Adesão e continuidade ao uso de aparelho de amplificação sonora individual: revisão de escopo

RESUMO

Objetivo

identificar os motivos que levam o indivíduo a seguir ou não a recomendação da necessidade do uso do aparelho de amplificação sonora individual (AASI) e a utilização desse dispositivo ao longo dos anos.

Estratégia de pesquisa

orientações do Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews (PRISMA-ScR) foram seguidas. As bases de dados pesquisadas foram: Pubmed, Pubmed Central, Scopus, Embase, Web of Science e Cochrane, utilizando os seguintes descritores: “Hearing Aids”, “Patient Compliance” e o indicador booleano AND.

Critérios de seleção

artigos originais primários com desenhos prospectivos, retrospectivos, observacionais ou experimentais; que levantassem, relatassem, verificassem ou analisassem os motivos de adesão ou não ao uso de AASI, independentemente de ser usuário experiente ou não; realizados com a população jovem, adulta e idosa; com indivíduos com qualquer grau, tipo e configuração de perda auditiva; com adaptações unilaterais ou bilaterais e em português, inglês e espanhol.

Resultados

incluídos 27 estudos na análise. Verificaram-se duas situações distintas no processo de reabilitação auditiva: aceitação à indicação do uso do AASI e a continuidade do uso do dispositivo de maneira efetiva. Os aspectos que auxiliaram positivamente, negativamente ou não interferiram nessas duas fases foram compilados e apresentados.

Conclusão

os fatores de maior relevância para a não aquisição do AASI são: percepção de baixo custo-benefício, falta de entendimento da real necessidade e dificuldade de aceitação do uso, enquanto que os que mais impactam na continuidade do uso são: qualidade sonora do AASI, dificuldades de manuseio e percepção de pouco benefício.

Palavras-chave:
Auxiliares de audição; Cooperação do paciente; Audição; Perda auditiva; Cooperação e adesão ao tratamento

ABSTRACT

Purpose

To identify the reasons that lead the individual to follow or not the recommendation to use the hearing aid and its use over the years.

Research strategy

Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews (PRISMA-ScR) recommendations were followed. The databases searched were: Pubmed, Pubmed Central, Scopus, Embase, Web of science and Cochrane, using the following descriptors: “Hearing Aids”, “Patient Compliance” and the Boolean indicator AND.

Selection criteria

primary original articles with prospective, retrospective, observational or experimental designs; that raise, report, verify or analyze the reasons for adherence or not to the use of hearing aids, regardless of being an experienced user or not; carried out with the young, adult and elderly population; with individuals with any degree, type and configuration of hearing loss; with unilateral or bilateral adaptations and in Portuguese, English and Spanish.

Results

27 studies were included in the analysis. There were two distinct situations in the auditory rehabilitation process: acceptance of the indication of the use of HA and the continuity of the effective use. Thus, the aspects that positively, negatively or do not interfere in these two phases were compiled and presented.

Conclusion

the most relevant factors in the non-adherence to HA were: perception of low cost-benefit, lack of understanding of the real need and difficulty in accepting its use; while the ones that most impacted the continuity of use were: HA sound quality, handling difficulties and perception of little benefit.

Keywords:
Hearing aid; Patient compliance; Hearing; Hearing loss; Treatment adherence and compliance

INTRODUÇÃO

O Relatório Mundial da Audição, publicado em 2021, trouxe a projeção de que, em 2050, 2,5 milhões de pessoas estarão convivendo com algum grau de perda auditiva e, ao menos, 700 milhões irão necessitar de serviços de reabilitação auditiva(¹).

Existem diversas intervenções possíveis para reabilitar indivíduos com perda auditiva que buscam reduzir as limitações de participação e favorecer melhores estratégias de comunicação, assim como propor modificações ambientais para reduzir as consequências negativas da perda auditiva(²). As mais difundidas são: aconselhamento, uso de tecnologia auxiliar de escuta, estratégias de comunicação e o aparelho de amplificação sonora individual (AASI)(³). Dentre as opções disponíveis, o AASI é frequentemente recomendado(⁴), pois permite que o indivíduo retome o acesso aos sons perdidos por conta da perda auditiva.

O processo de reabilitação auditiva se inicia previamente à colocação do AASI, ou seja, desde o momento em que o indivíduo inicia sua jornada em busca de ajuda, realiza a avaliação audiológica e recebe a recomendação do uso do dispositivo, sendo que há uma combinação de fatores (audiológicos e não audiológicos) importantes para que ele obtenha sucesso nesse processo(⁵). No entanto, nem todos os indivíduos que devem utilizar o AASI aceitam tal prescrição e vão adquirir e utilizar o dispositivo.

Em pesquisa, um terço dos pacientes não adquiriu o AASI que lhe foi recomendado(⁶), enquanto as principais explicações para essa ocorrência foram: renda insuficiente, falta de conhecimento de programas de concessão, falta de interesse real em melhorar a audição, estigma/preconceito, mau atendimento do médico otorrinolaringologista e/ou fonoaudiólogo, experiências prévias próprias insatisfatórias, experiências insatisfatórias entre familiares ou amigos, problemas de saúde intercorrentes e medo(⁶-⁸). A percepção errônea dos cuidadores de indivíduos com perda auditiva sobre a importância do AASI também é um fator-chave que fomenta o atraso na busca do tratamento(⁹).

Semelhante às pesquisas realizadas pela Associação de Indústrias de Aparelhos Auditivos (HIA), nos Estados Unidos, conhecida como MarkeTrak(¹⁰), existem as pesquisas equivalentes na Europa, desenvolvidas pela associação de manufatores de instrumentos auditivos (EHIMA), chamados de EuroTrak. Essas pesquisas são amplas e demonstram relevantes achados sobre o mercado de AASI e de seus usuários Em estudo de 2009(¹¹), os fatores de decisão mais significativos para a adesão ao tratamento e uso do AASI foram: gravidade da deficiência, opinião e relacionamento com o otorrinolaringologista e fonoaudiólogo e ambiente familiar. Em outro relato(¹²), os sete fatores de decisão mais significativos foram: facilidade de uso, atendimento das expectativas, custo, grau de perda auditiva, qualidade do serviço de AASI, experiência de familiares e amigos e eficácia de possíveis tratamentos alternativos. A razão primordial e convincente para a aceitação de uso do AASI foi a necessidade de se comunicar adequadamente(¹³). No entanto, os fatores supracitados dão luz à importância de redirecionar a atenção também para os aspectos psicológicos e sociais(⁶).

