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A SINTAXE NO BRASIL: NOTAS HISTORIOGRÁFICAS E EIXOS TEMÁTICOS DE INVESTIGAÇÃO

RESUMO:

Este artigo estabelece alguns eixos temáticos apropriados à realização de investigações historiográficas sobre saberes, ideias, questões, teorias e modelos pedagógicos que envolvam a dimensão sintática dos estudos gramaticais no Brasil, entre os séculos XIX e XXI. Os eixos de investigação e as notas sobre a história da sintaxe que os fundamentam são desenvolvidos no campo da Historiografia da Linguística, nos termos de Swiggers (2013SWIGGERS, P. A historiografia da linguística: objeto, objetivos, organização. Revista Confluência, Rio de Janeiro, n.44-45, p.39-59, 2013. Disponível em: http://llp.bibliopolis.info/confluencia/pdf/1171.pdf. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, 2012SWIGGERS, P. Linguistic historiography: object, methodology, modelization. Todas as Letras, São Paulo, v.14, n.1, p.38-53, 2012. Disponível em: http://editorarevistas.mackenzie.br/index.php/tl/article/view/4527/3489. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, 2009)SWIGGERS, P. La historiografía de la lingüística: apuntes y reflexiones. Revista Argentina de Historiografia Lingüística, Buenos Aires, v.1, n.1, p.67-76, 2009. Disponível em: http://www.rahl.com.ar/index.php/rahl/article/view/6. Acesso em: 19 fev. 2019.
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e Altman (2012ALTMAN, C. História, estórias e historiografia da Linguística brasileira. Todas as Letras, São Paulo, v.14, n.1, p.14-37, 2012. Disponível em: http://editorarevistas.mackenzie.br/index.php/tl/article/view/4526/3488. Acesso em: 12 fev. 2019.
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, 2009ALTMAN, C. Retrospectivas e perspectivas da historiografia da linguística no Brasil. Revista Argentina de Historiografia Linguística, Buenos Aires, v.1, n.2, p.115-136, 2009. Disponível em: http://www.rahl.com.ar/index.php/rahl/article/view/12. Acesso em: 12 fev. 2019.
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, 2004)ALTMAN, C. A pesquisa linguística no Brasil (1968-1988). 2.ed. São Paulo: Humanitas, 2004.. Procura-se esboçar algumas linhas de compreensão capazes de conduzir a construção de narrativas descritivas, interpretativas e explicativas sobre como o conhecimento sintático foi adquirido, formulado, difundido, transformado, preservado, ensinado ou esquecido no contexto intelectual brasileiro. Para tanto, elabora-se uma espécie de trajetória concisa dos estudos sintáticos, considerando, sobretudo, o universo greco-latino, a gramatização do português e o cenário pedagógico brasileiro. A narrativa tecida deságua na sistematização, em forma de questões de pesquisa, de três possíveis eixos temáticos para uma historiografia da sintaxe no Brasil, envolvendo aspectos teóricos, descritivo-normativos e didático-pedagógicos.

PALAVRAS-CHAVE:
Historiografia da Linguística; Sintaxe; Gramática

ABSTRACT:

This article sets out some thematic axes, particularly designed for the development of historiographical researches into knowledge, ideas, problems, theories and pedagogical models that involve the syntactic dimension of the grammatical studies in Brazil, between the 19th and 21st centuries. The researching axes and the notes on the history of the syntax, which support them, are based on the grounds of the Historiography of Linguistics, according to Swiggers (2013SWIGGERS, P. A historiografia da linguística: objeto, objetivos, organização. Revista Confluência, Rio de Janeiro, n.44-45, p.39-59, 2013. Disponível em: http://llp.bibliopolis.info/confluencia/pdf/1171.pdf. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, 2012SWIGGERS, P. Linguistic historiography: object, methodology, modelization. Todas as Letras, São Paulo, v.14, n.1, p.38-53, 2012. Disponível em: http://editorarevistas.mackenzie.br/index.php/tl/article/view/4527/3489. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, 2009)SWIGGERS, P. La historiografía de la lingüística: apuntes y reflexiones. Revista Argentina de Historiografia Lingüística, Buenos Aires, v.1, n.1, p.67-76, 2009. Disponível em: http://www.rahl.com.ar/index.php/rahl/article/view/6. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, and Altman (2012ALTMAN, C. História, estórias e historiografia da Linguística brasileira. Todas as Letras, São Paulo, v.14, n.1, p.14-37, 2012. Disponível em: http://editorarevistas.mackenzie.br/index.php/tl/article/view/4526/3488. Acesso em: 12 fev. 2019.
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, 2009ALTMAN, C. Retrospectivas e perspectivas da historiografia da linguística no Brasil. Revista Argentina de Historiografia Linguística, Buenos Aires, v.1, n.2, p.115-136, 2009. Disponível em: http://www.rahl.com.ar/index.php/rahl/article/view/12. Acesso em: 12 fev. 2019.
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, 2004)ALTMAN, C. A pesquisa linguística no Brasil (1968-1988). 2.ed. São Paulo: Humanitas, 2004.. We drafted some comprehension lines so as to implement the construction of descriptive, interpretative, and explanatory narratives about the ways how syntactic knowledge has been acquired, formulated, widespread, transformed, preserved, taught or forgotten in the Brazilian intellectual context. For this purpose, we drew up some sort of brief review of syntactic studies, considering, above all, the Greco-Roman scholarship, the grammatization process of Portuguese and the Brazilian pedagogical context. The narrative is closed with the systematization of three possible thematic axes, carried out in the form of research questions for a historiography of syntax in Brazil, involving theoretical, descriptive-normative, and didactic-pedagogical aspects.

KEYWORDS:
Linguistic Historiography; Syntax; Grammar

Considerações preliminares

Este artigo busca estabelecer alguns eixos temáticos apropriados à realização de investigações historiográficas sobre saberes, ideias, questões, teorias e modelos pedagógicos que envolvam a dimensão sintática dos estudos gramaticais no Brasil, entre os séculos XIX e XXI.

Desenvolvido no âmbito do grupo de pesquisa HGEL – Historiografia, Gramática e Ensino de Línguas (UFPB/PROLING/CNPq)1 1 Espelho do grupo de pesquisa no Diretório dos Grupos de Pesquisa no Brasil (Plataforma Lattes/CNPq): http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/6433198070413694. , o trabalho dialoga, sobretudo, com reflexões recentes sobre o percurso histórico da gramática tradicional – entendida como uma “teoria das línguas” – e seus impactos na linguística brasileira e no ensino de língua contemporâneos (cf. VIEIRA, 2018VIEIRA, F. E. A gramática tradicional: história crítica. São Paulo: Parábola, 2018.; BORGES NETO, 2018)BORGES NETO, J. História da Gramática. Curitiba: Ed. da UFPR. 2018. No prelo..

Embora o espaço e o tempo de produção, recepção e circulação de saberes sintáticos estejam restritos no trabalho ao contexto brasileiro dos oitocentos até hoje, a consideração de outros lugares e épocas será fundamental à argumentação aqui desenvolvida. Também importante será o resgate de alguns aspectos da história dos estudos brasileiros sobre sintaxe já mapeados ou sugeridos por diferentes historiógrafos.

Além dessa seção preliminar, o artigo está organizado em outras oito partes. As bases teórico-metodológicas gerais são expostas na próxima seção. Nas seis seguintes, apresenta-se uma espécie de trajetória concisa dos estudos sintáticos, considerando, sobretudo, o universo greco-latino, a gramatização do português e o cenário pedagógico brasileiro. Finalmente, são sistematizados, em forma de questões de pesquisa, três possíveis eixos temáticos para uma historiografia da sintaxe no Brasil, envolvendo aspectos teóricos, descritivo-normativos e didático-pedagógicos. Encerra o trabalho uma breve seção conclusiva.

Bases teórico-metodológicas gerais

As notas aqui perfiladas sobre a história da sintaxe no Brasil inserem-se na área denominada de Historiografia da Linguística, nos termos de Swiggers (2013SWIGGERS, P. A historiografia da linguística: objeto, objetivos, organização. Revista Confluência, Rio de Janeiro, n.44-45, p.39-59, 2013. Disponível em: http://llp.bibliopolis.info/confluencia/pdf/1171.pdf. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, 2012SWIGGERS, P. Linguistic historiography: object, methodology, modelization. Todas as Letras, São Paulo, v.14, n.1, p.38-53, 2012. Disponível em: http://editorarevistas.mackenzie.br/index.php/tl/article/view/4527/3489. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, 2009)SWIGGERS, P. La historiografía de la lingüística: apuntes y reflexiones. Revista Argentina de Historiografia Lingüística, Buenos Aires, v.1, n.1, p.67-76, 2009. Disponível em: http://www.rahl.com.ar/index.php/rahl/article/view/6. Acesso em: 19 fev. 2019.
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e Altman (2012ALTMAN, C. História, estórias e historiografia da Linguística brasileira. Todas as Letras, São Paulo, v.14, n.1, p.14-37, 2012. Disponível em: http://editorarevistas.mackenzie.br/index.php/tl/article/view/4526/3488. Acesso em: 12 fev. 2019.
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, 2009ALTMAN, C. Retrospectivas e perspectivas da historiografia da linguística no Brasil. Revista Argentina de Historiografia Linguística, Buenos Aires, v.1, n.2, p.115-136, 2009. Disponível em: http://www.rahl.com.ar/index.php/rahl/article/view/12. Acesso em: 12 fev. 2019.
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, 2004)ALTMAN, C. A pesquisa linguística no Brasil (1968-1988). 2.ed. São Paulo: Humanitas, 2004., por exemplo. Buscam-se, desse modo, a descrição e compreensão de produtos e processos que constituem e caracterizam a história da Linguística. Esta, por sua vez, é vista de forma ampla, global, não necessariamente institucionalizada. Abarca o conjunto de conhecimentos e reflexões relacionados à linguagem e as línguas, ultrapassando os limites da disciplinaridade científica stricto sensu, ou seja, rompendo as fronteiras daquilo que se entende por Linguística somente a partir do século XIX.

De modo particular, procura-se esboçar algumas linhas de compreensão que poderão conduzir, posteriormente, a construção de narrativas descritivas, interpretativas e explicativas sobre como o conhecimento sintático foi adquirido, formulado, difundido, transformado, preservado, didatizado, ensinado ou esquecido no contexto intelectual brasileiro. A reflexão que se promove aqui contribuirá, portanto, para a reconstrução do “ideário sintático” e de seus movimentos por meio de análises heurísticas e hermenêuticas de fontes textuais brasileiras.

