Acessibilidade / Reportar erro

VOLATILIZAÇÃO E LIXIVIAÇÃO DE 14C-HEXACLOROBENZENO EM SOLO CONTAMINADO* * Auxílio FAPESP (Processo no 98/16541).

VOLATILIZATION AND LEACHING OF 14C-HEXACHLOROBENZENE IN CONTAMINATED SOIL

RESUMO

A possibilidade de contaminação do ar e da água a partir de solo contaminado com hexaclorobenzeno foi estudada em laboratório através da análise da volatilização e da lixiviação de 14C-hexaclorobenzeno neste solo. Para o estudo de volatilização, amostras de terra contaminada misturadas a fontes de matéria orgânica, cal, ou alagadas foram tratadas com solução de 14Chexaclorobenzeno; os 14C-compostos voláteis formados foram capturados por lâminas de poliuretano, extraídos com hexano e analisados por Espectrometria de Cintilação em Líquido. A lixiviação do hexaclorobenzeno foi estudada através de percolação de água em tubos de PVC contendo amostras de terra contaminada tratadas com bagaço de cana de açúcar e/ou cal e solução de 14C-hexaclorobenzeno, dispostas sobre amostras de terra não contaminada; os tubos foram seccionados e a terra e a água lixiviada foram analisadas por Espectrometria de Cintilação em Líquido. Houve formação de14C-compostos voláteis em todas as amostras de terra, principalmente nas amostras alagadas e com adição de matéria orgânica e não se observou lixiviação do 14Chexaclorobenzeno, indicando possibilidade de contaminação do ar, mas não de águas subterrâneas.

PALAVRAS-CHAVE
Hexaclorobenzeno; volatilização; mobilidade; lixiviação; solo; matéria orgânica

ABSTRACT

The possibility of air and water contamination by hexachlorobenzene derived from a contaminated soil was studied by analysis of volatilization and leaching of 14Chexachlorobenzene. For the volatilization study, contaminated soil samples mixed with organic material sources, lime, or flooded were treated with a 14C-hexachlorobenzene solution; the volatile 14C-compounds were captured by polyurethane lamina, extracted by hexane and analyzed by Liquid Scintillation Counting. The leaching of the hexachlorobenzene was studied by water percolation through PVC tubes containing contaminated soil treated with sugarcane bagasse and/or lime and 14C-HCB placed over noncontaminated soil; the tubes were cut in sections and the soil and the leached water were analyzed by Liquid Scintillation Counting. The volatilization of the 14C-compounds occurred in all the samples, mainly in the flooded samples with organic matter addition and the leaching of the 14C-HCB was not observed, indicating the possibility of contamination of the air but not the groundwater.

KEY WORDS
Hexachlorobenzene; volatilization; mobility; leaching; soil; organic material

INTRODUÇÃO

O despejo de resíduos industriais e a aplicação de agrotóxicos podem levar ao acúmulo de compostos tóxicos no solo que, por sua vez, pode ser uma de fonte de contaminação de outras partes do ambiente, como o ar e as águas subterrâneas. A contaminação do ar pode ocorrer através da volatilização de compostos presentes no solo e a contaminação de águas subterâneas, pela sua lixiviação através do perfil do solo. A volatilização e a lixiviação de um composto dependem das características deste composto, das características do solo e das condições ambientais (SPENCER & CLIATH, 1974SPENCER, W.F. & CLIATH, M.M. Vaporization of chemicals. In: HAQUE, R. & FREED, V.H. (Eds.). Environmental dynamics of pesticides. New York: Plenum Press, 1974. p.61-78.; SCHEUNERT, 1993SCHEUNERT, I. Transport and transformation of pesticides in soil. In: MANSOUR, M. (Ed.). Fate and prediction of environmental chemicals in soil, plants, and aquatic systems. Boca Raton: Lewis Publishers, 1993. p.1-22.). Os principais fatores que afetam a volatilização de um composto são as suas propriedades físico-químicas, como pressão de vapor e solubilidade em água, sua persistência no solo e as condições ambientais como temperatura do solo e da água, conteúdo de água no solo, matéria orgânica e pH do solo (VAN DER BERG et al., 1999VAN DER BERG, F.; KUBIAK, R.; BENJEY, W.G.; MAJEWSKI, M.S.; YATES, S.R.; REEVES, G.L.; SMELT, J.H.; VAN DER LINDEN, A.M.A. Emission of pesticides into the air. Water Air Soil Pollut., v.115, p.195-218, 1999.). A lixiviação de um composto no solo depende da capacidade de adsorção do composto, da sua taxa de degradação, da textura, da quantidade de matéria orgânica e da temperatura do solo (SCHEUNERT, 1993SCHEUNERT, I. Transport and transformation of pesticides in soil. In: MANSOUR, M. (Ed.). Fate and prediction of environmental chemicals in soil, plants, and aquatic systems. Boca Raton: Lewis Publishers, 1993. p.1-22.).

