Acessibilidade / Reportar erro

CONSOANTES RÓTICAS DUPLAS EM CONTEXTO INTERVOCÁLICO: ESTUDO DA POSSIBILIDADE DE GEMINAÇÃO NA ÉPOCA ARCAICA DO PORTUGUÊS

RESUMO

O objetivo deste artigo consiste em estudar os fenômenos fonológicos do português falado na etapa trovadoresca, investigando especificamente as consoantes róticas presentes em 250 poemas medievais galego-portugueses. Nosso propósito é o de verificar se, naquela época da língua, havia dois fonemas róticos em oposição, ou se, do ponto de vista fonológico, o som intervocálico geralmente representado por <rr> poderia ser interpretado como sendo uma variante geminada do usualmente grafado como <r>. A análise da amostragem foi feita a partir dos modelos fonológicos não-lineares. O método eleito se embasa na observação da possibilidade de variação na escrita das vibrantes, a fim de determinar as relações existentes entre letras e fonemas, e no estudo do comportamento fonológico de <rr> no interior da sílaba e do vocábulo. Os casos demonstraram que, entre vogais, a rótica dobrada preenche dois contextos temporais na organização interna da sílaba. Reconhecemos a existência de apenas um fonema rótico no PA, o r-fraco, que, foneticamente, apresenta duas variantes, uma simples, retratada nos cancioneiros por um ou dois grafemas (<r>/<rr>), e uma geminada, de representação dupla (<rr>).

Português arcaico; estrutura silábica; geminação; cantigas medievais galego-portuguesas; consoantes róticas

ABSTRACT

This article aims to study the Phonology of the ancient Portuguese from the troubadour period, specifically investigating the rhotic consonants found in 250 poems in medieval Galician-Portuguese. Our goal is to verify whether there were two rhotic phonemes in opposition at that time or, from the phonological point of view, the sound represented by <rr> could be interpreted as a geminate variant from the one represented with <r>. The analysis is based on non-linear phonological models. The method is based on the observation of the possibility of variation in the trill spelling, in order to appoint the relations existing between letters and phonemes, and on the study of the behavior of <rr> within the syllable and the word. The cases showed evidences that among vowels the double rhotic fills two slots in the syllable internal organization. We acknowledge the existence of only one rhotic phoneme in Archaic Portuguese, the weak-r, which phonetically presents two variants, a simple one, represented by two graphemes (<r>/<rr>), and a geminate one, represented by the double rr (<rr>).

Archaic Portuguese; syllable structure; gemination; Medieval Galician-Portuguese cantigas; rhotic consonants

Introdução e objetivos

Este estudo objetiva promover uma análise fonológica do grafema <rr> em posição intervocálica durante a etapa medieval do português, visando confirmar ou não a ocorrência do fenômeno de geminação e apurar as consequências desse processo para se considerar a existência de um ou mais fonemas róticos na língua empregada naquela época. Sendo assim, pretende-se averiguar se, do ponto de vista fonológico, a vibrante <rr>, entre vogais, pode ser interpretada como uma variante geminada de <r> simples. Para tanto, optou-se por um corpus formado por 250 cantares medievais galego-portugueses: 100 Cantigas de Santa Maria (CSM), da vertente religiosa, e 150 obras profanas, 50 de cada um dos três gêneros canônicos (de amor, de amigo e de escárnio e maldizer). Os critérios adotados para a seleção do recorte profano foram três e se embasaram na análise feita por Massini-Cagliari (2015)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: desvendando a prosódia medieval. São Paulo: Ed. da UNESP Digital, 2015.: representatividade, elegendo autores de todas as épocas; localidade, uma vez que poetas galegos, portugueses e castelhanos conviviam no mesmo meio; e estatuto social, visto que existiam trovadores pertencentes à alta sociedade (reis, nobres e clérigos) e à baixa (jograis).

Partimos da conjectura de que uma apropriada compreensão de ocorrências do passado contribui para o esclarecimento do momento presente, sendo o inverso também verdadeiro, ou seja, a atualidade da língua é capaz de esclarecer determinados processos de transformações já concluídas (PAIVA; DUARTE, 2012PAIVA, M. da C. de; DUARTE, M. E. L. Mudança linguística: observações no tempo real. In: MOLLICA, M. C.; BRAGA, M. L. (org.). Introdução à Sociolinguística: o tratamento da variação. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2012. p.179-190.). Os documentos antigos chegam até nós por intermédio de copistas e com os incrementos julgados necessários pelos editores modernos. À vista disso, Paiva e Duarte (2012)PAIVA, M. da C. de; DUARTE, M. E. L. Mudança linguística: observações no tempo real. In: MOLLICA, M. C.; BRAGA, M. L. (org.). Introdução à Sociolinguística: o tratamento da variação. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2012. p.179-190. argumentam que uma boa maneira de lidar com essas questões é controlar o gênero escolhido e estabelecer comparações com a situação atual, fato que garante uma maior credibilidade acerca das fases anteriores do idioma. No presente artigo, assumimos tal perspectiva crítica de análise e selecionamos uma coletânea de cantigas que viabilizou uma descrição fonológica das róticas do português arcaico (PA). Nesse estágio da história, a língua portuguesa estava em plena fase de construção de sua escrita e apresentava muita flutuação na grafia, fato que ajuda na comprovação ou não de hipóteses a respeito do sistema linguístico do idioma falado no decorrer do século XIII.

A escolha por focalizar o período arcaico na discussão da possível geminação das consoantes róticas intervocálicas deriva da possibilidade de contribuir para a discussão acerca do status fonológico dessas consoantes no português atual, nas vertentes brasileira e portuguesa. Com relação ao Português Brasileiro (de agora em diante, PB), a consideração de r-forte como sendo a geminação de dois r-brandos foi primeiramente postulada por Câmara Junior (1953). Entretanto, o próprio autor, em trabalho posterior (CÂMARA JUNIOR, 1985[1970]), reformula o seu posicionamento, considerando a existe dois fonemas em contraste: r-fraco (tepe) e r-forte (que apresenta grande variação na sua pronúncia – CAGLIARI, 2007CAGLIARI, L. C. Elementos de Fonética do Português Brasileiro. São Paulo: Paulistana, 2007.). Em relação ao Português Europeu (PE), Mateus e d’Andrade (2000) propõem uma única rótica simples subjacente, sendo a oposição entre [R] e [ɾ] uma oposição entre rótica simples e dobrada. Massini-Cagliari, Cagliari e Redenbarger (2016) apresentam toda a problemática da definição do status fonológico das róticas no PB e no PE e concluem que, até este momento, um acordo entre os estudiosos do assunto ainda não foi alcançado.

Entretanto, com relação ao ancestral histórico do português, o Latim, parece não haver tanta controvérsia quanto ao status fonológico das consoantes róticas, sendo considerada a existência de um único fonema rótico, que pode se atualizar como simples ou geminado. De fato, Maurer Jr. (1959) considera apenas uma consoante rótica no quadro das consoantes simples do latim vulgar, que teria conservado, neste aspecto, a estrutura do latim clássico. Por sua vez, Ravizza (1940RAVIZZA, J. Gramática latina. 9. ed. Niterói: Escolas Profissionais Salesianas, 1940., p. 12) caracteriza a estrutura silábica da rótica dupla, afirmando que “de duas consoantes iguais, uma pertence à vogal antecedente e outra à seguinte”. Para Faria (1970FARIA, E. Fonética Histórica do Latim. Rio de Janeiro: Livraria Acadêmica, 1970., p. 105), “o r latino era uma vibrante pré-palatal, como o r italiano, sendo produzido pela vibração da ponta da língua”, considerando que o comportamento da geminada, naquela época, era semelhante ao que ainda ocorre no italiano. Maurer Jr. (1959, p. 49) considera a sobrevivência das geminadas no italiano “evidência abundante de que o latim vulgar conserva, de um modo geral, as geminadas antigas até o fim do período imperial”, o que inclui as róticas.

Com relação ao PA, há alguns estudos que mostram a variação gráfica entre <r> e <rr>, como o de Maia (1997)MAIA, C. de A. História do Galego-Português: Estudo linguístico da Galiza e do Noroeste de Portugal desde o século XIII ao século XVI (Com referência à situação do galego moderno). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, 1997.. Entretanto, não são muitos os estudos que consideram o nível fonológico da língua, determinando se havia um ou dois fonemas róticos na época e, por consequência, se havia a possibilidade de geminação. Ao inserir dois fonemas distintos, /ɾ/ e /ř/, Mattos e Silva (2006, pMATTOS E SILVA, R. V. O português arcaico: fonologia, morfologia e sintaxe. São Paulo: Contexto, 2006., p. 74) considera que havia dois fonemas em oposição, descartando a ocorrência de geminação fonológica. Por sua vez, Massini-Cagliari (2015)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: desvendando a prosódia medieval. São Paulo: Ed. da UNESP Digital, 2015. acata a possibilidade de geminação no PA.

Dadas as discrepâncias de consideração da possibilidade de geminação das róticas na origem latina (dada como certa) e no momento atual (polêmica), um estudo da geminação no PA é estratégico, como ponto histórico medial entre esses momentos históricos.

Corpus

Mongelli (2009)MONGELLI, L. M. Fremosos cantares: Antologia da lírica medieval galego-portuguesa. São Paulo: Martins Fontes, 2009. alega que a obra lírica trovadoresca se diferenciou das demais poesias por possuir uma grande aliança com a música e por estar inserida em uma atmosfera feudal na qual as escolhas temáticas eram bastante restritas. O artista do medievo chegou muito perto de exteriorizar seus estados de espírito, muito embora suas poesias não sejam consideradas como confessionais. Nelas, o indivíduo está dissolvido no geral. Massini-Cagliari (2015)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: desvendando a prosódia medieval. São Paulo: Ed. da UNESP Digital, 2015. pontua que ambas as vertentes das obras arcaicas foram escritas com uma linguagem palaciana, limitada à corte, ainda que se encontrem distantes geográfica e funcionalmente. Nas cantigas profanas, o idioma poético consiste em um uso artístico da língua nativa da população. Já nas religiosas, a língua poética utilizada é o PA, posto que a nobreza acreditava que esse falar (estrangeiro) era mais adequado para louvar as virtudes da Virgem Maria.

