a estudos de fonologia do português brasileiro. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1996. p. 247-261., 2000BISOL, L. A elisão, uma regra variável. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 35, n. 1, p. 319-330, 2000., 2002BISOL, L. Sândi vocálico externo. In: ILARI, R. (org.). Gramática do Português Falado: Níveis de Análise Lingüística. Campinas: Ed. da Unicamp, 2002. p.19-35., 2003BISOL, L. Sandhi in Brazilian Portuguese. Probus, Dordrecht, v.15, n.2, p.177-200, 2003.); Abaurre (1996)ABAURRE, M. Acento frasal e os processos fonológicos segmentais. Letras Hoje, Porto Alegre, v. 31, n.2, p.41-50, 1996.; Abaurre, Galves e Scarpa (1999); Tenani (2002TENANI, L. Sândi vocálico e estrutura prosódica. Estudos linguísticos, São Paulo, p.1-4, 2002., 2003TENANI, L. Domínios prosódicos e processos de reestruturação silábica. Estudos linguísticos, São Paulo, p.1-4, 2003., 2004TENANI, L. O efeito de eurritmia e a degeminação. Estudos linguísticos, São Paulo, p.928-932, 2004.); Brescancini e Barbosa (2005)BRESCANCINI, C.; BARBOSA, C. A elisão da vogal média /e/ no sul do Brasil. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 40, n.3, p. 39-56, 2005.; Collischoon (2005, 2011, 2012) – sobre o sândi traz de forma unânime e sem controvérsias três processos fonológicos que operam em juntura vocálica intervocabular no PB: elisão, degeminação e ditongação. Para o PA, Massini-Cagliari (1995)MASSINI-CAGLIARI, G. Cantigas de amigo: do ritmo poético ao linguístico: um estudo do percurso histórico da acentuação em Português. 1995. Tese (Doutorado em Linguística) – Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1995. e Cangemi (2014)CANGEMI, A. Sândi vocálico externo no Português Arcaico. 2014. 208 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2014. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/handle/11449/123907. Acesso em: 01 ago. 2019.
    https://repositorio.unesp.br/handle/1144...
    indicam, como processos: elisão, crase e ditongação.
  • 7
    Massini-Cagliari (2005)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: estudos de prosódia do português arcaico, a partir das cantigas profanas e religiosas. Tese (Livre docência em Linguística) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2005. preferiu denominar o processo de sândi ocorrente entre dois as como crase – e não como degeminação –, já que é, por sua natureza, um pouco diverso do processo descrito por Bisol (1992a) para o PB. A degeminação não pressupõe a simplificação da sílaba, considerando que as duas moras, correspondentes a cada uma das vogais /a/ que se fundem, mantêm-se. Verificar o exemplo (7), neste artigo, em relação aos mecanismos formais de diferenciação dos processos.
  • 8
    Convém ressaltar que o sândi vocálico externo é um fenômeno da língua falada, ou seja, oral. Logo, os estudos relacionados a esse tema, no PB, têm, como corpus, a língua oral. No PA, século XIII, não há gravação da produção do falante. Assim, com as devidas metodologias e ponderações, estudamos aspectos segmentais e suprassegmentais de períodos passados de línguas, nos quais não há gravação da produção do falante, por meio do texto escrito.
  • 9
    A preservação do morfema é importante, pois é uma entidade portadora de significado. Se, porventura, for apagado, há a perda de valores semânticos.
  • 10
    Quando há a combinação de qualquer timbre de vogais átonas que pertencem à mesma categoria na subjacência, seja [ɐ, a], seja [I,i] e outras resulta a vogal de timbre mais forte. Esses casos são interpretados como apagamento da vogal mais fraca (BISOL, 1992a, p.88).
  • 11
    Quando a ressilabação acontece, em se tratando de vogais de mesma categoria, as diferenças fonéticas provenientes das diferentes posições que ocupavam, na palavra, as sílabas em que estavam anexadas desaparecem. Perdido o limite entre as duas palavras, perdem-se as variantes “posicionalmente condicionadas” (BISOL,1992a, p.88). A esses fatos, Bisol (1992a) permite a interpretação de um processo em que a fusão das vogais ocorre.
  • 12
    O PCO (Princípio do Contorno Obrigatório – de OCP, Obligatory Contour Principle) foi formulado por Leben (1973)LEBEN, W. Suprasegmental Phonology. 1973. 199f. PhD Dissertation (Doctor in Philosophy) - Massachusetts Institute of Technology, Cambridge, 1973. e é um dos princípios fundamentais para a análise fonológica de segmentos geminados. Sequências idênticas de autossegmentos são proibidas pelo PCO. Exemplo: a sequência de segmentos (aa) que contém duas unidades se reduz a uma unidade (a) através de um processo derivacional. Esse segmento (a) que vale por dois (aa) recebe o nome de geminado. As sequências de unidades idênticas são proibidas nas representações fonológicas.
  • 13
    Como foi visto, a elisão ocorre, no PB, quando a vogal átona final da primeira palavra é apagada, e uma nova sílaba é formada, a partir da junção do onset da sílaba átona final da primeira palavra com a vogal inicial da segunda palavra.
  • 14
    A ocorrência de hiato segue o caminho contrário à ocorrência de elisão, isto é, para que ocorra o hiato deve-se primeiramente ter o encontro da vogal final da primeira palavra com a vogal inicial da segunda palavra, sem que aquela – vogal final da primeira palavra - se apague.
  • 15
    São considerados ditongos decrescentes uma sequência CVV, em que a segunda V seja uma semivogal, i.e., um glide. Então, para a ocorrência de encontros de ditongos decrescentes com vogal ter-se-ia o seguinte contexto: a sílaba da primeira palavra seria CVV, sendo a segunda V um glide, e está entraria em contado com a V inicial da segunda palavra.
  • 16
    São considerados ditongos crescentes uma sequência CVV, em que a primeira V seja uma semivogal, i.e., um glide. Então, para a ocorrência de encontros de ditongos crescentes com vogal ter-se-ia o seguinte contexto: a sílaba da primeira palavra seria CVV, sendo a primeira V um glide, e está entraria em contado com a V inicial da segunda palavra. Ressalta-se que tanto o encontro de ditongos crescentes com vogal quanto ditongos decrescentes com vogal levam ao hiato.
  • 17
    Para ocorrência de ditongação como sândi vocálico externo há o seguinte contexto: a primeira palavra, CV encontra-se com o início da segunda palavra, portadora de uma V. A V da primeira palavra converte-se em glide quando entra em contrato com a V inicial da segunda palavra. Assim coma a elisão, a ditongação é o resultado de um mecanismo de ressilabação.
  • 18
    Assim como fez Massini-Cagliari (2005)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: estudos de prosódia do português arcaico, a partir das cantigas profanas e religiosas. Tese (Livre docência em Linguística) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2005., de acordo com os estudos de Maia (1997)MAIA, C. História do galego-português. 2. ed. Coimbra: Fundação Calouste Gulbenkian/ Junta de Investigação Científica e Tecnológica, 1997., adotamos, durante a pesquisa, as abreviaturas “e+” como referência à grafia usual do fonema ausente /e/, embora não se possa especificar com certeza a sua realização fonética como [e] ou [i]. Da mesma forma, usamos a abreviatura “o+” referindo-se à grafia mais usual na época da vogal ausente, que no caso, refere-se ao fonema /o/, que possivelmente teria como realizações fonéticas [o] e [u].
  • 19
    Sequência de palavras retirada da CSM 28, verso 39.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Set 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    6 Maio 2020
  • Aceito
    20 Jul 2020
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