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Direito do comum em Canudos

Law of the common in Canudos

Resumo

Este artigo objetiva analisar a experiência de Canudos a partir do referencial do Direito do Comum. Procede a uma abordagem genealógica, desencavando o que foi soterrado por suas representações tradicionais como mero “fanatismo religioso” ou “rebeldia primitiva”. Como resultado, foi possível identificar elementos de sua gestão comunitária, capaz de constituir sentido próprio e um arranjo institucional alternativo.

Palavras-chave:
Direito do Comum; Canudos; Cercamento

Abstract

This article aims to analyze the experience of Canudos from the theorical framework of the law of commom. It proceeds to a genealogical approach, unraveling what was buried by its traditional missrepresentations as mere “religious fanaticism” or “primitive rebellion.” As a result, it was possible to identify the elements of its community management, capable of constitute its own meaning and an alternative institutional arrangement.

Keywords:
Law of the Common; Canudos; Enclosurement

1. Introdução

A crise política brasileira, sentida com grande intensidade nos Poderes Executivo e Legislativo, vem expondo os limites das estruturas de poder para a ampliação da democracia. O tradicional sistema representativo, baseado essencialmente na atuação dos partidos, tem se mostrado resistente a outras formas de participação política, como é o caso dos coletivos. Desse modo, novas formas de “autoridade comum” esbarram nas antigas formas de pensar as relações sociais e políticas. Contra isso, o Direito do Comum é um projeto político radical, pois procura voltar-se contra a “raiz” mesma das concepções liberais de poder e sociedade. Christian Laval e Pierre Dardot fazem um longo esforço para tanto em Común: ensayo sobre la revolución em el siglo XXI 1 1 DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. Común: ensayo sobre la revolución em el siglo XXI. Tradução de Alfonso Diez. Paris: Gediza, 2014. . Mostram como a lógica exclusiva do sujeito proprietário está longe de ser universal. Laval-Dardot recuperam o conceito de Comum, exemplificam-no historicamente e reconstroem-no, para, afinal, apresentar algumas propostas de ruptura com a ordem liberal.

A partir dessa leitura, é possível observar como a ideia de propriedade foi concebida como uma projeção natural do sujeito, e como o Estado foi apresentado como uma projeção institucional deste. Mas vemos também que houve diferentes arranjos, coisas públicas que não eram estatais e coisas privadas que não eram particulares.

O Brasil tornou-se um dos casos emblemáticos de crise institucional neste começo de século. A ocorrência de manifestações populares desde 2013, o acirramento do jogo político, os escândalos de corrupção envolvendo partidos e grandes empresas financiadoras do sistema e financiadas por ele, remetem aum sistema fechado, que media normativamente a sociedade, mas se autonomiza em relação a ela e passa a gerenciar suas próprias demandas.

A organização autoritária do Estado brasileiro 2 2 Para uma análise de como a organização autoritária do Estado brasileiro serviu como um sério obstáculo à construção da cidadania, ver: CARVALHO, José Murilo. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2014. , que durante a maior parte da história republicana procurou se impor como demiurgo da sociedade – na tentativa de sufocar a atuação dos movimentos sociais –, não foi eliminada totalmente após a redemocratização. Essa situação é responsável pelo déficit de cidadania ainda presente na sociedade brasileira, que, no caso, mesmo após a redemocratização e a promulgação da Constituição de 1988, ainda encontra dificuldades para fazer com que suas reivindicações sejam ouvidas pelas estruturas de poder do Estado. O sistema político se encontra blindado em relação aos movimentos que ocorrem nas ruas, ao distanciar cada vez mais os representantes políticos das pessoas comuns 3 3 Essa situação foi observada por Marcos Nobre em seu livro Imobilismo em movimento , ao utilizar um novo conceito para compreender o modus operandi do sistema político brasileiro. Segundo ele, após a redemocratização o sistema passou a operar de forma autônoma em relação à sociedade, buscando arrefecer os conflitos sociais e as disputas políticas que ocorrem naturalmente numa democracia. Esse fenômeno foi denominado por Nobre como “peemedebismo”. Nesse ambiente dominado pelo peemedebismo, as pautas reivindicatórias de setores marginalizados da sociedade brasileira não encontram espaço no Parlamento. São sufocadas prematuramente por grupos de pressão que alcançam maioria entre os parlamentares, e impedem que as minorias consigam debater suas posições. Ou seja, a redemocratização não foi capaz de abrir por completo as instituições políticas brasileiras, pois manteve um grau significativo de blindagem do sistema político em relação à sociedade. Apesar desse conceito fazer referência ao PMDB, Nobre destaca que o fenômeno do peemedebismo não se reduz somente a esta organização partidária, mas é utilizado em sua obra para explicar o funcionamento do sistema político brasileiro. (NOBRE, Marcos. Imobilismo em Movimento: da abertura democrática ao governo Dilma. São Paulo. Companhia das Letras, 2013.) .

