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Avaliação da linguagem oral de crianças com deficiência visual: uma revisão integrativa da literatura

RESUMO

Objetivo

revisar a literatura nacional e internacional a respeito dos instrumentos, métodos e técnicas para avaliação de linguagem de crianças com deficiência visual.

Estratégia de pesquisa

foram realizadas buscas nas bases BVS, PubMed e Scopus, utilizando-se os descritores transtornos da visão, linguagem infantil, baixa visão, cegueira, fonoaudiologia e reabilitação.

Critérios de seleção

artigos publicados em periódicos nacionais e internacionais, nos idiomas inglês, espanhol e português. Trabalhos indisponíveis para leitura, com amostra composta por não crianças, não pertencentes ao assunto abordado, ou que mencionassem deficiências sensoriais associadas à visual, foram excluídos. Foram também excluídos os artigos que versassem sobre intervenção, salvo os que também abordassem a avaliação. As referências dos artigos lidos na íntegra foram selecionadas de acordo com esses critérios. Analisaram-se os instrumentos/métodos/técnicas de avaliação propostos, os objetivos dos estudos, sua amostra e principais resultados obtidos.

Resultados

foram recuperados 157 artigos, dos quais, selecionaram-se, a partir dos critérios de exclusão, 6 para leitura integral, e mais 6 obtidos de suas referências, totalizando 12 artigos. Sete trabalhos foram realizados com crianças pré-escolares e cegas e os instrumentos/métodos/técnicas de avaliação foram variados, contemplando desde avaliações de níveis linguísticos específicos, até habilidades sociocomunicativas. Os objetivos dos estudos relacionaram-se à comparação entre o desenvolvimento da criança com deficiência visual e vidente.

Conclusão

a revisão trouxe contribuições para pensar a avaliação da linguagem de crianças com deficiência visual, como a utilização dos sentidos remanescentes; nenhum estudo apresentou instrumento para avaliação de níveis da linguagem em crianças escolares com deficiência visual.

Palavras-chave:
Transtornos da visão; Fonoaudiologia; Linguagem infantil; Linguagem; Testes de linguagem

ABSTRACT

Purpose

to review the national and international literature regarding instruments, methods and techniques for language assessment in visually impaired children.

Research strategy

searches in the VHL, PUBMED and SCOPUS databases using the descriptors vision disorders, child language, low vision, blindness, speech-language pathology and rehabilitation.

Selection criteria

articles published in national and international journals, in English, Spanish and Portuguese. Studies that were unavailable for reading, with a sample other than children, not addressing the subject, or that reported sensory impairments associated with visual impairments were excluded. Studies that dealt with intervention were also excluded, except for those that also addressed assessment. The references of the articles read in full were selected according to these criteria. The investigators evaluated the proposed assessment instruments/methods/techniques, as well as the objectives of the studies, their samples and main results.

Results

157 articles were retrieved, of which 6 were selected for full reading based on the exclusion criteria, and another 6 studies were obtained from their references, thus totaling 12 articles. Seven studies involved preschool and blind children, with various assessment instruments/methods/techniques, ranging from assessments of specific linguistic levels to socio-communicative skills. The objectives of the studies were related to the comparison between the development of children with and without visual impairment.

Conclusion

the review provided contributions to analyses of the language assessment of visually impaired children, such as the use of the remaining senses; no study had an instrument to assess language levels in schoolchildren with VI.

Keywords:
Vision disorders; Speech, language and hearing sciences; Child language; Language; Language tests

INTRODUÇÃO

De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), existem, em termos globais, cerca de 2,2 bilhões de pessoas com algum grau de deficiência visual (DV)(11 WHO: World Health Organization [Internet]. Genebra: WHO; 2022 [citado em 2022 Out 14]. Disponível em: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/blindness-and-visual-impairment#:~:text=The%20leading%20causes%20of%20vision,affect%20people%20of%20all%20ages
https://www.who.int/news-room/fact-sheet...
). Ainda segundo essa instituição, aproximadamente um bilhão desses casos têm sua origem em causas evitáveis ou curáveis, como glaucoma congênito, catarata congênita não operada, erros de refração não corrigidos, como miopia, hipermetropia e astigmatismo, dentre outros(11 WHO: World Health Organization [Internet]. Genebra: WHO; 2022 [citado em 2022 Out 14]. Disponível em: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/blindness-and-visual-impairment#:~:text=The%20leading%20causes%20of%20vision,affect%20people%20of%20all%20ages
https://www.who.int/news-room/fact-sheet...
,22 WHO: World Health Organization. World report on vision [Internet]. Genebra: WHO; 2019 [citado em 2020 Out 19]. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/world-report-on-vision
https://www.who.int/publications/i/item/...
).

A DV pode ser definida como a presença de alterações em uma ou mais funções visuais, devido à determinada doença ocular, de forma que varia, em um espectro, da baixa visão à cegueira(22 WHO: World Health Organization. World report on vision [Internet]. Genebra: WHO; 2019 [citado em 2020 Out 19]. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/world-report-on-vision
https://www.who.int/publications/i/item/...
). As funções visuais dizem respeito à qualidade com que a imagem chega ao globo ocular do indivíduo, sendo, dessa forma, muito caras à determinação das estratégias e condutas terapêuticas a serem tomadas pelos profissionais da equipe de habilitação e/ou reabilitação responsável pelo cuidado do sujeito com DV(33 Silva MRD. Avaliação terapêutica ocupacional para adolescentes e adultos com deficiência visual baseada na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) [dissertação]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas; 2016.).

Dentre elas, pode-se citar a acuidade visual, que é uma medida quantitativa da visão do indivíduo, relacionada à capacidade de enxergar os objetos de forma nítida; o campo visual, que se refere à medida, em graus, da área enxergada pelo sujeito, quando diante de um dado objeto no espaço; a visão de cores, relacionada à capacidade de identificar diferentes comprimentos de onda luminosa; a sensibilidade ao contraste, referente à identificação de diferença entre os padrões de brilho entre duas superfícies próximas, entre outras(33 Silva MRD. Avaliação terapêutica ocupacional para adolescentes e adultos com deficiência visual baseada na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) [dissertação]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas; 2016.,44 Domingues CA, Sá ED, Carvalho SHR, Arruda SMCP, Simão VS. Os alunos com deficiência visual: baixa visão e cegueira [Internet]. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará; 2010 [citado em 2020 Mai 2]. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=7105-fasciculo-3-pdf&Itemid=30192
http://portal.mec.gov.br/index.php?optio...
).

De acordo com a literatura da área da DV, as crianças com essa deficiência podem apresentar atrasos no desenvolvimento, os quais, se não abordados precocemente, comprometerão o processo de aquisição da linguagem. Alguns autores(55 Monteiro MMB, Montilha RCI. Intervenção fonoaudiológica e deficiência visual: percepções de profissionais de equipe interdisciplinar. Medicina. 2010;43(1):11-9. http://dx.doi.org/10.11606/issn.2176-7262.v43i1p11-19.
http://dx.doi.org/10.11606/issn.2176-726...

6 Cunha ACB, Enumo SRF. Desenvolvimento da criança com deficiência visual (dv) e interacção mãe-criança: algumas considerações. Psicol Saúde Doenças [Internet]. 2003 [citado em 2020 Jun 22];4(1):33-46. Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=36240103
http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=36...
-77 Kaodoinski F, Toniazzo FR. Deficiência visual, interação e desenvolvimento da linguagem. Scripta. 2017;21(41):185-203. http://dx.doi.org/10.5752/P.2358-3428.2017v21n41p185.
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) asseveram que crianças com DV, de 0 a 3 anos, têm, geralmente, menos oportunidades de interação com os pais, o que ocorre em razão do sentimento de luto que eles vivenciam pela perda do filho idealizado e da falta de conhecimento que têm a respeito da DV. Isso pode ocorrer, também, devido à falta de ações comunicativas por parte da criança, como o olhar para objetos e para o(s) cuidador(es) e a realização de gestos comunicativos, visto que, diante dessa situação, há uma diminuição nas respostas do interlocutor adulto por não receber feedback da criança frente aos seus intentos comunicativos(88 Tröster H, Brambring M. Early social-emotional development in blind infants. Child Care Health Dev. 1992;18(4):207-27. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1992.tb00355.x. PMid:1386004.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
,99 Rattray J, Zeedyk MS. Early communication in dyads with visual impairment. Infant Child Dev. 2005;14(3):287-309. http://dx.doi.org/10.1002/icd.397.
http://dx.doi.org/10.1002/icd.397...
).