Portanto, qualquer alteração nas características de um solo contaminado com compostos tóxicos, pode ter como conseqüência a volatilização e/ou a lixiviação destes compostos.

No Brasil, na Cidade de São Vicente, existem várias áreas contaminadas com resíduos industriais contendo entre outros compostos, o hexaclorobenzeno (GOMES et al., 1992GOMES, D.C.; KERN, R.S.; SHINOBE, A. Avaliação dos teores de organoclorados remanescentes no solo do “Quarentenário” e metas de saneamento. São Bernardo do Campo, 1992.; AIROLDI, 1997AIROLDI, F.P.S. Determinação de pentaclorofenol e hexaclorobenzeno em solo contaminado por resíduos industriais. São Carlos: 1997. 70p. [Dissertação (Mestrado) – Instituto de Química, Univ. São Paulo].; ZUIN, 1997ZUIN, V.G. Determinação de pentaclorofenol e hexaclorobenzeno em águas naturais de subsuperfície de áreas afetadas por resíduos de organoclorados. São Carlos: 1997. 66p. [Dissertação (Mestrado) – Instituto de Química, Univ. São Paulo].; BARROS, 1998BARROS, E.S. Biodegradação e adsorção de hexaclorobenzeno em areia quartzosa. Rio Claro: 1998. 88p. [Dissertação (Mestrado) – Instituto de Biociências da Univ. Estadual Paulista].; ZUIN, 1999ZUIN, V.G.; AIROLDI, F.P.S.; NASCIMENTO, N.R. Determination of pentachlorophenol and hexachlorobenzene in natural waters affected by industrial chemical residues. J. Braz. Chem. Soc., v.10, p.25-30, 1999.; BROCKELMANN, 2001BROCKELMANN, A.M. Avaliação da biodegradação de hexaclorobenzeno para fins de biorremediação. São Carlos: 2001. 110p. [Tese (Doutorado) – Universidade Federal de São Carlos].; CETESB, 1997COMPANHIA DE TECNOLOGIA DE SANEAMENTO AMBIENTAL (SP). Consolidação do inventário de fontes (incluindo os municipais) e de locais de tratamento e disposição final de resíduos sólidos. São Paulo: CETESB, 1997. 66p.; MATHEUS, 2003MATHEUS, D.R Otimização da biodegradação de hexaclorobenzeno por fungos basidiomicetos em solos contaminados com resíduos industriais. Rio Claro: 2003. 125p. [Tese (Doutorado) – Instituto de Biociências, Univ. Estadual Paulista].). Nesta região, um dos maiores depósitos de resíduos está localizado no Quarentenário, uma área densamente povoada na periferia da Cidade de São Vicente (ZUIN, 1999ZUIN, V.G.; AIROLDI, F.P.S.; NASCIMENTO, N.R. Determination of pentachlorophenol and hexachlorobenzene in natural waters affected by industrial chemical residues. J. Braz. Chem. Soc., v.10, p.25-30, 1999.). A maior parte deste solo já foi removida e está armazenado em uma "Estação de Espera" aguardando tratamento (GOMES et al., 1992GOMES, D.C.; KERN, R.S.; SHINOBE, A. Avaliação dos teores de organoclorados remanescentes no solo do “Quarentenário” e metas de saneamento. São Bernardo do Campo, 1992.). O hexaclorobenzeno (HCB), um dos principais compostos presentes neste solo contaminado, que já foi usado como fungicida, é um composto organoclorado classificado como "poluente orgânico persistente" (POP) devido a sua toxicidade, persistência, capacidade de bioacumulação e de transporte atmosférico (ALCOCK & JONES, 1999ALCOCK, R.E. & JONES, K.C. New directions “new” organic compounds in the environment. Atmos. Environ., v.33, p.1645-1646, 1999.).