Naturalmente, não se focaliza apenas a dimensão interna – cognitiva, teórica, prática, conceitual, terminológica – do desenvolvimento do conhecimento sobre sintaxe no Brasil, mas também a sua dimensão externa – o entorno político, sociocultural, filosófico, ideológico em que tal conhecimento fora condicionado ou determinado, consoante Asencio, Del Arco e Swiggers (2014)ASENCIO, J. J. G.; DEL ARCO, E. T. M.; SWIGGERS, P. Principios, tareas, métodos e instrumentos en historiografia lingüística. In: CALERO, M. L. et al. (ed.). Métodos y resultados actuales en Historiografia de la Lingüística. Münster: Nodus Publikationen, 2014. p.266-301.. Conteúdo e contexto são dimensões correlativas na Historiografia da Linguística (SWIGGERS, 2012)SWIGGERS, P. Linguistic historiography: object, methodology, modelization. Todas as Letras, São Paulo, v.14, n.1, p.38-53, 2012. Disponível em: http://editorarevistas.mackenzie.br/index.php/tl/article/view/4527/3489. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, isto é, aspectos internalistas e externalistas não só podem como devem ser relacionados na descrição e interpretação historiográficas. Assim, operam-se a seleção, a reconstrução, a ordenação e a interpretação de fatos sintáticos nos níveis teórico, descritivo-normativo e didático-pedagógico, articulados a seus respectivos contextos intelectuais através do tempo.

O estabelecimento de um contexto intelectual envolve o resgate do “clima de opinião” do período em foco, isto é, a consideração da atmosfera intelectual, do cenário cultural e epistemológico geral (cf. KOERNER, 1996)KOERNER, E. F. K. Questões que persistem em historiografia linguística. Revista da ANPOLL, Florianópolis, n.2, p.45-70, 1996. Disponível em: https://revistadaanpoll.emnuvens.com.br/revista/article/view/240/253. Acesso em: 19 fev. 2019.
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. É consenso na historiografia que fatores extralinguísticos podem causar impacto nas ideias e teorias linguísticas surgidas, recebidas ou rejeitadas. Essa relação entre tempos contíguos é própria do trato historiográfico aqui proposto, baseado numa espessura temporal que antecede e sucede a atmosfera intelectual da época, o que Auroux (1992)AUROUX, S. A revolução tecnológica da gramatização. Tradução de Eni Puccinelli Orlandi. Campinas: Ed. da UNICAMP, 1992. denomina de “horizonte de retrospecção” e “horizonte de projeção”. Nas palavras deste autor,

[o] saber (as instâncias que o fazem trabalhar) não destrói seu passado como se crê erroneamente com frequência; ele o organiza, o escolhe, o esquece, o imagina, o idealiza, do mesmo modo que antecipa seu futuro sonhando-o enquanto o constrói. Sem memória e sem projeto, simplesmente, não há saber. (AUROUX, 1992AUROUX, S. A revolução tecnológica da gramatização. Tradução de Eni Puccinelli Orlandi. Campinas: Ed. da UNICAMP, 1992., p.11-12).

O horizonte de retrospecção dos saberes sintáticos no Brasil remonta evidentemente ao pensamento sobre a linguagem na Antiguidade ocidental, representada tanto pela gramática tradicional quanto por outros modelos teóricos intelectualmente mais próximos da epistemologia da Linguística moderna. É verdade que o termo “sintaxe” propriamente dito não ocorre em todas as fontes a que se pode ter acesso; entretanto, os temas e as categorias que inevitavelmente são associadas hoje a esse nível de análise das línguas já costumam aparecer, de certa forma, em textos da filosofia clássica, conforme é mostrado a seguir.

Sobre a sintaxe greco-latina

Talvez o primeiro registro embrionário de uma sintaxe da oração esteja nO Sofista, diálogo de Platão do século V AEC (Antes da Era Comum), entre o matemático Teeteto e o Estrangeiro. O texto nos fornece uma reflexão sobre o lógos e suas partes constitutivas primárias: o nome (ónoma), que executa uma ação, e o verbo (rhêma), que a exprime:

Estrangeiro: […] Possuímos, na verdade, para exprimir vocalmente o ser, dois gêneros de sinais.

Teeteto: Quais?

Estrangeiro: Os nomes [ónoma] e os verbos [rhêma], como os chamamos.

Teeteto: Explica tua distinção.

Estrangeiro: O que exprime as ações, nós chamamos verbo.

Teeteto: Sim.

Estrangeiro: Quanto aos sujeitos que executam essas ações, o sinal vocal que a eles se aplica é um nome.

Teeteto: Perfeitamente.

Estrangeiro: Nomes apenas, enunciados de princípio a fim, jamais formam um discurso [lógos], assim como verbos enunciados sem o acompanhamento de algum nome. […] Por exemplo, anda, corre, dorme, e todos os demais verbos que significam ação; mesmo dizendo-os todos, uns após outros, nem por isso formam um discurso.

Teeteto: Naturalmente.

Estrangeiro: E se dissermos ainda: leão, cervo, cavalo, e todos os demais nomes que denominam sujeitos executando ações, há ainda aqui, uma série da qual jamais resultou discurso algum; pois, nem nesta, nem na precedente, os sons proferidos indicam nem ação, nem inação, nem o ser, de um ser, ou de um não-ser, pois não unimos verbos aos nomes. Somente unidos haverá o acordo e, desta primeira combinação nasce o discurso que será o primeiro e mais breve de todos os discursos. (PLATÃO, 1972PLATÃO. Diálogos: O banquete – Fédon – Sofista – Político. São Paulo: Abril Cultural, 1972., p.195-196).

A divisão que o Estrangeiro propõe do lógos consiste, na verdade, num caminho para a reflexão sobre a qualidade verdadeira ou falsa do discurso e, consequentemente, do pensamento, sendo aquele visto como expressão vocal deste. Essa ideia é retomada por Aristóteles, agora no século IV AEC, em termos de “proposições predicativas”. Ou seja, a conexão entre esses dois elementos, o nome e o verbo, algo semelhante à estrutura sujeito-predicado de nossos tempos, reflete os fatos do mundo e permite-nos observar como se manifesta a relação entre a linguagem e a realidade ontológica.

As primeiras gramáticas apareceriam logo depois, precisamente a partir do século III AEC, com os trabalhos dos gramáticos e filólogos da Alexandria antiga. Todavia, a Tékhnē Grammatikē de Dionísio Trácio (século I AEC) – conhecida como a primeira gramática de uma língua ocidental, o grego clássico – abriga apenas o que hoje conhecemos por fonética e morfologia, praticamente ignorando a sintaxe.

É verdade que Dionísio (2003)DIONÍSIO. Tékhne Grammatikē. Séc. I a.C. In: CHAPANSKI, G. Uma tradução da Tékhne Grammatikē, de Dionísio Trácio, para o português. 2003. 190f. Dissertação (Mestrado em Letras) - Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2003. p.21-36. categoriza e analisa as oito “partes do discurso” (mere lógou), o que não deixa de ser uma reflexão de caráter sintático em sua essência, pois a existência de partes pressupõe, em algum momento, a articulação destas na construção de um todo (no caso, o lógos, o discurso). A classificação das partes se vale, inclusive, de alguns critérios (morfos)sintáticos, além de semânticos (ou mesmo ontológicos) e morfológicos (cf. VIEIRA, 2018)VIEIRA, F. E. A gramática tradicional: história crítica. São Paulo: Parábola, 2018.. A linguista Gisele Chapanski (2003)CHAPANSKI, G. Uma tradução da Tékhne Grammatikē, de Dionísio Trácio, para o português. 2003. 190f. Dissertação (Mestrado em Letras) - Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2003., em dissertação que traduz e comenta a gramática de Dionísio, revela que questões de natureza sintática também figuram na obra na abordagem dos “vícios e virtudes da linguagem”, ou seja, quando trechos literários são apresentados como exemplos de boa concordância ou de licença poética que rompe com os padrões de correção da língua.

Porém, estudos sintáticos propriamente ditos são identificados apenas na obra do alexandrino Apolônio Díscolo, no século II EC (Era Comum). Autores como Robins (1979)ROBINS, R. H. Pequena história da linguística. Tradução de Luiz Martins Monteiro de Barros. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico; Brasília: INL, 1979., Corrêa (2010)CORRÊA, E. F. de S. Socrates currit bene: um breve passeio pela história da gramática. Soletras, São Gonçalo, n.19, p.116-123, 2010. Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/soletras/article/view/7046. Acesso em: 12 fev. 2019.
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e Fortes (2012)FORTES, F. da S. Sintaxe greco-romana: Prisciano de Cesareia e Apolônio Díscolo na história do pensamento gramatical antigo. 2012. 406f. Tese (Doutorado em Linguística) - Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 2012., entre outros, defendem que Apolônio tenha desenvolvido algo como a primeira teoria sintática do grego. Sua obra está organizada em três tratados, sendo o último e mais longo destinado à sintaxe. Baseia-se na dicotomia filosófica nome-verbo e nas relações desses elementos entre si e com as outras partes do discurso, com foco na relação de concordância. Entre seus méritos, está o prenúncio do aparecimento das ideias de sujeito, objeto e outras noções sintáticas que surgiriam posteriormente, como regime/regência e mesmo a ideia estruturalista de constituintes imediatos.

No universo da gramaticografia latina, trabalhos sobre sintaxe quase não existiram ou foram preservados até o declínio do Império Romano. A perda mais sentida talvez seja a da terceira parte da obra De Lingua Latina, de Varrão (século I EC), que, em tese, teria abordado os processos de combinação de palavras na sintaxe latina. Apesar dessas ausências, pode ser dito, na esteira de Fortes (2012)FORTES, F. da S. Sintaxe greco-romana: Prisciano de Cesareia e Apolônio Díscolo na história do pensamento gramatical antigo. 2012. 406f. Tese (Doutorado em Linguística) - Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 2012., que a maioria dos autores latinos reconhecia a existência de uma sintaxe, à medida que atentava aos problemas normativos de construção sintática, os chamados “solecismos”, embora esses mesmos autores não tenham oferecido uma reflexão teórica explícita sobre a estrutura interna da oração.