Outro fator que contribui para a restrição nas interações é o déficit na realização de movimentos voluntários geralmente presente em crianças com DV, uma vez que se sabe que a visão é um dos sentidos que contribuem para a manutenção da postura corporal e do equilíbrio(1010 Silva PMVA. Deficiência visual e sistema estomatognático: uma relação de importância para a fonoaudiologia [tese]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas; 2018.), além de ser relacionada à exploração da criança do seu ambiente, já que, ao enxergar os objetos, executa movimentos para explorá-los, isto é, há uma integração entre o desenvolvimento visual e neuropsicomotor(88 Tröster H, Brambring M. Early social-emotional development in blind infants. Child Care Health Dev. 1992;18(4):207-27. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1992.tb00355.x. PMid:1386004.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
,1111 Gagliardo HGRG, Nobre MIRS. Intervenção precoce na criança com baixa visão. Rev Neurociênc. 2001;9(1):16-9. http://dx.doi.org/10.34024/rnc.2001.v9.8928.
http://dx.doi.org/10.34024/rnc.2001.v9.8...
). Dessa forma, a falta ou déficit visual influencia negativamente esses aspectos mencionados e a atividade exploratória ativa da criança fica limitada, o que exacerba a sua passividade e, consequentemente, acarreta alterações de linguagem, visto que, por causa disso, não serão bem estabelecidas as relações entre significado e significante, fundamentais ao processo de aquisição linguística(77 Kaodoinski F, Toniazzo FR. Deficiência visual, interação e desenvolvimento da linguagem. Scripta. 2017;21(41):185-203. http://dx.doi.org/10.5752/P.2358-3428.2017v21n41p185.
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).

Por esse motivo, os significados das palavras podem não ficar bem estabelecidos, principalmente para as crianças cegas, devido ao seu déficit visual mais acentuado, o que pode culminar no surgimento de questões como a ecolalia - falas repetitivas e sem sentido - e o verbalismo - utilização de termos cujo significado é conhecido apenas pela explicação de outrem e não por experiência própria, os quais, nem sempre, apresentam amparo na realidade(77 Kaodoinski F, Toniazzo FR. Deficiência visual, interação e desenvolvimento da linguagem. Scripta. 2017;21(41):185-203. http://dx.doi.org/10.5752/P.2358-3428.2017v21n41p185.
http://dx.doi.org/10.5752/P.2358-3428.20...
). Em razão dessas características, as crianças pré-escolares com DV podem ser diagnosticadas, erroneamente, com o transtorno do espectro autista (TEA), o que aponta para a importância de um diagnóstico diferencial entre as características decorrentes da DV e aquelas relacionadas ao autismo, a fim de intervir da melhor forma possível junto à criança e seus responsáveis(1212 Mosca R, Kritzinger A, Van der Linde J. Language and communication development in preschool children with visual impairment: a systematic review. S Afr J Commun Disord. 2015;62(1):e-1-10. http://dx.doi.org/10.4102/sajcd.v62i1.119. PMid:26809155.
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). Autores(1212 Mosca R, Kritzinger A, Van der Linde J. Language and communication development in preschool children with visual impairment: a systematic review. S Afr J Commun Disord. 2015;62(1):e-1-10. http://dx.doi.org/10.4102/sajcd.v62i1.119. PMid:26809155.
http://dx.doi.org/10.4102/sajcd.v62i1.11...
) afirmam que o estabelecimento desse diagnóstico diferencial é uma das principais dificuldades enfrentadas pelos profissionais da área da DV.

Observa-se, com base nesses fatos, que crianças com DV apresentam risco de atraso e/ou complicações no desenvolvimento da linguagem e, sendo assim, são fundamentais a orientação e intervenção precoces junto a esses sujeitos e seus responsáveis, a fim de que possam ser utilizadas estratégias alternativas e compatíveis às características visuais da criança, as quais lhe permitam interagir com o outro (adulto) e com o ambiente à sua volta, bem como estabelecer as relações significado-significante(77 Kaodoinski F, Toniazzo FR. Deficiência visual, interação e desenvolvimento da linguagem. Scripta. 2017;21(41):185-203. http://dx.doi.org/10.5752/P.2358-3428.2017v21n41p185.
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,99 Rattray J, Zeedyk MS. Early communication in dyads with visual impairment. Infant Child Dev. 2005;14(3):287-309. http://dx.doi.org/10.1002/icd.397.
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). Infere-se, portanto, que não é a deficiência, por si só, a responsável pelas questões de linguagem em crianças com DV, mas sim os padrões interativos estabelecidos entre elas e o(s) seu(s) pais ou cuidadores(99 Rattray J, Zeedyk MS. Early communication in dyads with visual impairment. Infant Child Dev. 2005;14(3):287-309. http://dx.doi.org/10.1002/icd.397.
http://dx.doi.org/10.1002/icd.397...
).

Por ser um profissional que trabalha, dentre outros aspectos, com as afecções relacionadas ao desenvolvimento da linguagem, de maneira abrangente, o fonoaudiólogo é o mais indicado para fornecer orientações aos pais/cuidadores sobre as melhores estratégias para estimular e interagir com a criança com DV e, se necessário, poderá realizar intervenções terapêuticas junto a ela, de forma que se apresenta como profissional complementar, porém, fundamental à equipe de habilitação(55 Monteiro MMB, Montilha RCI. Intervenção fonoaudiológica e deficiência visual: percepções de profissionais de equipe interdisciplinar. Medicina. 2010;43(1):11-9. http://dx.doi.org/10.11606/issn.2176-7262.v43i1p11-19.
http://dx.doi.org/10.11606/issn.2176-726...
,1313 Fernandes AC, Montilha RCI. The comprehensive evaluation in speech therapy for people with visual impairments: a case report. Rev CEFAC. 2015;17(4):1362-9. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517420314.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
,1414 Monteiro MMB, Montilha RCI, Gasparetto MERF. A atenção fonoaudiológica e a linguagem escrita de pessoas com baixa visão: estudo exploratório. Rev Bras Educ Espec. 2011;17(1):121-36. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382011000100009.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382011...
).

Para a sua atuação no contexto da habilitação e reabilitação de sujeitos com DV, o fonoaudiólogo deve, não apenas conhecer com profundidade os conceitos e especificidades próprios dessa área, mas também as características particulares, as limitações e as potencialidades da criança com relação à linguagem oral, bem como a família e o ambiente sociocultural onde ela está inserida, a fim de intervir da melhor forma possível, o que só pode ocorrer mediante uma avaliação fonoaudiológica abrangente.

Em vista desses pressupostos a respeito do desenvolvimento da linguagem em crianças com DV e da importância da avaliação, faz-se necessária a compreensão do modo como a avaliação fonoaudiológica em linguagem oral dessas crianças vem sendo retratado por estudos científicos nacionais e internacionais, a fim de que profissionais de saúde e pesquisadores tenham subsídios teóricos e metodológicos que norteiem suas práticas clínicas e/ou pesquisas científicas na área da DV e da fonoaudiologia. De antemão, acredita-se que haja poucos estudos na literatura a respeito dessa temática, visto que, tradicionalmente, a DV não se apresenta como uma das principais áreas de atuação do fonoaudiólogo.

OBJETIVO

Esse estudo teve por objetivo revisar a literatura nacional e internacional a respeito dos instrumentos, métodos e técnicas propostos(as) para a avaliação da linguagem oral de crianças com DV.

ESTRATÉGIA DE PESQUISA

Trata-se de um estudo de revisão integrativa da literatura. Nesse tipo de revisão, dados de estudos de diversas abordagens e delineamentos (qualitativos e quantitativos, experimentais e não experimentais, etc.) são descritos e analisados criticamente, para auxiliar na compreensão mais completa de um determinado fenômeno que se deseja investigar(1515 Souza MT, Silva MD, Carvalho R. Revisão integrativa: o que é e como fazer. Einstein. 2010;8(1):102-6. http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082010rw1134. PMid:26761761.
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).

Para a construção da revisão, foram seguidas as seis etapas propostas pela literatura(1515 Souza MT, Silva MD, Carvalho R. Revisão integrativa: o que é e como fazer. Einstein. 2010;8(1):102-6. http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082010rw1134. PMid:26761761.
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), a saber: elaboração da questão norteadora, buscas bibliográficas em bases de dados, coleta de dados dos estudos, análise crítica dos trabalhos incluídos na revisão, discussão dos resultados da revisão e apresentação final do trabalho/síntese do conhecimento.

Na primeira etapa, foi elaborada a seguinte pergunta norteadora: “Quais instrumentos/métodos/técnicas de avaliação da linguagem oral de crianças com DV têm sido propostos por estudos da literatura, e de que maneira propõem que seja realizada?”

Em seguida, na segunda etapa, foram realizadas buscas bibliográficas nas bases de dados eletrônicas BVS, PubMed e Scopus, utilizando-se, tanto os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) quanto os Medical Subject Headings terms (MeSh terms). Optou-se por essas três bases eletrônicas citadas devido ao fato de serem amplamente utilizadas na grande área da saúde com a qual se relaciona esta pesquisa de revisão. Os termos DeCS utilizados foram: transtornos da visão, baixa visão, cegueira, fonoaudiologia, linguagem infantil e reabilitação, nos idiomas inglês, espanhol e português. Já os MeSh terms foram vision disorders; vision, low; blindness; speech therapy e rehabilitation. Na base PubMed, foram utilizados os campos de busca title/abstract e MeSh terms; já na BVS e na Scopus, não foram selecionados campos de busca específicos.