Mesmo possuindo baixa pressão de vapor, o HCB pode ser volatilizado devido a sua baixa hidrossolubilidade (MANSOUR et al., 1986MANSOUR, M.; SCHEUNERT, I.; VISWANATHAN, R.; KORTE, F. Assessment of the persistence of hexachlorobenzene in the ecosphere. In: MORRIS, C.R. & CABRAL, C.R. (Eds.). Hexachlorobenzene: Proceedings of an International Symposium. Lyon: International Agency for Research on Cancer Scientific Publications, 1986. p.53-59.) e, por outro lado, apesar da baixa hidrossolubilidade, a alta persistência do HCB possibilita a sua lixiviação e a contaminação de águas subterrâneas. Em áreas de despejo de resíduos perigosos nos Estados Unidos detectou-se a presença de HCB no solo, em águas subterrâneas, em águas superficiais e no ar (DAVIS & MORGAN, 1986DAVIS, B.D. & MORGAN, R.C. Hexachlorobenzene in hazardous wastes. In: MORRIS, C.R. & CABRAL, C.R. (Eds.). Hexachlorobenzene: Proceedings of an International Symposium. Lyon: International Agency for Research on Cancer Scientific Publications, 1986. p.23-30).

Este estudo verificou a possibilidade de contaminação do ar e de águas subterrâneas a partir de solo contaminado com hexaclorobenzeno através de análise do efeito da adição de matéria orgânica, alteração de pH e alagamento do solo, sobre a volatilização e a liviação de 14 C-hexaclorobenzeno.

MATERIAL E MÉTODOS

Solo

Amostras de terra contaminada com HCB, contendo cerca de 3.000µg de HCB g-1 terra, foram cedidas pela Rhodia do Brasil Ltda e tiveram como origem uma "Estação de Espera" onde está armazenado o solo contaminado proveniente de áreas do Município de São Vicente, SP.

Estas amostras de terra contaminada foram misturadas a amostras de terra não contaminada proveniente de área próxima (solo arenoso: 2,0 g dm-3 de matéria orgânica; 99,8% de areia; 0,1% de limo; 0,1% de argila, pH 3,6), na proporção de 1:10.

Composto radiomarcado (14C-hexaclorobenzeno)

Uma solução de 14 C-hexaclorobenzeno (14 C-HCB) com 4,05 kBq e 0,01 mg mL-1 hexano foi preparada a partir de hexaclorobenzeno (HCB) uniformemente radiomarcado no anel aromático, com atividade específica de 11,46 GBq mmol-1 e 97% de pureza radioquímica, obtido da "International Isotopes Münich", Alemanha.

Análise da contaminação inicial do solo

Nove amostras de 3 g de terra contaminada misturada a terra não contaminada foram extraídas com mistura de hexano: acetona (75:25) por energia de microondas (80 W) em 12 ciclos de 1 min (ANDRÉA et al., 2001ANDRÉA, M.M.; PAPINI, S.; NAKAGAWA, L.E. Optimizing microwave-assisted solvent extraction (MASE) of pesticides from soil. J. Environ. Sci. Health, part B., v.36, p.87-93, 2001.).

Os extratos obtidos foram submetidos a "clean up" em filtro com membrana "durapore" de 0,45 µm de poro e analisados por cromatografia gasosa (CG) para quantificação do HCB.

As análises cromatográficas foram realizadas em cromatógrafo a gás Varian 3400 nas seguintes condições: coluna megabore de fase estacionária DB-17 com 30 m de comprimento, 0,53 mm d.i. e filme de 1,0 µm, com rampa de temperatura de 188° C a 240° C (10° C min-1), tendo como gás de arraste o Nitrogênio a 1,5 mL min-1 de vazão; detector de captura eletrônica (DCE) mantido à temperatura de 300° C; injetor splitless à temperatura de 220° C.

A curva de calibração para quantificação do HCB foi feita pelo método de MEIER & ZÜND (1993)MEIER, P.C. & ZÜND, R.E. Statistical methods in analytical chemistry. New York: John Wiley, 1993. com cinco concentrações do composto variando de 6 a 15µgmL-1 , com limite de confiança de 98%.