Existem, entretanto, indivíduos que adquiriram o AASI, porém não fazem uso efetivo (igual ou maior que oito horas/dia). Enquanto a literatura internacional aponta que a não adesão ao uso dos AASI deve atingir um máximo de 30% dos indivíduos(¹⁴), a porcentagem de não uso se mostra em torno de 40% no Reino Unido(¹⁵), 50% na Austrália(¹⁶), 60% na Suíça(¹⁷), 39% nos Estados Unidos(¹⁸) e 57% na China(¹⁹). Outra pesquisa mostrou que os níveis de descontinuação do uso do AASI atingiram 21,7% dos pacientes em 30 meses de análise(²⁰).

Embora se acreditasse que o uso efetivo do AASI iria aumentar com o desenvolvimento das tecnologias digitais não lineares(³,¹⁵), já que elas dispõem de inúmeros recursos e algoritmos, pouco foi visto na prática. Desde a década de 1980, os problemas mais referidos por usuários que prejudicavam o uso efetivo eram: ruído de fundo, falta de percepção da necessidade, problemas com moldes auriculares/acopladores, problemas com óculos, AASI não eficaz, não estético, muito barulhento, problemas mecânicos do AASI e baixa qualidade de som(²¹). Em 2010, no MarkeTrak V, observou-se que, em ordem de maior aparecimento para menor, os seguintes motivos foram: falta de benefício no silêncio e no ruído, dificuldade de adaptação e conforto, efeitos negativos da perda auditiva, custos de reparos, necessidade de ajuda com o AASI, qualidade sonora pobre, dificuldade de manuseio do controle de volume, microfonia, AASI irritante, atendimento ruim do audiologista e estigma(²²).

Observa-se que queixas referentes à compreensão de fala no ruído, percepção de pouco benefício e questões de incômodo com a qualidade sonora, além de dificuldades de manuseio, estigmas estéticos e mau atendimento do profissional da saúde, permanecem no topo dos motivos que levam à baixa porcentagem de uso efetivo do AASI(³).

Destarte, confirma-se a necessidade de criação de ações que possam favorecer o uso, não somente para beneficiar o usuário, mas também para redução do desperdício de dinheiro dos serviços de saúde(¹⁵). Pesquisas mostram a importância de colocar mais ênfase na orientação dos pacientes em saber distinguir entre problemas que são comuns e os que podem ser resolvidos. Deve-se propor um planejamento de reabilitação com sessões de acompanhamento previamente organizadas(²³), pois estudos apontam que, mesmo após dez meses de adaptação, alguns pacientes apresentavam dificuldades simples e que poderiam ser resolvidas com acompanhamento e orientações(⁶).

Entender os fatores que influenciam na não adesão ao tratamento com AASI é uma iniciativa que vem sendo descrita na literatura e, há décadas, observam-se estudos que trazem essa temática. Mas, além disso, a compilação de fatores que levam o usuário a aderir e realmente fazer o uso efetivo também é importante e deve ser elencada, apesar de esses fatores ainda variarem consideravelmente(⁸).

OBJETIVOS

Objetivo primário: Identificar os motivos que levam o indivíduo a seguir ou não a recomendação da necessidade do uso do AASI e a sua utilização ao longo dos anos.

Objetivos secundários

• Identificar os motivos que favorecem o indivíduo a seguir recomendação da necessidade do uso do AASI;

• Identificar os motivos que dificultam o indivíduo a seguir recomendação da necessidade do uso do AASI;

• Identificar os motivos que favorecem a continuidade do uso do AASI;

• Identificar os motivos que dificultam a continuidade do uso do AASI.

ESTRATÉGIAS DE PESQUISA

A pergunta norteadora se baseou no mnemônico P (população), C (conceito) e C (contexto), que orientou a pergunta da revisão de escopo: “Quais os motivos que levam os usuários de AASI a aderirem ou não ao uso desse dispositivo?”. A população se refere aos indivíduos com perda auditiva que usam ou não o dispositivo; o conceito se refere ao AASI e o contexto se refere ao uso do AASI.

Foram seguidas as recomendações do Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews (PRISMA-ScR)(²⁴,²⁵). Cada vez mais utilizada em pesquisas da área da saúde(²⁶), a revisão de escopo tem como intuito a realização de mapeamento da literatura em um determinado campo de interesse(²⁶). Ela é adequada a tópicos amplos, podendo reunir vários desenhos de estudos e tem a finalidade de reconhecer as evidências produzidas(²⁷).

A revisão de escopo se difere das revisões sistemáticas por permitir mapear tópicos mais extensos com diferentes desenhos de estudos, mas não significa que tem menor nível de evidência, pois segue, também criteriosamente, um rigor metodológico(²⁸). Para os objetivos desta pesquisa, a possibilidade de expandir a busca dos estudos que traziam os motivos do uso e não uso do AASI não somente como objetivo primário se mostrou necessária.

Autores sugerem que a revisão de escopo organize, resuma e dissemine os achados de outras pesquisas e identifique possíveis gaps na literatura(²⁷). De acordo com o explanado e contemplando o objetivo deste estudo, a revisão de escopo se mostrou como método mais apropriado.

Procedimentos

A busca pelos estudos foi realizada no mês de junho de 2021, por um bibliotecário que auxiliou na condução do processo, em conjunto com o pesquisador responsável. As bases de dados pesquisadas foram: Pubmed, Pubmed Central, Scopus, Embase, Web of Science e Cochrane.