A partir do contato com a tradução de algumas gramáticas latinas e com os estudos de comentadores do tema, a exemplo de Gonçalves e Conto (2010)GONÇALVES, R. T.; CONTO, L. de. Prisciano e a história da gramática: considerações acerca da sintaxe e da morfologia. Revista Eletrônica Antiguidade Clássica, Rio de Janeiro, n.5, p.85-99, jan.-jun. 2010. Disponível em: http://www.latindex.org/latindex/ficha?folio=21844. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, Valenza (2010)VALENZA, G. M. De lingua latina, de Marco Terêncio Varrão: tradução dos livros VIII, IX e X. 2010. 167f. Dissertação (Mestrado em Letras) - Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2010., Dezotti (2011)DEZOTTI, L. C. Arte menor e Arte maior de Donato: tradução, anotação e estudo introdutório. 2011. 186f. Dissertação (Mestrado em Letras) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011., o próprio Fortes (2012)FORTES, F. da S. Sintaxe greco-romana: Prisciano de Cesareia e Apolônio Díscolo na história do pensamento gramatical antigo. 2012. 406f. Tese (Doutorado em Linguística) - Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 2012., entre outros, vejo nos Fundamentos gramaticais (Institutiones Grammaticae), do gramático Prisciano de Cesareia, escritos no século VI EC, a fonte mais abrangente e representativa do estudo da sintaxe na Antiguidade greco-latina. De um total de dezoito, destacam-se os dois últimos livros, mais conhecidos como Priscianus minor, dedicados à sintaxe e fundamentados na ideia de oração como “arranjo harmonioso dotado de sentido completo”, tal qual se pode encontrar em outras gramáticas latinas e gregas.

Na sintaxe de Prisciano, a “oração perfeita” se revela o objeto a ser compreendido em sua organização. As categorias essenciais da estrutura oracional de sentido completo seriam o nome (a substância) e o verbo (o acidente), às quais todos os fenômenos sintáticos fazem referência, tal qual o sujeito e o predicado da sintaxe tradicional de agora, apresentados como termos essenciais da oração na Nomenclatura Gramatical Brasileira de 1958, a NGB.

O desenvolvimento da ideia de completude oracional proporcionado pelas reflexões de Prisciano teria originado as noções de intransitividade (ação verbal completa em si mesma) e transitividade (ação verbal que, para se completar, precisa transitar até outro elemento), centrais aos modelos sintáticos contemporâneos, tradicionais ou não. Também vale destacar a possível relação entre a abordagem da oração perfeita do gramático de Cesareia e a noção de gramaticalidade dos chomskyanos (cf. GONÇALVES; CONTO, 2010)GONÇALVES, R. T.; CONTO, L. de. Prisciano e a história da gramática: considerações acerca da sintaxe e da morfologia. Revista Eletrônica Antiguidade Clássica, Rio de Janeiro, n.5, p.85-99, jan.-jun. 2010. Disponível em: http://www.latindex.org/latindex/ficha?folio=21844. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, abrindo espaço para a investigação de uma possível descontinuidade na história da linguística envolvendo o gerativismo do século XX e a sintaxe greco-latina sistematizada e aprofundada por Prisciano no século VI.

Vê-se que, com Prisciano, a abordagem da sintaxe, enfim, saía do campo prático e prescritivo da listagem de solecismos e entrava no campo teorético e investigativo da reflexão sobre o mecanismo organizacional da oração “perfeita” e “de sentido completo”. É verdade que a noção de função ainda não estava presente nesse ponto da história da sintaxe, pois o que importava era o movimento combinatório e as relações lógicas das partes da oração entre si. Entretanto, seguindo a argumentação de Fortes (2012)FORTES, F. da S. Sintaxe greco-romana: Prisciano de Cesareia e Apolônio Díscolo na história do pensamento gramatical antigo. 2012. 406f. Tese (Doutorado em Linguística) - Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 2012., avalio que o deslocamento do prático ao investigativo acarretou um distanciamento entre os Fundamentos gramaticais de Prisciano e as outras gramáticas latinas e, ao mesmo tempo, uma aproximação dos objetivos do grego Apolônio, num flagrante caso de descontinuidade na história da gramática.

Séculos mais tarde, a sintaxe latina ganharia novas diretrizes (bem como manteria outras tantas), dessa vez com os gramáticos especulativos ou modistas (1270-1330). A base da teoria modista é a correspondência especular entre mundo, intelecto e linguagem, sendo a lógica aristotélica fundamento adequado a esse a priori. Dando continuidade ao que já estava consolidado na gramática latina, o par nome-verbo, ou sujeito-predicado, foi considerado essencial à construção sintática bem formada. A inovação dos especulativos, de acordo com Robins (1979)ROBINS, R. H. Pequena história da linguística. Tradução de Luiz Martins Monteiro de Barros. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico; Brasília: INL, 1979., fica por conta de suas análises terem ido além das construções sujeito-verbo e verbo-objeto, ao configurar relações sintáticas com base nas ideias de dependente (termo que deve ou pode exigir a presença do outro) e terminante (termo que satisfaz tal exigência). Esse tipo de relação serviu, entre outras finalidades, para identificar orações subordinadas, um bom exemplo de aprimoramento modista no campo teórico e terminológico dos estudos sintáticos.

Sintaxe em gramáticas de língua portuguesa até o século XIX

Também fazem parte do horizonte de retrospecção dos saberes sintáticos no Brasil os primeiros séculos da gramaticografia portuguesa. É verdade que o pioneirismo de Fernão de Oliveira (1507-1581), com sua Grammatica da lingoagem portuguesa (1536), não nos oferece uma abordagem sintática efetiva. Embora haja menção à ideia de construção, entendida como a “[…] composição ou concerto que as partes ou dições da nossa língua tem entre si.” (OLIVEIRA, F., 1871OLIVEIRA, F. de. Grammatica da linguagem portuguesa. Porto: Imprensa Portuguesa, 1871., p.117), não há reflexões sintáticas desenvolvidas e sistematizadas na obra, pois ao assunto só é dado espaço no capítulo XLIX – o penúltimo da gramática, pouco maior que uma página. Nele, lê-se que a sintaxe deveria ser tratada com fôlego em obra posterior, já começada, mas que nunca viria a ser finalizada (ou talvez tenha se perdido).

Não faz algo diferente disso a Grammatica da lingua portuguesa, publicada em 1540 pelo historiador João de Barros (1496-1570). A última das quatro partes do instrumento é dedicada a Sintaxe ou Construção, compreendida como “conveniência entre as partes do discurso”. Entretanto, as questões sintáticas propriamente ditas ficam restritas ao campo normativo da concordância e do regimento (regência) ou das figuras (barbarismos). A propósito, a questão normativa é forte tanto em Barros quanto em Oliveira: este percebe a variação como constitutiva da língua, mas equivale o português à fala dos homens cultos de sua época; aquele compreende as mudanças do latim ao português como ausências ou perdas. Por isso, as poucas considerações sobre sintaxe do período estão perpassadas pelo viés ufanista-padronizador desses dois primeiros gramáticos portugueses.

Em linhas gerais, até o século XVIII, a teoria sintática sempre ocupou espaço pouco significativo nas gramáticas do português, quando comparado aos lugares dados aos níveis dos sons/letras e palavras. Alinhado, por exemplo, a Azeredo (2015)AZEREDO, J. C. de. Sintaxe normativa tradicional. In: OTHERO, G. Á.; KENEDY, E. (org.). Sintaxe, sintaxes: uma introdução. São Paulo: Contexto, 2015. p.197-216. e Beccari e Leal (2015)BECCARI, A. J.; LEAL, E. de. S. Uma breve revisão dos antecedentes históricos da pressuposição dos dois níveis da linguagem na sintaxe das gramáticas racionalistas portuguesas do final do século XVIII. Cadernos de Historiografia Linguística do CEDOCH: VII MiniEnapol de Historiografia Linguística (2013), São Paulo, v.1, p.54-70, 2015. Disponível em: http://cedoch.fflch.usp.br/sites/cedoch.fflch.usp.br/files/u65/CHLC1_0.pdf. Acesso em: 12 fev. 2019.
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, penso que uma mudança parece ter tido início somente a partir da influência teórica que as gramáticas das línguas europeias passaram a receber da Gramática Geral e Razoada de Port-Royal (1660), também conhecida como gramática racionalista ou filosófica. Escrita pelos monges franceses Antoine Arnauld (1612-1694) e Claude Lancelot (1615-1695), essa gramática seria, assim, ponto de ruptura com a tradição gramaticográfica humanística, em que se fundamentaram as primeiras gramáticas do português (ARNAULD; LANCELOT, 1803)ARNAULD, A.; LANCELOT, C. Grammaire générale et raisonnée de Port-Royal. Paris: Imprimerie de Munier, 1803. Disponível em: https://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k6117192g.texteImage. Acesso em: 12 fev. 2019.
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.

A Gramática Geral e Razoada de Port-Royal (doravante GGR) parte da ideia de que existe uma articulação de base lógica entre a linguagem e o pensamento, sendo este último constituído a partir de três operações: a concepção (isolamento de uma coisa qualquer no mundo), o julgamento (afirmação daquilo que uma coisa é ou não é) e o raciocínio (uso de dois julgamentos para chegar a outro). Nesse âmbito, a gramática seria um conjunto de processos universais e mentais, o que justifica seus epítetos “geral” e “razoada”. E a sintaxe da GGR estaria fundamentada justamente na análise da operação de “julgamento”, o campo da oração, estrutura proposicional que representa o pensamento.

Nota-se que o objeto da sintaxe permanece sendo a oração. Entretanto, a análise desse objeto é desenvolvida na GGR a partir da consideração de dois níveis de linguagem: o nível da Sintaxe propriamente dito, ou seja, o nível profundo, lógico, universal e inato; e o nível da Construção, isto é, o nível externo, particular, relacionado aos usos e contraparte sobressaliente do primeiro nível. Assim, estruturas proposicionais diferentes como Eu fui ao cinema e Ao cinema eu fui teriam construções diferentes mas sintaxes idênticas.

É nesse nível, o da Sintaxe, que toda oração seria formada por três elementos básicos: o sujeito; seu atributo; e a cópula, que estabelece a ligação entre os dois. A cópula seria o “verbo substantivo”, primário, real. Os demais verbos, denominados “verbos adjetivos”, seriam criados a partir do verbo substantivo associado a um atributo. Toda construção teria de ser reduzida a esse modelo. Logo, construções como Eu falo, Pedro vive e Os homens sonham equivaleriam, no nível sintático (profundo), a Eu sou falante, Pedro é vivente e Os homens são sonhadores, respectivamente. Beccari e Leal (2015)BECCARI, A. J.; LEAL, E. de. S. Uma breve revisão dos antecedentes históricos da pressuposição dos dois níveis da linguagem na sintaxe das gramáticas racionalistas portuguesas do final do século XVIII. Cadernos de Historiografia Linguística do CEDOCH: VII MiniEnapol de Historiografia Linguística (2013), São Paulo, v.1, p.54-70, 2015. Disponível em: http://cedoch.fflch.usp.br/sites/cedoch.fflch.usp.br/files/u65/CHLC1_0.pdf. Acesso em: 12 fev. 2019.
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apontam como essa distinção entre Sintaxe e Construção da GGR se relaciona com a noção de inatismo linguístico e o quanto a linguística moderna, na figura de Noam Chomsky (1928-), por exemplo, é tributária dos modelos racionalistas – um bom exemplo de descontinuidade teórica dentro da história da sintaxe no Ocidente.