Volatilização de 14C-hexaclorobenzeno

O tratamento da terra por adição de matéria orgânica (MO) foi feito por meio de adição de 0,025 g de bagaço de cana de açúcar g-1 terra ou 0,025 g de vermicomposto (húmus de minhoca) g-1 terra às amostras de terra contaminada misturada a terra não contaminada colocadas em frascos de vidro (100 g equivalente em massa seca por frasco). A alteração do pH foi feita conforme KIËHL (1979)KIEHL, E.J. Manual de Edafologia. Relação solo-planta. São Paulo: Agronômica Ceres, 1979. p.90-91. por meio de adição de 0,6 mg de carbonato de cálcio (cal) g-1 terra. As condições de alagamento foram obtidas através de adição de água de modo a formar uma camada de cerca de 1 cm acima da superfície da terra estabelecendo condiçõesdeanaerobiose.Outras amostras não sofreram qualquer tipo de tratamento servindo como controle e outras receberam uma mistura dos tratamentos (adição de bagaço de cana de açúcar ou vermicomposto e cal, ou adição de bagaço de cana de açúcar ou vermicomposto e alagamento). Desta forma, foram preparadas triplicatas dos seguintes tratamentos: 1) controle (t); 2) adição de bagaço (b); 3) adição de vermicomposto (v); 4) adição de cal (c); 5) alagamento (a); 6) adição de bagaço e cal (bc); 7) adição de vermicomposto e cal (vc); 8) adição de bagaço e alagamento (ba) e 9) adição de vermicomposto e alagamento (va), conforme a Figura 2. Estas amostras receberam água até atingir 50% da capacidade máxima de retenção de água que foi determinada através de repetidas percolações com 10 mL de água em 10 g de terra (INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION, 1992INTERNATIONALORGANIZATION FOR STANDARDIZATION. ISO/DIS 11274: Draft international standart. Geneva: ISO, 1992. p.1-30.; KLUTE, 1986KLUTE, A. A physical and mineralogical methods. In: KLUTE, A. (Ed.). Methods of soil analysis. Madison: American Society of Agronomy, 1986.). A seguir, foram mantidas em câmara de temperatura controlada a aproximadamente 29° C durante um mês, para propiciar a reativação dos microrganismos presentes.

Fig. 2
14C-compostos volatilizados de terra contaminada com HCB em porcentagem em relação ao 14C-HCB aplicado, após diferentes tratamentos; t = controle; b = adição de bagaço; v = adição de vermicomposto; c = adição de cal; bc = adição de bagaço e cal; vc = adição de vermicomposto e cal; a = alagamento; ba = adição de bagaço e alagamento; va = adição de vermicomposto e alagamento.

Após o período de reativação, uma alíquota da solução de 14 C-HCB foi adicionada tanto às amostras controle como às amostras tratadas por adição de matéria orgânica e cal, e por alagamento, de modo a resultar em 0,032 kBq por amostra de terra. Para captura de 14 C-compostos voláteis, colocou-se uma lâmina de poliuretano na boca destes frascos. A seguir, as amostras foram incubadas em câmara de temperatura controlada a aproximadamente 29° C por 270 dias. A volatilização de 14 C-compostos foi acompanhada mensalmente através de extração dos 14 C-compostos voláteis capturados nas lâminas de poliuretano por contato com 30 mL de hexano durante 6h e análise do extrato por Espectrometria de Cintilação em Líquido (ECL) em aparelho Packard LSI600 após adição de líquido cintilador composto por tolueno, PPO (2,5-Difeniloxazol) e POPOP (1,4-bis2-(5-feniloxazolil)-benzeno). Os valores foram calculados como porcentagem de 14 C-compostos voláteis formados, em relação à quantidade de radiocarbono adicionada como 14 C-HCB.

Lixiviação de 14C-hexaclorobenzeno

Este estudo foi conduzido em tubos de PVC medindo 35,0 cm de altura x 5,0 cm de diâmetro nos quais colocou-se na base, um filme plástico contendo furos pequenos, de modo a impedir a perda de terra, mas permitir o escoamento de água. No interior de cada tubo foram colocadas amostras de terra não contaminada formando a camada inferior da coluna de terra (5-25 cm).

Fig. 1
Diagrama esquemático de: 1) Tratamentos das amostras de terra contaminada comHCB; 2) Lixiviação de14C-HCB em coluna de terra (ECL = Espectrometria de Cintilação em Líquido).