Os descritores utilizados na pesquisa foram: “Hearing Aids” AND “Patient Compliance” e seus termos alternativos. A escolha dos descritores se deu por serem palavras-chave indexadas, requisito relevante para uma revisão de escopo.

O descritor “Patient Compliance” foi escolhido pelo fato de sua definição se referir à cooperação voluntária do paciente em seguir a conduta prescrita, no caso, o uso do AASI, englobando, em sua compreensão, a aderência e adesão do paciente à reabilitação auditiva.

As bases PubMed, PubMed Central e Cochrane Library seguem o vocabulário de assuntos MeSH - Medical Subject Headings. A Embase segue o Emtree, e, por isso o descritor preferido foi Hearing Aid (sem o “s” no final). Já as bases Scopus e Web of Science não têm vocabulário definido de assuntos. Sendo assim, deu-se preferência para os termos MeSH também.

Para cada base, utilizou-se uma estratégia de busca de acordo com os critérios adotados na base (Quadro 1).

Quadro 1
Estratégia de busca por base de dados

Fonte	Estratégia
PubMed	((Hearing Aids[MeSH Terms]) OR (“Hearing Aids”[Title/Abstract] OR “Aid, Hearing”[Title/Abstract] OR “Aids, Hearing”[Title/Abstract] OR “Hearing Aid”[Title/Abstract] OR “Ear Molds”[Title/Abstract] OR “Ear Mold”[Title/Abstract] OR “Mold, Ear”[Title/Abstract] OR “Molds, Ear”[Title/Abstract])) AND ((Patient Compliance[MeSH Terms]) OR (“Patient Compliance”[Title/Abstract] OR “Compliance, Patient”[Title/Abstract] OR “Patient Adherence”[Title/Abstract] OR “Adherence, Patient”[Title/Abstract] OR “Patient Cooperation”[Title/Abstract] OR “Cooperation, Patient”[Title/Abstract] OR “Client Compliance”[Title/Abstract] OR “Client Compliances”[Title/Abstract] OR “Compliance, Client”[Title/Abstract] OR “Client Adherence”[Title/Abstract] OR “Adherence, Client”[Title/Abstract] OR “Treatment Compliance”[Title/Abstract] OR “Compliance, Treatment”[Title/Abstract] OR “Treatment Compliances”[Title/Abstract] OR “Therapeutic Compliance”[Title/Abstract] OR “Compliance, Therapeutic”[Title/Abstract] OR “Therapeutic Compliances”[Title/Abstract] OR “Patient Non-Compliance”[Title/Abstract] OR “Non-Compliance, Patient”[Title/Abstract] OR “Patient Non Compliance”[Title/Abstract] OR “Patient Noncompliance”[Title/Abstract] OR “Noncompliance, Patient”[Title/Abstract] OR “Patient Nonadherence”[Title/Abstract] OR “Nonadherence, Patient”[Title/Abstract] OR “Non-Adherent Patient”[Title/Abstract] OR “Non Adherent Patient”[Title/Abstract] OR “Non-Adherent Patients”[Title/Abstract] OR “Patient, Non-Adherent”[Title/Abstract] OR “Patient Non-Adherence”[Title/Abstract] OR “Non-Adherence, Patient”[Title/Abstract] OR “Patient Non Adherence”[Title/Abstract]))
PubMed PMC	((Hearing Aids[MeSH Terms]) OR (“Hearing Aids”[Title/Abstract] OR “Aid, Hearing”[Title/Abstract] OR “Aids, Hearing”[Title/Abstract] OR “Hearing Aid”[Title/Abstract] OR “Ear Molds”[Title/Abstract] OR “Ear Mold”[Title/Abstract] OR “Mold, Ear”[Title/Abstract] OR “Molds, Ear”[Title/Abstract])) AND ((Patient Compliance[MeSH Terms]) OR (“Patient Compliance”[Title/Abstract] OR “Compliance, Patient”[Title/Abstract] OR “Patient Adherence”[Title/Abstract] OR “Adherence, Patient”[Title/Abstract] OR “Patient Cooperation”[Title/Abstract] OR “Cooperation, Patient”[Title/Abstract] OR “Client Compliance”[Title/Abstract] OR “Client Compliances”[Title/Abstract] OR “Compliance, Client”[Title/Abstract] OR “Client Adherence”[Title/Abstract] OR “Adherence, Client”[Title/Abstract] OR “Treatment Compliance”[Title/Abstract] OR “Compliance, Treatment”[Title/Abstract] OR “Treatment Compliances”[Title/Abstract] OR “Therapeutic Compliance”[Title/Abstract] OR “Compliance, Therapeutic”[Title/Abstract] OR “Therapeutic Compliances”[Title/Abstract] OR “Patient Non-Compliance”[Title/Abstract] OR “Non-Compliance, Patient”[Title/Abstract] OR “Patient Non Compliance”[Title/Abstract] OR “Patient Noncompliance”[Title/Abstract] OR “Noncompliance, Patient”[Title/Abstract] OR “Patient Nonadherence”[Title/Abstract] OR “Nonadherence, Patient”[Title/Abstract] OR “Non-Adherent Patient”[Title/Abstract] OR “Non Adherent Patient”[Title/Abstract] OR “Non-Adherent Patients”[Title/Abstract] OR “Patient, Non-Adherent”[Title/Abstract] OR “Patient Non-Adherence”[Title/Abstract] OR “Non-Adherence, Patient”[Title/Abstract] OR “Patient Non Adherence”[Title/Abstract]))
Scopus	(TITLE-ABS-KEY (“Hearing Aids” OR “Aid, Hearing” OR “Aids, Hearing” OR “Hearing Aid” OR “Ear Molds” OR “Ear Mold” OR “Mold, Ear” OR “Molds, Ear”) AND TITLE-ABS-KEY (“Patient Compliance” OR “Compliance, Patient” OR “Patient Adherence” OR “Adherence, Patient” OR “Patient Cooperation” OR “Cooperation, Patient” OR “Client Compliance” OR “Client Compliances” OR “Compliance, Client” OR “Client Adherence” OR “Adherence, Client” OR “Treatment Compliance” OR “Compliance, Treatment” OR “Treatment Compliances” OR “Therapeutic Compliance” OR “Compliance, Therapeutic” OR “Therapeutic Compliances” OR “Patient Non-Compliance” OR “Non-Compliance, Patient” OR “Patient Non Compliance” OR “Patient Noncompliance” OR “Noncompliance, Patient” OR “Patient Nonadherence” OR “Nonadherence, Patient” OR “Non-Adherent Patient” OR “Non Adherent Patient” OR “Non-Adherent Patients” OR “Patient, Non-Adherent” OR “Patient Non-Adherence” OR “Non-Adherence, Patient” OR “Patient Non Adherence”))
Web of Science	TÓPICO: (“Hearing Aids” OR “Aid, Hearing” OR “Aids, Hearing” OR “Hearing Aid” OR “Ear Molds” OR “Ear Mold” OR “Mold, Ear” OR “Molds, Ear”) AND TÓPICO: (“Patient Compliance” OR “Compliance, Patient” OR “Patient Adherence” OR “Adherence, Patient” OR “Patient Cooperation” OR “Cooperation, Patient” OR “Client Compliance” OR “Client Compliances” OR “Compliance, Client” OR “Client Adherence” OR “Adherence, Client” OR “Treatment Compliance” OR “Compliance, Treatment” OR “Treatment Compliances” OR “Therapeutic Compliance” OR “Compliance, Therapeutic” OR “Therapeutic Compliances” OR “Patient Non-Compliance” OR “Non-Compliance, Patient” OR “Patient Non Compliance” OR “Patient Noncompliance” OR “Noncompliance, Patient” OR “Patient Nonadherence” OR “Nonadherence, Patient” OR “Non-Adherent Patient” OR “Non Adherent Patient” OR “Non-Adherent Patients” OR “Patient, Non-Adherent” OR “Patient Non-Adherence” OR “Non-Adherence, Patient” OR “Patient Non Adherence”) Índices=SCI-EXPANDED, SSCI, A&HCI, CPCI-S, CPCI-SSH, ESCI Tempo estipulado=Todos os anos
Embase	'hearing aid'/syn AND 'patient compliance'/syn
Cochrane Library	(“Hearing Aids” OR “Aid, Hearing” OR “Aids, Hearing” OR “Hearing Aid” OR “Ear Molds” OR “Ear Mold” OR “Mold, Ear” OR “Molds, Ear”):ti,ab,kw AND (“Patient Compliance” OR “Compliance, Patient” OR “Patient Adherence” OR “Adherence, Patient” OR “Patient Cooperation” OR “Cooperation, Patient” OR “Client Compliance” OR “Client Compliances” OR “Compliance, Client” OR “Client Adherence” OR “Adherence, Client” OR “Treatment Compliance” OR “Compliance, Treatment” OR “Treatment Compliances” OR “Therapeutic Compliance” OR “Compliance, Therapeutic” OR “Therapeutic Compliances” OR “Patient Non-Compliance” OR “Non-Compliance, Patient” OR “Patient Non Compliance” OR “Patient Noncompliance” OR “Noncompliance, Patient” OR “Patient Nonadherence” OR “Nonadherence, Patient” OR “Non-Adherent Patient” OR “Non Adherent Patient” OR “Non-Adherent Patients” OR “Patient, Non-Adherent” OR “Patient Non-Adherence” OR “Non-Adherence, Patient” OR “Patient Non Adherence”):ti,ab,kw