A estratégia de busca consistiu em duas consultas realizadas em cada uma das bases de dados citadas, utilizando-se as mesmas combinações, de forma que apenas o vocabulário (MeSh ou DeCS) foi diferente entre as bases. Foram utilizadas as seguintes combinações:

  • Busca 1: ((vision disorders OR trastornos de la visión OR transtornos da visão)) OR ((vision, low OR baja visión OR baixa visão)) OR ((blindness OR ceguera OR cegueira)) AND ((speech, language and hearing sciences OR fonoaudiología OR fonoaudiologia)) AND ((rehabilitation OR rehabilitación OR reabilitação))

  • Busca 2: ((vision disorders OR trastornos de la visión OR transtornos da visão)) OR ((vision, low OR baja visión OR baixa visão)) OR ((blindness OR ceguera OR cegueira)) AND ((child language OR lenguaje infantil OR linguagem infantil))

Ressalta-se que os descritores cegueira e baixa visão foram utilizados em associação com transtornos da visão, através do booleano OR a fim de recuperar, também, trabalhos cuja amostra fosse composta apenas por crianças com baixa visão ou cegas. Não foi delimitado um período para o levantamento dos artigos, visando obter o maior número possível de estudos que fossem úteis ao objetivo da presente pesquisa e respondessem à pergunta norteadora, tendo em vista a hipótese prévia dos autores, estabelecida antes da definição da estratégia de pesquisa, de que haveria, na literatura, poucos estudos a respeito da temática abordada.

Também não foi utilizado o recurso de restrição dos resultados aos textos completos disponíveis ou aos free full texts, devido à possibilidade de o autor em ter acesso a alguns textos via biblioteca institucional, mesmo que esses textos não estivessem indicados nas bases eletrônicas como disponíveis para leitura.

CRITÉRIOS DE SELEÇÃO

Ainda na segunda etapa da revisão, conforme proposto pela literatura(1515 Souza MT, Silva MD, Carvalho R. Revisão integrativa: o que é e como fazer. Einstein. 2010;8(1):102-6. http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082010rw1134. PMid:26761761.
http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082010...
), foram definidos os seguintes critérios de inclusão e exclusão:

  • Critérios de inclusão: artigos publicados em periódicos científicos nacionais e internacionais nos idiomas inglês, espanhol e português.

  • Critérios de exclusão: artigos que não pertencessem ao assunto abordado e/ou não respondessem à pergunta norteadora da presente pesquisa de revisão, que mencionassem outras deficiências sensoriais associadas à DV, como a surdocegueira, ou cuja amostra fosse composta apenas por indivíduos de faixa etária maior de 12 anos (não crianças), ou ainda cujo texto integral não estivesse disponível. Foram também excluídos os estudos que versassem sobre a intervenção fonoaudiológica, exceto os que também abordassem a realização de avaliação.

Eliminadas as duplicações dos artigos obtidos com as estratégias de pesquisa, os trabalhos foram submetidos aos critérios de exclusão, a partir da leitura dos títulos e resumos, o que resultou em um conjunto de artigos que seriam utilizados para esta revisão. Após esse procedimento, foram selecionadas referências contidas nos artigos eleitos, a fim de ampliar ainda mais as possibilidades de discussão a respeito da temática aqui proposta, o que se trata de um procedimento previsto no método da revisão integrativa(1515 Souza MT, Silva MD, Carvalho R. Revisão integrativa: o que é e como fazer. Einstein. 2010;8(1):102-6. http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082010rw1134. PMid:26761761.
http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082010...
). Na seleção dessas referências, foram aplicados os mesmos critérios de inclusão e exclusão já descritos, de forma que, para tanto, foram lidos os títulos e resumos dos estudos.

A Figura 1 apresenta uma síntese das etapas de seleção seguidas na presente pesquisa, bem como a quantidade de artigos resultantes de cada uma delas.

Figura 1
Fluxograma que representa as etapas de seleção da amostra da revisão e as respectivas quantidades de artigos

ANÁLISE DOS DADOS

Para a coleta e análise de dados dos estudos selecionados na revisão - terceira etapa proposta na literatura(1515 Souza MT, Silva MD, Carvalho R. Revisão integrativa: o que é e como fazer. Einstein. 2010;8(1):102-6. http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082010rw1134. PMid:26761761.
http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082010...
) - foram considerados os objetivos dos estudos, os métodos, as técnicas e os instrumentos de avaliação de linguagem apresentados por cada um deles, as características das suas amostras quanto ao tamanho amostral, ao tipo da DV (cegueira e/ou baixa visão), ao gênero e à faixa etária, além dos principais resultados obtidos em cada um com a aplicação dos instrumentos/métodos/técnicas propostos. Esses dados foram extraídos e registrados e serão exibidos e discutidos criticamente a seguir, perfazendo as três etapas seguintes da revisão integrativa (análise crítica dos trabalhos incluídos na revisão, discussão dos seus resultados e apresentação final do trabalho/síntese do conhecimento)(1515 Souza MT, Silva MD, Carvalho R. Revisão integrativa: o que é e como fazer. Einstein. 2010;8(1):102-6. http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082010rw1134. PMid:26761761.
http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082010...
).

RESULTADOS

Com a aplicação das estratégias de busca, foram recuperados 157 artigos (Figura 1). Após eliminação das duplicações e aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, 6 artigos foram selecionados para leitura do conteúdo integral. Considerando as inclusões de referências, a amostra final desta pesquisa foi composta por 12 artigos. Ressalta-se que a base de dados que mais retornou artigos foi a BVS e que a PubMed não recuperou nenhum estudo que atendesse aos critérios de seleção desta revisão (Figura 1). Para descrever a amostra, o Quadro 1 apresenta a caracterização dos artigos selecionados segundo título, autor(es), ano de publicação e periódico nos quais foram publicados (volume, número e páginas).

Quadro 1
Caracterização geral dos artigos considerados para a revisão

Quanto à nacionalidade dos estudos, houve maior quantidade de pesquisas internacionais, sendo que 5 artigos(1616 Alpes MF, Valério NG, Santos CM, Mandrá PP. Intervenção fonoaudiológica na deficiência visual associada à paralisia cerebral: relato de um caso. Arch Health Sci. 2018;25(3):10-4. http://dx.doi.org/10.17696/2318-3691.25.3.2018.1043.
http://dx.doi.org/10.17696/2318-3691.25....

17 Lima AL, Nunes RTA. Perfil fonológico de crianças com baixa visão de 6 a 9 anos de idade em uma instituição para cegos na cidade de Salvador - BA. Rev CEFAC. 2015;17(5):1490-8. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517521114.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...

18 Silva MA, Batista CG. Mediação semiótica: estudo de caso de uma criança cega, com alterações no desenvolvimento. Psicol Reflex Crit. 2007;20(1):148-56. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-79722007000100019.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-79722007...

19 França-Freitas MLP, Gil MSCA. O desenvolvimento de crianças cegas e de crianças videntes. Rev Bras Educ Espec. 2012;18(3):507-26. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382012000300010.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382012...
-2020 Oliveira JP, Marques SL. Análise da comunicação verbal e não-verbal de crianças com deficiência visual durante interação com a mãe. Rev Bras Educ Espec. 2005;11(3):409-28. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005000300007.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005...
) pertenciam à literatura nacional e 7(2121 Tadić V, Pring L, Dale N. Story discourse and use of mental state language between mothers and school-aged children with and without visual impairment. Int J Lang Commun Disord. 2013;48(6):679-88. http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.12040. PMid:24165364.
http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.1204...

22 Kitzinger M. The role of repeated and echoed utterances in communication with a blind child. Br J Disord Commun. 1984;19(2):135-46. http://dx.doi.org/10.3109/13682828409007184. PMid:6477820.
http://dx.doi.org/10.3109/13682828409007...

23 McConachie HR, Moore V. Early expressive language of severely visually impaired children. Dev Med Child Neurol. 1994;36(3):230-40. http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-8749.1994.tb11836.x. PMid:8138072.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-8749.19...

24 Hughes M, Dote-Kwan J, Dolendo J. Characteristics of maternal directiveness and responsiveness with young children with visual impairments. Child Care Health Dev. 1999;25(4):285-98. http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.1999.00118.x. PMid:10399033.
http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.19...

25 Perez-Pereira M, Castro J. Pragmatic functions of blind and sighted children’s language: a twin case study. First Lang. 1992;12(34):17-37. http://dx.doi.org/10.1177/014272379201203402.
http://dx.doi.org/10.1177/01427237920120...

26 McConachie H. Early language development and severe visual impairment. Child Care Health Dev. 1990;16(1):55-61. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1990.tb00638.x. PMid:2311199.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
-2727 Tadić V, Pring L, Dale N. Are language and social communication intact in children with congenital Visual impairment at school age? J Child Psychol Psychiatry. 2010;51(6):696-705. PMid:20025621.) à internacional (Quadro 1).