Triplicatas de 150 g de mistura de terra contaminada com não contaminada foram tratadas com bagaço de cana de açúcar a 0,025 g-1 terra, ou carbonato de Cálcio (cal) a 0,6 mg g-1, ou bagaço de cana de açúcar e cal, ou não sofreram qualquer tipo de adição (Fig. 1). Todas as amostras foram umedecidas a 50% da CMRA e incubadas em câmara de temperatura controlada a aproximadamente 29° C durante um mês, para propiciar a reativação dos microrganismos presentes. Após este período, adicionou-se 5,0 mL de solução de 14 C-HCB em cada amostra, resultando em 0,135 kBq de 14 C-HCB g-1 de terra. Estas amostras foram colocadas sobre a terra não contaminada dos tubos de PVC, formando a camada superior (0-5 cm) de cada coluna.

Paralelamente, registrou-se a pluviosidade semanal através de leituras em pluviômetro colocado ao ar livre e calculou-se o volume de água a ser adicionado semanalmente em cada tubo através da relação 1 mm = 1L m-2 . Após a percolação da água nos tubos, o volume de água lixiviada foi coletado também semanalmente e alíquotas de 1,0 mL foram analisadas por ECL para determinação da presença de 14 C-compostos (Fig. 1).

No final dos 270 dias, cada tubo foi seccionado de modo a separar a camada superior (0–5 cm), que representava a camada tratada adicionada, e a camada inferior (de 5–25 cm), que foi subdividida de 5 cm em 5 cm. As amostras foram então analisadas quanto à presença de 14 C-compostos, através da combustão de 3 alíquotas de 0,5 g de terra e quantificação do radiocarbono por ECL.

Análise Estatística

Os resultados foram submetidos à análise estatística por teste F para análise de variância, e teste de Tukey para comparação entre as médias, para determinar diferenças significativas entre as amostras (VIEIRA & HOFFMAN, 1989VIEIRA, S. & HOFFMANN, R. Estatística experimental. São Paulo: Atlas, 1989. 179p.).

RESULTADOS

A análise da contaminação inicial do solo indicou presença de 3427,7 mg de HCB g-1 terra.

A formação de 14 C-compostos voláteis foi observada em todas as amostras de terra e, após 270 dias de incubação, atingiram taxas que variaram de 14% a 40% (Fig. 2).

As maiores taxas de volatilização foram observadas nas amostras alagadas e com adição de matéria orgânica, tanto na forma de bagaço de cana de açúcar como de vermicomposto (Fig. 2). A análise estatística indicou que, após 30 dias de incubação, todas as amostras alagadas (a, ba e va) apresentaram taxa de volatilização significativamente maior do que a amostra controle (t). Após 90 e 180 dias de incubação, esta diferença foi observada apenas nas amostras alagadas e com vermicomposto (va), e no T.270, nas amostras alagadas e com adição de ambas formas de matéria orgânica (ba e va).

As menores taxas de volatilização, por outro lado, foram observadas nas amostras com adição de M.O. sem alagamento, embora apenas para a amostra com adição de vermicomposto e cal (vc) do T.180, a taxa de volatilização tenha sido significativamente menor que a amostra controle (Fig. 2).

A mobilidade e a lixiviação do14 C-HCB, não foram observadas, já que toda a radioatividade presente nas colunas de terra permaneceu na camada superior e nenhuma radioatividade foi encontrada na água lixiviada, mesmo após adição de M.O. ou alteração do pH.

DISCUSSÃO

A formação de 14 C-compostos voláteis nas amostras de terra contaminada com HCB indicou que existe a possibilidade da transferência do HCB e/ou dos seus metabólitos para o ar.

A volatilização de HCB e de outros compostos organoclorados também foi observada em outros estudos (DAVIS & MORGAN, 1986DAVIS, B.D. & MORGAN, R.C. Hexachlorobenzene in hazardous wastes. In: MORRIS, C.R. & CABRAL, C.R. (Eds.). Hexachlorobenzene: Proceedings of an International Symposium. Lyon: International Agency for Research on Cancer Scientific Publications, 1986. p.23-30; VAN DJIK & GUICHERIT, 1999VAN DJIK, H.F.G. & GUICHERIT, R. Atmospheric dispersion of current-use pesticides: a review of the evidence from monitoring studies. Water Air Soil Pollut., v.115, p.2170, 1999.) e podem ter como conseqüências a contaminação do ar e o transporte atmosférico a longas distâncias (SCHEUNERT, 1993SCHEUNERT, I. Transport and transformation of pesticides in soil. In: MANSOUR, M. (Ed.). Fate and prediction of environmental chemicals in soil, plants, and aquatic systems. Boca Raton: Lewis Publishers, 1993. p.1-22.; BIDLEMAN, 1999BIDLEMAN, T.F. Atmospheric transport and air-surface exchange of pesticides. Water Air Soil Pollut., v.115, p.115-166, 1999.).