As CSM, ao lado do conjunto da lírica profana, constituem um recorte muitíssimo rico das composições realizadas e difundidas por toda a Península Ibérica. Se por um lado as CSM se caracterizam por manifestar a marcante religiosidade da época, por outro, as obras profanas mostram sua enorme representatividade por abarcarem diferentes períodos, lugares, categorias sociais e nacionalidades. O corpus da pesquisa, como se vê, foi pensado visando representar o amplo leque de singularidades da documentação produzida pelos trovadores. Massini-Cagliari (2007)MASSINI-CAGLIARI, G. Cancioneiros Medievais Galego-Portugueses: Fontes, edições e estrutura. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2007. discute que a coletânea profana galego-portuguesa é composta por mais de 1700 obras, cuja autoria é atribuída a cerca de 160 autores. Cabe destacar que muito pouco dessa produção sobreviveu até os dias de hoje, restando só três cancioneiros, nos quais há compilações gerais, e cinco folhas avulsas contendo um ou mais poemas. O cancioneiro religioso, ou mariano, por sua vez, é constituído por 427 CSM e se considera que sua elaboração foi obra do monarca D. Afonso X, de Leão e Castela, e de seus colaboradores.

Mesmo distantes em seis séculos, é possível vislumbrar toda a intimidade, os costumes e a natureza da sociedade medieval por meio da leitura das cantigas profanas, que espelham as especificidades da vida de então. As cantigas de amor, conforme Massini-Cagliari (2007)MASSINI-CAGLIARI, G. Cancioneiros Medievais Galego-Portugueses: Fontes, edições e estrutura. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2007., são aquelas nas quais o trovador se dirige diretamente à dama. Expressam uma submissão cega ou absoluta à amada e seguem um formalismo sentimental. Para Bueno (1968)BUENO, F. da S. Antologia Arcaica: Trechos, em prosa e verso, coligidos em obras do século VIII ao século XVI. São Paulo: Indústria Gráfica Saraiva, 1968., nesse gênero há o predomínio de um meio social cortês ou aristocrático. Caracteriza-se por ser mais culto, sendo destinado à leitura e à recitação dos mais eruditos da época. Lanciani (1993)LANCIANI, G. Cantiga de amor. In: LANCIANI, G.; TAVANI, G. (org.). Dicionário da literatura medieval galega e portuguesa. Lisboa: Caminho, 1993. p.136-138. pondera que esse tipo de poema não se volta a uma mulher real, mas a uma abstração. As cantigas de amigo são mais comprometidas com a dança e com a música e, se comparadas às de amor, são bem mais populares e nacionais. A temática desse gênero gira em torno de uma voz feminina que retrata seu sofrer amoroso pelo amigo, sua saudade e aflição devido à sua ausência, sua reclamação e lamento pelos obstáculos impostos pela mãe de ver o amado e mesmo seu agradecimento a ela pela ajuda e compreensão. Essas cantigas são escritas por homens, apesar de aparecerem sob a fala de uma mulher.

As cantigas de escárnio e maldizer, por fim, abrangem não só sátiras morais, literárias e políticas, mas também maledicências pessoais, tensões, prantos e paródias. Massini-Cagliari (2007)MASSINI-CAGLIARI, G. Cancioneiros Medievais Galego-Portugueses: Fontes, edições e estrutura. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2007. salienta que ambas as obras foram escritas com a finalidade de falar mal de alguém, no entanto, nas cantigas de escárnio isso se dava de maneira coberta, ambígua, e nas de maldizer de modo descoberto, direto, sem disfarces. Como consequência ao emprego de várias palavras cobertas, de significação dúbia, esse tipo de cantiga, com relação à forma, não era tão popular e se aproximava dos gêneros vistos como mais eruditos. Mongelli (2009)MONGELLI, L. M. Fremosos cantares: Antologia da lírica medieval galego-portuguesa. São Paulo: Martins Fontes, 2009. argumenta que esses cantares, além de referenciarem personagens, locais e situações concretas, fornecendo um rico panorama do cotidiano da população da Idade Média, ganharam um significativo prestígio por conterem nuances do cômico.

No que se refere aos cantares marianos, Leão (2007)LEÃO, Â. V. Cantigas de Santa Maria de Afonso X, o sábio: Aspectos culturais literários. São Paulo: Linear B; Belo Horizonte: Veredas & Cenários, 2007. e Massini-Cagliari (2015)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: desvendando a prosódia medieval. São Paulo: Ed. da UNESP Digital, 2015. alegam que a coletânea foi realizada na segunda metade do século XIII e que, se seu autor não fosse o rei, ela nunca chegaria a existir, porque sua condição régia forneceu os meios necessários para executar tão luxuoso feito. Para Leão (2007)LEÃO, Â. V. Cantigas de Santa Maria de Afonso X, o sábio: Aspectos culturais literários. São Paulo: Linear B; Belo Horizonte: Veredas & Cenários, 2007., o próprio monarca compôs e traduziu um grande número de textos, contudo, delegou a maioria da produção a seus colaboradores, que, segundo Parkinson (1998)PARKINSON, S. As Cantigas de Santa Maria: estado das cuestións textuais. Vigo: Anuario de estudios literarios galegos, 1998., só poderiam ter sido os trovadores conhecidos daquele período. Apesar dos esforços dos pesquisadores, ainda há dúvidas sobre quais deles, dentre tantos, fizeram parte da equipe do rei. Filgueira Valverde (1985)FILGUEIRA VALVERDE, J. Introducción. In: ALFONSO X EL SABIO. Cantigas de Santa María: Códice Rico de El Escorial. Madri: Castalia, 1985. p.XI-LXIII. pondera que o trabalho coletivo que marca as CSM é revelado pelo uso de determinados versos, como: quero que seja colocado, relativo à inclusão de um milagre na coletânea (CSM 219), e ordenéi que se escrevera, trecho detectado na CSM 295. É importante ressaltar que o idioma materno de D. Afonso X era o castelhano, embora as CSM tenham sido redigidas em galego-português, língua apreciada na fase trovadoresca como sendo mais apropriada à prática artística.

As CSM podem ser de dois tipos: de milagre e de louvor. Mongelli (2009)MONGELLI, L. M. Fremosos cantares: Antologia da lírica medieval galego-portuguesa. São Paulo: Martins Fontes, 2009. declara que o rei organizou a coletânea religiosa em formato de rosário, uma vez que a cada dez narrativas de milagre acrescentou uma de louvor. As cantigas de milagre são conhecidas por contarem as intervenções da Virgem Maria em favor de seus fiéis em diversos ambientes. As de louvor são mais subjetivas e narram os louvores de D. Afonso X, que enaltece de forma contemplativa as virtudes e a beleza da Santa. Cabe enfatizar que as cantigas da vertente religiosa possuem uma temática circular, visto que seu foco sempre acaba retornando para a imagem da mãe de Deus, que é retratada como indulgente advogada junto do seu filho (BERTOLUCCI PIZZORUSSO, 1993BERTOLUCCI PIZZORUSSO, V. Cantigas de Santa Maria. In: LANCIANI, G.; TAVANI, G. (org.). Dicionário da literatura medieval galega e portuguesa. Lisboa: Caminho, 1993. p.142-146.). Castro (2006)CASTRO, B. M. As Cantigas de Santa Maria: Um estilo gótico na lírica ibérica medieval. Niterói: EdUFF, 2006. discute que a ideologia da obra se apoia na ideia de que o reino de Leão e Castela era abençoado, bem como seu governante.

Procedimentos metodológicos

Para determinar a possibilidade de geminação das consoantes róticas em posição intervocálica no PA, há que se considerar evidências provenientes de três níveis distintos de análise, que se correlacionam, porém: gráfico, fonético e fonológico. Todos esses níveis podem trazer pistas da ocorrência (ou não) da geminação das róticas; entretanto, as pistas advindas de nenhum desses níveis, isoladamente, pode se constituir na palavra final quanto à questão.

No nível gráfico, serão observadas as variações de representação entre <r> e <rr>, já comprovadas como possíveis naquele momento histórico (MAIA, 1997MAIA, C. de A. História do Galego-Português: Estudo linguístico da Galiza e do Noroeste de Portugal desde o século XIII ao século XVI (Com referência à situação do galego moderno). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, 1997.), mas que podem se constituir, em casos específicos, apenas como erros de cópia. Assim, foi empreendida a verificação de todos os ambientes em que ocorre <rr> duplo no interior do vocábulo, assim como os diferentes tipos de alternância identificados nos fólios dos cancioneiros. Foi mapeado se a ocorrência de variação se dá no interior de uma mesma cantiga ou se em cantigas e/ou códices diferentes.

A ocorrência da variação gráfica e a observação da posição em que ocorre o grafema mapeado na sílaba trazem evidências da realização fonética e da função fonológica da rótica observada. Porém, para a determinação do status fonológico como de simples ou geminada, é crucial a observação do comportamento do contexto fonológico da rótica (por exemplo, se ocorrem ditongos ou consoantes nasais na sílaba anterior). É a confluência de pistas advindas desses três níveis, que se inter-relacionam mas não se confundem, que poderá apontar para uma conclusão mais segura quanto à possibilidade de geminação da rótica no PA. Desta maneira, há que se considerar que tanto a constatação da variação gráfica quanto a verificação de variação na pronúncia (como ocorre até hoje no PB e no PE), isoladamente, não levam a uma conclusão automática quanto à geminação, uma vez que a consideração do comportamento da rótica dentro da sílaba e seu relacionamento com as sílabas do entorno são cruciais, porque o que se está buscando é uma resposta quanto ao sistema fonológico da língua na época.