Em geral, as gramáticas do português entre os séculos XVIII e XIX ancoraram suas abordagens da sintaxe nesse direcionamento teórico e descritivo-explicativo dos autores da GGR e de outros autores franceses que desenvolveram, à época, saberes renovados sobre a linguagem de um modo geral. Denominadas de “gramáticas filosóficas”, costumavam apresentar um capítulo intitulado fraseologia, sintaxe ou construção, em que tais diretrizes racionalistas eram assumidas. Ao mesmo tempo, era negado, sobretudo pelo apagamento da questão, o espaço de legitimação de aspectos sintáticos particulares do português do Brasil, mesmo estes já se fazendo perceber.

A primeira dessas obras portuguesas que carregou explicitamente a qualificação “filosófica” no título foi a Grammatica philosophica, e ortographia racional da Lingua Portugueza; Para se pronunciarem, e escreverem com acerto os vocabulos d'este idiôma, de Bernardo de Lima e Melo Bacelar (1736-1787), editada em Portugal, em 1783. Essa gramática teve pouca repercussão, diferentemente da Grammatica philosophica da lingua portugueza, do também português Jerónimo Soares Barbosa (1737-1816), cuja primeira edição é de 1822 e a última, de 1881. Comentadores da gramática filosófica de Soares Barbosa (cf. BECCARI; LEAL, 2015BECCARI, A. J.; LEAL, E. de. S. Uma breve revisão dos antecedentes históricos da pressuposição dos dois níveis da linguagem na sintaxe das gramáticas racionalistas portuguesas do final do século XVIII. Cadernos de Historiografia Linguística do CEDOCH: VII MiniEnapol de Historiografia Linguística (2013), São Paulo, v.1, p.54-70, 2015. Disponível em: http://cedoch.fflch.usp.br/sites/cedoch.fflch.usp.br/files/u65/CHLC1_0.pdf. Acesso em: 12 fev. 2019.
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; UCHÔA, 2010)UCHÔA, C. E. F. Sobre o ensino da análise sintática: história e redirecionamento. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2010. costumam apontá-la como a precursora de um sistema de análise, sobretudo sintática, que seria a base do que ainda hoje é usada na pedagogia tradicional do ensino de gramática.

Ter conhecimento dos laços e fendas que constituem esses e outros instrumentos gramaticais portugueses dos quinhentos aos oitocentos é relevante, portanto, para nos entendermos, como professores e pesquisadores, na história e no presente da investigação linguística e da pedagogia da sintaxe (e da gramática) no Brasil.

A fala brasileira no cenário gramaticográfico

Aspectos sintáticos próprios da “fala brasileira” só passaram a ser notados nas gramáticas de língua portuguesa quando estas também vieram a ser elaboradas por autores brasileiros, sobretudo a partir das últimas décadas do século XIX. Eram dignos de notas as sentenças interrogativas em ordem direta, o uso do verbo ter por haver, a duplicação do não, a próclise em início de oração, os pronomes ele e lhe em função de objeto direto, a construção para mim + infinitivo verbal, o uso da preposição em por a, entre outros.

À guisa de exemplos, podem ser apresentados os seguintes trechos das gramáticas do mineiro Júlio Ribeiro (1845-1890) e do sergipano João Ribeiro (1860-1934), ambas intituladas Grammatica Portugueza, publicadas, respectivamente, em 1881 e 1887: “Cumpre notar que, principalmente no Brazil, vai-se estabelecendo o uso de construir as sentenças interrogativas em ordem direta, deixando-se o seu sentido de pergunta a cargo somente da inflexão da voz, ex.: << Tu queres vir almoçar comigo? >>.” (RIBEIRO, Julio, 1881RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. São Paulo: Typ. de Jorge Seckler, 1881. Disponível em: https://www.labeurb.unicamp.br/bvclb/pages/obras/lerObra.bv?idObr=27. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, p.221); Substituem-se também ter a haver e dizem: “<< Tem muita gente na igrejaAgora tem muito peixe no tanque >>. Este uso vai-se tornando geral no Brazil até mesmo entre as pessôas ilustradas.” (RIBEIRO, Julio, 1881RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. São Paulo: Typ. de Jorge Seckler, 1881. Disponível em: https://www.labeurb.unicamp.br/bvclb/pages/obras/lerObra.bv?idObr=27. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, p.257); “Em algumas provincias do Brazil, como Bahia, Minas, não duplica-se, ex.: << Não posso, não. Não dou, não >>” (RIBEIRO, Julio, 1881RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. São Paulo: Typ. de Jorge Seckler, 1881. Disponível em: https://www.labeurb.unicamp.br/bvclb/pages/obras/lerObra.bv?idObr=27. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, p.260); “Costumam todos os philologos designar por brasileirismo (e eu em tal conta sempre o tive, até não ha muito) o uso do pronome pessoal elle, ella, elles, ellas, como objecto do verbo: << Eu vi elle, Eu deixei elle. >>” (RIBEIRO, João, 1920RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. 19.ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1920 [1887]., p.258).

Historiógrafas como Coelho, Danna e Polachini (2014)COELHO, O. F.; DANNA, S. M. D. G.; POLACHINI, B. S. O português do Brasil em gramáticas do século XIX. Confluência, Rio de Janeiro, n.46, p.115-141, 2014. Disponível em: http://llp.bibliopolis.info/confluencia/rc/index.php/rc/article/view/11. Acesso em: 12 fev. 2019.
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mencionam ter havido, a partir das últimas décadas dos oitocentos, algo como uma “escola” brasileira de descrição gramatical do português, justamente no momento em que nossos usos linguísticos pareceram se difundir com maior amplitude e estabilidade no processo de formação sócio-histórica das normas brasileiras. Além disso, a orientação histórico-comparativa que atravessava esse momento da gramaticografia no Brasil compreende o processo constante de mudança como algo natural às línguas, diferentemente da orientação racionalista, cuja relação estabelecida entre pensamento perfeito e linguagem perfeita, de certo modo, não se harmoniza com a consideração do diferente sem depreciá-lo.

Por essa época até o início do século XX, também surgiram as conhecidas polêmicas entre separatistas e legitimistas acerca da língua dos brasileiros (cf. ALBUQUERQUE; COX, 1997ALBUQUERQUE, J. G de; COX, M. I. P. A polêmica entre separatistas e legitimistas em torno de língua do Brasil na segunda metade do século XIX. Polifonia, Cuiabá, n.3, p.31-59, 1997. Disponível em: http://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/polifonia/article/view/1175. Acesso em: 12 fev. 2019.
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; PFEIFFER, 2001PFEIFFER, C. C. A Língua nacional no espaço das polêmicas do século XIX/XX. In: ORLANDI, E. P. (org.). História das ideias linguísticas: construção do saber metalinguístico e constituição da língua nacional. Campinas: Unemat, 2001. p.167-183.; SILVA, 2010SILVA, M. Júlio Ribeiro polemista: um capítulo da história das querelas linguísticas no Brasil. Polifonia, Cuiabá, v.2, n.1, p.64-74, jan.-jun. 2010. Disponível em: http://www.periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/polifonia/article/viewFile/16/16. Acesso em: 19 fev. 2019.
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; entre outros), marcando o período da constituição da língua nacional do Brasil – agora Império e depois República. De um lado, o ideário de liberdade dos separatistas, que pregavam a diferenciação linguística entre Brasil e Portugal, e defendiam o falar brasileiro no léxico, na morfologia e na sintaxe; de outro lado, o conservadorismo dos legitimistas, que protegiam o português clássico contra a invasão de neologismos e da fala popular. Entre as principais polêmicas, os embates mais calorosos foram entre os seguintes separatistas e legitimistas, respectivamente: José de Alencar vs. Pinheiros Chagas, em 1870; Carlos de Laet vs. Camilo Castelo Branco, em 1879-1880; Ernesto Carneiro Ribeiro vs. Rui Barbosa, em 1902-1907, no fatídico caso em torno da redação do Código Civil; e Carlos de Laet vs. João Ribeiro, em 1913.

Quanto ao posicionamento conciliatório ou separatista dos gramáticos brasileiros desse interstício (final do século XIX e início do século XX), as diferentes formas como eles nomeiam a língua do Brasil já revelam algum juízo de valor, como registra Coelho (2012)COELHO, O. F. O português do Brasil em Macedo Soares (1838-1905). Limite: Revista de Estudios Portugueses y de la Lusofonía, Cáceres, n.6, p.199-215, 2012. Disponível em: http://www.revistalimite.es/volumen%206/10coel.pdf. Acesso em: 12 fev. 2019.
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, em lista que cataloga termos como luso-brasileiro, dialeto brasileiro, dialeto nacional, brasileiro, nossa língua, língua brasileira, entre outros. Segundo a autora, a postura desses gramáticos, em linhas gerais, tende a ser mais conservadora, quer por eles restringirem as particularidades sintáticas dos brasileiros à fala e à coloquialidade, quer por eles ressaltarem a unidade entre o português do Brasil e o de Portugal, pondo os traços brasileiros em caráter de exceção à regra.

Os trechos seguintes, extraídos mais uma vez de Júlio Ribeiro (1881)RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. São Paulo: Typ. de Jorge Seckler, 1881. Disponível em: https://www.labeurb.unicamp.br/bvclb/pages/obras/lerObra.bv?idObr=27. Acesso em: 19 fev. 2019.
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e João Ribeiro (1920RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. 19.ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1920 [1887]. [1887]), exemplificam a contento as restrições normativas dos gramáticos do período, as quais desautorizam aspectos sintáticos da fala brasileira: “E’ erro vulgar no Brazil usar-se em casos taes da relação subjectiva; diz-se, por exemplo, << Vi elle caminhar ás pressasDeixa elle ir >>.” (RIBEIRO, Julio, 1881RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. São Paulo: Typ. de Jorge Seckler, 1881. Disponível em: https://www.labeurb.unicamp.br/bvclb/pages/obras/lerObra.bv?idObr=27. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, p.228); “Os pronomes substantivos em relação adverbial nunca podem servir de sujeitos, nem mesmo nas phrases infinitivas que vêm depois de uma preposição […], ex.: << Esta laranja é para eu comer >>. No Brazil pecca-se contra este preceito dizendo-se << Para mim comer, etc. >>.” (RIBEIRO, Julio, 1881RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. São Paulo: Typ. de Jorge Seckler, 1881. Disponível em: https://www.labeurb.unicamp.br/bvclb/pages/obras/lerObra.bv?idObr=27. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, p.228); “Por em relação subjectiva o pronome substantivo que serve de objeto a um verbo é erro comezinho no Brasil, até mesmo entre os doutos: ouvem-se a cada passo as locuções incorretas << Eu vi elle – Espere eu >>.” (RIBEIRO, Julio, 1881RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. São Paulo: Typ. de Jorge Seckler, 1881. Disponível em: https://www.labeurb.unicamp.br/bvclb/pages/obras/lerObra.bv?idObr=27. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, p.230); “A expressão O que é a vida? com anteposição do pronome o, é provavelmente um brasileirismo. O uso clássico não admitte anteposição do o.” (RIBEIRO, João, 1920RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. 19.ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1920 [1887]. [1887], p.169); “Nunca se começa phrase ou período com o pronome oblíquo. <<Me dê>>, <<me faça>>, etc., são brasileirismos que devem ser evitados” (RIBEIRO, João, 1920RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. 19.ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1920 [1887]. [1887], p.231).