CRITÉRIOS DE SELEÇÃO

Foi utilizada a ferramenta Rayyan, desenvolvida pelo Qatar Computing Research Institute, com intuito de auxiliar o processo de inclusão e exclusão dos artigos para a análise final. A escolha dessa ferramenta dentre as outras existentes justificou-se pelo fato de ela estar disponível em plataforma Web, o que gera uma alta taxa de portabilidade, além de ser intuitiva e gratuita, apresentando-se de forma útil e valiosa para o auxílio nesta etapa da revisão de escopo.

Os estudos incluídos na revisão respeitaram os seguintes critérios: artigos originais primários com desenhos prospectivos, retrospectivos, observacionais ou experimentais; estudos que levantassem, relatassem, verificassem ou analisassem os motivos de adesão ou não ao uso de aparelho de amplificação sonora individual, independentemente de ser usuário experiente ou não; estudos realizados com a população jovem, adulta e idosa; estudos com indivíduos com qualquer grau, tipo e configuração de perda auditiva; com adaptações unilaterais ou bilaterais e estudos em português, inglês e espanhol.

Foram excluídos materiais provenientes de artigos não completos ou não publicados, resumos, outros tipos de revisões e dissertações/teses. Também foram excluídos artigos que analisavam outras tecnologias de amplificação, como implante coclear e prótese ancorada ao osso.

Os resultados não foram limitados quanto ao período, sem restrições do tipo de desenho de estudo desenvolvido. Além disso, foram analisados artigos com acesso livre ou acesso restrito.

ANÁLISE DOS DADOS

Dois revisores independentes e com expertise na área foram responsáveis pela análise dos 517 estudos levantados em primeiro momento. Restaram, então, 236 artigos após a exclusão das duplicatas. A seleção dos artigos foi realizada em duas etapas: a primeira foi a avaliação do título e do resumo do artigo e a segunda foi a leitura do texto em sua íntegra, com as decisões sempre pautadas nos critérios de inclusão e exclusão adotados nesta revisão. Os conflitos apresentados na primeira etapa (29 estudos) foram solucionados por um terceiro revisor, que teve como objetivo resolver as divergências. O processo de inclusão dos artigos da primeira etapa e solução de conflitos foi realizado em três meses (de junho a agosto de 2021).

Após exclusão dos artigos na primeira etapa, restaram 78 artigos para serem lidos na íntegra pelos dois revisores independentes. Os conflitos apresentados na segunda etapa (três estudos) foram solucionados por um terceiro revisor, a fim de resolver as divergências. Esse processo se iniciou em setembro de 2021 e foi finalizado em fevereiro de 2022 (Figura 1).