Assim sendo, o primeiro passo metodológico foi a coleta de todas as palavras grafadas com róticas no corpus. Os vocábulos localizados foram agrupados por cantiga e por gênero, e sistematizados em quadros classificatórios, nos quais se analisou a ocorrência dos referidos segmentos de acordo com sua posição na sílaba e na palavra. O contexto preenchido na unidade silábica é determinante para o tipo de realização da consoante. Desta maneira, os casos de rótica duplicada na grafia foram confrontados em distintos ambientes, como ataque e coda.

Para classificar as consoantes duplas como simples ou geminadas, no nível fonológico, o contexto relevante considerado é sua ocorrência em começo de sílaba e meio de palavra. No vocábulo acorrer (CSM 36), por exemplo, a vibrante <rr> inicia a terceira sílaba e preenche o centro da palavra, ambiente que se configura como ideal para que possamos descobrir se essas consoantes do PA ocupam, ao mesmo tempo, a coda da primeira sílaba, travando-a, e o ataque da sílaba subsequente, na qual se concretiza foneticamente. O contexto de travamento silábico consiste em um dos pontos principais da análise que ora se propõe, pois o comportamento dos segmentos róticos nessa posição pode revelar se havia ou não oposição fonológica entre <r> e <rr> no período arcaico da língua portuguesa.

Após o mapeamento das cantigas, os dados foram examinados qualitativamente, tendo como embasamento o instrumental fornecido pelas teorias fonológicas não-lineares. Embora o estudo em questão compreenda um trabalho histórico, não objetiva o desenvolvimento de uma análise diacrônica da língua, mas se volta à realização de uma caracterização sincrônica de um momento do passado (MATTOS E SILVA, 1989MATTOS E SILVA, R. V. Estruturas trecentistas: elementos para uma gramática do Português Arcaico. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1989.). Dentro da perspectiva defendida, nenhuma ocorrência pode ser desconsiderada, na medida em que até mesmo um único dado de variação pode trazer pistas importantes sobre os limites entre as possibilidades e as impossibilidades do léxico, que nunca se esgotam, visto que o sistema linguístico de qualquer língua viva é dotado de uma dinamicidade contínua.

Breves considerações sobre os conceitos de sílaba e de geminação

O estudo empreendido é norteado pelos modelos fonológicos não-lineares, em especial as teorias métrica e autossegmental. Por meio de um recorte dos aspectos mais importantes de tais abordagens, que vêm sendo usadas com o objetivo de chegar a generalizações nas línguas, refletimos acerca da unidade silábica e do fenômeno de geminação. É necessário salientar que nossa intenção não foi concluir qualquer discussão a respeito da temática, mas sim fornecer ao leitor um panorama geral das questões pertinentes ao presente trabalho.

A sílaba não foi profundamente analisada nos primeiros estudos da Fonologia Gerativa Padrão, pois as palavras eram entendidas como sequências lineares de consoantes e vogais, ou seja, não havia uma caracterização dos pontos mais profundos da estrutura silábica, como tom e acento. No entanto, quando as Fonologias não-lineares surgiram, houve um aprofundamento dessas pesquisas, fato que conduziu a uma nova representação da sílaba. Segundo Collischonn (2005)COLLISCHONN, G. A sílaba em português. In: BISOL, L. (org.). Introdução a estudos de fonologia do português brasileiro. 4. ed. rev. e ampl. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2005. p.101-129., a Fonologia Autossegmental prevê que a organização interna da sílaba é composta por camadas independentes, uma das quais representa as sílabas, que estão unidas diretamente aos segmentos. Logo, a relação que se estabelece entre os elementos é igual. Alves (2017)ALVES, U. K. Teoria da Sílaba. In: HORA, D.; MATZENAUER, C. L. (org.). Fonologia, fonologias: uma introdução. São Paulo: Contexto, 2017. p.125-140. destaca que, nessa teoria, a unidade silábica se define pela ausência de uma hierarquia interna entre os elementos que a constituem. O modelo teórico, assim, pressupõe que a estrutura da sílaba está ordenada unicamente sobre a camada CV, isto é, cada contexto disponível se associa a uma ou mais regiões dessa camada, de modo linear.

Na Fonologia Métrica, ao contrário, os segmentos que formam a unidade silábica estão estruturados hierarquicamente. Desta forma, a sílaba compreende um ataque (A) ou onset (O), e uma rima (R), que integra um núcleo (Nu) e uma coda (Co). Qualquer posição, com exceção do núcleo, pode ser vazia. Essa proposta segue Selkirk (1982)SELKIRK, E. The Syllable. In: HULST, H.; SMITH, N. (org.). The structure of phonological representations (part. II). Dordrecht: Foris, 1982. p.337-383., que calcula um relacionamento muito mais estreito entre a vogal que preenche o núcleo e a consoante que está na coda do que entre essa vogal e a consoante que ocupa o onset. Isto posto, a representação da autora garante uma maior inter-relação entre as unidades do núcleo e da coda. A organização interna pensada por Selkirk (1982)SELKIRK, E. The Syllable. In: HULST, H.; SMITH, N. (org.). The structure of phonological representations (part. II). Dordrecht: Foris, 1982. p.337-383. faz com que seja possível aplicar certas regras fonológicas em constituintes específicos da sílaba, sem que seja necessário abranger a sílaba inteira. O agrupamento pico + coda em um constituinte é visto por Selkirk (1982)SELKIRK, E. The Syllable. In: HULST, H.; SMITH, N. (org.). The structure of phonological representations (part. II). Dordrecht: Foris, 1982. p.337-383. como um aspecto universal, que engloba a composição de todas as línguas, independente de seu molde silábico.

Vários pesquisadores da área se dedicaram ao estudo do modelo ataque-rima, que vê a sílaba como uma combinação de três partes: o ambiente nuclear é sempre ocupado por vogal e é indispensável em português. As outras duas partes são periféricas e opcionais, sendo o onset e a coda preenchidos por consoantes e podendo figurar no início ou no interior do vocábulo de maneira simples ou ramificada. De acordo com Alves (2017)ALVES, U. K. Teoria da Sílaba. In: HORA, D.; MATZENAUER, C. L. (org.). Fonologia, fonologias: uma introdução. São Paulo: Contexto, 2017. p.125-140., a posição assumida pelos segmentos vocálicos e consonânticos na unidade silábica determina o seu caráter distintivo ou alofônico. Em vista disso, a discussão do status fonológico do elemento, dentro de um sistema linguístico, não pode estar desvinculada de considerações sobre a estrutura da sílaba da língua focalizada. Afinal, como menciona Massini-Cagliari (1992)MASSINI-CAGLIARI, G. Acento e ritmo. São Paulo: Contexto, 1992., a sílaba consiste em uma unidade fundamental da Fonologia dos idiomas, sendo um domínio no qual se dá a aplicação de vários fenômenos fonológicos. É, com efeito, compreendida como sendo uma organização essencial, basilar (BISOL, 1999BISOL, L. A sílaba e seus constituintes. In: NEVES, M. H. M. (org.). Gramática do Português Falado. São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP; Campinas: Ed. da UNICAMP, 1999. v.7. p.701-742.).

Em diversos falares do mundo há a diferenciação entre sílabas leves e pesadas, sendo a composição da sílaba um fator decisivo para o peso ou quantidade silábica. As sílabas pesadas são aquelas em que mais de um elemento ocupa a rima. Então, sílabas constituídas apenas por vogais são leves. Collischonn (2005)COLLISCHONN, G. A sílaba em português. In: BISOL, L. (org.). Introdução a estudos de fonologia do português brasileiro. 4. ed. rev. e ampl. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2005. p.101-129. explica que a posição de ataque é irrelevante para o peso da sílaba, isto é, ataques ramificados não fazem com que a sílaba seja entendida como pesada. Em prêmio, por exemplo, prê é uma sílaba leve, embora possua três elementos. Como se vê, o fato de uma unidade silábica conter mais de dois segmentos não institui que ela seja pesada, já que o peso é determinado por sua estruturação interna e não pela quantidade de elementos que ela pode ou não comportar.

Hyman (1975)HYMAN, L. M. Phonology: theory and analysis. New York: Holt, Rinehart and Winston, 1975. pontua que as sílabas consistem em unidades de peso, tradicionalmente conhecidas como moras (μ). Essa proposta defende que uma sílaba pesada contém duas moras e uma leve, uma mora. Segundo Massini-Cagliari (1999)MASSINI-CAGLIARI, G. Do poético ao lingüístico no ritmo dos trovadores: três momentos da história do acento. São Paulo: Cultura Acadêmica, 1999., sílabas CVV são sempre bimoraicas ou pesadas. Já o peso das sílabas CVC varia de acordo com os distintos falares: as línguas que contam os elementos do núcleo a consideram monomoraica e as que somam os segmentos que preenchem a rima (núcleo + coda) a julgam como bimoraica. O estudo da abordagem moraica se revela primordial, dado que oferece um tratamento para as consoantes geminadas. Na teoria das moras, um segmento longo é representado como duplamente associado e um simples, com uma única linha de associação. A consoante do tipo geminada tem uma mora na subjacência e se agrega, ao mesmo tempo, à coda e ao onset. A quantidade silábica é considerada como uma oposição binária, sendo μμ o máximo de moras que uma sílaba pode portar. Mesmo se alguma consoante estiver atrelada a sílabas CVC ou CVV, ela é integrada à última mora e não fornece mais peso à sílaba. Collischonn (2005)COLLISCHONN, G. A sílaba em português. In: BISOL, L. (org.). Introdução a estudos de fonologia do português brasileiro. 4. ed. rev. e ampl. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2005. p.101-129. expõe que a abordagem em questão concebe a duração como uma propriedade independente das outras características do elemento. Ademais, quando um segmento é apagado em decorrência de uma regra fonológica, sua duração pode se manter intacta e ser reassociada a outro elemento que está nas imediações. O referido processo ocorre em numerosas línguas e é chamado de alongamento compensatório.