Verificou-se que o alagamento combinado com adição de matéria orgânica foi o principal agente causador de processos que resultaram em aumento da volatilização do 14 C-HCB da terra. Este fato pode ser explicado pela baixa hidrossolubilidade do HCB, que faz com que a sua volatilidade seja maior na presença de água. Segundo SPENCER & CLIATH (1974)SPENCER, W.F. & CLIATH, M.M. Vaporization of chemicals. In: HAQUE, R. & FREED, V.H. (Eds.). Environmental dynamics of pesticides. New York: Plenum Press, 1974. p.61-78., os compostos pouco polares volatilizam mais rapidamente em solos úmidos porque são removidos dos sítios de adsorção da superfície do solo e substituídos pela água. Estudos realizados por MILL & HAAG (1986)MILL, T. & HAAG, W. The environmental fate of hexachlorobenzene. In: MORRIS, C.R. & CABRAL, C.R. (Eds.). Hexachlorobenzene: Proceedings of an International Symposium. Lyon: International Agency for Research on Cancer Scientific Publications, 1986. p.61-66. também indicaram que o HCB introduzido na água volatiliza-se rapidamente para a atmosfera e CHIARENZELLI et al. (1997)CHIARENZELLI, J.R.; SCRUDATO, R.J.; WUNDERLICH, M.L.; OENGA, G.N.; LASHKO, O.P. PCBvolatile loss and the moisture content of sediment during drying. Chemosphere, v.34, p.2429-2436, 1997. observaram maior volatilização de PCBs de sedimento submerso do que de sedimento seco.

Além disso, as condições de anaerobiose propiciadas pelo alagamento e a presença de co-substratos fornecidos pela matéria orgânica, podem ser um estímulo aos processos de descloração redutiva microbiana (HÄGGBLOM, 1992HÄGGBLOM, M.M. Microbial breakdown of halogenated aromatic pesticides and related compounds. FEMS Microbiol. Rev., v.103, p.29-72, 1992.), resultando na transformação do HCB a metabólitos menos clorados e mais voláteis (SPENCER & CLIATH, 1974SPENCER, W.F. & CLIATH, M.M. Vaporization of chemicals. In: HAQUE, R. & FREED, V.H. (Eds.). Environmental dynamics of pesticides. New York: Plenum Press, 1974. p.61-78.; SCHEUNERT et al., 1994SCHEUNERT, I.; TOPP, E.; ATTAR, A.; KORTE, F. Uptake pathways of chlorobenzenes in plants and their correlation with N-octanol/water partition coefficients. EcotoxEnviron. Safety, v.27, p.90-104, 1994.; SCHEUNERT & KORTE, 1986SCHEUNERT, I. & KORTE, F. Comparative laboratory and outdoor studies on the behaviour of 14C-labelled chlorinated benzenes in soil. In: ASSINK, J.W. & VAN DEN BRINK, W.J. (Eds.). Contaminated soil. Dordrecht: Martinius Nijhoff, 1986. p.141-143.).

A menor volatilização observada nas amostras com M.O. pode ter sido conseqüência da maior adsorção do HCB ao solo nestas amostras. Segundo BARRIUSO et al. (1997)BARRIUSO, E.; HOUOT, S.; SERRA-WITTLING, C. Influence of Compost Addition to soil on the Behaviour of Herbicides. Pestic. Sci., v.49, p. 65-75, 1997., aM.O. pode promover a adsorção de compostos ao solo resultando na diminuição da sua volatilização.