Figura 1
Fluxograma do processo de revisão de escopo

RESULTADOS

No levantamento final, 236 artigos foram analisados. Houve exclusão de alguns artigos a partir da leitura e análise dos títulos e resumos, mostrando-se elegíveis 78 estudos para leitura completa. Desses, 51 foram excluídos por não se enquadrarem aos critérios estabelecidos na pesquisa. Assim, 27 estudos foram selecionados para análise neste estudo (Figura 1).

No decorrer da revisão e leitura dos artigos, observou-se que existem aspectos iniciais ao processo de reabilitação auditiva que, predominantemente, determinam se o indivíduo vai em busca de solucionar o seu problema de privação auditiva, aceitando a recomendação do uso do AASI, e aspectos posteriores à aquisição/recebimento do AASI, que dizem respeito à continuidade do uso e do processo terapêutico. Dessa forma, os resultados foram organizados em duas tabelas (Tabelas 1-2), para melhor entendimento dos motivos.

Tabela 1
Fatores que influenciam a aquisição do aparelho de amplificação sonora individual

Autor e ano	Fatores para adquirir * , **	Fatores para não adquirir* , **
Alberti & Brown (1980) (6)		· Pouco benefício (n=10)
		· Dificuldade de manuseio (n=8)
		· Qualidade sonora ruidosa (n=5)
		· Preço excessivo (n=8)
		· Resistência ao uso (n=6)
		· Não sentem necessidade (n=4)
		· Estética (“é muito visível”) (n=4)
		· Outras debilitações (“eu sou muito velho e doente”)
Franks & Beckmann (1985) (29)		· Preço excessivo
		· Estigma e preconceito
		· Medo de ser “enganado” pelos profissionais
		· Qualidade sonora ruidosa
		· Desconforto com as características físicas do AASI
		· Dificuldades de manuseio
		· Postura do otorrinolaringologista ou audiologista (voltados somente à comercialização e não à saúde)
		· Falta de acesso a serviços de reabilitação auditiva
		· Sons muito fortes - desconfortáveis
Chukuezi (1992) (13)		· Desconforto com as características físicas do AASI
	· Necessidade de se comunicar adequadamente	· Estigma e preconceito
		· Preço excessivo
		· Qualidade sonora ruidosa
		· Aguardavam medicamentos para solucionar a perda auditiva
Gussekloo et al. (2003) (31)	· Grau da perda auditiva	· Estigma e preconceito
	· Dificuldade de se comunicar
	· Impactos que a perda auditiva gera nas atividades de vida diária
	· Estratégias de enfrentamento
Cohen-Mansfield & Taylor (2004) (32)		· Não sentem necessidade (n=15)
		· Preço excessivo (n=3)
Meister et al. (2008) (33)	· Percepção da dificuldade auditiva	· Estigma e preconceito
	· Expectativa de melhora da qualidade de vida	· Preço excessivo
Laplante-Lévesque et al. (2010) (12)	· (1) Conveniência	· (1) Conveniência
	· (2) adesão e resultados esperados;	· (2) adesão e resultados esperados;
	· (3) custos financeiros	· (3) custos financeiros
	· (4) deficiência auditiva	· (4) deficiência auditiva
	· (5) natureza da intervenção;	· (5) natureza da intervenção;
	· (6) experiências, recomendações e apoio de outras pessoas	· (6) experiências, recomendações e apoio de outras pessoas
	· (7) solução preventiva e provisória	· (7) solução preventiva e provisória
	Esses fatores tiveram influências positivas e negativas para adesão a prescrição do uso do AASI	Esses fatores tiveram influências positivas e negativas para adesão a prescrição do uso do AASI
Abdellaoui & Huy (2013) (7)	· Conselho do especialista (37%)	· Preço excessivo (n = 27)
	· Preço (30%)	· Falta de interesse real em melhorar a audição (n=20)
	· Efetividade do teste (18%)	· Postura do otorrinolaringologista ou audiologista (n = 2)
		· Experiências insatisfatórias entre familiares ou amigos (n = 1)
		· Outros problemas de saúde intercorrentes (n = 3)
		· Medo de ser “enganado” pelos profissionais (n = 2)

• ^*
  Quando o motivo aparece em mais de uma coluna, significa que pode influenciar de mais de uma maneira;
• ^**
  Quando não há o “n” ou a porcentagem (%) é porque não foi referido no estudo
• Legenda: AASI = Aparelho de amplificação sonora individual; n = Amostra do estudo; % = Porcentagem

Tabela 2
Fatores que influenciam o uso ou não uso do aparelho de amplificação sonora individual