Os periódicos em que foram publicados os estudos obtidos foram variados, de forma que 4 deles foram obtidos de revistas cujo escopo se relacionava à linguagem, em específico(1717 Lima AL, Nunes RTA. Perfil fonológico de crianças com baixa visão de 6 a 9 anos de idade em uma instituição para cegos na cidade de Salvador - BA. Rev CEFAC. 2015;17(5):1490-8. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517521114.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
,2121 Tadić V, Pring L, Dale N. Story discourse and use of mental state language between mothers and school-aged children with and without visual impairment. Int J Lang Commun Disord. 2013;48(6):679-88. http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.12040. PMid:24165364.
http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.1204...
,2222 Kitzinger M. The role of repeated and echoed utterances in communication with a blind child. Br J Disord Commun. 1984;19(2):135-46. http://dx.doi.org/10.3109/13682828409007184. PMid:6477820.
http://dx.doi.org/10.3109/13682828409007...
,2525 Perez-Pereira M, Castro J. Pragmatic functions of blind and sighted children’s language: a twin case study. First Lang. 1992;12(34):17-37. http://dx.doi.org/10.1177/014272379201203402.
http://dx.doi.org/10.1177/01427237920120...
), 5 à saúde e desenvolvimento infantil de forma geral(1616 Alpes MF, Valério NG, Santos CM, Mandrá PP. Intervenção fonoaudiológica na deficiência visual associada à paralisia cerebral: relato de um caso. Arch Health Sci. 2018;25(3):10-4. http://dx.doi.org/10.17696/2318-3691.25.3.2018.1043.
http://dx.doi.org/10.17696/2318-3691.25....
,2020 Oliveira JP, Marques SL. Análise da comunicação verbal e não-verbal de crianças com deficiência visual durante interação com a mãe. Rev Bras Educ Espec. 2005;11(3):409-28. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005000300007.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005...
,2323 McConachie HR, Moore V. Early expressive language of severely visually impaired children. Dev Med Child Neurol. 1994;36(3):230-40. http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-8749.1994.tb11836.x. PMid:8138072.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-8749.19...
,2424 Hughes M, Dote-Kwan J, Dolendo J. Characteristics of maternal directiveness and responsiveness with young children with visual impairments. Child Care Health Dev. 1999;25(4):285-98. http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.1999.00118.x. PMid:10399033.
http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.19...
,2626 McConachie H. Early language development and severe visual impairment. Child Care Health Dev. 1990;16(1):55-61. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1990.tb00638.x. PMid:2311199.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
) e 3 à cognição e saúde mental(1818 Silva MA, Batista CG. Mediação semiótica: estudo de caso de uma criança cega, com alterações no desenvolvimento. Psicol Reflex Crit. 2007;20(1):148-56. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-79722007000100019.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-79722007...
,1919 França-Freitas MLP, Gil MSCA. O desenvolvimento de crianças cegas e de crianças videntes. Rev Bras Educ Espec. 2012;18(3):507-26. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382012000300010.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382012...
,2727 Tadić V, Pring L, Dale N. Are language and social communication intact in children with congenital Visual impairment at school age? J Child Psychol Psychiatry. 2010;51(6):696-705. PMid:20025621.).

Com relação ao ano de publicação dos estudos, notou-se que 7 dos trabalhos foram publicados entre 2005 e 2018, demonstrando que há um interesse predominantemente recente pela temática aqui proposta, apesar da quantidade considerável de artigos anteriores a 2005, principalmente na literatura internacional.

No que diz respeito à autoria, quatro autores se destacaram nos achados deste estudo: Tadić V, Pring L, Dale N e McConachie HR, responsáveis, juntos, por, aproximadamente, 33% das pesquisas encontradas.

O Quadro 2 traz os objetivos, a amostra/participantes e suas características, os instrumentos/técnicas/métodos de avaliação utilizados em cada pesquisa e seus principais resultados.

Quadro 2
Descrição dos estudos segundo objetivos, amostra, instrumentos/técnicas/métodos de avaliação e principais resultados

DISCUSSÃO

O método da revisão integrativa proporcionou o contato com estudos de diferentes abordagens a respeito do tema proposto, o que contribui para seu conhecimento amplo. Em primeiro lugar, ressalta-se que, mesmo frente a um interesse recente pela temática (Quadro 1), foi encontrado um pequeno número de referências, o que reflete a sua incipiência na literatura da área da DV e aponta para a necessidade da realização de mais estudos que a ela se dediquem, a fim de que sejam gerados mais subsídios teóricos que orientem a prática clínica do fonoaudiólogo que atua, ou deseja atuar, em equipe de habilitação de crianças com DV.

No que tange aos objetivos dos estudos, observou-se que, apesar de serem diversos, quatro deles(1717 Lima AL, Nunes RTA. Perfil fonológico de crianças com baixa visão de 6 a 9 anos de idade em uma instituição para cegos na cidade de Salvador - BA. Rev CEFAC. 2015;17(5):1490-8. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517521114.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
,1919 França-Freitas MLP, Gil MSCA. O desenvolvimento de crianças cegas e de crianças videntes. Rev Bras Educ Espec. 2012;18(3):507-26. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382012000300010.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382012...
,2020 Oliveira JP, Marques SL. Análise da comunicação verbal e não-verbal de crianças com deficiência visual durante interação com a mãe. Rev Bras Educ Espec. 2005;11(3):409-28. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005000300007.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005...
,2525 Perez-Pereira M, Castro J. Pragmatic functions of blind and sighted children’s language: a twin case study. First Lang. 1992;12(34):17-37. http://dx.doi.org/10.1177/014272379201203402.
http://dx.doi.org/10.1177/01427237920120...
) apresentam-se em torno da comparação entre o desenvolvimento da linguagem de crianças com DV e videntes (Quadro 2). Ao adotarem tais objetivos, esses trabalhos partem do parâmetro fornecido pelo “desenvolvimento típico” para verificar os efeitos da deficiência e se eles existem. Entretanto, o papel dessas comparações para a prática clínica, apesar de útil, nem sempre é relevante, uma vez que as divergências encontradas com relação ao “desenvolvimento típico” podem representar processos específicos da aquisição da linguagem desse sujeito, e não necessariamente um “atraso” ou “comprometimento” do desenvolvimento linguístico.

Por exemplo, um desses estudos(2020 Oliveira JP, Marques SL. Análise da comunicação verbal e não-verbal de crianças com deficiência visual durante interação com a mãe. Rev Bras Educ Espec. 2005;11(3):409-28. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005000300007.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005...
) relata, em seus resultados, que houve poucas produções gestuais das crianças com DV, tanto em contexto de interação livre, quanto planejada, ao serem comparadas às videntes (Quadro 2), fato que pode ser atribuído à própria falta ou déficit visual e, por isso, constituir uma característica das crianças com DV. Apesar de, em alguns casos, como o descrito no referido estudo(2020 Oliveira JP, Marques SL. Análise da comunicação verbal e não-verbal de crianças com deficiência visual durante interação com a mãe. Rev Bras Educ Espec. 2005;11(3):409-28. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005000300007.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005...
), essas diferenças parecerem óbvias, elas exigem do profissional um olhar acurado para estabelecer o limite entre a normalidade e a patologia.

Quanto à amostra dos estudos revisados, um número considerável dos artigos(1818 Silva MA, Batista CG. Mediação semiótica: estudo de caso de uma criança cega, com alterações no desenvolvimento. Psicol Reflex Crit. 2007;20(1):148-56. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-79722007000100019.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-79722007...

19 França-Freitas MLP, Gil MSCA. O desenvolvimento de crianças cegas e de crianças videntes. Rev Bras Educ Espec. 2012;18(3):507-26. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382012000300010.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382012...
-2020 Oliveira JP, Marques SL. Análise da comunicação verbal e não-verbal de crianças com deficiência visual durante interação com a mãe. Rev Bras Educ Espec. 2005;11(3):409-28. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005000300007.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005...
,2222 Kitzinger M. The role of repeated and echoed utterances in communication with a blind child. Br J Disord Commun. 1984;19(2):135-46. http://dx.doi.org/10.3109/13682828409007184. PMid:6477820.
http://dx.doi.org/10.3109/13682828409007...

23 McConachie HR, Moore V. Early expressive language of severely visually impaired children. Dev Med Child Neurol. 1994;36(3):230-40. http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-8749.1994.tb11836.x. PMid:8138072.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-8749.19...

24 Hughes M, Dote-Kwan J, Dolendo J. Characteristics of maternal directiveness and responsiveness with young children with visual impairments. Child Care Health Dev. 1999;25(4):285-98. http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.1999.00118.x. PMid:10399033.
http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.19...
-2525 Perez-Pereira M, Castro J. Pragmatic functions of blind and sighted children’s language: a twin case study. First Lang. 1992;12(34):17-37. http://dx.doi.org/10.1177/014272379201203402.
http://dx.doi.org/10.1177/01427237920120...
) traz resultados de pesquisas realizadas com um “n” reduzido (menos de dez participantes), composto por crianças pré-escolares (com menos de 6 anos), das quais, pelo menos uma apresenta diagnóstico oftalmológico de cegueira (Quadro 2). Quanto ao tamanho amostral restrito, pode ser justificado pelos objetivos desses estudos, que não apontam para a necessidade de generalizar um determinado resultado ou realizar estimativas populacionais.