Assim, se é verdade que as gramáticas brasileiras, a partir das últimas décadas do século XIX, abordaram o português falado no Brasil em termos de sintaxe (bem como pronúncia, léxico e morfologia), também o é que tais abordagens costumavam avaliar negativamente esse português, pondo seus traços linguísticos no campo dos provincianismos, vícios e solecismos. Observar como esses e outros fatos são tratados nos instrumentos linguísticos que se sobrepuseram temporalmente às gramáticas brasileiras do século XIX e começo do século XX é crucial à apreensão dos aspectos que circundam a padronização da língua até os dias de hoje e a uma necessária atuação política e pedagógica sobre a questão.

Das gramáticas filosóficas às gramáticas “científicas”: modelos sintáticos

Ainda pelas décadas finais dos oitocentos, a cena linguística brasileira encabeçada pelo pensamento histórico-comparativo interferiu não só na lida com questões normativas envolvendo a sintaxe do português (do Brasil), mas também nos modelos teóricos selecionados pelos gramáticos para descrever essa sintaxe.

A já citada Grammatica Portugueza, de Júlio Ribeiro (1881)RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. São Paulo: Typ. de Jorge Seckler, 1881. Disponível em: https://www.labeurb.unicamp.br/bvclb/pages/obras/lerObra.bv?idObr=27. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, costuma ser reconhecida como marco inaugural dessa abordagem dita “científica” (cf. CAVALIERE, 2002CAVALIERE, R. Uma proposta de periodização dos estudos linguísticos. Confluência, Rio de Janeiro, v.23, p.102-119, 2002. Disponível em: http://llp.bibliopolis.info/confluencia/pdf/1456.pdf. Acesso em: 12 fev. 2019.
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; LEITE, 2005LEITE, M. Q. A hiperlíngua brasileira na construção da norma gramatical: um estudo de gramáticas do século XIX. Estudios portugueses, Salamanca, v.5, p.103-112, 2005. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=3745637. Acesso em: 19 fev. 2019.
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; VIDAL NETO, 2010VIDAL NETO, J. B. C. A Grammatica portugueza, de Júlio Ribeiro: um corte epistemológico na gramaticografia brasileira e a questão da língua portuguesa no Brasil. 2010. 141f. Dissertação (Mestrado em Letras) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.; entre outros). À época, o alcance das gramáticas filosófico-racionalistas havia se abrandado, ao passo que a linguística histórico-comparativa – preocupada com as manifestações concretas e as mudanças nas línguas particulares, e não com suas estruturas subjacentes supostamente universais – passava a ser reverenciada.

Porém, as mudanças não se deram sem deslizamentos de sentido, rearticulações, ou mesmo resistências. Conforme Borges Neto (2018)BORGES NETO, J. História da Gramática. Curitiba: Ed. da UFPR. 2018. No prelo., a forte influência do pensamento histórico-comparativo trouxe algumas inovações no tratamento da fonologia e da morfologia pelas gramáticas, mas o impacto causado na sintaxe foi menor. De fato, as primeiras gramáticas brasileiras novecentistas (de autores como Júlio Ribeiro e Ernesto Carneiro Ribeiro), independentemente de se declararem “científicas” ou partidárias das ideias evolucionistas ou da metodologia comparativa e histórica da glotologia, retomavam, em certa medida, o arranjo sintático tripartite sujeito + cópula + atributo e seu aspecto holístico, ou seja, a ideia de “proposição perfeita”, elaborada por meio da operação de “julgamento”.

É o caso do próprio Júlio Ribeiro. A 1a edição de sua gramática (1881) segue na prática o modelo sintático do racionalismo francês, mesmo já apresentando forte “retórica revolucionária” (MURRAY, 1994)MURRAY, S. O. Theory groups and study of language in North America: a social history. Amsterdã: John Benjamins, 1994. contra o espírito gramaticográfico da época:

Sentença é uma coordenação de palavras ou mesmo uma só palavra formando sentido perfeito, ex.: As abelhas fazem melOs cães ladramMorro. […] Por << formar sentido perfeito >> entende-se – dizer alguma cousa a respeito de outra de modo completo. (RIBEIRO, 1881RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. São Paulo: Typ. de Jorge Seckler, 1881. Disponível em: https://www.labeurb.unicamp.br/bvclb/pages/obras/lerObra.bv?idObr=27. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, p.221).

[…] o laço que prende o predicado propriamente dito ao sujeito: chama-se copula. Neste exemplo << Rosas são flores >> << Rosas >> é o sujeito; << são >> a copula; << flores >>, o predicado. Neste outro << Pedro ama >> << ama>> decompõe-se em << é amante >>, e todo o exemplo analysa-se como acima. Em geral, póde-se dizer […] que a copula grammatical de todas as sentenças consiste na flexão do verbo. O acto da mente, pelo qual o predicado se liga a noção expressa pelo sujeito, chama-ae (sic) juizo. O resultado de um juizo é um pensamento. A expressão do pensamento é a sentença. (RIBEIRO, 1881RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. São Paulo: Typ. de Jorge Seckler, 1881. Disponível em: https://www.labeurb.unicamp.br/bvclb/pages/obras/lerObra.bv?idObr=27. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, p.222-223).

Essa aparente contradição de Julio Ribeiro (1881)RIBEIRO, J. Grammatica portugueza. São Paulo: Typ. de Jorge Seckler, 1881. Disponível em: https://www.labeurb.unicamp.br/bvclb/pages/obras/lerObra.bv?idObr=27. Acesso em: 19 fev. 2019.
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ratifica o que diz Polachini (2010-2011), quando sugere ter havido primeiramente um momento de intensa recusa retórica do modelo lógico-filosófico de Port-Royal pelos gramáticos, para que apenas posteriormente tal modelo pudesse ser substituído nas descrições sintáticas efetivamente elaboradas.

Ernesto Carneiro Ribeiro (1839-1920) também foi outro gramático brasileiro que transitou, no decorrer de seus textos, de uma análise sintática de base lógica, cujo objeto é a proposição (julgável verdadeira ou falsa), a uma análise sintática que considera a estrutura gramatical particular, pautada na gramática científica de influência inglesa, cujo objeto é a sentença, veículo linguístico da proposição e de outras construtos que não são proposições (cf. BORGES NETO, 2018)BORGES NETO, J. História da Gramática. Curitiba: Ed. da UFPR. 2018. No prelo..

De acordo com Bastos, Brito e Hanna (2006)BASTOS, N. M. O. B.; BRITO, R. H. P.; HANNA, V. L. H. Gramaticografia novecentista: raízes maximinianas. In: BASTOS, N. B.; PALMA, D. V. (org.). História entrelaçada 2: a construção de gramáticas e o ensino de língua portuguesa na primeira metade do século XX. Rio de Janeiro: Lucerna, 2006. p.61-81., Dias (2008)DIAS, L. F. Articulação sintática em gramáticas do século XIX. Letras, Santa Maria, n.37, p.125-134, 2008. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/letras/article/view/11983. Acesso em: 12 fev. 2019.
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, Polachini (2015)POLACHINI, B. S. Uma proposta de periodização “complexa” para a gramaticografia oitocentista do português. Cadernos de Historiografia Linguística do CEDOCH: VII MiniEnapol de Historiografia Linguística (2013), São Paulo, v.1, p.18-33, 2015. Disponível em: http://cedoch.fflch.usp.br/sites/cedoch.fflch.usp.br/files/u65/CHLC1_0.pdf. Acesso em: 19 fev. 2019.
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e outros autores, a ruptura definitiva com a sintaxe racionalista só aconteceria com Maximino Maciel (1865-1923) e sua Grammatica Descriptiva, baseada das doutrinas modernas, cuja 1a edição é de 1894. Na obra em questão, Maciel (1920MACIEL, M. Grammatica Descriptiva, baseada nas doutrinas modernas. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1920., p.253) divide o que chama de Syntaxologia – “[…] o tratado das palavras, consideradas collectivamente, isto é, nas suas diversas funcções ou relações lógicas.” – em três partes: syntaxe relacional, syntaxe phraseologica e syntaxe literária ou estylistica. Nas duas primeiras, o gramático passa a definir proposição a partir do modelo bipartite sujeito-predicado e compreender o complemento verbal como um elemento subordinado formalmente ao verbo, condizente com o que vemos na sintaxe tradicional de hoje. Na perspectiva desse gramático, o verbo integra um predicado que projeta um termo de funcção objectiva:

Proposição é um pensamento expresso por uma ou mais palavras. Dous são os termos da proposição: sujeito e predicado, ex.: […]

SUJEITO PREDICADOS Os céos resoam do Senhor a gloria O Douro é bem carregado e triste

Sujeito é o ser de quem se diz alguma cousa, ex.: Os céos… Predicado é o que se diz a respeito do sujeito, ex.: resoam do Senhor a gloria. (MACIEL, 1920MACIEL, M. Grammatica Descriptiva, baseada nas doutrinas modernas. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1920., p.324-325).

A funcção objectiva é exercida por uma palavra ou expressão a que se transmite imediata ou mediatamente a acção do verbo de predicação incompleta. A palavra em funcção objectiva diz-se objecto, que pôde ser directo ou indirecto. (MACIEL, 1920MACIEL, M. Grammatica Descriptiva, baseada nas doutrinas modernas. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1920., p.258).

Deve ser dito que a recusa à sintaxe de Port-Royal não surtiria efeitos práticos sem os contributos teóricos de alguns gramáticos e linguistas alemães, ingleses e franceses dos oitocentos, principais influenciadores explícitos da gramaticografia luso-brasileira. O linguista Ricardo Cavaliere escarafuncha essas relações em alguns artigos do livro A gramática no Brasil: ideias, percursos e parâmetros, publicado pela Editora Lexicon, em 2014. Retomemos sumariamente algumas das principais influências apontadas pelo autor, no que diz respeito à sintaxe.