Autor e ano	Fatores que influenciam negativamente *** , ****	Fatores que influenciam positivamente***,****	Fatores que são indiferentes***,****
Surr et al. (1978) (21)	· Incômodo em situação de ruído (32%)	· Sentir necessidade
	· Não sentem necessidade (31%)	· Treinamentos
	· Desconforto com as características físicas do AASI (problemas no molde) (9%)	· Acompanhamentos e follow-ups
	· Percepção de pouco ou nenhum benefício (4%)	· Motivação
	· Sons muito fortes - desconfortáveis (4%)	(aspectos extra-acústicos e psicossociais)
	· Problemas de defeitos técnicos do AASI (3%)
	· Qualidade sonora desagradável (2%)
	· Estigma e preconceito (4%)
	· Outros (não descritos) (6%)
Sorri et al. (1984) (36)	· Idade: idosos usam menos que os mais jovens
	· Se sentirem incapazes de usar
Amedofu et al. (2004) (37)	· Não sentem necessidade (“audição muito boa”) (29%)
	· Estigma e preconceito (“problemas de aceitação”) através do manuseio (21%)
	· Dificuldades de manuseio
	· Problemas de defeitos técnicos do AASI
	· Falta de motivação
Cohen-Mansfield & Taylor (2004) (32)	· Problemas de defeitos técnicos do AASI (n=12)
	· Desconforto com as características físicas do AASI (n=7)
	· Dificuldades de manuseio (n=14)
	· Custo de manutenção e conserto
Kaplan-Neeman et al. (2012) (38)	· Incômodo em situação de ruído
	· Percepção de pouco ou nenhum benefício
Linssen et al. (2013) (39)	· Percepção de pouco ou nenhum benefício
	· Expectativas perante o AASI não adequadas
	· Ajustes do AASI não estão adequados
	· Postura do otorrinolaringologista ou audiologista
	· Pressão de outros para o usar o AASI
Salonen et al. (2013) (40)	· Incômodo em situação de ruído (73,7%)
	· Desconforto com as características físicas do AASI (10,5%)
	· Microfonia (17,5%)
	· Dificuldade de manuseio (3,5%)
	· Custo de manutenção e conserto (ex.: custo das pilhas) (22,8%)
	· Não sentem necessidade (“Estou tão sozinho que não preciso de um aparelho auditivo”) (5,3%)
	· Estigma e preconceito (7%)
	· Pressão de outros para o usar o AASI (17,5%)
	· Se sentirem incapazes de usar (3,5%)
Guerra-Zúñiga et al. (2014) (41)	· Medo de perder o AASI (só usar em situações específicas)	· Apoio da família
	· Indivíduos com graus de perda profundo são menos aderentes (percebem pouco benefício)	· Vivenciar atividades sociais
Iwahashi et al. (2015) (42)	· Não comparecer aos atendimentos de acompanhamento (follow-up)
	· Qualidade sonora desagradável (29,8%)
	· Percepção de pouco ou nenhum benefício (17%)
	· Dificuldade de manuseio (14,9%)
	· Problemas de defeitos técnicos do AASI (14,9%)
	· Ajustes do AASI não estão adequados (10,6%)
	· Debilitações outras (8,5%)
	· Perder o AASI (4,3%)
Lee & Noh (2015) (43)	· Tipo de AASI	· Tipo de AASI
	· Método de processamento do sinal	· Método de processamento do sinal
	· Número de canais	· Número de canais
	· Atividades sociais e/ou laborais	· Atividades sociais e/ou laborais
	· Fatores sociocomportamentais	· Fatores sociocomportamentais
	· Acompanhamentos e follow-ups	· Acompanhamentos e follow-ups
Aazh et al. (2015) (15)	· Incômodo em situação de ruído (59%)
	· Não sentem necessidade (consegue se virar sem eles) (39%)
	· Consequências negativas do uso (ex.: coceira, acúmulo de cera) (26%)
	· Desconforto com as características físicas do AASI (22%)
	· Dificuldades de manuseio (18%)
	· Percepção de pouco ou nenhum benefício (18%)
	· Estética (“não gosto da aparência deles”) (10%)
	· Estigma e preconceito (“me faz eu me sentir velho”) (9%)
	· Outros (não descritos) (53%)
Maeda et al. (2016) (44)		· Melhora subjetiva na qualidade de vida	· Parâmetros audiológicos por si só
			· Idade
			Índices de reconhecimento de fala
Bennett et al. (2016) (45)			· Continuidade do mesmo audiologista
			*viés de a pesquisa ter sido realizada em mesmo centro em que os profissionais seguem os mesmos protocolos
Carrasco-Alarcón et al. (2018) (14)	· Incômodo em situação de ruído
	· Percepção de pouco ou nenhum benefício
	· Desconforto com as características físicas do AASI
	· Não tem pilhas
Gallagher & Woodside (2018) (8)	· Dificuldade de manuseio
	· Não sentem necessidade (acreditam que escutam bem) - Sugerem que a adesão ao uso regular se dá quando a perda auditiva chega em determinado limite (como quando passa a interferir em atividades diárias)
Ho et al. (2018) (9)	· Quanto mais velho, menos propenso a usar
	· Quanto melhor a audição, menos propenso a usar
Solheim et al. (2018) (46)	· Dificuldade de manuseio (25,4%)
	· Qualidade sonora desagradável (26,0%)
	· Não sentem necessidade (18,8%)
	· Percepção de pouco ou nenhum benefício (2,8%)
	· Desconforto com as características físicas do AASI (2,2%)
	· Custo de manutenção e conserto (ex.: custo das pilhas) (4,4%)
	· Problemas de defeitos técnicos do AASI (8,3%)
	· Perder o AASI (2,8%)
	· Estigma e preconceito (1,1%)
	· Debilitações outras (9,9%)
	· Outros (não descritos) (10,5%)
Fuentes-López et al. (2019) (20)	· Percepção de pouco ou nenhum benefício (18,2%)
	· Incômodo em situação de ruído (18,2%)
	· Ajustes do AASI não estão adequados (15,6%)
	· Dificuldade de manuseio (ex.: controle de volume) (15,6%)
	· Qualidade sonora desagradável (5.2%)
	· Consequências negativas do uso (ex.: coceira, acúmulo de cera, erupções cutâneas) (5.2%)
	· Não sentem necessidade (2,6%)
	· Outros (não descritos) (53,2%)
Fuentes-López et al. (2019) (47)		· A autoeficácia do uso

• ^***
  Quando o motivo aparece em mais de uma coluna, significa que pode influenciar de mais de uma maneira;
• ^****
  Quando não há o “n” ou a porcentagem (%) é porque não foi referido no estudo
• Legenda: AASI = Aparelho de amplificação sonora individual; n = Amostra do estudo; % = Porcentagem

O número de estudos somados nas duas tabelas foi maior do que o selecionado para análise, pois alguns deles foram inseridos nas duas tabelas, já que trouxeram diferentes dados.