A opção pela faixa etária pré-escolar, observada em grande parte dos artigos revisados, ratifica o argumento consenso na literatura especializada em desenvolvimento infantil, segundo o qual é nesse período que ocorrem as aquisições e os marcos mais caros ao desenvolvimento do indivíduo, dentre eles, os relacionados à linguagem oral, como o balbucio, as primeiras palavras, as noções de turnos dialógicos, etc.(2828 Alves PV, Sousa GAFD, Gagliardo HGRG. Habilidades funcionais na criança com cegueira congênita: um estudo de caso. Rev Ter Ocup Univ São Paulo. 2014;25(3):249-54. http://dx.doi.org/10.11606/issn.2238-6149.v25i3p249-254.
http://dx.doi.org/10.11606/issn.2238-614...
). Nessa faixa etária, o déficit visual total pode proporcionar à criança um atraso importante no desenvolvimento global, caso não haja estimulação precoce adequada(66 Cunha ACB, Enumo SRF. Desenvolvimento da criança com deficiência visual (dv) e interacção mãe-criança: algumas considerações. Psicol Saúde Doenças [Internet]. 2003 [citado em 2020 Jun 22];4(1):33-46. Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=36240103
http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=36...
,77 Kaodoinski F, Toniazzo FR. Deficiência visual, interação e desenvolvimento da linguagem. Scripta. 2017;21(41):185-203. http://dx.doi.org/10.5752/P.2358-3428.2017v21n41p185.
http://dx.doi.org/10.5752/P.2358-3428.20...
). Esse fato justifica o interesse pela cegueira demonstrado por grande parte dos estudos aqui revisados, na medida em que se propõem a investigar a forma com que ocorre a referida estimulação para o desenvolvimento de diferentes aspectos da linguagem desses indivíduos.

A estimulação/intervenção precoce junto à criança cega, seja por meio da terapia com ela própria, ou por orientações da equipe interdisciplinar à família, a fim de que ela possa estimular as habilidades dessa criança, se faz extremamente necessária visando evitar complicações futuras no desenvolvimento(1313 Fernandes AC, Montilha RCI. The comprehensive evaluation in speech therapy for people with visual impairments: a case report. Rev CEFAC. 2015;17(4):1362-9. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517420314.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
,2828 Alves PV, Sousa GAFD, Gagliardo HGRG. Habilidades funcionais na criança com cegueira congênita: um estudo de caso. Rev Ter Ocup Univ São Paulo. 2014;25(3):249-54. http://dx.doi.org/10.11606/issn.2238-6149.v25i3p249-254.
http://dx.doi.org/10.11606/issn.2238-614...
). Concordando com essa argumentação, um dos estudos encontrados nesta revisão(1919 França-Freitas MLP, Gil MSCA. O desenvolvimento de crianças cegas e de crianças videntes. Rev Bras Educ Espec. 2012;18(3):507-26. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382012000300010.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382012...
) relata que a criança cega que não recebeu estimulação precoce sistemática e especializada apresentou resultados piores na aplicação do instrumento de avaliação da linguagem proposto, tanto com relação à outra criança cega que foi estimulada constante e sistematicamente, quanto a um indivíduo vidente da mesma faixa etária e série escolar que ela (Quadro 2).

Outra justificativa possível para a preferência por estudar a cegueira nos artigos aqui revisados é o modo particular pelo qual a criança cega adquire e desenvolve a linguagem. Autores(66 Cunha ACB, Enumo SRF. Desenvolvimento da criança com deficiência visual (dv) e interacção mãe-criança: algumas considerações. Psicol Saúde Doenças [Internet]. 2003 [citado em 2020 Jun 22];4(1):33-46. Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=36240103
http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=36...
,77 Kaodoinski F, Toniazzo FR. Deficiência visual, interação e desenvolvimento da linguagem. Scripta. 2017;21(41):185-203. http://dx.doi.org/10.5752/P.2358-3428.2017v21n41p185.
http://dx.doi.org/10.5752/P.2358-3428.20...
) argumentam que isso ocorre porque a ausência da visão obriga o indivíduo a utilizar os sentidos remanescentes e, dessa forma, os conceitos, os signos e as relações complexas existentes entre eles lhe são apresentados de uma forma outra que não aquela que geralmente ocorre com crianças videntes ou com baixa visão. Soma-se a esse processo de aquisição de conceitos a mediação do outro (adulto vidente) para que, por meio de estímulos aos sentidos remanescentes e do uso da própria linguagem, a criança cega seja introduzida na cultura do ambiente social no qual está imersa(66 Cunha ACB, Enumo SRF. Desenvolvimento da criança com deficiência visual (dv) e interacção mãe-criança: algumas considerações. Psicol Saúde Doenças [Internet]. 2003 [citado em 2020 Jun 22];4(1):33-46. Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=36240103
http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=36...
).

Três estudos recuperados nesta revisão destacaram a importância do adulto vidente(2020 Oliveira JP, Marques SL. Análise da comunicação verbal e não-verbal de crianças com deficiência visual durante interação com a mãe. Rev Bras Educ Espec. 2005;11(3):409-28. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005000300007.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005...
,2121 Tadić V, Pring L, Dale N. Story discourse and use of mental state language between mothers and school-aged children with and without visual impairment. Int J Lang Commun Disord. 2013;48(6):679-88. http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.12040. PMid:24165364.
http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.1204...
,2424 Hughes M, Dote-Kwan J, Dolendo J. Characteristics of maternal directiveness and responsiveness with young children with visual impairments. Child Care Health Dev. 1999;25(4):285-98. http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.1999.00118.x. PMid:10399033.
http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.19...
), de forma que encontraram resultados satisfatórios na avaliação da linguagem quando a interação da mãe junto à criança foi efetiva, no sentido de realizar comentários e descrições a respeito do “estado mental” de outras pessoas, isto é, seus pensamentos e sentimentos, o que auxilia na compreensão da noção de “eu e outro” e no desenvolvimento de habilidades pragmáticas(2121 Tadić V, Pring L, Dale N. Story discourse and use of mental state language between mothers and school-aged children with and without visual impairment. Int J Lang Commun Disord. 2013;48(6):679-88. http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.12040. PMid:24165364.
http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.1204...
); a evitar controlar excessivamente as ações da criança a partir da utilização de muitas sentenças diretivas, já que essa ação se correlacionou negativamente ao desenvolvimento de habilidades sociocomunicativas(2424 Hughes M, Dote-Kwan J, Dolendo J. Characteristics of maternal directiveness and responsiveness with young children with visual impairments. Child Care Health Dev. 1999;25(4):285-98. http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.1999.00118.x. PMid:10399033.
http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.19...
) e a valorizar o diálogo e a descrição de objetos e ações a partir da linguagem oral(2020 Oliveira JP, Marques SL. Análise da comunicação verbal e não-verbal de crianças com deficiência visual durante interação com a mãe. Rev Bras Educ Espec. 2005;11(3):409-28. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005000300007.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005...
) (Quadro 2).

Quanto aos instrumentos/técnicas/métodos de avaliação da linguagem utilizados nos estudos, observou-se que se mostraram bastante diversos, de modo que foram relatados desde protocolos para a avaliação de um único nível específico da linguagem(1717 Lima AL, Nunes RTA. Perfil fonológico de crianças com baixa visão de 6 a 9 anos de idade em uma instituição para cegos na cidade de Salvador - BA. Rev CEFAC. 2015;17(5):1490-8. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517521114.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
), até a observação das manifestações linguísticas da criança em contexto livre de interação com o outro (adulto) à luz de um determinado referencial teórico e/ou mediante a utilização de questionários aplicados com os pais/responsáveis(1818 Silva MA, Batista CG. Mediação semiótica: estudo de caso de uma criança cega, com alterações no desenvolvimento. Psicol Reflex Crit. 2007;20(1):148-56. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-79722007000100019.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-79722007...
,2222 Kitzinger M. The role of repeated and echoed utterances in communication with a blind child. Br J Disord Commun. 1984;19(2):135-46. http://dx.doi.org/10.3109/13682828409007184. PMid:6477820.
http://dx.doi.org/10.3109/13682828409007...
,2525 Perez-Pereira M, Castro J. Pragmatic functions of blind and sighted children’s language: a twin case study. First Lang. 1992;12(34):17-37. http://dx.doi.org/10.1177/014272379201203402.
http://dx.doi.org/10.1177/01427237920120...
,2727 Tadić V, Pring L, Dale N. Are language and social communication intact in children with congenital Visual impairment at school age? J Child Psychol Psychiatry. 2010;51(6):696-705. PMid:20025621.). Isso demonstra que não há um consenso quanto às formas de avaliar aspectos da linguagem oral de crianças com DV. Também não se pode negar que a opção por um ou outro instrumento/método/técnica se deu de acordo com os objetivos de cada um dos trabalhos e com o(s) nível(is) da linguagem enfocados por eles, bem como as diferentes concepções de linguagem assumidas.