No tocante à geminação, Goldsmith (1990)GOLDSMITH, J. A. Autosegmental & metrical phonology. Oxford: Blackwell, 1990. esclarece que, se duas consoantes idênticas aparecem entre vogais, no ambiente intervocálico, elas pertencem a duas sílabas separadas, ou seja, o primeiro elemento forma a coda da sílaba da esquerda e o segundo, o onset da sílaba da direita. Massini-Cagliari (2015)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: desvendando a prosódia medieval. São Paulo: Ed. da UNESP Digital, 2015. nota que as róticas duplas são entendidas como complexas em PB, já que a distribuição de <rr> integra duas posições dentro da estrutura interna da sílaba. O estudo da geminação está bastante vinculado aos postulados da abordagem moraica, tendo em vista que o peso e o contexto dos segmentos no interior do constituinte silábico se manifestam determinantes. Relaciona-se também à duração silábica, da perspectiva fonética da língua. Tal duração não se mostra pertinente para diferenciar fonemas em português, mas isso não a torna irrelevante. Conforme Massini-Cagliari (1992)MASSINI-CAGLIARI, G. Acento e ritmo. São Paulo: Contexto, 1992., os falantes são capazes de atribuir uma grande quantidade de durações às sílabas quando proferem enunciados em interações sociais, sendo a principal motivação disso o acento.

Sobre o peso das geminadas, têm-se que elas carregam apenas uma mora, uma vez que uma parte da consoante se encontra na coda da sílaba antecedente e a outra, no onset da sílaba em que se realiza foneticamente; e o onset não porta mora, não contribuindo, pois, para o peso da sílaba (PERLMUTTER, 1995PERLMUTTER, D. Phonological Quantity and Multiple Association. In: GOLDSMITH, J. A. (ed.). The handbook of Phonological Theory. Oxford, UK: Blackwell, 1995. p.307-317.). Goldsmith (1990)GOLDSMITH, J. A. Autosegmental & metrical phonology. Oxford: Blackwell, 1990. exibe que há dois tipos de geminadas: as verdadeiras, multiplamente associadas, que se constituem dentro de um morfema simples; e as falsas, que são resultado da combinação de dois segmentos equivalentes, pois se localizam em morfemas diferentes. Desta maneira, as falsas geminadas podem ser tidas como a justaposição acidental de traços iguais, à proporção que as verdadeiras consistem na associação sistemática delas mesmas. É preciso ponderar que somente as geminadas consideradas verdadeiras podem ser empregadas na análise da duração.

Cedeño e Morales-Front (1999)CEDEÑO, R. A. N.; MORALES-FRONT, A. Fonologia generativa contemporánea de la lengua española. Washington, DC: Georgetown University Press, 1999. determinam que as consoantes geminadas portam duas propriedades fonológicas: integridade e inalterabilidade. Esses elementos se caracterizam pela resistência aos embates de processos linguísticos que poderiam se aplicar a eles. Sendo assim, não é possível separá-los por regras de epêntese, dado que violaria sua integridade. Tampouco há a possibilidade de alterar apenas uma de suas partes, fato que representaria uma infração ao princípio de inalterabilidade. A adição de uma vogal epentética no meio de uma geminada faz com que haja o cruzamento de linhas associadas, o que acarreta agramaticalidades. Perlmutter (1995)PERLMUTTER, D. Phonological Quantity and Multiple Association. In: GOLDSMITH, J. A. (ed.). The handbook of Phonological Theory. Oxford, UK: Blackwell, 1995. p.307-317. acredita que não é possível introduzir um ou mais elementos no interior das geminadas intervocálicas, uma vez que são um único segmento consonantal que vale por dois. Dentro das teorias não-lineares, o jeito mais correto de reproduzir consoantes desse tipo e vogais longas é por intermédio da múltipla associação.

A variação nos cancioneiros medievais

Como mostra Mattos e Silva (2006MATTOS E SILVA, R. V. O português arcaico: fonologia, morfologia e sintaxe. São Paulo: Contexto, 2006., p. 43), sobre o período medieval do português, não sobreviveram “reflexões de gramáticos” e “outros tipos de textos em que transpareçam comentários sobre os usos linguísticos”, sendo a documentação remanescente caracterizada pela variação gráfica, uma vez que ainda não estava estabelecida uma norma padrão. Huber (1986HUBER, J. Gramática do português antigo. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1986. Primeira edição alemã de 1933. [1933]) comenta que, apesar da diversidade de representações gráficas que caracterizava o PA, o idioma se mostrava uniforme no conjunto, ressaltando que a oscilação gráfica também era percebida na escolha da pontuação, que aparecia de forma bastante heterogênea nos cancioneiros.

Da perspectiva de quem decifra a escrita da obra, podem ocorrer dificuldades de delimitação gráfica entre as letras. Nas palavras em que os grafemas vocálicos <i> e <u> estavam lado a lado, por exemplo, havia muita dificuldade de segmentação na leitura, fato que causou a necessidade de se acrescentar pingos nos Is. No que diz respeito à pontuação, os copistas daquela época não a transcreviam, mas introduziam uma ou outra quando achavam oportuno. Embora não existisse ainda um sistema de regras ortográficas preestabelecidas durante o século XIII, é evidente que os escribas e autores refletiam sobre a língua de então e redigiam conforme alguns parâmetros gerais. Existiam, inclusive, determinados padrões e usos gráficos próprios de cada scriptorium do medievo. No transcorrer do processo de realização das composições, um grande número de traços estilísticos individuais se perdiam em virtude da existência de modelos específicos, que eram seguidos com a finalidade de uniformizar a escrita utilizada pela equipe de profissionais. Diante do exposto, Parkinson (1998)PARKINSON, S. As Cantigas de Santa Maria: estado das cuestións textuais. Vigo: Anuario de estudios literarios galegos, 1998. desconfia que as indicações de autoria localizadas nas cantigas são meras convenções literárias.

Os critérios adotados pelos copistas e escritores do período arcaico eram determinados por uma consciência do usuário sobre seu próprio sistema linguístico. Por vezes, a variação de uma forma se dá em decorrência de uma preferência estilística do compositor. A esse respeito, Massini-Cagliari (2015)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: desvendando a prosódia medieval. São Paulo: Ed. da UNESP Digital, 2015. defende que as variações resultantes de uma seleção embasada no estilo devem ser consideradas situações de desvio, pois o falante, depois de avaliar todas as opções lexicais disponíveis com base na hierarquia de restrições do idioma, resolve suspender conscientemente esse julgamento para, então, adotar um outro, a fim de promover o efeito que ele, com pretensões artísticas, deseja obter. Em vista disso, o uso de uma forma e não de outra pode ter sido motivado por distintos fatores, dentre eles o estilo assumido pelo escriba ou pelo trovador/jogral na criação da obra, com o objetivo de refinar seu ofício mediante inovações na linguagem literária escolhida.

Muito se discute sobre a possibilidade de se conseguir vestígios da variedade falada no passado de uma língua, da qual não se tem registros orais, empregando como recurso os textos escritos remanescentes daquela fase da história. No presente estudo, acreditamos que o fato de não existir ainda uma norma padronizada em PA favoreceu a reprodução de singularidades da linguagem falada nos documentos escritos. Sobre o assunto em questão, Mattos e Silva (2006)MATTOS E SILVA, R. V. O português arcaico: fonologia, morfologia e sintaxe. São Paulo: Contexto, 2006. argumenta que a ausência de um controle gramatical acabou resultando em variações frequentes, que refletem alguns dos usos do idioma. Para a autora, o que está escrito espelha a voz do passado e “esta nos fala”, embora não integralmente, de seu “uso primeiro”. Logo, o ato de analisar a variação nos cancioneiros fornece inúmeras pistas para alguma percepção das vozes que eram pronunciadas na antiguidade.

Cabe destacar que a documentação escrita do PA se define não apenas por alternâncias na escrita, mas também na morfologia e na sintaxe. Mattos e Silva (2006)MATTOS E SILVA, R. V. O português arcaico: fonologia, morfologia e sintaxe. São Paulo: Contexto, 2006. alega que, por intermédio da variação gráfica, podem-se inferir sinais das realizações fônicas coexistentes no passado do idioma, enquanto pelas alterações morfológicas e sintáticas podem ser constatadas possibilidades estruturais em uso no período, que são indicadores para mudanças que vieram a ocorrer e que, a partir da normatização gramatical, as obras escritas passam a omitir, já que só uma parte das variações existentes é eleita para compor o sistema ortográfico das línguas. Isto posto, os textos remanescentes do século XIII são um significativo subsídio para compreender e analisar o idioma utilizado cotidianamente na sociedade trovadoresca, apesar das numerosas limitações e dificuldades inevitavelmente impostas no decurso do processo de transferência da produção oral para o registro escrito.

Levantamento dos dados

Como mencionado, o trabalho aqui empreendido visa trazer novas informações sobre o estatuto fonológico das consoantes róticas no PA, colaborando para a consolidação de um mosaico fonológico das realizações do idioma da Idade Média. Para tanto, coletou-se uma amostragem de 672 ocorrências de <rr> no corpus examinado. Cabe reforçar que todos os dados foram organizados segundo o ambiente ocupado dentro da sílaba e da palavra.