DISCUSSÃO

É indiscutível que, no campo da audiologia, as mudanças e avanços tecnológicos são constantes, o que leva os profissionais à necessidade de estarem aptos a manejar adequadamente as soluções disponíveis, tanto pelas novas tecnologias dos dispositivos, como pelo aumento da divulgação do conhecimento e informação que os usuários já têm(²⁹,³⁰). No entanto, o processo de seleção e adaptação do AASI é bem definido e vai muito além de somente definir características físicas e eletroacústicas do dispositivo. Diversos aspectos prévios ao próprio AASI impactam a adesão ou não ao uso. Isso porque o processo de reabilitação auditiva é complexo e extenso e não é solucionado somente com a colocação do AASI.

Diante disso, esta revisão de escopo, em sua organização de resultados e díspar ao encontrado na literatura, optou por trazer separadamente os aspectos que impactam a busca para utilizar o AASI e adquiri-lo e os aspectos relacionados ao uso efetivo do dispositivo por aqueles indivíduos que já o possuíam. Essa escolha se deu pelo fato de que, apesar de os motivos se interligarem, se supõe que a forma de abordagem de solução do problema seja diferente em cada etapa do processo.

A Tabela 1 demonstra os fatores que influenciam na aquisição do AASI. Dos fatores apontados como facilitadores para a busca do uso do AASI, observou-se com maior frequência a necessidade de se comunicar adequadamente e superar os impactos que a perda auditiva gera nas atividades de vida diária, assim como a expectativa do indivíduo de melhora na qualidade de vida(¹²,³¹,³²). No entanto, muito mais explorado nos estudos, são os motivos para não adquirir o AASI. Os mais relatados foram: preço excessivo, percepção de pouco benefício, estigma e preconceito, desconforto com as características físicas e eletroacústicas, qualidade sonora desagradável durante o teste, não sentir necessidade do uso e a postura dos profissionais que atendem o indivíduo(⁶,⁷,¹²,¹³,²⁹,³²,³³).

No momento em que o indivíduo está compreendendo sua situação, recebendo a indicação e analisando o custo x benefício em adquirir um AASI e como esse aparelho terá impacto em sua vida, as estratégias para fidelização do usuário e criação do vínculo com o profissional de saúde são de extrema importância. Autores sugerem que existem três fatores-chave para alcançar a adesão ao tratamento: avaliação realista do conhecimento e compreensão dos pacientes quanto ao processo de reabilitação auditiva, comunicação clara e eficaz entre profissionais de saúde e seus pacientes e nutrição da confiança na relação terapêutica(³⁴).

É possível melhorar a adesão dos pacientes ao tratamento. De acordo com estudo(³⁵), o primeiro passo diz respeito ao início do vínculo, em que é necessário entender o que trouxe o paciente ali e seu objetivo. É preciso observar se há necessidade de, primeiramente, discutir sobre as barreiras de aceitação. Depois, deve-se avaliar a motivação, elemento-chave para dar o passo de investir em uma audição melhor. Os autores referem que conseguir demonstrar ao indivíduo que o AASI deve ser utilizado relaciona-se diretamente à capacidade de convencê-los de que aquele é o momento ideal para fazer algo para resolver seu problema. O segundo passo deve ser o desenvolvimento de um processo detalhado e bem estruturado para testar e apresentar informações aos pacientes. Isso requer compreensão mútua a cada passo do caminho. Concomitantemente, o profissional da saúde deve ser simpático e acolhedor, mas se posicionando como uma autoridade respeitada. Além disso, é de suma importância acreditar que o AASI é necessário e confiar nas evidências científicas, compartilhando esses conhecimentos com o indivíduo, para conscientizá-lo. Guiar o paciente ao longo do processo deve ser papel do fonoaudiólogo que atua nessa área.

Ademais, é evidente a necessidade urgente de criar ações e intervenções que possam favorecer o uso, também pelo fato de haver desperdício financeiro dos serviços. Como solução, autores sugerem a realização de entrevistas motivacionais e de compreensão do panorama, como uma possibilidade de aumentar a adesão ao uso do AASI(¹⁵).

Além dos fatores supracitados, diversos relatos demonstram que, mesmo após adquirir o AASI, os pacientes não fazem uso efetivo. A Tabela 2 demonstrou fatores que influenciam no uso ou não uso do AASI. Observou-se que, novamente, os fatores que influenciam negativamente o uso efetivo são mais expressivos que os que influenciam positivamente. Diante dos que têm impacto negativo, entre os mais citados estão as questões de qualidade sonora desagradável e desconforto em ambientes ruidosos.

Neste estudo, não houve limitação de período de busca de artigos, no intuito de, realmente, construir uma linha do tempo em relação aos fatores que impactam o uso do AASI, assim como as Tabelas 1-2 foram descritas em ordem cronológica das pesquisas. Mesmo com a ideia de que os fatores se modificariam por conta dos avanços tecnológicos alcançados, observou-se que muitos se mantiveram similares no decorrer dos anos estudados.

Na Tabela 1, verifica-se que o estudo da década de 1980 trouxe oito fatores que que influenciam a aquisição do AASI(⁶), enquanto o estudo de 2013(⁷) trouxe seis motivos, dos quais, três eram os mesmos: preço excessivo, ausência de real interesse/não sentir necessidade e outros problemas de saúde que afetavam o uso.

Já na Tabela 2, estudo do final dos anos 1970(²¹) pontuou nove fatores negativos que influenciam o uso efetivo do AASI, enquanto pesquisa de 2019(²⁰) trouxe oito aspectos. Na comparação desses dois estudos, houve cinco aspectos em comum: percepção de pouco ou nenhum benefício, incômodo em situação de ruído, qualidade sonora desagradável, não sentirem necessidade e outros (não descritos).

No decorrer da revisão e a leitura dos artigos, observou-se que os aspectos que explicariam a baixa adesão ao AASI são diversos e multifatoriais(⁸,³²). Pode-se subdividir os fatores em questões relacionadas ao próprio paciente, questões relacionadas à patologia (perda auditiva) e questões relacionadas ao serviço e profissionais envolvidos(⁴¹).