Contudo, apesar dessa variabilidade, verificou-se que seis dos trabalhos dos que citam algum protocolo de avaliação padronizado(1919 França-Freitas MLP, Gil MSCA. O desenvolvimento de crianças cegas e de crianças videntes. Rev Bras Educ Espec. 2012;18(3):507-26. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382012000300010.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382012...

20 Oliveira JP, Marques SL. Análise da comunicação verbal e não-verbal de crianças com deficiência visual durante interação com a mãe. Rev Bras Educ Espec. 2005;11(3):409-28. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005000300007.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005...
-2121 Tadić V, Pring L, Dale N. Story discourse and use of mental state language between mothers and school-aged children with and without visual impairment. Int J Lang Commun Disord. 2013;48(6):679-88. http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.12040. PMid:24165364.
http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.1204...
,2323 McConachie HR, Moore V. Early expressive language of severely visually impaired children. Dev Med Child Neurol. 1994;36(3):230-40. http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-8749.1994.tb11836.x. PMid:8138072.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-8749.19...
,2424 Hughes M, Dote-Kwan J, Dolendo J. Characteristics of maternal directiveness and responsiveness with young children with visual impairments. Child Care Health Dev. 1999;25(4):285-98. http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.1999.00118.x. PMid:10399033.
http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.19...
,2727 Tadić V, Pring L, Dale N. Are language and social communication intact in children with congenital Visual impairment at school age? J Child Psychol Psychiatry. 2010;51(6):696-705. PMid:20025621.) utilizaram-se de instrumentos de avaliação indiretos(2929 Guimarães CF, Oda AL. Instrumentos de avaliação de linguagem infantil: aplicabilidade em deficientes. Rev CEFAC. 2013;15(6):1690-702. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462013000600033.
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462013...
), ou seja, questionários, roteiros de entrevistas, inventários, checklists, escalas de desenvolvimento etc. (Quadro 2). Esses instrumentos têm a vantagem de poderem ser aplicados sem a necessidade de que a criança faça alguma tarefa específica, já que são baseados em observações da interação mãe/cuidador-criança, no comportamento da criança na interação com o terapeuta, ou em questões direcionadas aos pais a respeito do comportamento do filho no contexto domiciliar.

A respeito desse último modo de se obter dados do desenvolvimento da linguagem da criança, qual seja, por meio de respostas dos pais/responsáveis a questionários padronizados, dois estudos(2121 Tadić V, Pring L, Dale N. Story discourse and use of mental state language between mothers and school-aged children with and without visual impairment. Int J Lang Commun Disord. 2013;48(6):679-88. http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.12040. PMid:24165364.
http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.1204...
,2727 Tadić V, Pring L, Dale N. Are language and social communication intact in children with congenital Visual impairment at school age? J Child Psychol Psychiatry. 2010;51(6):696-705. PMid:20025621.) lançaram mão dessa técnica, utilizando-se do Children's Communication Checklist-2 (CCC-2) e do Social Communication Questionnaire (SCQ) - questionários que se prezam a avaliação de aspectos comunicativos e de interação social das crianças e adolescentes, sendo geralmente utilizados na triagem de pacientes com TEA.

Porém, apesar de úteis à avaliação da linguagem de crianças com DV por não dependerem da realização de tarefas visuais e de terem grande chance de refletir a realidade, as respostas dos pais/responsáveis aos referidos questionários podem ser subestimadas ou superestimadas, tendo em vista que eles não têm conhecimentos específicos sobre as peculiaridades do desenvolvimento da linguagem da criança com DV, conforme relatado na discussão dos resultados de um dos estudos revisados(2727 Tadić V, Pring L, Dale N. Are language and social communication intact in children with congenital Visual impairment at school age? J Child Psychol Psychiatry. 2010;51(6):696-705. PMid:20025621.), o que exige cautela na generalização dos achados desses dois estudos citados(2121 Tadić V, Pring L, Dale N. Story discourse and use of mental state language between mothers and school-aged children with and without visual impairment. Int J Lang Commun Disord. 2013;48(6):679-88. http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.12040. PMid:24165364.
http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.1204...
,2727 Tadić V, Pring L, Dale N. Are language and social communication intact in children with congenital Visual impairment at school age? J Child Psychol Psychiatry. 2010;51(6):696-705. PMid:20025621.). Sendo assim, além da aplicação de questionários aos pais/responsáveis, para que haja maior confiabilidade nos resultados da avaliação, sugere-se que seja realizada, pelo terapeuta, a observação de uma situação de interação entre o responsável e a criança, mesmo no ambiente do consultório, a fim de observar aspectos talvez não contemplados por eles.

Já na aplicação de instrumentos diretos, tendo em vista que exigem o cumprimento de determinadas tarefas, deve-se levar em consideração as características e as capacidades de cada indivíduo, sob o risco de o profissional não lograr êxito na coleta dos dados por incapacidade do avaliado de realizar a tarefa solicitada pelo teste, o que não se aplica ao pensar em instrumentos indiretos. Dessa forma, quando se trata da DV, as opções de instrumentos de avaliação da linguagem diretos que podem ser aplicados junto a essa população são mais restritas, devido às habilidades visuais exigidas por grande parte deles(2929 Guimarães CF, Oda AL. Instrumentos de avaliação de linguagem infantil: aplicabilidade em deficientes. Rev CEFAC. 2013;15(6):1690-702. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462013000600033.
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462013...
).

Tanto esse fato procede, que apenas três estudos encontrados na presente revisão(1616 Alpes MF, Valério NG, Santos CM, Mandrá PP. Intervenção fonoaudiológica na deficiência visual associada à paralisia cerebral: relato de um caso. Arch Health Sci. 2018;25(3):10-4. http://dx.doi.org/10.17696/2318-3691.25.3.2018.1043.
http://dx.doi.org/10.17696/2318-3691.25....
,1717 Lima AL, Nunes RTA. Perfil fonológico de crianças com baixa visão de 6 a 9 anos de idade em uma instituição para cegos na cidade de Salvador - BA. Rev CEFAC. 2015;17(5):1490-8. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517521114.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
,2727 Tadić V, Pring L, Dale N. Are language and social communication intact in children with congenital Visual impairment at school age? J Child Psychol Psychiatry. 2010;51(6):696-705. PMid:20025621.) se utilizaram de instrumentos diretos de avaliação da linguagem, os quais foram adaptados e não são validados para aplicação junto a crianças com DV. Nessa adaptação, porém, os autores de uma das pesquisas(1717 Lima AL, Nunes RTA. Perfil fonológico de crianças com baixa visão de 6 a 9 anos de idade em uma instituição para cegos na cidade de Salvador - BA. Rev CEFAC. 2015;17(5):1490-8. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517521114.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
) deixaram de considerar questões cruciais à atenção às pessoas com DV, principalmente baixa visão (foco do referido estudo), quais sejam: a acuidade visual de cada criança avaliada, as características das demais funções visuais, bem como o controle da iluminação do ambiente, que não é mencionado no texto, e encontraram alterações fonológicas em grande parte das crianças avaliadas (Quadro 2).

Sabe-se, claro, que alterações fonológicas podem estar presentes em crianças de 6 a 9 anos com baixa visão, porém, as referidas inadequações limitam a validade desse instrumento para a prática clínica fonoaudiológica junto a essa população. Necessário destacar, no entanto, que o trabalho citado(1717 Lima AL, Nunes RTA. Perfil fonológico de crianças com baixa visão de 6 a 9 anos de idade em uma instituição para cegos na cidade de Salvador - BA. Rev CEFAC. 2015;17(5):1490-8. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517521114.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
) foi o único recuperado nesta revisão que apresentou uma reflexão sobre quais os aspectos do déficit visual que podem culminar em um “atraso no desenvolvimento fonológico”.

Já as adaptações propostas em outro trabalho(1616 Alpes MF, Valério NG, Santos CM, Mandrá PP. Intervenção fonoaudiológica na deficiência visual associada à paralisia cerebral: relato de um caso. Arch Health Sci. 2018;25(3):10-4. http://dx.doi.org/10.17696/2318-3691.25.3.2018.1043.
http://dx.doi.org/10.17696/2318-3691.25....
), que utilizou instrumentos diretos, foram realizadas de modo a favorecer tanto o resíduo visual, quanto os sentidos remanescentes, por meio do uso de brinquedos com sons, objetos reais do cotidiano da criança, como alimentos (frutas, leite e pão), além da apresentação dos objetos no seu campo visual, o que proporcionou maior fidedignidade aos resultados obtidos, tendo em vista que as tarefas propostas e o material utilizado foram adequados às características visuais da criança.