É do inglês Alexander Bain (1818-1903) o modelo de divisão da gramática em duas grandes partes, a lexiologia e a sintaxe, modelo este que viria a ser adotado e popularizado na obra de João Ribeiro. Por sua vez, a teoria das relações sintáticas do inglês Charles Peter Mason (1820-1900), pautada em dois níveis temáticos – o da sintaxe léxica e o da sintaxe lógica –, teria sido tomada por Júlio Ribeiro para lhe acrescentar um terceiro nível, o das regras de sintaxe, envolvendo concordância, regência e particularidades sintáticas das partes do discurso. O mesmo Júlio Ribeiro também remete aos estudos do francês Michel Bréal (1832-1915), para caracterizar o infinitivo e o particípio como formas nominais do verbo (o primeiro representa o substantivo e o segundo, o adjetivo), ao invés de modos verbais; ou para analisar o pronome se em construções ativas, passivas e reflexivas. Alguns anos mais tarde, seria a vez do filólogo fluminense Manuel Said Ali Ida (1861-1953), um dos maiores sintaticista da língua portuguesa, se inspirar na teoria sintática do alemão Berthold Delbrück (1842-1922), a fim de sustentar, por exemplo, a tese da oração sem sujeito em português. Said Ali também cita, entre outros linguistas alemães, Karl Brugmann (1849-1919), na abordagem das vozes verbais; Friedrich Diez (1794-1876), quando comenta o caráter peculiar do infinitivo flexionado português; e Hermann Paul (1846-1921), na célebre questão do clítico se em construções “passivas”, o qual, de acordo com Said Ali, exerceria a função de sujeito, tese fora da caixa da tradição gramatical brasileira até hoje. Cavaliere (2014)CAVALIERE, R. A gramática no Brasil: ideias, percursos e parâmetros. Rio de Janeiro: Lexikon, 2014. sugere que essas influências tenham se arrefecido na gramaticografia brasileira somente a partir dos anos 1940, sobretudo com a entrada do modelo estruturalista e, posteriormente, do modelo gerativo na pesquisa linguística universitária, implementada no Brasil a partir da década de 1960.

Em suma, uma historiografia do pensamento sintático no Brasil, constituído por processos elásticos de continuidade e movimentos retóricos ou concretos de ruptura (MURRAY, 1994)MURRAY, S. O. Theory groups and study of language in North America: a social history. Amsterdã: John Benjamins, 1994., requer a compreensão de guinadas teóricas, redes de influência (SWIGGERS, 2004)SWIGGERS, P. Modelos, métodos y problemas en la historiografia de la lingüística. In: ZUMBADO, C. et al. (ed.). CONGRESSO, INTERNACIONAL DE LASEHL, 4., 2003. Actas […]. Madrid: Arco Libros, 2004. p.113-146. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/libro?codigo=6013. Acesso em: 19 fev. 2019.
https://dialnet.unirioja.es/servlet/libr...
, atmosferas intelectuais (KOERNER, 1996)KOERNER, E. F. K. Questões que persistem em historiografia linguística. Revista da ANPOLL, Florianópolis, n.2, p.45-70, 1996. Disponível em: https://revistadaanpoll.emnuvens.com.br/revista/article/view/240/253. Acesso em: 19 fev. 2019.
https://revistadaanpoll.emnuvens.com.br/...
, horizontes de retrospecção e prospecção (AUROUX, 1992)AUROUX, S. A revolução tecnológica da gramatização. Tradução de Eni Puccinelli Orlandi. Campinas: Ed. da UNICAMP, 1992., entre outros fenômenos internos e externos sugeridos ou já apontados (mas pouco aprofundados) por outras pesquisas historiográficas sobre sintaxe.

A virada pragmática e o discurso antigramática

Circunscritos nas balizas teóricas e normativas apresentadas acima, os saberes sintáticos e sua disciplinarização escolar seguiram no Brasil na primeira metade do século XX. A literatura costuma dizer que, somente nos anos 1960, com a entrada da Linguística nos cursos de graduação em Letras e a abertura dos primeiros cursos de pós-graduação em Linguística, as críticas à gramática tradicional e a seu ensino eclodiram no meio acadêmico.

No entanto, já no final dos anos 1940, antes mesmo da ascensão da Linguística sobre à Filologia no Brasil (cf. ALTMAN, 2004)ALTMAN, C. A pesquisa linguística no Brasil (1968-1988). 2.ed. São Paulo: Humanitas, 2004., vozes novas já se faziam ouvir. É o caso do filólogo e gramático Gladstone Chaves de Melo (1917-2001), ex-professor da Universidade Federal Fluminense e autor dos textos “Vícios do nosso ensino gramatical” e “Como se deve estudar a língua”, publicados em 1949, em forma de capítulos, na obra Iniciação à Filologia Portuguêsa. Esses textos de Chaves de Melo já clamavam pelo combate à “gramatiquice”, pela aproximação entre Linguística e ensino de gramática, pela relativização da regra e do erro, conforme exemplificam os seguintes trechos:

[…] No nosso modesto porém tenaz combate contra essa enormidade a que chamamos gramatiquice, […] temos encontrado consoladoras ressonâncias em muitos amigos […] É, aliás, essa generosa ressonância que explica o aparecimento deste livrinho, cujo objetivo constante é a denúncia dos vícios do nosso ensino gramatical e a propugnação de métodos racionais e à altura da ciência linguística atual. (MELO, 1957MELO, G. C. de. Iniciação à Filologia Portuguêsa. 2.ed. Rio de Janeiro: Livraria Acadêmica, 1957., p.343-344, grifo nossos).

Tal ensino gramatical parte, continua e termina, tendo em vista excessivamente o lado negativo, o êrro, os aleijões. Escrever bem seria escrever sem erros, o que é um conceito pobríssimo. […] Além do mais, bom número dos erros apontados à execração pelos ditos senhores não são erros, são infrações a regras inventadas, criadas e cultivadas por êles próprios, numa edificante sociedade de auxílios e elogios mútuos. (MELO, 1957MELO, G. C. de. Iniciação à Filologia Portuguêsa. 2.ed. Rio de Janeiro: Livraria Acadêmica, 1957., p.353, grifo nossos).

Pode-se dizer, portanto, que a formalização da Linguística no Brasil, a partir dos anos 1960, tenha engrossado o coro dos descontentes com as soluções descritivo-normativas e pedagógicas que vinham sendo ofertadas à esteira da tradição gramatical brasileira, não raro com pouca criticidade. A ruptura, inicialmente restrita ao nível retórico, ganharia contornos mais concretos desde então, num primeiro momento capitaneado por linguistas formalistas – inicialmente pela linguística estrutural e a partir dos anos 1970 pela linguística gerativa.

Por essa época, conforme Bastos, Brito e Hanna (2006)BASTOS, N. M. O. B.; BRITO, R. H. P.; HANNA, V. L. H. Gramaticografia novecentista: raízes maximinianas. In: BASTOS, N. B.; PALMA, D. V. (org.). História entrelaçada 2: a construção de gramáticas e o ensino de língua portuguesa na primeira metade do século XX. Rio de Janeiro: Lucerna, 2006. p.61-81. e Gomes Júnior (2017)GOMES JÚNIOR, S. C. Prescrição e descrição – dois vieses na Gramática Fundamental da Língua Portuguesa, de Gladstone Chaves de Melo. Estudos Linguísticos, São Paulo, n.46, p.154-171, 2017. Disponível em: https://revistas.gel.org.br/estudos-linguisticos/article/view/1583. Acesso em: 19 fev. 2019.
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, alguns linguistas passaram a renegar o modelo tradicional de análise gramatical e adotar os métodos proporcionados pelo estruturalismo, a exemplo de Leodegário A. de Azevedo Filho (1927-2011), que, em 1971, publicou o livro programático Para uma gramática estrutural da língua portuguesa; e do cearense José Rebouças Macambira (1917-1992), que, em 1974, publicou a conhecida obra A estrutura morfossintática do português. Mesmo gramáticos considerados tradicionais, como Celso Cunha (1917-1989) e o recém-citado Gladstone Chaves de Melo, sofreram influência do estruturalismo na elaboração de suas gramáticas no final dos anos 1960 (cf. MELO, 1970)MELO, G. C. de. Gramática fundamental da língua portuguesa. 2.ed. Rio de Janeiro: Livraria Acadêmica, 1970. e início dos 1970 (cf. CUNHA, 1986CUNHA, C. Gramática da Língua Portuguesa. 11.ed. Rio de Janeiro: FAE, 1986., 1970)CUNHA, C. Gramática do português contemporâneo. Belo Horizonte: Bernardo Alves S. A, 1970. e, por extensão, na abordagem da sintaxe nesses instrumentos.

Ainda por essa década e na década de 1980, começaram a tomar corpo na Linguística brasileira diferentes teorias que tomam a língua em uso, o que autoriza a se falar em uma virada pragmática nos contextos de pesquisa linguística e de reflexão sobre o ensino-aprendizagem de línguas. A ideia, comum à epistemologia da gramática tradicional, de que o estudo da forma resultaria no bom uso da língua passava a ser suplantada pelo ponto de vista de que o uso da língua deveria ser anterior ao estudo da forma. A Linguística, assim, distendeu seus próprios horizontes no Brasil e complexificou seu território, propondo formulações teóricas elaboradas no diálogo com outras disciplinas e com fatores extralinguísticos. Teorias linguísticas não formalistas, centradas no texto, no discurso, na variação linguística e em ampla recepção pelos linguistas brasileiros, começaram a fundamentar a formação básica ou continuada de professores, bem como documentos oficiais (guias, orientações e parâmetros curriculares municipais, estaduais, federais), contribuindo para a elaboração de textos sobre língua e ensino, para a regulação curricular e para os instrumentos didáticos da área de linguagem no Brasil.