Segundo Octavio Ianni, “modernizam-se a economia e o aparelho estatal. Simultaneamente, os problemas sociais e as conquistas políticas revelam-se defasados. [...] A mesma nação industrializada, moderna, conta com situações sociais, políticas e culturais desencontradas” 4 4 IANNI, Otavio. Pensamento Social no Brasil. Bauru, SP: Edusc, 2004. pp. 120-121. . Um desencontro intencional que, ainda segundo as palavras de Ianni, pertence ao próprio modelo de modernização capitalista seguido pelo Brasil, que contribuiu para cristalizar o modo conservador de lidar com os conflitos sociais.

Qual a alternativa? O apego à mera reforma desse sistema pode bloquear a imaginação. Como visto em Laval-Dardot, a busca de alternativas hoje pode se beneficiar com releituras históricas.

Partindo dessa hipótese, interessa retomar a genealogia do comum num episódio marcante na história brasileira: a auto-organização de um vilarejo no sertão da Bahia do final século XIX, seu funcionamento apesar de todas as dificuldades, sua resistência aos poderes Constituídos, e, afinal, sua repressão militar pela recém-proclamada República.

A Guerra de Canudos é um dos episódios mais descaracterizados das revoltas populares no Brasil. Lido à direita como “fanatismo religioso” e à esquerda como espécie de rebeldia primitiva, as categorias tradicionais de análise não lhe fazem justiça. Parece haver nisso um juízo depreciativo segundo alguma escala exterior de “razão”. Afinal, segundo quem tais expressões religiosas seriam fanáticas em relação às outras? Segundo quem seriam rebeldes? Segundo quem seriam primitivos? Falta compreender seu sentido a partir da sua própria dinâmica, as fontes de integração social, o elã que sustentou esta comunidade durante tanto tempo, em meio a tantas circunstâncias adversas, com instituições relativamente funcionais. Eis o problema a ser enfrentado.

Para tanto, o referencial dos common studies pode contribuir para lançar luz sobre um aspecto pouco considerado de Canudos: a dinâmica de auto-gestão desses grupos, sua potência constituinte, mais do que o simples vácuo de autoridade em que se encontravam.

Com este objetivo, procederemos da seguinte maneira neste artigo: partimos de uma introdução aos estudos do Comum, expondo as dificuldades das instituições contemporâneas e o bloqueio das suas categorias tradicionais de análise frente às movimentações sociais (2); justificada essa abordagem do problema, especificamos nosso referencial teórico-metodológico no Direito do Comum, numa breve reconstrução do pensamento de Christian Laval e Pierre Dardot (2.1); para mostrar a aplicação do Comum, retomamos exemplos concretos da luta campesina citados por Laval e Dardot — mostrando bens e espaços que pertenciam à gestão comum funcional, que de repente se viram “cercados” (enclosured) —, tirando algumas conclusões parciais sobre o Comum que orientarão nossa análise (2.1.1); feitas as cargas teóricas, expomos alguns eventos centrais da Guerra de Canudos a partir da obra de Euclides da Cunha, sem buscar novidades historiográficas, destacando apenas o que foi soterrado por outras realidades institucionais (3); para discutir os bloqueios nas leituras de Canudos, à esquerda e à direita, aproveitamos a polêmica iniciada com intelectuais marxistas brasileiros sobre o livro A guerra do fim do mundo, do escritor peruano Mario Vargas Llosa (4); aberta essa brecha nos dogmatismos, discutimos uma breve alusão a Canudos feita por Antonio Negri e Giuseppe Cocco, com a visão proposta pelo Direito do Comum (5); e, por fim, costuramos todas essas pontas, nos perguntando o que o exemplo do arraial baiano tem a agregar às discussões contemporâneas sobre a crise do Estado, “modernização” autoritária e movimentações sociais (6). Vamos do campo teórico do Comum ao caso de Canudos, e fazemos o caminho de volta.