Em outro estudo, que se utilizou de um instrumento direto de avaliação da linguagem(2727 Tadić V, Pring L, Dale N. Are language and social communication intact in children with congenital Visual impairment at school age? J Child Psychol Psychiatry. 2010;51(6):696-705. PMid:20025621.), foi proposta uma adaptação do Clinical Evaluation of Language Fundamentals-3 (CELF-3) (Quadro 2), instrumento que avalia aspectos formais da linguagem expressiva, como vocabulário, fonologia, sintaxe, etc. e a linguagem compreensiva. Para a sua aplicação junto às crianças com DV do estudo, foram eliminados itens que dependessem da visão, o que, segundo os próprios autores(2727 Tadić V, Pring L, Dale N. Are language and social communication intact in children with congenital Visual impairment at school age? J Child Psychol Psychiatry. 2010;51(6):696-705. PMid:20025621.), pode ter comprometido os achados da pesquisa, visto que as crianças com DV não completaram a avaliação proposta pelo instrumento e não há estudos anteriores que confirmem sua confiabilidade para fins clínicos, na ausência de algum de seus itens, fato esse que não permite afirmar, com certeza, que crianças escolares com DV congênita apresentam melhor desempenho em habilidades formais da linguagem que seus pares videntes (Quadro 2).

Interessante observar que, entre esses três estudos, dois(1717 Lima AL, Nunes RTA. Perfil fonológico de crianças com baixa visão de 6 a 9 anos de idade em uma instituição para cegos na cidade de Salvador - BA. Rev CEFAC. 2015;17(5):1490-8. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517521114.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
,2727 Tadić V, Pring L, Dale N. Are language and social communication intact in children with congenital Visual impairment at school age? J Child Psychol Psychiatry. 2010;51(6):696-705. PMid:20025621.) tiveram como amostra crianças em idade escolar, o que permite afirmar que não foram encontrados instrumentos diretos validados para crianças com DV nessa faixa etária, o que, sem dúvida, representa uma lacuna a ser preenchida na literatura científica, tanto da área da DV, quanto da fonoaudiologia e áreas afins.

A despeito da divisão proposta pela literatura(2929 Guimarães CF, Oda AL. Instrumentos de avaliação de linguagem infantil: aplicabilidade em deficientes. Rev CEFAC. 2013;15(6):1690-702. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462013000600033.
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462013...
) entre instrumentos de avaliação diretos e indiretos, três estudos(2323 McConachie HR, Moore V. Early expressive language of severely visually impaired children. Dev Med Child Neurol. 1994;36(3):230-40. http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-8749.1994.tb11836.x. PMid:8138072.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-8749.19...
,2424 Hughes M, Dote-Kwan J, Dolendo J. Characteristics of maternal directiveness and responsiveness with young children with visual impairments. Child Care Health Dev. 1999;25(4):285-98. http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.1999.00118.x. PMid:10399033.
http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.19...
,2626 McConachie H. Early language development and severe visual impairment. Child Care Health Dev. 1990;16(1):55-61. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1990.tb00638.x. PMid:2311199.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
) se utilizaram de um mesmo instrumento, o qual não se adéqua a essa classificação, já que apresenta tanto questões dirigidas aos pais e itens para observação no comportamento da criança, quanto tarefas a serem realizadas por ela, de maneira que o modo de aplicação dependerá diretamente das habilidades esperadas para cada faixa etária estabelecida pelo instrumento e da forma que propõe para avaliá-la(3030 Reynell J, Zinkin P. New procedures for the developmental assessment of young children with severe visual handicaps. Child Care Health Dev. 1975;1(1):61-9. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1975.tb00203.x.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
). Trata-se da Reynell-Zinkin Developmental Scale for Young Visually Handicapped Children (Quadro 2), que foi validada e planejada para crianças com DV, tendo sido proposta em 1975 por Reynell & Zinkin(3030 Reynell J, Zinkin P. New procedures for the developmental assessment of young children with severe visual handicaps. Child Care Health Dev. 1975;1(1):61-9. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1975.tb00203.x.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
). É composta por duas partes: a) desenvolvimento motor e b) desenvolvimento mental. A parte b foi utilizada por ambos os estudos encontrados nesta revisão, que citam a escala(2323 McConachie HR, Moore V. Early expressive language of severely visually impaired children. Dev Med Child Neurol. 1994;36(3):230-40. http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-8749.1994.tb11836.x. PMid:8138072.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-8749.19...
,2424 Hughes M, Dote-Kwan J, Dolendo J. Characteristics of maternal directiveness and responsiveness with young children with visual impairments. Child Care Health Dev. 1999;25(4):285-98. http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.1999.00118.x. PMid:10399033.
http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.19...
,2626 McConachie H. Early language development and severe visual impairment. Child Care Health Dev. 1990;16(1):55-61. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1990.tb00638.x. PMid:2311199.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
).

Quanto às áreas avaliadas no desenvolvimento mental (parte b da escala), em sua última edição publicada em forma de manual por seus autores(3131 Reynell J. Developmental patterns of visually handicapped children. Child Care Health Dev. 1978;4(5):291-303. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1978.tb00088.x. PMid:719853.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
), o instrumento aborda seis itens do desenvolvimento infantil: adaptação social, compreensão sensoriomotora, exploração do ambiente, compreensão verbal e respostas aos sons e linguagem expressiva (estrutura, vocabulário e conteúdo)(2424 Hughes M, Dote-Kwan J, Dolendo J. Characteristics of maternal directiveness and responsiveness with young children with visual impairments. Child Care Health Dev. 1999;25(4):285-98. http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.1999.00118.x. PMid:10399033.
http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.19...
,3131 Reynell J. Developmental patterns of visually handicapped children. Child Care Health Dev. 1978;4(5):291-303. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1978.tb00088.x. PMid:719853.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
,3232 Vervloed MPJ, Hamers JHM, Van Mens-Weisz MM, Timmer-Van de Vosse H. New age levels of the Reynell-Zinkin developmental scales for young children with visual impairments. J Vis Impair Blind. 2000;94(10):613-24. http://dx.doi.org/10.1177/0145482X0009401002.
http://dx.doi.org/10.1177/0145482X000940...
). Contudo, autores(3232 Vervloed MPJ, Hamers JHM, Van Mens-Weisz MM, Timmer-Van de Vosse H. New age levels of the Reynell-Zinkin developmental scales for young children with visual impairments. J Vis Impair Blind. 2000;94(10):613-24. http://dx.doi.org/10.1177/0145482X0009401002.
http://dx.doi.org/10.1177/0145482X000940...
) apontam para o fato de que a escala Reynell-Zinkin apresenta algumas limitações, como poucas orientações para administração e interpretação dos itens e existência de intervalos etários muito amplos entre si, de modo que a pontuação em um item/tarefa a mais ou a menos provoca um aumento (ou diminuição) de três meses na idade do desenvolvimento específico avaliado por determinada subescala; além disso, há que se considerar também o fato de datar de meados da década de 1970.

Além disso, seus escores brutos não são padronizados e válidos por si só e, por essa razão, foram confrontados, em dois dos estudos que a utilizaram(2323 McConachie HR, Moore V. Early expressive language of severely visually impaired children. Dev Med Child Neurol. 1994;36(3):230-40. http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-8749.1994.tb11836.x. PMid:8138072.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-8749.19...
,2424 Hughes M, Dote-Kwan J, Dolendo J. Characteristics of maternal directiveness and responsiveness with young children with visual impairments. Child Care Health Dev. 1999;25(4):285-98. http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.1999.00118.x. PMid:10399033.
http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.19...
), com os escores de idade mental fornecidos por outra escala, a Social Maturity Scale for blind Preschool Children. As idades fornecidas pelo segundo instrumento foram utilizadas em detrimento das idades cronológicas, o que favoreceu maior confiabilidade aos resultados da escala Reynell-Zinkin(2424 Hughes M, Dote-Kwan J, Dolendo J. Characteristics of maternal directiveness and responsiveness with young children with visual impairments. Child Care Health Dev. 1999;25(4):285-98. http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.1999.00118.x. PMid:10399033.
http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2214.19...
). Aliás, os próprios autores da escala(3131 Reynell J. Developmental patterns of visually handicapped children. Child Care Health Dev. 1978;4(5):291-303. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1978.tb00088.x. PMid:719853.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
) utilizaram-na também mediante comparação dos escores obtidos com a Social Maturity Scale for blind Preschool Children, o que demonstra sua limitação em termos psicométricos.