Aspectos prévios e intrínsecos ao próprio indivíduo se referem à motivação ao uso, expectativas, demandas individuais, ambientes que o indivíduo frequenta, idade, apoio dos familiares, destreza e habilidades motoras, que afetam o uso do AASI e são frequentemente descritos nas pesquisas(²⁰,³⁷,³⁹,⁴³). Alguns fatores, como experiência prévia ruim com AASI, atitudes perante as dificuldades apresentadas, emprego e atividades sociais são apresentados como aspectos que têm relação a aquisição do AASI(⁴¹).

Questões relacionadas ao tipo, grau e configuração da perda auditiva, associadas ao impacto que a perda auditiva tem na vida do indivíduo e o quanto prejudica sua qualidade de vida e atividades de vida diária são relevantes(³¹). Mas, além disso, o próprio estigma causado pela perda auditiva e pelo uso de AASI, bem como o custo da aquisição do dispositivo dificultam a aceitação e a busca por ajuda.

Os serviços de saúde podem, também, ter influência no uso do AASI. Evidencia-se a relevância da implementação de diferentes tipos de aconselhamento e educação do indivíduo quanto ao uso do AASI antes, durante e depois da indicação(⁴¹). A postura do profissional de saúde pode impactar de forma negativa ou positiva na aquisição do AASI(⁷). Por isso, a forma de manejo com os pacientes deve ser levada em consideração durante os atendimentos.

Inúmeros artigos reforçam a importância de um programa de acompanhamento (follow up) adequado, em que os profissionais orientem os usuários sobre as dificuldades envolvidas no processo e problemas que são comuns e os que podem ser resolvidos. Há a proposta de sessões de acompanhamento previamente organizadas, não somente para oferecer ajuda caso eles procurem e precisem(²³). Pesquisas(³) demonstram que os obstáculos ao uso se referem a dificuldades de manuseio e destreza com o AASI, o que poderia ser previamente avaliado, treinado e solucionado nos acompanhamentos. O suporte e aconselhamento podem ser até mais relevantes que a tecnologia embutida no AASI(⁴⁸).

É importante salientar que a gama de artigos que discorrem sobre os motivos para a não adesão e o não uso efetivo são mais expressivos. Isso faz pensar que, talvez, uma forma de conseguir sucesso no resultado da reabilitação auditiva seja, na verdade, se apoiar e aumentar o entendimento dos motivos que fazem o paciente realmente aderir a todo o processo de seleção e adaptação do AASI, além de compreender as orientações e valorizar a necessidade dos acompanhamentos periódicos e regulares. Tornar o paciente satisfeito com a adaptação, para que faça um uso efetivo do AASI, pode ser complexo pelo fato de a satisfação ser subjetiva e multifacetada(⁴⁹).

Pesquisadores apontam que deve ser proposto um planejamento da reabilitação auditiva centrada no paciente e que a adequação das expectativas perante a isso possibilite um uso efetivo do AASI e maiores níveis de satisfação com esse uso(⁵,⁵⁰).

Uma das maneiras de tornar o processo mais adequado é analisar a autoeficácia do AASI, que tem sido sugerida como um dos principais fatores que podem explicar a adesão ao seu uso(⁴⁷). A autoeficácia do dispositivo foi definida por West & Smith(⁵¹) como a confiança dos indivíduos sobre sua própria capacidade de cuidar do AASI e usá-lo com sucesso. A autoeficácia do AASI é um elemento-chave no processo de se tornar um usuário bem-sucedido.

Os facilitadores mais importantes da procura de ajuda e do sucesso do uso do AASI foram crenças atitudinais positivas sobre os AASI, o apoio de pessoas outras consideradas significativas para o usuário e autoeficácia do AASI. Outro fator que, muitas vezes, é apontado como influenciador da reabilitação efetiva é a tolerância do indivíduo em ouvir na presença de ruído de fundo. No entanto, descobertas sobre o que determina uma reabilitação auditiva bem-sucedida e o uso adequado do AASI ainda variaram consideravelmente nos estudos analisados(⁸).

Embora tenha se tentado desenvolver uma estratégia de busca abrangente, é possível que alguns estudos relevantes tenham sido perdidos. Igualmente, materiais e pesquisas que não foram publicados em periódicos acadêmicos nas bases de dados pesquisadas e que poderiam fornecer informação adicional não constam desta revisão.

Como já descrito, as revisões de escopo não incorporam uma avaliação de qualidade dos estudos para sua inclusão, diferentemente das revisões sistemáticas. No entanto, essas questões apontadas são características metodológicas comuns em revisões de escopo.

CONCLUSÃO

A revisão de escopo permitiu identificar, de forma abrangente, os motivos que que levam o indivíduo a seguir, ou não, a recomendação da necessidade do uso do AASI e a sua utilização ao longo dos anos.

De acordo com a visão dos candidatos ao uso do AASI, os fatores envolvidos na não aquisição estão relacionados ao baixo custo-benefício, dificuldade de aceitação e falta de entendimento da real necessidade. No entanto, os fatores mais citados quanto ao uso efetivo após a aquisição do AASI estão relacionados a questões de qualidade sonora, dificuldades de manuseio e percepção de pouco benefício.

Para maior conscientização, adesão e uso efetivo do AASI, a postura do profissional de saúde é extremamente relevante e deve ser baseada no acolhimento, criação de vínculo e planejamento da reabilitação auditiva centrada no paciente. Após o processo de adaptação, é importante manter alinhamento de expectativas, bem como o acompanhamento próximo dos usuários, baseado em aconselhamentos e orientações constantes.

A identificação dos fatores mais relevantes que impactam o uso do AASI em diferentes momentos do processo de reabilitação auditiva é necessária para desenvolver e aprimorar estratégias para otimizar esse processo, favorecendo maior adesão ao uso do AASI. Sugere-se uma investigação mais aprofundada dos fatores que influenciam positivamente o uso.

AGRADECIMENTOS

Agradecimento a ao Programa de Pós-graduação em Saúde, Interdisciplinaridade e Reabilitação da Universidade Estadual de Campinas.

• Trabalho realizado na Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil.
• Financiamento: Nada a declarar.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  22 Maio 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  21 Jul 2022
• Aceito
  14 Fev 2023