2. Commom studies

Qual o sentido de se falar em comum hoje? Não vivemos o “fim da história” profetizado por Fukuyama 5 5 FUKUYAMA, Francis. O fim da história e o último homem. Rio de Janeiro: Rocco, 1992. , em que se articulam definitivamente, sob uma economia capitalista, Estados que mediam a vida em sociedade? Temos toda a atividade política que se poderia almejar, com sistemas representativos e algumas brechas domesticadas para participação direta? Faltaria apenas melhorar a aplicação desse modelo?

Ocorre que a malha significativa que sustentava isso tudo vem mostrando rupturas. Há vários eventos observáveis no mundo todo que qualificam a crise: as dificuldades de continuar gerindo economias de exclusão e políticas públicas de inclusão 6 6 BOLZAN DE MORAIS, José Luiz. O Estado e seus limites: reflexões iniciais sobre a profanação do estado social e a dessacralização da modernidade. In: Francisco José R. de O. Neto; Jacinto N. de M. Coutinho; Orides Mezzaroba; Paulo de T. Brandão (Orgs.) Constituição e Estado Social: Os obstáculos à concretização da Constituição. Coimbra: Coimbra 2008. ; as crises dos sistemas financeiros, com grandes players tendo que ser socorridos pelo Estado com dinheiro dos contribuintes; a dificuldade de coordenar esses players de modo sustentável na exploração de recursos escassos; o aumento das desigualdades a picos inéditos nos últimos séculos; as dificuldades de se efetivar participações políticas diretas; o fechamento dos sistemas representativos nos representantes, em parcerias dos partidos com empresas (depois contratadas para prestação de serviços públicos) que financiam campanhas eleitorais cada vez mais midiatizadas e massificadas; os desequilíbrios geopolíticos, em que situações de dominação local globalmente acomodadas tornam-se instáveis, afetando tabelas de preços internacionais e forçando grandes fluxos migratórios.

Atravessando isso tudo, há uma constante: uma força de desestabilização ou ao menos de contestação do modelo. Ela não aparece nos termos de subjetividade política a que estamos habituados. Não são eleitores, partidos, frequentemente nem são reconhecidos como cidadãos (imigrantes ilegais), não são movimentos sociais com uma só sigla e uma estrutura hierarquizada. São muito mais “movimentações sociais”, na expressão de José Bolzan de Morais 7 7 BOLZAN DE MORAIS, José Luiz. REPE&C 20 – O Estado de Direito não sobrevive com sujeitos mediatizados. Empório do Direito. Florianópolis, 23 mar. 2016. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/repec-20-o-estado-de-direito-nao-sobrevive-com-sujeitos-mediatizados/ . Acesso em: 01 mai. 2017. .

Para usar um vocabulário da Teoria Critica 8 8 Em especial, referimo-nos ao vocabulário de Jürgen Habermas, conjugando expressões de Max Weber, Karl Max e tantos outros. HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade. Tradução de Flavio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. v. I e II. : temos visto energias sociais que fluem fora dos trilhos de um agir instrumental, de estratégias traçadas calculando custos e benefícios, meios e fins, por agentes ensimesmados, que abordam uns aos outros com enfoque objetificador. Elas fogem aos diagnósticos pessimistas da modernidade, de reificação e alienação da base da pirâmide social.

Por outro lado, essas energias nem sempre se apresentam de uma maneira reconduzível ao sistema de que escapam. Nem sempre podem ser canalizadas pelas vias institucionais para legitimar o Estado. Sua institucionalização pode mutilá-las, achatá-las, despotenciá-las. É significativo o lost in translation aqui.

Enfim, essas energias nem sempre poderão ser trabalhadas como racionalidades comunicativas (como quer Jürgen Habermas 9 9 Fazemos essa referência, sem pretensão de aprofundar este diálogo aqui, por julgá-la representativa de uma concepção “reformista”. ). Nisso ainda há uma concepção modernizadora de sociedade. Muitas vezes elas se expressam como afetos, encontros, como vida que não se deixa codificar.

Negri e Hardt 10 10 NEGRI, Antonio; HARDT, Michael. Multidão: guerra e democracia na era do Império. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2012. falam numa outra subjetividade política, a Multidão. Distinguem-na da concepção clássica de “povo”, um corpo político unificado, sintetizado num super-sujeito, com uma vontade própria, distinta da de seus membros, em nome da qual o soberano (e depois os representantes) legitimam suas ações. Distinguem-na também da “massa”, sombra moderna de um sujeito político, sem unidade, porém uniforme, achatado, sem vontades próprias, que precisa de uma vanguarda que lhe sirva de centro nervoso e de uma estruturação partidária que lhe dê espinha.