Tabela 1 Mapeamento do grafema <rr> quanto à posição em que se encontra na sílaba.

Posição na sílaba <rr>
Começo 672 (100%)
Meio -
Final -
Fonte: Elaboração própria.

Tabela 2 Mapeamento do grafema <rr> quanto à posição em que se encontra na palavra.

Posição na palavra <rr>
Começo 45 (6,7%)
Meio 627 (93,3%)
Final -
Fonte: Elaboração própria.

A totalidade de ocorrências de <rr> apareceu em começo de sílaba e predominantemente no meio da palavra, o que pode indicar que o segmento representado por esse grafema específico era uma geminada, que preenche, ao mesmo tempo, a coda da sílaba anterior, fechando-a, e o onset da seguinte. Na tabela 2, vemos que 93,3% dessas consoantes figuram no contexto intervocálico, posição ideal para se ter uma geminação. O mapeamento dos códices medievais evidenciou uma variedade de formas gráficas, que divergem não somente de um cancioneiro para outro, mas também no interior de cada compilação. Dentro de determinadas cantigas, uma palavra pode manifestar mais de uma escrita, vestígios de um período em que ainda não existia uma norma ortográfica instituída por lei. Embora haja diferentes tipos de variação no corpus, focalizamos, neste artigo, na variação RR-IR-YR, visando tornar nossa argumentação viável, do ponto de vista prático. Ademais, foi preciso realizar um recorte para evitar repetições. Deste modo, o quadro 1 expõe somente uma pequena parcela das variações apuradas.

O quadro 1 expressa que esse tipo de variação pode acontecer dentro de um paradigma verbal (morrer/moirer/moiro/moire/moira etc.), em verbos e em substantivos (guerra/gueira). Os termos correola/coyreola se referem a um antropônimo utilizado por Airas Pérez Vuitoron em um de seus poemas. A variação IR-YR se dá copiosamente nos dados e se configura como uma alteração gráfica, pois no século XIII <i> e <y> eram empregados de forma alternada por questões estilísticas. Assim, espelham um mesmo som e não causam mudanças de significado na palavra. Eventualmente, quando algum vocábulo ocorre mais de uma vez em uma obra, ele pode estar escrito de distintas maneiras, ora com <i>, ora com <y>, o que reitera a diversidade marcante das produções da era arcaica.

Quadro 1
Variação RR-IR-YR.

Análise dos dados de variação

Nesta seção, apresentaremos uma interpretação fonológica dos dados mapeados e verificaremos de que modo o material analisado confirma ou não a existência do fenômeno de geminação. Somenzari (2006)SOMENZARI, T. Estudo da possibilidade de geminação em português arcaico. 200f. Dissertação (Mestrado em Linguística e Língua Portuguesa) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2006., ao investigar quais as possibilidades de geminação no decorrer da fase medieval do português, promoveu um estudo das consoantes duplas presentes na lírica galego-portuguesa. Para a autora, o recurso à grafia duplicada para os segmentos consonantais não representa uma marca de geminação, em quase todas as ocorrências. O único caso no qual atribui status de geminada é o de <rr> entre vogais; as outras consoantes duplas, bem como os dados de <rr> em início de vocábulo e em ataque de sílaba depois de consoante, consistem em elementos simples, do ponto de vista fonológico da língua. O argumento eleito por Somenzari (2006)SOMENZARI, T. Estudo da possibilidade de geminação em português arcaico. 200f. Dissertação (Mestrado em Linguística e Língua Portuguesa) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2006. para advogar em favor da presença da geminação intervocálica da vibrante dobrada em PA se fundamenta na variação RR-IR-YR.

O conceito de peso silábico se mostra importante para a explicação dessa variação, que tão amplamente abrange os dados da nossa pesquisa e as ocorrências retratadas no trabalho de Somenzari (2006)SOMENZARI, T. Estudo da possibilidade de geminação em português arcaico. 200f. Dissertação (Mestrado em Linguística e Língua Portuguesa) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2006.. O ditongo (vogal + i/y) ocupa duas posições na rima, uma no núcleo e uma na coda, formando uma sílaba pesada. Para que a sílaba inicial dos vocábulos (morrer, erra, e assim por diante) conserve o mesmo peso silábico da primeira sílaba dos termos com variação (moirer, eyra) é necessário que <rr> seja interpretado como geminado. Assim, a semivogal do ditongo completa a coda da sílaba, ambiente também ocupado por parte da consoante dobrada nos termos sem variação. Ao analisarmos <rr> como geminado, mantém-se a correspondência entre as palavras grafadas com <ir>/<yr> e com <rr>.

Essa discussão demonstra que <rr> intervocálico integra duas posições na organização interna da sílaba, uma na coda da primeira sílaba, travando-a, e outra no contexto de ataque da unidade silábica consecutiva. Logo, a premissa adotada considera que o sistema fonológico do PA era ainda semelhante ao do latim, diferenciando-se do atual. É significativo ressaltar que a consideração de uma geminada é a única possibilidade capaz de elucidar a variação localizada por nós e por Somenzari (2006)SOMENZARI, T. Estudo da possibilidade de geminação em português arcaico. 200f. Dissertação (Mestrado em Linguística e Língua Portuguesa) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2006., em que o encadeamento de dois sons diferentes (uma vogal + uma vibrante escrita como <r>) se equivale em quantidade (uma mora, licenciada pela coda) e em função a uma consoante dupla <rr>.

Esse fato não implica que, necessariamente, houvesse somente um som (= fone) rótico em PA. O que a consideração da geminação na posição intervocálica demonstra é que, mesmo havendo dois fones róticos (o tepe [ɾ] e a vibrante múltipla [r], como há até hoje em português europeu), eles não estavam em oposição fonológica e simbolizavam a produção de um mesmo fonema da língua. Essa hipótese foi primeiramente pensada para o PB e para o PE por Câmara Junior (1953) e representa uma continuação ao sistema do latim, no qual havia apenas um fonema rótico, que podia ser geminado. Abaurre e Sandalo (2003)ABAURRE, M. B. M.; SANDALO, M. F. S. Os róticos revisitados. In: HORA, D.; COLLISCHONN, G. (org.). Teoria Linguística: Fonologia e outros temas. João Pessoa: Editora Universitária, 2003. p.144-180. alegam que as realizações fricativas e retroflexas produzidas na atualidade, ao lado do tepe e da vibrante, são novidades na história do idioma falado hoje no Brasil.

Figura 1
Variação erra/eyra.

(1)

As planilhas silábicas apresentadas em 1 exibem o que foi constatado até aqui: como erra e eyra consistem na representação de uma mesma palavra, a quantidade das sílabas tende a se igualar nos dois termos. Não é algo automático; o fenômeno manifesta maior naturalidade quando se mantém o mesmo número de moras. O ditongo ey transforma em pesada a primeira sílaba de eyra, com duas moras subjacentes. Já a segunda sílaba do vocábulo é leve, pois porta uma mora, já que o onset não contribui para a quantidade moraica. Desta forma, para que haja equivalência entre erra e eyra, <rr> se reparte e ocupa dois ambientes na estrutura da sílaba, a coda e o onset. Com isso, a sílaba inicial de erra é fechada pela consoante rótica <r> e passa a ser pesada, com rima ramificada. A sílaba seguinte se iguala em peso e em configuração CV à última sílaba da palavra eyra, ambas preservando somente uma unidade de peso no interior do contexto nuclear ou central.

Michaëlis de Vasconcelos (1946)MICHAËLIS DE VASCONCELOS, C. Lições de filologia portuguesa (segundo as predileções feitas aos cursos de 1911/12 e de 1912/13): seguidas das lições práticas de português arcaico. Lisboa: Editorial Império Limitada, 1946. [Revista: Ocidente]. confirma, por meio de uma breve passagem em que tece algumas ponderações sobre o percurso da língua portuguesa, a existência da variação RR-IR-YR. Os trabalhos históricos de Câmara Junior, assim como os estudos desenvolvidos antes dele por filólogos, já testemunhavam isso.

Se os galego-portugueses diziam, por ex.: moiro, cômio, e coimo, dôrmio, arço, perço, menço, senço, – porque tais são os representantes fonèticamente exactos de morio – (por morior) comedo, ardeo, perdeo, mentio, sentio – os pósteros preferiram tirar dos infinitivos morrer, comer, dormir, arder, mentir, sentir, os presentes regulares ou analógicos morro, como, durmo, ardo, minto, sinto (MICHAËLIS DE VASCONCELOS, 1946MICHAËLIS DE VASCONCELOS, C. Lições de filologia portuguesa (segundo as predileções feitas aos cursos de 1911/12 e de 1912/13): seguidas das lições práticas de português arcaico. Lisboa: Editorial Império Limitada, 1946. [Revista: Ocidente]., p.16).

O que essa citação exemplifica é que, na origem, <rr> era derivado de um <r> e de um <i>, ou seja, havia duas moras em sua estrutura. A consideração da presença de duas moras na primeira sílaba de morrer, nos primórdios de sua constituição enquanto palavra pertencente ao português, determina que, já naquela fase da história, a rótica dupla entre vogais ocupava dois contextos na organização da unidade silábica e colaborava com o seu peso. Convém explicitar que, embora a autora afirme que a escrita do medievo era fonética, assumimos a concepção de Massini-Cagliari (1998)MASSINI-CAGLIARI, G. Escrita do Cancioneiro da Biblioteca Nacional de Lisboa: fonética ou ortográfica? Filologia e Linguística Portuguesa, São Paulo, n.2, p.159-178, 1998., que tece um conjunto de argumentos que comprovam que a grafia do PA não pode ser ponderada como uma transcrição fiel dos sons da fala, ainda que traga alguns indícios confiáveis da pronúncia de então.