Necessário destacar, porém, que o outro estudo que se utilizou da escala Reynell-Zinkin Developmental Scale for Young Visually Handicapped Children (2626 McConachie H. Early language development and severe visual impairment. Child Care Health Dev. 1990;16(1):55-61. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1990.tb00638.x. PMid:2311199.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
) não menciona a Social Maturity Scale for blind Preschool Children como forma de obtenção das idades mentais dos participantes da pesquisa. É possível supor que, por se tratar de um estudo retrospectivo baseado em dados de prontuários (Quadro 2), os resultados da Reynell-Zinkin Developmental Scale for Young Visually Handicapped Children já estivessem de acordo com a escala de idade mental preconizada pelos autores do instrumento, não tendo sido citada por ser utilizada apenas para adequação dos escores obtidos(3131 Reynell J. Developmental patterns of visually handicapped children. Child Care Health Dev. 1978;4(5):291-303. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1978.tb00088.x. PMid:719853.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
,3232 Vervloed MPJ, Hamers JHM, Van Mens-Weisz MM, Timmer-Van de Vosse H. New age levels of the Reynell-Zinkin developmental scales for young children with visual impairments. J Vis Impair Blind. 2000;94(10):613-24. http://dx.doi.org/10.1177/0145482X0009401002.
http://dx.doi.org/10.1177/0145482X000940...
).

Apesar dessas limitações, a referida escala, por ter sido especialmente planejada para crianças pré-escolares com DV, traz estratégias interessantes para a avaliação da linguagem oral dessa população, como o uso de objetos concretos e mais próximos ao cotidiano da criança, que terá mais chance de reconhecê-los em um teste de vocabulário, por exemplo(3030 Reynell J, Zinkin P. New procedures for the developmental assessment of young children with severe visual handicaps. Child Care Health Dev. 1975;1(1):61-9. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1975.tb00203.x.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
,3131 Reynell J. Developmental patterns of visually handicapped children. Child Care Health Dev. 1978;4(5):291-303. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.1978.tb00088.x. PMid:719853.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2214.19...
).

Também foi proposto pela literatura(2121 Tadić V, Pring L, Dale N. Story discourse and use of mental state language between mothers and school-aged children with and without visual impairment. Int J Lang Commun Disord. 2013;48(6):679-88. http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.12040. PMid:24165364.
http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.1204...
,2727 Tadić V, Pring L, Dale N. Are language and social communication intact in children with congenital Visual impairment at school age? J Child Psychol Psychiatry. 2010;51(6):696-705. PMid:20025621.) um protocolo específico da psicologia, qual seja, a Wechsler Intelligence Scales for Children-III (WISC-III) em sua escala verbal. Apesar de ser um instrumento de avaliação da inteligência, apresenta, em seus itens, aspectos caros ao desenvolvimento da linguagem, como memória de longo prazo, atenção auditiva, etc. Contudo, não são mencionados, nesses estudos(2121 Tadić V, Pring L, Dale N. Story discourse and use of mental state language between mothers and school-aged children with and without visual impairment. Int J Lang Commun Disord. 2013;48(6):679-88. http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.12040. PMid:24165364.
http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.1204...
,2727 Tadić V, Pring L, Dale N. Are language and social communication intact in children with congenital Visual impairment at school age? J Child Psychol Psychiatry. 2010;51(6):696-705. PMid:20025621.), resultados da aplicação dessa escala, (Quadro 2, última coluna), visto que foi utilizada apenas com a finalidade de estabelecer o critério de exclusão para as suas amostras, a partir de determinados valores de quociente de inteligência verbal (QIV).

O trabalho conjunto entre o fonoaudiólogo e o psicólogo é bastante útil à clínica dos distúrbios do desenvolvimento da linguagem e, por essa razão, propõe-se um diálogo com participação efetiva das duas áreas, as quais, sendo trabalhadas sob a lógica interdisciplinar e centrada no paciente, têm muito a contribuir, também, para o desenvolvimento técnico e científico da temática proposta nesta revisão(3333 Beltrami L, Souza APR, Dias LO. Ansiedade e depressão em mães de crianças com distúrbios de linguagem: a importância do trabalho interdisciplinar. Fractal Rev Psicol. 2013;25(3):515-30. http://dx.doi.org/10.1590/S1984-02922013000300007.
http://dx.doi.org/10.1590/S1984-02922013...
).

Apenas um estudo recuperado na presente revisão(2020 Oliveira JP, Marques SL. Análise da comunicação verbal e não-verbal de crianças com deficiência visual durante interação com a mãe. Rev Bras Educ Espec. 2005;11(3):409-28. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005000300007.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382005...
) propôs, além de um instrumento de avaliação indireta do nível pragmático da linguagem, a utilização de um roteiro de anamnese a ser aplicado com as mães (Quadro 2), a fim de obter informações sobre o desenvolvimento global de cada criança participante do estudo, bem como quanto aos períodos perinatal e pós-natal, à rotina do menor etc. Uma anamnese abrangente permite ao avaliador, além da obtenção de dados caros ao processo avaliativo e terapêutico, como história pregressa da queixa, presença ou não de doenças associadas etc., a compreensão do paciente em sua dimensão biopsicossocial, favorecendo um olhar integral para além da deficiência, o que lhe proporciona desviar o foco das (in)capacidades para as potencialidades e habilidades do sujeito(3434 Soares MOM, Higa EFR, Gomes LF, Marvã JPQ, Gomes AIF, Gonçalves AHC. Impacto da anamnese para o cuidado integral: visão dos estudantes portugueses. Rev Bras Promoç Saúde. 2016;29(Supl):66-75. http://dx.doi.org/10.5020/18061230.2016.sup.p66.
http://dx.doi.org/10.5020/18061230.2016....
).

Em outra direção, mesmo aqueles estudos que não apresentaram instrumentos específicos, trouxeram, a partir de métodos/técnicas mais flexíveis, aspectos relevantes a serem observados no processo avaliativo da linguagem de crianças com DV. Dois desses estudos(1818 Silva MA, Batista CG. Mediação semiótica: estudo de caso de uma criança cega, com alterações no desenvolvimento. Psicol Reflex Crit. 2007;20(1):148-56. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-79722007000100019.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-79722007...
,2525 Perez-Pereira M, Castro J. Pragmatic functions of blind and sighted children’s language: a twin case study. First Lang. 1992;12(34):17-37. http://dx.doi.org/10.1177/014272379201203402.
http://dx.doi.org/10.1177/01427237920120...
) ressaltam a importância da avaliação enquanto acompanhamento longitudinal, o que fornece diretrizes para a tomada de decisões quanto à continuidade ou não de um determinado modo de intervenção.

Outra pesquisa(2222 Kitzinger M. The role of repeated and echoed utterances in communication with a blind child. Br J Disord Commun. 1984;19(2):135-46. http://dx.doi.org/10.3109/13682828409007184. PMid:6477820.
http://dx.doi.org/10.3109/13682828409007...
), que também não propôs a utilização de instrumentos de avaliação, chama a atenção para as repetições comuns na fala de crianças com cegueira em processo de aquisição de linguagem, de forma a destacar o seu papel no desenvolvimento da criança cega congênita e problematizar o seu status de sintomas do TEA.

Nos resultados da pesquisa citada, obtidos a partir de transcrições de episódios de interações livres com uma criança cega congênita, a autora(2222 Kitzinger M. The role of repeated and echoed utterances in communication with a blind child. Br J Disord Commun. 1984;19(2):135-46. http://dx.doi.org/10.3109/13682828409007184. PMid:6477820.
http://dx.doi.org/10.3109/13682828409007...
) assevera que tais repetições têm a função de manter o diálogo e o contato entre os interlocutores (criança cega e adulto vidente), já que se configuram como uma forma de obter esclarecimentos sobre aquilo que não foi compreendido, além de serem uma estratégia da criança para organizar seus pensamentos e planejar suas ações. Todavia, mais uma vez, destaca-se a necessidade de mais investigações para verificar se essa é mesmo uma característica encontrada nessas crianças.

CONCLUSÃO

Grande parte dos estudos foi realizada com crianças cegas pré-escolares e seus objetivos foram variados, porém, em sua maioria, os estudos trouxeram a comparação entre crianças com DV e videntes. Os instrumentos/métodos/técnicas de avaliação da linguagem também foram diversos, porém, houve predominância de questionários aos pais a respeito de habilidades sociocomunicativas e escalas de desenvolvimento; além disso não foram encontrados instrumentos diretos para a avaliação de níveis da linguagem oral de escolares com DV. A revisão trouxe, a partir de alguns instrumentos, contribuições e estratégias relevantes para pensar tal avaliação, como a utilização de tarefas que contemplam os sentidos remanescentes.

Contudo, faz-se necessário validar as adaptações de instrumentos, propostas em alguns estudos revisados, junto à população de crianças com DV, bem como estabelecer parâmetros de desenvolvimento linguístico para essa população e, assim, realizar avaliações da linguagem que contemplem suas peculiaridades e diferenciem a “normalidade” da patologia. Ressalta-se, também, a necessidade de futuras pesquisas bibliográficas em mais bases de dados eletrônicas e em livros e periódicos impressos, bem como na literatura cinzenta, a fim de obter um panorama mais completo da temática proposta.

  • Trabalho realizado na Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil.
  • Financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES), processo nº: 001.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    17 Nov 2021
  • Aceito
    13 Fev 2023
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