Nessa linha de metáforas, a multidão não seria um corpo político unitário nem uniforme, mas uma carne social, um tecido vivo em pura potência. Concretamente, ela se refere a movimentações sem líder nem hierarquias que se espalham pelo mundo, como as várias Occupy, as Jornadas de Junho de 2013, a praça Tahir, as colaborações entre hackers e etc. Todas são expressões políticas multitudinárias de uma sociabilidade comum, que “sobra” diante das representações tradicionais.

No referencial dos common studies, a Multidão é referida como expressão corpórea do comum. Mas, afinal, o que é esse comum no qual se centram? Negri e Hardt respondem:

[...] Em suma, o comum assinala uma nova forma de soberania, uma soberania democrática (ou, mais precisamente) uma forma de organização social que desloca a soberania) na qual as singularidades sociais controlam através de sua própria atividade biopolítica aqueles bens e serviços que permitem a reprodução da própria multidão. Esta haveria de constituir uma passagem da Res-publica para a Res-communis. 11 11 NEGRI, Antonio; HARDT, Michael. Multidão: guerra e democracia na era do Império. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2012, p 268.

Sob essa alcunha, Dardot e Laval tentam falar de outra relação entre pessoas e coisas, tudo aquilo que é sufocado na polarização entre estatal e particular. Em última análise, estas duas categorias são expressões da mesma lógica de um sujeito proprietário. A propriedade do soberano foi sucedida pelo Estado moderno, mas herdou dele todas as suas condições de sujeito, servindo de espelho das subjetividades particulares. Dizer que algum bem é público não é dizer que seja comum, mas que é propriedade deste super-sujeito.

Contudo, essa polarização não é universal nem natural; é um constructo relativamente recente e nem sempre verificável em todos os lugares. Observa-se em vários momentos históricos e em várias sociedades a concepção de algo que não é nem propriedade pública nem privada, mas simplesmente inapropriável e compartilhado desde sempre por todos os seus membros.

Chirstian Laval e Pierre Dardot se dedicam a uma ampla e profunda releitura do comum. Tentam mostrar as contingências políticas na formação dessas relações entre as coisas e as pessoas, sem pretensão de romantizá-las ou de achar antes delas um comum originário, essencial, mito fundador do comunismo primitivo. Não se trata de achar a verdadeira natureza humana ou a forma natural de viver em sociedade, mas justamente de desnaturalizar as formas atuais, trazendo à tona outros exemplos que funcionaram, e liberando a imaginação para outras possibilidades. Outro mundo é possível (Negri-Hardt); na verdade, outros mundos já existiram e existem à sombra de narrativas oficiais.

2.1. Direito do comum

Como visto, a ideia do Comum pede passagem para outro mundo. Não se trata de mobilizar o Comum pontualmente, e, na área jurídica, de falar num direito do comum em contraposição ao direito conhecido. Trata-se de um princípio constitutivo de um novo Direito, em outra relação entre pessoas e coisas. Situa-se para além das tradicionais bipolarizações: entre a propriedade pública e privada, ele se situa para além da própria lógica proprietária; entre o direito estatutário e o Common Law, ele se situa para além da normação mediada pelos juristas.

Dardot e Laval revelam que outro mundo é possível ao questionarem a “necessidade” desse mundo atual. Aproveitam, para tanto, a crítica de Aristóteles à comunidade platônica dos bens na República. O argumento aristotélico é que o cuidado do que é comum seria muito confuso. O erro de Platão teria sido confundir “viver juntos” e “viver em comum”. Uma cidade não pode ter a unidade de uma família, por isso é preferível combinar a “propriedade privada” dos bens com seu “uso comum”. Para Aristóteles devem-se distinguir duas formas de “pôr em comum”: 1) o pôr em comum de todos os bens, que até compromete ou impede o comum político de viver juntos; e, 2) o pôr em comum das palavras, dos pensamentos e das ações que, pelo contrário, constituem esse mesmo comum no que tem de irredutível.

A diferença central é que a segunda forma não dá lugar a uma apropriação. Não pode haver uma “propriedade comum” das palavras. Já com relação à primeira forma, pode até haver uma “propriedade comum”, mas esta seria até prejudicial à cidade e ao que se busca aqui como comum.