É interessante observar que a substituição de um ditongo por uma consoante rótica não é um fenômeno exclusivo do passado do idioma. Casos semelhantes ao descrito por Michaëlis de Vasconcelos (1946)MICHAËLIS DE VASCONCELOS, C. Lições de filologia portuguesa (segundo as predileções feitas aos cursos de 1911/12 e de 1912/13): seguidas das lições práticas de português arcaico. Lisboa: Editorial Império Limitada, 1946. [Revista: Ocidente]. podem ser encontrados nos dias de hoje, que é o que ocorre na palavra besouro. Embora sua representação ortográfica tenha um ditongo (ou), ele tende a desaparecer durante sua realização fonética. Desta forma, pode-se estabelecer uma comparação entre essas variações, pois, apesar da distância temporal que separa tais ocorrências, elas dizem respeito ao mesmo processo linguístico.

Nos termos besouro e moirer temos um ditongo que confere peso à sílaba e uma rótica simples que se segue. Nas duas palavras, o ditongo cede lugar a uma vibrante. De acordo com Wetzels (2000)WETZELS, W. L. Consoantes palatais como geminadas fonológicas no português brasileiro. Revista de Estudos da Linguagem, Belo Horizonte, v.9, n.2, p.5-15, jul./dez. 2000., as geminadas nunca são antecedidas por ditongo em PB, pois a coda da sílaba inicial deve estar vazia para poder abrigar parte do segmento. Diante disso, o desaparecimento do ditongo viabiliza o surgimento de outra produção para a rótica que o acompanha, que passa de um tepe para uma vibrante. A realização fonética de besouro pode, ainda, manter o tepe em certas variedades faladas em PB, todavia, o ditongo não se conserva na maioria dos casos. Em 2, exibimos algumas das pronúncias possíveis do termo:

(2)

Besouro:

[bi’zoʊ̭ɾu], [bi’zoɾu], [bi’zohu], [bi’zoxu], [bi’zoɦu] etc.

Os dados de variação da vogal pretônica, que ora se realiza como [e], ora como [i], não foram indicados em decorrência de esse não ser nosso foco. O que os exemplos expressam é a não co-ocorrência do ditongo com uma vibrante, isto é, não há *besourro na fala do PB, embora haja besorro, o que reforça a possibilidade da presença da geminação intervocálica no período trovadoresco, visto que, segundo argumenta Câmara Junior (1985[1970]), depois de ditongo só é possível ocorrer um elemento simples, entre as consoantes róticas.

As palavras omrado/onrrado, valredes/valrredes, salrá/salrrá, nas quais a rótica dupla figura após sílaba pesada, expõem um contra-argumento para a consideração da geminação no PA, contudo, também apontam para soluções que resolvem o impasse. Como demonstrado, os códices não apresentam de forma categórica a configuração gráfica dos vocábulos, que variam constantemente na escolha das consoantes simples e dobradas. Logo, o fato de um termo estar escrito com <rr> não significa que, da perspectiva fonológica, esse grafema represente /rr/. As variações encontradas tornam possível alegar que essas alterações ocorrem exclusivamente no nível da escrita, ou seja, a rótica duplicada pode ser considerada como uma consoante simples fonologicamente. A título de exemplo, ilustramos abaixo a alternância omrado/onrrado, a fim de fundamentar nossa argumentação.

Figura 2
Omrado.

Figura 3
Onrrado.

A posição favorável para a ocorrência de geminadas consiste em uma sílaba aberta CV ou V antes de <rr>. Nas palavras destacadas, a coda antecedente está preenchida por um outro elemento consonantal, que não <r>, por isso se definem como ocorrências que caminham para o sentido oposto do defendido por nós. O contexto precedente e a estrutura silábica se revelam essenciais para a constatação ou não da geminação da rótica em PA, uma vez que determinam a possibilidade de essa consoante se comportar como complexa. Como o português não possui uma gramática medieval ou um dicionário do período, os casos em questão foram consultados no Glossário desenvolvido por Mettmann (1972)METTMANN, W. Glossário. In: AFONSO X, O SÁBIO. Cantigas de Santa Maria. Coimbra: Universidade, 1972. v.IV: Glossário., que embora contemple apenas os vocábulos presentes nas CSM, pode ser usado para refletir sobre questões relativas ao léxico das cantigas profanas, dado que a linguagem empregada nas duas vertentes da lírica galego-portuguesa não manifesta divergências significativas.

Os verbos citados (onrar/onrrar, sair e valer) assumem diferentes flexões e derivações nos textos arcaicos, mas só algumas delas portam uma consoante que fecha a sílaba que está à frente da rótica retratada como <rr>. O verbo transitivo onrrar somente aparece conjugado no infinitivo e em formas derivadas, como os substantivos femininos onrra/desonrra e o adjetivo onrrado/a. O verbo intransitivo sair conserva apenas um tempo verbal no qual uma consoante antecede a rótica dobrada, que é a terceira pessoa do singular do futuro do indicativo. Sobre as flexões de valer, três delas apresentam sílabas travadas CVC antes de <rr>. O elemento lateral <l>, que se encontra na posição de coda, confere uma segunda unidade de peso à sílaba inicial dos vocábulos listados a seguir:

  1. Valrria (terceira pessoa do singular do condicional);

  2. Valrrá (terceira pessoa do singular do futuro do indicativo);

  3. Valrredes (segunda pessoa do plural do futuro do indicativo).

Com relação às sílabas fechadas por consoante em português, Câmara Junior (1985[1970]) explica que, após vogal nasal (isto é, sílaba travada por arquifonema nasal /N/), só ocorre som forte, jamais r-fraco. Em outras palavras, termos como genro e honra possuem uma pronúncia obrigatória, sempre com r-forte. Esse fato exibe que, apesar dessas palavras apresentarem uma realização forte, o grafema representado é simples. Uma análise similar pode ser empreendida a respeito de omrado/onrrado, uma vez que, segundo Massini-Cagliari (2015)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: desvendando a prosódia medieval. São Paulo: Ed. da UNESP Digital, 2015., o rol de consoantes em posição de travamento silábico no PA já se assemelhava ao do PB. Tal fato leva à confirmação da nossa conjectura de que <rr> depois de sílaba travada deve ser entendido como uma variante gráfica de <r> simples. Assim, a presença da vibrante dobrada em onrrado pode sinalizar o anseio do escritor em expressar por meio da escrita uma articulação mais marcada.

Na coletânea profana, localizamos um único dado em que <rr> aparece retratado como <lr>, que é a variação carreira/calreyra. Essa ocorrência permite novos argumentos de que as róticas duplicadas, naquele momento da história, poderiam ser geminadas fonologicamente. O aparecimento de calreyra ilustra que, no desdobramento de uma geminada em duas partes, ou, no movimento oposto, quando ocorre a fusão de dois segmentos em uma geminada, a duração compensatória se revela sempre muito significativa. Em um fenômeno fonológico, quando um elemento associado a uma mora sofre supressão, a mora se conserva e passa a outro segmento. Portanto, se /l/ for apagado, a mora ligada a esse som (que possui mora, porque se encontra no contexto de coda) permanecerá, sendo vinculada à rótica, que se torna longa, ou geminada, ou dupla. Os elementos passam por determinadas mudanças, entretanto, a quantidade da sílaba se mantém exatamente igual. Logo, a duração compreende um mecanismo capaz de compensar o desaparecimento de segmentos da palavra.

Figura 4
Variação carreira/calreyra.

Em seguida, exibimos a representação arbórea dos vocábulos carreira e calreyra, com a finalidade de demonstrar que, em ambos os casos, as consoantes preenchem a coda da sílaba antecedente e o ataque da seguinte, ao mesmo tempo. Diante disso, fica claro que os grafemas <rr> e <lr> possuem uma mesma duração:

(3)

Um caso bastante semelhante foi localizado no trabalho de Macedo (2019)MACEDO, N. Z. Pelas pistas onomásticas: um estudo comparado da fonologia do português arcaico, do português europeu e do português brasileiro. Tese (Doutorado em Linguística e Língua Portuguesa) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2019., o que reforça a existência de uma grande variedade de formas gráficas naquela época. A palavra Israel foi retratada como Irrael nas CSM 4 e 27 da coletânea religiosa. Na referida variação, a desassociação da fricativa <s> originou uma rótica dupla por alongamento compensatório. Na figura 5, apresentamos uma reprodução do códice Escorial Músicos. É relevante pontuar que a alternância em destaque figura em todos os cancioneiros marianos.

Figura 5
Variação Israel/Irrael.

O segmento <s>, de Israel, encontra-se na posição de coda silábica e, portanto, carrega uma mora. Seu apagamento, contudo, não acarreta o desaparecimento da unidade de peso, que se preserva e é associada a outro elemento. Como se vê, quando um segmento sofre supressão em decorrência da aplicação de regras fonológicas, sua duração se mantém intacta e passa a se vincular a outro slot que se localiza nas imediações. Em Irrael, o apagamento da fricativa <s> gerou o alongamento da rótica, que incorporou a mora da coda anterior e passou a ser dobrada ou geminada. Sendo assim, o aumento da duração temporal da rótica compensou a omissão da consoante <s>, fenômeno conhecido como alongamento compensatório (HOGG; McCULLY, 1987)HOGG, R.; McCULLY, C. B. Metrical phonology: a coursebook. Cambridge: Cambridge University Press, 1987.. O exemplo 4 esclarece o descrito:

(4)

Como relatado nesta seção, o levantamento de dados realizado possibilita depreender a presença da geminação consonântica da rótica dupla intervocálica no estágio arcaico da língua portuguesa, tendo em vista que a vibrante <rr> preenche dois contextos dentro da organização interna da sílaba e apresenta uma duração maior do que sua correspondente simples. O contra-argumento encontrado foi solucionado pelo próprio corpus da pesquisa, pois o grande número de variações presentes nos códices mostrou que, nas ocorrências em que <rr> figura depois de sílaba fechada por consoante, a vibrante dobrada não espelha um segmento longo, do ponto de vista fonológico. Além disso, nenhum dado no qual um ditongo precede a rótica duplicada foi observado no interior da amostragem, o que favorece nossa interpretação de que <rr> pode ser geminado entre vogais, pois, para tal, a coda da sílaba antecedente deve estar livre, para poder abrigar uma das partes da consoante.