Nesse âmbito, foram tantos os estudos linguísticos e os textos de caráter de divulgação científica publicados sobretudo a partir da década de 1980, apontando contradições e insuficiências conceituais e metodológicas da gramática greco-latina, que, hoje em dia, a crítica à análise sintática tradicional chega a ser consenso entre linguistas das mais distintas áreas e entre professores de português formados em diferentes universidades. Muitas dessas publicações criticam não só a gramática tradicional e a ideia de norma-padrão que ela abraça, como também o ensino tradicional de língua portuguesa e o caráter beletrista da escola brasileira, sendo algumas delas já consideradas obras clássicas sobre o assunto, como Hauy (1983)HAUY, A. B. Da necessidade de uma gramática-padrão da Língua Portuguesa. São Paulo: Ática, 1983., Geraldi (1984)GERALDI, J. W. (org.). O texto na sala de aula. São Paulo: Ática, 1984., Luft (1995)LUFT, C. P. Língua e liberdade. 4.ed. São Paulo: Ática, 1995., Back (1987)BACK, E. Fracasso do ensino de português: proposta de solução. Petrópolis: Vozes. 1987., Franchi (2006)FRANCHI, C. Mas o que é mesmo “gramática”? São Paulo: Parábola Editorial, 2006. p.11-33., Travaglia (2008)TRAVAGLIA, L. C. Gramática e interação: uma proposta para o ensino de gramática. 12.ed. São Paulo: Cortez, 2008., Possenti (1996)POSSENTI, S. Por que (não) ensinar gramática na escola. Campinas: ALB: Mercado de Letras, 1996., Perini (1997)PERINI, M. A. Sofrendo a gramática. São Paulo: Ática, 1997. e Bagno (1999)BAGNO, M. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. São Paulo: Edições Loyola, 1999..

Também há de se considerar que, por essa época, as teorias linguísticas que fundamentaram a virada da forma aos usos já haviam revelado aspectos da linguagem e das línguas (incluindo aí a língua portuguesa) até então desconhecidos, negados ou marginalmente abordados pela gramática tradicional e mesmo pela Linguística de viés formalista. O deslocamento do foco – da frase para o texto, do enunciado para a enunciação – provocado pelas abordagens “hifenizadas” dos estudos linguísticos (sociolinguística, linguística de texto, análise do discurso, psicolinguística etc.) tentou abranger o fenômeno linguagem para além dos aspectos verbais, incorporando em suas análises aspectos funcionais, textuais, discursivos e interacionais. Isso demandou novas categorias de análise para se refletir sobre a língua, de maior alcance explicativo em comparação às categorias seculares da tradição gramatical, restritas ao escopo da oração.

Há algumas posições compartilhadas pelos diferentes agentes da virada, dentre as quais podem ser destacadas: a necessidade de revisão crítica dos princípios de análise e da norma-padrão da gramática tradicional, ou mesmo da elaboração de gramáticas sob novas configurações epistemológicas; a importância do respeito às variedades linguísticas em geral e a consideração da variedade linguística do estudante no trato pedagógico; e a mudança na unidade máxima de ensino de língua, que sai do nível oracional sintático e migra para o domínio do texto, do gênero, do discurso. Os impactos desse redirecionamento epistemológico seriam sentidos, de diferentes maneiras, no cotidiano pedagógico do professor de português no Brasil.

Não tenho dúvidas de que esse movimento tenha sido necessário e produtivo à pesquisa e ao ensino de língua. Entretanto, entendo também que ele tenha ajudado a construir e legitimar o radicalismo do discurso antigramática no ensino e na formação dos professores de português, concretizado em afirmações como “gramática não serve pra nada”, o qual tendo a avaliar como precipitado ou mesmo equivocado. Nesse sentido, são bastante lúcidas as palavras de Oliveira e Quarezemin (2016)OLIVEIRA, R. P.; QUAREZEMIN, S. Gramáticas na escola. Petrópolis: Vozes, 2016., transcritas abaixo:

[…] esse movimento [da entrada da Linguística nas escolas] foi interpretado como uma negação do ensino de gramática na escola. É como se, desse momento em diante, não se devesse ensinar gramática na escola. […] Nos círculos dos detentores do saber sobre o ensino de português, ensinar gramática ficou relegado a muito pouco e esse pouco é, na verdade, o que já se fazia antes. Há uma mudança porque deslocamos o eixo do decorar regras da gramática normativa para a produção e leitura de textos, mas mantém-se a mesma imagem de gramática que se tinha e a mesma prática com relação ao seu estudo. A gramática foi oficialmente expulsa da sala de aula e continuou de modo absolutamente tradicional e mais forte, porque agora apresentada como um instrumento sem importância. (OLIVEIRA, R.; QUAREZEMIN, 2016OLIVEIRA, R. P.; QUAREZEMIN, S. Gramáticas na escola. Petrópolis: Vozes, 2016., p.28-29, grifo nosso).

Em nenhum momento, os documentos oficiais elaborados nesse contexto da virada – que culminaria, apenas oficialmente, com os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclo do ensino fundamental: língua portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1998.) – advogam a negação do ensino de gramática (e de sintaxe) nas aulas de língua portuguesa, embora alguns profissionais insistam nessa cantilena. O que veio sendo proposto fora o deslocamento da gramática como centro, passando a ser subsidiária da leitura e da produção escrita e oral. A defesa desse deslocamento, a que se vem dando o nome, há mais de 30 anos, de “prática de análise linguística” (cf. GERALDI, 2001GERALDI, J. W. Unidades básicas do ensino de português. In: GERALDI, J. W. (org.). O texto na sala de aula. São Paulo: Ática, 2001. p.59-79.; MENDONÇA, 2006MENDONÇA, M. Análise linguística no ensino médio: um novo olhar, um outro objeto. In: MENDONÇA, M.; BUNZEN, C. (org.). Português no ensino médio e formação do professor. São Paulo: Parábola Editorial, 2006. p.199-226.; BEZERRA; REINALDO, 2013)BEZERRA, M. A.; REINALDO, M. A. Análise linguística: afinal, a que se refere? São Paulo: Cortez, 2013., foi mesmo necessária à época (e ainda é), mas creio que essa “nova” proposta ainda careça de procedimentos metodológicos concretos, em termos de pesquisas, políticas públicas, progressão curricular, materiais didáticos etc. Afinal, ela permanece enevoada aos olhos da grande maioria dos professores de língua portuguesa (e dos professores que formam os professores de língua portuguesa).

Devido a essa carência metodológica, muitos professores, salvo exceções, preferem adotar o discurso antigramática, subtraindo qualquer espécie de abordagem gramatical de seu horizonte pedagógico; outros tentam aplicar os direcionamentos teóricos da prática de análise linguística, mas somente oferecem o texto como suporte para a identificação do sujeito ou do verbo de ligação, por exemplo (a conhecida metodologia do texto como pretexto para o ensino de gramática); outros ainda, geralmente constrangidos por talvez estarem sendo tachados de desatualizados pelos pares, ignoram o discurso da mudança e permanecem na cartilha supostamente segura da tradição, espaço em que a análise sintática é carro-chefe.

A sintaxe normativa tradicional em contextos pedagógicos atuais

A análise sintática de orientação tradicional – ou “sintaxe normativa tradicional”, nos termos de Azeredo (2015)AZEREDO, J. C. de. Sintaxe normativa tradicional. In: OTHERO, G. Á.; KENEDY, E. (org.). Sintaxe, sintaxes: uma introdução. São Paulo: Contexto, 2015. p.197-216. – centra-se: na decomposição do período em orações; na identificação e etiquetagem das funções dos constituintes da oração; e, posteriormente, no estabelecimento de regras de concordância, regência e colocação entre os constituintes etiquetados. Trata-se de uma entidade ao mesmo tempo teórica, analítica, metalinguística, normativa e pedagógica, tendo sido o principal conteúdo das aulas de gramática no século XX e, arrisco a dizer, das duas primeiras décadas do século XXI.

Ponto que contribui para a sua permanência na escola do século XXI, mesmo com a virada dos usos já consolidada ao menos em discurso, é a evidente presença de seu arcabouço teórico-metodológico nos livros didáticos, inclusive naqueles que desenvolvem um trabalho com leitura, escrita e oralidade em lastros sociointeracionistas; nas gramáticas escolares, inclusive naquelas que se dizem reflexivas, aplicadas, contextualizadas etc.; e na base intelectual do professor de português.

Mesmo antes da NGB, que no final dos anos 1950 homogeneizou as partes da sintaxe, sua terminologia e, por consequência, as técnicas de análise, já havia certa uniformidade classificatória, conceitual e analítica nas gramáticas que atravessaram a primeira metade do século em sucessivas edições, como as de Eduardo Carlos Pereira (1855-1923) – cf. Pereira (1944PEREIRA, E. C. Gramática expositiva: curso elementar. 59.ed. São Paulo: Companhia Ed. Nacional, 1944., 1926)PEREIRA, E. C. Gramática expositiva: curso superior. 92.ed. São Paulo: Companhia Ed. Nacional, 1926. – e Manuel Said Ali. Na obra deste último, cuja 1a edição é de 1923, vislumbrava-se uma sintaxe semelhante à tradição de hoje, em que a oração, estrutura basilar da análise sintática, é constituída por termos primários (sujeito e predicado), integrantes (complementos) e acessórios (determinantes, aposto). A propósito, como bem aponta Cavaliere (2014)CAVALIERE, R. A gramática no Brasil: ideias, percursos e parâmetros. Rio de Janeiro: Lexikon, 2014., os estudos gramaticais de Said Ali foram decisivos para a integração entre sintaxe e morfologia, no sentido de que certas funções sintáticas estariam vinculadas a determinadas partes da oração. Essa postura seria acatada sob a rubrica “morfossintaxe” pelos estruturalistas do século XX. Tal abordagem morfossintática, conjugando classes, funções e regras de concordância/regência verbal e nominal e colocação pronominal, é hoje prática comum às aulas de gramática tradicional, embora nem sempre a identificação das classes e de suas respectivas funções seja realizada de modo consciente, reflexivo e crítico.

No que diz respeito às recentes gramáticas elaboradas por alguns linguistas de competência inconteste (cf. CASTILHO, 2010CASTILHO, A. T. de. Nova gramática do português brasileiro. São Paulo: Contexto, 2010.; BAGNO, 2012BAGNO, M. Gramática pedagógica do português brasileiro. São Paulo: Parábola, 2012.; PERINI, 2016PERINI, M. A. Gramática descritiva do português brasileiro. Petrópolis: Vozes, 2016.; AZEREDO, 2018AZEREDO, J. C. de. Gramática Houaiss da Língua Portuguesa. 4.ed. rev. ampl. São Paulo: Publifolha, 2018.; MOURA NEVES, 2018MOURA NEVES, M. H. de. A gramática do português revelada em textos. São Paulo: Ed. da UNESP, 2018.; entre outros), os autores flertam com ou mesmo se apropriam de algumas concepções teóricas, categorias e conceitos da Linguística, em suas atuais e diferentes epistemologias. Todavia, dada a impossibilidade de adotarem um paradigma teórico-metodológico delineado e suficiente para a descrição sintática, valem-se, explícita ou implicitamente, de procedimentos analíticos, terminologias, redes categorias e conceituais próprios da sintaxe normativa tradicional.