A ausência de lixiviação do HCB demonstra que neste caso, a possibilidade de contaminação de águas subterrâneas é pequena, conforme observado também por outros autores. SOTIRIOU et al. (1994)SOTIRIOU, N.; MOZA, P.; SCHEUNERT, I.; FEICHT, E.A. Uptake and fate of 14C-hexachlorobenzene en tobacco and wheat plants. Fresenius Environ. Bull., v.3, p.175-180, 1994. observaram em experimento de campo, que a maior parte (77% a 85%) do 14 C-HCB aplicado ao solo foi encontrado na camada superior do solo e HAGENMAIER et al. (1992)HAGENMAIER, H.; SHE, J.; LINDING, C. Persistence of polychlorinated dibenzo-p-dioxins and polychlorinated dibenzofurans in contaminated soil at Maulach and Rastatt in southwest Germany. Chemosphere, v.25, p.1449-1456, 1992. observaram que mais de 90% do hexaclorobenzeno encontrado em uma área contaminada estava nos primeiros 10 cm de solo.

CONCLUSÕES

  • Existe a possibilidade de contaminação do ar através da volatilização do hexaclorobenzeno e a adição de M.O. aliada ao alagamento do solo pode agravar esta contaminação.

  • A possibilidade de lixiviação do hexaclorobenzeno no perfil o solo não foi observada.