As róticas possuem uma quantidade expressiva de variações no PB falado no presente, sobretudo quando se leva em consideração variedades regionais. No entanto, não é sua grande diversidade de realizações que mais chama a atenção, mas as controvérsias no que se refere ao seu status fonológico, tanto em períodos pretéritos do português como na atualidade. O que se encontra na literatura é o registro de duas visões: 1) a língua portuguesa possui duas vibrantes, uma forte e uma fraca; 2) o português dispõe de um único fonema rótico, que, para alguns, é o r-forte e, para outros, o r-brando. Para Massini-Cagliari (2015)MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: desvendando a prosódia medieval. São Paulo: Ed. da UNESP Digital, 2015., reside no fato de os elementos duplos não poderem aparecer no começo da palavra a primeira razão para analisar seu estatuto fonológico, dado que, caso fossem consoantes simples, tal restrição não se justificaria. Sobre a investigação realizada por Somenzari (2006)SOMENZARI, T. Estudo da possibilidade de geminação em português arcaico. 200f. Dissertação (Mestrado em Linguística e Língua Portuguesa) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2006., Massini-Cagliari (2006)MASSINI-CAGLIARI, G. Da possibilidade de geminação em português: um estudo comparado entre o português arcaico e o português brasileiro atual. In: HORA, D. et al. (org.). Língua(s) e povos: Unidade e Diversidade. João Pessoa: Idéia, 2006. p.72.80. discute que não há uma conclusão quanto à forma subjacente da rótica no PA. Como não foram encontrados casos nos quais r-forte se localiza após um travamento silábico em posição medial de vocábulo, a autora declara que Somenzari (2006)SOMENZARI, T. Estudo da possibilidade de geminação em português arcaico. 200f. Dissertação (Mestrado em Linguística e Língua Portuguesa) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2006. poderia ter arriscado uma interpretação que considerasse o tepe como a forma de base das róticas do medievo.

A perspectiva aqui assumida recorre ao latim e ao PE para formular ponderações sobre a discussão, haja vista que o PA consiste em um ponto intermediário compatível que congrega ambos os falares. No idioma latino, o ambiente intervocálico abarcava um /r/ simples e um /rr/ geminado (composto por meio da junção de dois segmentos com articulações idênticas), o que acarretava oposições como, por exemplo, ferum (feroz) x ferrum (ferro). O fonema subjacente era um tepe, sendo /rr/ forte um segmento geminado fonologicamente, isto é, uma sucessão de consoantes iguais entre as quais recaía uma fronteira silábica (CÂMARA JUNIOR., 1953). O italiano preserva ainda hoje essa configuração no que tange às geminadas. Além de ter promovido a manutenção das geminadas latinas, criou novas mediante assimilações.

Como o PE moderno mantém as produções de tepe e de vibrante múltipla, do ponto de vista fonético, muito possivelmente esses eram os sons articulados no estágio medieval. Desta maneira, a maior mudança ocorreu no português falado no Brasil, que ganhou fricativas como <rr> forte e retroflexas variando com tepe. Partindo dessas considerações e do que discutimos até o momento, reconhecemos que o fonema rótico do PA, época da qual não dispomos de um contato com os falantes nativos, consiste na vibrante branda e que a oposição fonológica entre r-forte e r-fraco, em contexto intervocálico, configura-se como consequência da geminação de dois r-brandos (ɾ + ɾ).

Renomados estudiosos, como Wetzels (1997)WETZELS, W. L. The lexical representation of nasality in Brazilian Portuguese. Probus, Berlin, v.9, n.2, p.203-232, 1997., Mateus e D’Andrade (2000), Monaretto (1997)MONARETTO, V. N. O. Um reestudo da vibrante: análise variacionista e fonológica. Tese (Doutorado em Linguística) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1997. e Lopez (1979)LOPEZ, B. The sound pattern of Brazilian Portuguese (cariocan dialect). 265f. Thesis (Doctor in Linguistics) - University of California, Los Angeles, 1979., assumem esse posicionamento para o PB atual. Em concordância com os autores mencionados, nos apoiamos nas ocorrências de variação encontradas para sustentar nossas reflexões. O trabalho de Monaretto (1997)MONARETTO, V. N. O. Um reestudo da vibrante: análise variacionista e fonológica. Tese (Doutorado em Linguística) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1997. mostra que o tepe possui um contexto maior de distribuição e tende se realizar com mais regularidade, além de ser a consoante que emerge em uma ressilabificação frasal. A pesquisadora expõe que as produções de r-forte em início de palavra e de sílaba são fruto de uma regra de reforçamento capaz de converter um tepe em um r-forte. De acordo com o ponto de vista defendido, o r-fraco se localiza em todos os ambientes linguísticos e está, portanto, na estrutura profunda da língua.

No contexto de contraste, ou seja, entre vogais, argumentamos em prol da ideia de que há uma rótica simples /ɾ/ em oposição à soma de duas /ɾ + ɾ/. Em caro, por exemplo, o fonema subjacente se superficializa, ao passo que a palavra carro apresenta duas vibrantes fracas, uma em posição de coda (car-) e outra em contexto inicial (-ro), que juntas formam uma consoante forte. Devido à atuação do PCO (Princípio do Contorno Obrigatório), que condena sequências de elementos análogos adjacentes no nível melódico, os dois r-fracos são reduzidos a um, com ligação dupla, fato que reforça que a rótica forte integra dois ambientes temporais na estrutura interna da sílaba. Em caro, a vibrante fraca se diferencia da forte pela ramificação simples que possui. Sendo assim, o valor contrastivo que o contexto intervocálico manifesta no sistema do português é depreendido por nós como resultado de uma geminação, exposta por meio de uma estrutura de ligação dobrada, que se contrapõe a um r-fraco de ligação simples. Isto posto, nos filiamos à corrente dos autores que defendem a hipótese da presença de somente uma vibrante no português, que é o tepe e apresenta duas variantes, uma simples, identificada nos fólios dos cancioneiros arcaicos por um ou dois grafemas (<r>/<rr>), e outra geminada, de representação sempre dupla (<rr>).

Conclusão

A análise dos dados revelou que os resultados obtidos foram significativos para a compreensão do comportamento das róticas no correr do século XIII. A metodologia se baseou na verificação da possibilidade de alternância na representação gráfica das vibrantes, a fim de estabelecer as relações existentes entre letras e sons, e no estudo do elemento representado graficamente como duplo em todos os ambientes silábicos possíveis. Pela apuração das ocorrências, foi possível depreender certas conclusões sobre as róticas, que merecem especial destaque. Na posição intervocálica, a consoante dobrada pode ser considerada como sendo geminada, no nível fonológico, visto que preenche dois contextos temporais na organização interna da sílaba e, portanto, manifesta uma duração maior do que sua correspondente simples. Não encontramos no material qualquer caso de ditongo antes de <rr>, o que contribui para a nossa interpretação, dado que a coda da sílaba anterior deve ser vazia para poder receber parte do segmento.

Em relação ao status fonológico das róticas ao longo da Idade Média, ponderamos que somente o tepe figura na estrutura profunda do português. Diante do exposto, filiamo-nos aos pesquisadores que defendem a existência de um único fonema vibrante na língua, que é o tepe e que possui duas variantes, uma simples, representada por <r> ou <rr>, e outra geminada, grafada predominantemente como <rr>. Ao reconhecermos a rótica fraca na subjacência do PA, assumimos que a oposição fonológica entre r-forte e r-brando, no ambiente intervocálico, configura-se como resultado da geminação de dois r-fracos. Convém destacar que partimos da opinião de Zucarelli (2002)ZUCARELLI, F. E. Ditongos e hiatos nas cantigas medievais galego-portuguesas. Dissertação (Mestrado em Linguística e Língua Portuguesa) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2002., no que diz respeito à configuração dos ditongos do PA, tendo em vista que a autora postula que a semivogal exerce a mesma função da consoante que trava a sílaba, isto é, considera a presença de apenas um lugar de ancoragem no centro silábico. Assim, a semivogal do ditongo integra a coda, fechando a sílaba. Neste artigo, admitimos que os ditongos da variação RR-IR-YR estão no núcleo e na coda, o que fortalece nossas reflexões. Conforme demonstramos, o ditongo (de moirer, por exemplo) expressa a mesma distribuição estrutural de uma vogal + uma consoante simples (morrer). Logo, moi e mor são sílabas com coda ramificada.

Por fim, no que tange à realização fonética dos segmentos <r> e <rr> naquela época da história do português, é significativo ter em mente que, em decorrência da ampla variedade de representações gráficas encontradas nas coletâneas arcaicas, existia uma certa instabilidade no registro dessas consoantes. Por vezes, palavras apareciam escritas ora com <r>, ora com <rr>, fato que pode sinalizar um desejo do escritor em expressar por meio da grafia variações fonéticas. Decerto, a produção oral do idioma trovadoresco era de tepe e de vibrante múltipla, haja visto o que se constata atualmente no português falado na Europa. Pelo exame dos poemas remanescentes do século XIII, é possível conjecturar que o uso das formas simples e duplicada visava retratar esses dois tipos de pronúncia e, como ainda não havia uma ortografia oficial, ocorria, em algum grau, certa flutuação na adoção dos elementos róticos nas cantigas arquitetadas na Península Ibérica.