Aqui retomo Vieira (2016)VIEIRA, F. E. Gramatização brasileira contemporânea do português: novos paradigmas? In: FARACO, C. A.; VIEIRA, F. E. (org.). Gramáticas brasileiras: com a palavra, os leitores. São Paulo: Parábola, 2016. p.19-69., trabalho que se debruçou sobre esses novos instrumentos linguísticos, para afirmar que essas gramáticas de linguistas, embora reconheçam e critiquem as limitações e os problemas da sintaxe normativa tradicional, não apagam o arcabouço categorial e conceitual herdado da sintaxe greco-latina, mas o rearranjam em busca de maior coerência descritiva. Muitas vezes, de modo explícito ou não, elas retomam propostas descritivas pré-NGB ou mesmo oitocentistas. Se há pontos de subversão nessas obras, muitos dos quais de qualidade e frescor teóricos evidentes, também há vários traços de continuidade com a tradição. Some-se a isso a existência de uma espécie de consenso geral terminológico-conceitual, tacitamente compartilhado, entre a gramática tradicional e os estudos linguísticos contemporâneos. Essas novas gramáticas parecem colocar o arcabouço descritivo da tradição em um estatuto aprioristicamente determinado, operando com objetos teóricos disfarçados de objetos observacionais – procedimento frequente nas pesquisas linguísticas contemporâneas, como analisa Borges Neto (2018)BORGES NETO, J. História da Gramática. Curitiba: Ed. da UFPR. 2018. No prelo..

Contraditoriamente, a presença incisiva da sintaxe normativa tradicional na investigação linguística e no campo da pedagogia da gramática não é garantia de que os egressos da educação básica desenvolvam plenamente sua competência sintática nos níveis metalinguístico e epilinguístico. No domínio pedagógico, por presença “incisiva”, refiro-me ao fato de que, em muitas escolas, os estudantes costumam ser submetidos a pelo menos cinco anos de ensino ininterrupto de análise sintática, levando em consideração que o estudo do “período simples”, nos currículos tradicionais, normalmente acontece a partir do 8o ano do ensino fundamental, ora se complexificando linearmente, ora operando em círculos, repetitivamente, até o final do ensino médio.

No início dos anos 1990, em texto intitulado “Nos bastidores da análise sintática tradicional”, os professores José Borges Neto e José Luis da Veiga Mercer (1993)BORGES NETO, J.; MERCER, J. L. da V. Nos bastidores da análise sintática tradicional. Letras, Santa Maria, n.5, p.86-100, 1993. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/letras/article/view/11452/6926. Acesso em: 12 fev. 2019.
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já alertavam que tamanha dificuldade de os estudantes aprenderem sintaxe talvez residisse na complexidade das análises implícitas que necessariamente subjazem à análise sintática apresentada nas gramáticas tradicionais. A tese dos professores continua pertinente, haja vista toda análise sintática pressupor: segmentação da oração em constituintes imediatos e sintagmas; análise morfológica e categorial para identificar determinadas funções; comparação, inferenciação, generalização e identificação de critérios e de relações sintáticas e semânticas entre os termos; além de outros conhecimentos e habilidades cognitivas quase nunca explicitados e exercitados, pois pouco abordados sistematicamente em gramáticas escolares, livros e apostilas didáticas, documentos oficiais, cursos de formação e, por conseguinte, no discurso pedagógico do professor.

Os cursos de licenciatura em Letras/Português também poderiam ser mais incisivos no que diz respeito ao trabalho com esses conhecimentos implícitos e raramente sistematizados e didatizados pelos diferentes agentes pedagógicos. Em geral, os planos de curso das disciplinas que correspondem ao nível sintático da análise da língua objetivam a comparação de modelos teóricos da linguística formal e/ou funcional, tomando a sintaxe normativa tradicional como ponto de partida, mesmo que tácito. O foco no potencial explicativo desses modelos (ou exclusivamente do modelo preferido do professor da disciplina) muitas vezes não abre espaço para abordagens de aspectos sintáticos e de procedimentos de análise mais relevantes ao ofício do professor de português na educação básica, ora em formação. Questões normativas também costumam ser negligenciadas, embora o futuro professor vá precisar identificar problemas sintáticos de natureza prescritiva, caracterizá-los, explicar aos alunos por que são vistos como erros ou mesmo relativizá-los e subvertê-los.

Some-se a tudo isso o seguinte cenário: por vezes, quando o professor de sintaxe não se dá conta de que os licenciandos não conseguem acompanhá-lo por não saberem o que vêm a ser, por exemplo, um “sujeito” ou uma “estrutura subordinada”, ele opta por fazer, inicialmente, uma revisão “crítica” da sintaxe normativa tradicional, na esperança de que os alunos aprendam em 4 ou 5 semanas o que não aprenderam em metade da vida escolar. O componente crítico da revisão consiste na desconstrução da sintaxe normativa tradicional, a partir da análise de suas lacunas e contradições, que não são poucas. Em suma, o estudante acaba tentando aprender a crítica antes mesmo de se apropriar do objeto criticado.

Diante dessa engrenagem em que se inserem a formação e a atuação dos professores brasileiros de português no final da segunda década do século XXI, ousaria dizer que um trabalho de formação docente que invista, a médio prazo, no aprendizado efetivo e reflexivo das categorias, dos princípios de análise e das regularidades normativas da sintaxe tradicional pode surtir resultados bastante relevantes ao desenvolvimento da competência sintática e à prática pedagógica desse professor. Essa abordagem poderia ser subsidiada por outras ideias e categorias sintáticas produtivas nos estudos da linguagem contemporâneos, provenientes de diferentes filiações teóricas, como constituintes imediatos, binarismo, comutação, sintagmas, estruturas hierárquicas, ordem, ambiguidade, (a)gramaticalidade, concordância, regência, argumento, predicador, papel temático, valência, ergatividade, topicalização, entre outras. Essa heterogeneidade teórica de partida na abordagem da sintaxe poderia surtir resultados mais produtivos ao professor em formação do que o estudo específico de um modelo teórico X ou Y da Linguística contemporânea, cujo potencial explicativo, embora produtivo às investigações sintáticas de ponta, ainda é de pouco impacto, por diferentes razões, nas questões fulcrais do ensino de gramática nas escolas.

Esse meu posicionamento não é peremptório: está mais para uma forte hipótese construída a partir de diferentes leituras e, sobretudo, do exercício diário e subjetivo de professor de Língua Portuguesa e Linguística no espaço universitário. Do que estou convicto, devo dizer, é que os estudos de sintaxe (e de gramática) não podem ser negligenciados na educação básica ou superior, sequer serem relegados a uma posição subsidiária para atender aos ecos imperativos do discurso da virada pragmática na reflexão sobre o ensino de português. Penso que a análise sintática, de certo mais reflexiva e menos mnemônica, é condição necessária, embora não suficiente, ao desenvolvimento da capacidade de construir e organizar orações e períodos, mas também parágrafos, textos, discursos, sentidos em geral.

Assim, investigar, de forma descritiva e interpretativa, a gênese, o desenvolvimento, a consolidação, o apagamento e a permanência da trajetória das ideias sobre o ensino da sintaxe normativa tradicional no Brasil é válido tanto à historiografia do ensino de língua num sentido amplo quanto à compreensão dos impactos desses processos históricos na educação linguística na contemporaneidade.

Eixos temáticos para uma historiografia da sintaxe no Brasil

A narrativa construída e as interpretações tecidas até aqui já vieram anunciando possíveis questões de pesquisa. Agora, essas questões serão organizadas em diálogo com os três componentes para o exame interno de fontes historiográficas apresentados em Asencio, Del Arco e Swiggers (2014ASENCIO, J. J. G.; DEL ARCO, E. T. M.; SWIGGERS, P. Principios, tareas, métodos e instrumentos en historiografia lingüística. In: CALERO, M. L. et al. (ed.). Métodos y resultados actuales en Historiografia de la Lingüística. Münster: Nodus Publikationen, 2014. p.266-301., p.282-283): o componente teórico; o componente descritivo e normativo ou descritivo-normativo; e o componente prático, aplicado, didático. Foram estabelecidos três eixos temáticos, um para cada componente. Cada um dos eixos contempla uma questão maior, denominada de pergunta central, e outras específicas, denominadas de perguntas satélites. Na formulação das perguntas, os três componentes dos autores, centrados originalmente na dimensão interna de gramáticas, tiveram aqui seu escopo ampliado e estendido à dimensão externa e a fontes historiográficas de perfis variados. Eis os três eixos desenvolvidos nos quadros a seguir:

Quadro 1
Eixo temático 1
Quadro 2
Eixo temático 2
Quadro 3
Eixo temático 3

À guisa de conclusão

Evidentemente, esse farto conjunto de questões não é exaustivo, mas pode ajudar a delinear investigações que pretendam identificar e compreender a epistemologia, nem sempre explicitada, dos trabalhos de gramáticos, filólogos e linguistas brasileiros sobre a sintaxe do português (brasileiro), além de entender os impactos educativos reverberados por esses trabalhos até os dias atuais. No âmbito do grupo de pesquisa HGEL – Historiografia, Gramática e Ensino de Línguas (UFPB/PROLING/CNPq), esse inventário vem se estabelecendo como diretrizes ou mesmo alicerces de diferentes investigações de doutorado, mestrado e iniciação científica, visando à construção coletiva de uma historiografia da sintaxe no Brasil.

Vale finalizar este trabalho – que pretendeu, acima de tudo, apontar caminhos investigativos para uma historiografia da sintaxe no Brasil – parafraseando a professora Cristina Altman (USP), um dos principais nomes da Historiografia da Linguística brasileira. Em texto de 2009, intitulado “Retrospectivas e perspectivas da historiografia da linguística no Brasil”, Altman defende que o linguista, o gramático e o professor de português não podem ignorar a dimensão histórica dos seus objetos para exercerem seus ofícios. Os modelos teóricos e pedagógicos são produtos históricos, de modo que a sua compreensão efetiva na contemporaneidade requer a investigação e a interpretação do passado a que está relacionado.

Portanto, os mergulhos nessa história da sintaxe, propiciados a partir dos três direcionamentos temáticos aqui apresentados (eixos da teoria, da norma e do ensino), certamente favorecem o reconhecimento crítico de como viemos trabalhando até agora com esse nível de análise da língua, tanto em termos investigativos quanto pedagógicos, como também possibilitam a construção de novas configurações teóricas à ciência linguística e ao ensino de sintaxe, de gramática e de língua, entidades inseparáveis e constitutivas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Nov 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    21 Fev 2019
  • Aceito
    28 Set 2019
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