  • *
    Auxílio FAPESP (Processo no 98/16541).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • AIROLDI, F.P.S. Determinação de pentaclorofenol e hexaclorobenzeno em solo contaminado por resíduos industriais São Carlos: 1997. 70p. [Dissertação (Mestrado) – Instituto de Química, Univ. São Paulo].
  • ALCOCK, R.E. & JONES, K.C. New directions “new” organic compounds in the environment. Atmos. Environ, v.33, p.1645-1646, 1999.
  • ANDRÉA, M.M.; PAPINI, S.; NAKAGAWA, L.E. Optimizing microwave-assisted solvent extraction (MASE) of pesticides from soil. J. Environ. Sci. Health, part B, v.36, p.87-93, 2001.
  • BARRIUSO, E.; HOUOT, S.; SERRA-WITTLING, C. Influence of Compost Addition to soil on the Behaviour of Herbicides. Pestic. Sci, v.49, p. 65-75, 1997.
  • BARROS, E.S. Biodegradação e adsorção de hexaclorobenzeno em areia quartzosa Rio Claro: 1998. 88p. [Dissertação (Mestrado) – Instituto de Biociências da Univ. Estadual Paulista].
  • BIDLEMAN, T.F. Atmospheric transport and air-surface exchange of pesticides. Water Air Soil Pollut, v.115, p.115-166, 1999.
  • BROCKELMANN, A.M. Avaliação da biodegradação de hexaclorobenzeno para fins de biorremediação São Carlos: 2001. 110p. [Tese (Doutorado) – Universidade Federal de São Carlos].
  • COMPANHIA DE TECNOLOGIA DE SANEAMENTO AMBIENTAL (SP). Consolidação do inventário de fontes (incluindo os municipais) e de locais de tratamento e disposição final de resíduos sólidos. São Paulo: CETESB, 1997. 66p.
  • CHIARENZELLI, J.R.; SCRUDATO, R.J.; WUNDERLICH, M.L.; OENGA, G.N.; LASHKO, O.P. PCBvolatile loss and the moisture content of sediment during drying. Chemosphere, v.34, p.2429-2436, 1997.
  • DAVIS, B.D. & MORGAN, R.C. Hexachlorobenzene in hazardous wastes. In: MORRIS, C.R. & CABRAL, C.R. (Eds.). Hexachlorobenzene: Proceedings of an International Symposium Lyon: International Agency for Research on Cancer Scientific Publications, 1986. p.23-30
  • INTERNATIONALORGANIZATION FOR STANDARDIZATION. ISO/DIS 11274: Draft international standart Geneva: ISO, 1992. p.1-30.
  • GOMES, D.C.; KERN, R.S.; SHINOBE, A. Avaliação dos teores de organoclorados remanescentes no solo do “Quarentenário” e metas de saneamento São Bernardo do Campo, 1992.
  • HÄGGBLOM, M.M. Microbial breakdown of halogenated aromatic pesticides and related compounds. FEMS Microbiol. Rev, v.103, p.29-72, 1992.
  • HAGENMAIER, H.; SHE, J.; LINDING, C. Persistence of polychlorinated dibenzo-p-dioxins and polychlorinated dibenzofurans in contaminated soil at Maulach and Rastatt in southwest Germany. Chemosphere, v.25, p.1449-1456, 1992.
  • KIEHL, E.J. Manual de Edafologia. Relação solo-planta São Paulo: Agronômica Ceres, 1979. p.90-91.
  • KLUTE, A. A physical and mineralogical methods. In: KLUTE, A. (Ed.). Methods of soil analysis Madison: American Society of Agronomy, 1986.
  • MANSOUR, M.; SCHEUNERT, I.; VISWANATHAN, R.; KORTE, F. Assessment of the persistence of hexachlorobenzene in the ecosphere. In: MORRIS, C.R. & CABRAL, C.R. (Eds.). Hexachlorobenzene: Proceedings of an International Symposium Lyon: International Agency for Research on Cancer Scientific Publications, 1986. p.53-59.
  • MATHEUS, D.R Otimização da biodegradação de hexaclorobenzeno por fungos basidiomicetos em solos contaminados com resíduos industriais Rio Claro: 2003. 125p. [Tese (Doutorado) – Instituto de Biociências, Univ. Estadual Paulista].
  • MEIER, P.C. & ZÜND, R.E. Statistical methods in analytical chemistry New York: John Wiley, 1993.
  • MILL, T. & HAAG, W. The environmental fate of hexachlorobenzene. In: MORRIS, C.R. & CABRAL, C.R. (Eds.). Hexachlorobenzene: Proceedings of an International Symposium Lyon: International Agency for Research on Cancer Scientific Publications, 1986. p.61-66.
  • SCHEUNERT, I. Transport and transformation of pesticides in soil. In: MANSOUR, M. (Ed.). Fate and prediction of environmental chemicals in soil, plants, and aquatic systems Boca Raton: Lewis Publishers, 1993. p.1-22.
  • SCHEUNERT, I. & KORTE, F. Comparative laboratory and outdoor studies on the behaviour of 14C-labelled chlorinated benzenes in soil. In: ASSINK, J.W. & VAN DEN BRINK, W.J. (Eds.). Contaminated soil Dordrecht: Martinius Nijhoff, 1986. p.141-143.
  • SCHEUNERT, I.; TOPP, E.; ATTAR, A.; KORTE, F. Uptake pathways of chlorobenzenes in plants and their correlation with N-octanol/water partition coefficients. EcotoxEnviron. Safety, v.27, p.90-104, 1994.
  • SOTIRIOU, N.; MOZA, P.; SCHEUNERT, I.; FEICHT, E.A. Uptake and fate of 14C-hexachlorobenzene en tobacco and wheat plants. Fresenius Environ. Bull, v.3, p.175-180, 1994.
  • SPENCER, W.F. & CLIATH, M.M. Vaporization of chemicals. In: HAQUE, R. & FREED, V.H. (Eds.). Environmental dynamics of pesticides New York: Plenum Press, 1974. p.61-78.
  • VAN DER BERG, F.; KUBIAK, R.; BENJEY, W.G.; MAJEWSKI, M.S.; YATES, S.R.; REEVES, G.L.; SMELT, J.H.; VAN DER LINDEN, A.M.A. Emission of pesticides into the air. Water Air Soil Pollut, v.115, p.195-218, 1999.
  • VAN DJIK, H.F.G. & GUICHERIT, R. Atmospheric dispersion of current-use pesticides: a review of the evidence from monitoring studies. Water Air Soil Pollut, v.115, p.2170, 1999.
  • VIEIRA, S. & HOFFMANN, R. Estatística experimental São Paulo: Atlas, 1989. 179p.
  • ZUIN, V.G. Determinação de pentaclorofenol e hexaclorobenzeno em águas naturais de subsuperfície de áreas afetadas por resíduos de organoclorados São Carlos: 1997. 66p. [Dissertação (Mestrado) – Instituto de Química, Univ. São Paulo].
  • ZUIN, V.G.; AIROLDI, F.P.S.; NASCIMENTO, N.R. Determination of pentachlorophenol and hexachlorobenzene in natural waters affected by industrial chemical residues. J. Braz. Chem. Soc, v.10, p.25-30, 1999.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2005

Histórico

  • Recebido
    05 Maio 2005
  • Aceito
    16 Jun 2005
Instituto Biológico Av. Conselheiro Rodrigues Alves, 1252 - Vila Mariana - São Paulo - SP, 04014-002 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: arquivos@biologico.sp.gov.br