Agradecimentos

FAPESP (Processo: 2018/24793-3) e CNPq (Processo: 302648/2019-4).

REFERÊNCIAS

  • ABAURRE, M. B. M.; SANDALO, M. F. S. Os róticos revisitados. In: HORA, D.; COLLISCHONN, G. (org.). Teoria Linguística: Fonologia e outros temas. João Pessoa: Editora Universitária, 2003. p.144-180.
  • ALVES, U. K. Teoria da Sílaba. In: HORA, D.; MATZENAUER, C. L. (org.). Fonologia, fonologias: uma introdução. São Paulo: Contexto, 2017. p.125-140.
  • ANGLÉS, H. La música de las Cantigas de Santa María del Rey Alfonso el sabio: fac-símil, transcripción y estudio critico por Higinio Anglés. Barcelona: Diputación Provincial de Barcelona; Biblioteca Central; Publicaciones de la Sección de Música, 1964.
  • BERTOLUCCI PIZZORUSSO, V. Cantigas de Santa Maria. In: LANCIANI, G.; TAVANI, G. (org.). Dicionário da literatura medieval galega e portuguesa. Lisboa: Caminho, 1993. p.142-146.
  • BISOL, L. A sílaba e seus constituintes. In: NEVES, M. H. M. (org.). Gramática do Português Falado. São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP; Campinas: Ed. da UNICAMP, 1999. v.7. p.701-742.
  • BUENO, F. da S. Antologia Arcaica: Trechos, em prosa e verso, coligidos em obras do século VIII ao século XVI. São Paulo: Indústria Gráfica Saraiva, 1968.
  • CAGLIARI, L. C. Elementos de Fonética do Português Brasileiro. São Paulo: Paulistana, 2007.
  • CÂMARA JUNIOR, J. M. Estrutura da língua portuguesa. 15. ed. Petrópolis: Vozes, 1985. Primeira edição de 1970.
  • CÂMARA JUNIOR, J. M. Para o estudo da fonêmica portuguesa. Rio de Janeiro: Padrão, 1953.
  • CANCIONEIRO da Biblioteca Nacional (Colocci-Brancuti): Cód. 10991. Reprodução fac-similada. Lisboa: Biblioteca Nacional, Imprensa Nacional, Casa da Moeda, 1982.
  • CANCIONEIRO Português da Biblioteca Vaticana (Cód. 4803): Reprodução fac-similada com introdução de L. F. Lindley Cintra. Lisboa: Centro de Estudos Filológicos, Instituto de Alta Cultura, 1973.
  • CASTRO, B. M. As Cantigas de Santa Maria: Um estilo gótico na lírica ibérica medieval. Niterói: EdUFF, 2006.
  • CEDEÑO, R. A. N.; MORALES-FRONT, A. Fonologia generativa contemporánea de la lengua española. Washington, DC: Georgetown University Press, 1999.
  • COLLISCHONN, G. A sílaba em português. In: BISOL, L. (org.). Introdução a estudos de fonologia do português brasileiro. 4. ed. rev. e ampl. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2005. p.101-129.
  • FARIA, E. Fonética Histórica do Latim. Rio de Janeiro: Livraria Acadêmica, 1970.
  • FILGUEIRA VALVERDE, J. Introducción. In: ALFONSO X EL SABIO. Cantigas de Santa María: Códice Rico de El Escorial. Madri: Castalia, 1985. p.XI-LXIII.
  • GOLDSMITH, J. A. Autosegmental & metrical phonology. Oxford: Blackwell, 1990.
  • HOGG, R.; McCULLY, C. B. Metrical phonology: a coursebook. Cambridge: Cambridge University Press, 1987.
  • HUBER, J. Gramática do português antigo. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1986. Primeira edição alemã de 1933.
  • HYMAN, L. M. Phonology: theory and analysis. New York: Holt, Rinehart and Winston, 1975.
  • LANCIANI, G. Cantiga de amor. In: LANCIANI, G.; TAVANI, G. (org.). Dicionário da literatura medieval galega e portuguesa. Lisboa: Caminho, 1993. p.136-138.
  • LEÃO, Â. V. Cantigas de Santa Maria de Afonso X, o sábio: Aspectos culturais literários. São Paulo: Linear B; Belo Horizonte: Veredas & Cenários, 2007.
  • LOPEZ, B. The sound pattern of Brazilian Portuguese (cariocan dialect). 265f. Thesis (Doctor in Linguistics) - University of California, Los Angeles, 1979.
  • MACEDO, N. Z. Pelas pistas onomásticas: um estudo comparado da fonologia do português arcaico, do português europeu e do português brasileiro. Tese (Doutorado em Linguística e Língua Portuguesa) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2019.
  • MAIA, C. de A. História do Galego-Português: Estudo linguístico da Galiza e do Noroeste de Portugal desde o século XIII ao século XVI (Com referência à situação do galego moderno). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, 1997.
  • MASSINI-CAGLIARI, G. A música da fala dos trovadores: desvendando a prosódia medieval. São Paulo: Ed. da UNESP Digital, 2015.
  • MASSINI-CAGLIARI, G. Cancioneiros Medievais Galego-Portugueses: Fontes, edições e estrutura. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2007.
  • MASSINI-CAGLIARI, G. Da possibilidade de geminação em português: um estudo comparado entre o português arcaico e o português brasileiro atual. In: HORA, D. et al. (org.). Língua(s) e povos: Unidade e Diversidade. João Pessoa: Idéia, 2006. p.72.80.
  • MASSINI-CAGLIARI, G. Do poético ao lingüístico no ritmo dos trovadores: três momentos da história do acento. São Paulo: Cultura Acadêmica, 1999.
  • MASSINI-CAGLIARI, G. Escrita do Cancioneiro da Biblioteca Nacional de Lisboa: fonética ou ortográfica? Filologia e Linguística Portuguesa, São Paulo, n.2, p.159-178, 1998.
  • MASSINI-CAGLIARI, G. Acento e ritmo. São Paulo: Contexto, 1992.
  • MASSINI-CAGLIARI, G.; CAGLIARI, L. C.; REDENBARGER, W. J. A Comparative Study of the Sounds of European and Brazilian Portuguese: Phonemes and Allophones. In: WETZELS, W. L.; MENUZZI, S.; COSTA, J. (ed.). The Handbook of Portuguese Linguistics. Oxford: Wiley-Blackwell, 2016. p. 56-68.
  • MATEUS, M. H. M.; ANDRADE, E. D. The Phonology of Portuguese. Oxford: Oxford University Press, 2000.
  • MATTOS E SILVA, R. V. O português arcaico: fonologia, morfologia e sintaxe. São Paulo: Contexto, 2006.
  • MATTOS E SILVA, R. V. Estruturas trecentistas: elementos para uma gramática do Português Arcaico. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1989.
  • MAURER Jr., Th. H. Gramática do Latim Vulgar. Rio de Janeiro: Livraria Acadêmica, 1959.
  • METTMANN, W. Glossário. In: AFONSO X, O SÁBIO. Cantigas de Santa Maria. Coimbra: Universidade, 1972. v.IV: Glossário.
  • MICHAËLIS DE VASCONCELOS, C. Lições de filologia portuguesa (segundo as predileções feitas aos cursos de 1911/12 e de 1912/13): seguidas das lições práticas de português arcaico. Lisboa: Editorial Império Limitada, 1946. [Revista: Ocidente].
  • MONARETTO, V. N. O. Um reestudo da vibrante: análise variacionista e fonológica. Tese (Doutorado em Linguística) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1997.
  • MONGELLI, L. M. Fremosos cantares: Antologia da lírica medieval galego-portuguesa. São Paulo: Martins Fontes, 2009.
  • PAIVA, M. da C. de; DUARTE, M. E. L. Mudança linguística: observações no tempo real. In: MOLLICA, M. C.; BRAGA, M. L. (org.). Introdução à Sociolinguística: o tratamento da variação. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2012. p.179-190.
  • PARKINSON, S. As Cantigas de Santa Maria: estado das cuestións textuais. Vigo: Anuario de estudios literarios galegos, 1998.
  • PERLMUTTER, D. Phonological Quantity and Multiple Association. In: GOLDSMITH, J. A. (ed.). The handbook of Phonological Theory. Oxford, UK: Blackwell, 1995. p.307-317.
  • RAVIZZA, J. Gramática latina. 9. ed. Niterói: Escolas Profissionais Salesianas, 1940.
  • SELKIRK, E. The Syllable. In: HULST, H.; SMITH, N. (org.). The structure of phonological representations (part. II). Dordrecht: Foris, 1982. p.337-383.
  • SOMENZARI, T. Estudo da possibilidade de geminação em português arcaico. 200f. Dissertação (Mestrado em Linguística e Língua Portuguesa) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2006.
  • WETZELS, W. L. Consoantes palatais como geminadas fonológicas no português brasileiro. Revista de Estudos da Linguagem, Belo Horizonte, v.9, n.2, p.5-15, jul./dez. 2000.
  • WETZELS, W. L. The lexical representation of nasality in Brazilian Portuguese. Probus, Berlin, v.9, n.2, p.203-232, 1997.
  • ZUCARELLI, F. E. Ditongos e hiatos nas cantigas medievais galego-portuguesas. Dissertação (Mestrado em Linguística e Língua Portuguesa) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2002.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    18 Ago 2019
  • Aceito
    27 Mar 2020
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho Rua Quirino de Andrade, 215, 01049-010 São Paulo - SP, Tel. (55 11) 5627-0233 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: alfa@unesp.br