Nesse aparente “liberalismo” de Aristóteles parece haver uma perspectiva interessante a ser explorada: a preocupação com o “pôr em comum”, para além do simples “viver juntos”. Não é a comunidade política que faz a atividade posta em comum, mas a atividade posta em comum que cria o comum político.

O Comum político não é capturável por uma propriedade. Por sinal, em determinada fase do Direito Romano a ideia de comum se desencaminharia de vez para a “natureza da coisa” que não pode ser “privatizada”, sumindo no objeto.

Na outra ponta, o Comum também não se identifica com um sujeito individuado, num direito contraposto à práxis social.

Porque no hay y no puede haber sujeto de lo común. Em efecto, aunque el uso de un común como práctica colectiva produce su sujeto, este sujeto no es el sujeto del común em cuestión, porque este último no preexiste a dicha práctica. No hay pus modo de oponer un buen sujeto, el del uso colectivo, a um mal sujeto, el del dominio-propiredad. Para entenderlo, hay que aceptar reconsiderar el viejo concepto tan criticado de administración, para articularlo com el de uso, del que hasta ahora hemos tratado ampliamente: entoces se obtendría el concepto de un uso administrativo, incluso de un uso adminsitrativo común, que permitiria, no desplazar sino, más radicalmente, superar la subjetividad abstracta de la titularidad sobre las cosas12 12 DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian.Común: ensayo sobre la revolución em el siglo XXI. Tradução de Alfonso Diez. Paris: Gediza, 2014. p. 303. .

Dardot-Laval entendem o Comum político pela “actividad sustenida y contínua de puesta en común” e a “actualización de la capacidad natural de la puesta en común”. Trata-se do inapropriável, pela própria afetação comum de sujeitos reciprocamente referidos.

E o direito do Comum se trata de uma coprodução de normas jurídicas [não estatais] que obrigam a todos os coprodutores no cumprimento de sua tarefa. Nele, as pessoas e as coisas já se acham imersas em outra relação de dever-ser, não mediada pelos juristas. Ele reinventa a noção de autoridade porque parte de outra sociabilidade. Trata-se do acesso ao comum, que não é simplesmente o acesso à distribuição equitativa da propriedade, não é simplesmente o cumprimento da função social da propriedade, não é acesso à coisa pública...

Alguns exemplos concretos podem ajudar a visualizá-lo melhor.

2.1.1. Exemplos privilegiados: a luta campesina contra o “cercamento” (enclosurement)

Há algumas batalhas em curso pelos chamados “common goods ”, bens tradicionalmente aceitos como “não-privatizáveis”, e que, agora, frente à elevação do consumo pelo desenvolvimento industrial, revelam-se numa característica inédita: escassez. A água é o exemplo por excelência. Em determinados cenários, é preciso uma gestão sustentável, do contrário todos os players envolvidos entram num dilema que assegura a destruição mútua. E não há como “legislar temperança”, já adverdia Garret Hardin no clássico The tragedy of Commons13 13 HARDIN, Garret. The Tragedy of the Commons. Science: Vol. 162, Issue 3859, 13 Dec 1968. pp. 1243-1248. Disponível em: http://science.sciencemag.org/content/162/3859/1243 . Acesso em 29 jul. 2016. .

Dardot e Laval vão para além da tragédia dos commons . Revelam a insuficiência da saída por mediação estatal. E até mesmo da ação coordenada dos agentes privados, via Teoria dos Jogos. Todas ainda estão na lógica da “não-privatização”, mas que admite apropriação, seja pelo Estado ou por consórcios. Somos bombardeados por eles com exemplos que mostram bens e espaços que pertenciam à gestão comum funcional, que de repente se viram “cercados” (enclosured).

Foi assim com os pastos comunais na Inglaterra medieval, anexados pelas elites aos seus castelos através da Carta Magna de 1215. Tais espaços de uso comum não eram propriedade de uma pessoa, originados na distinção entre o direito do senhor ao solo e o direito ao pasto dos commmoners. A Carta de 1215 veio a restituir essa propriedade, acabando com os commons em favor da propriedade privada ancestral. A Carta de 1225 (Carta da Floresta) até chega a reinscrever esses direitos aos pastos comunais e estende garantias sobre uma série de outros direitos relacionados dos commons. Contudo, em última análise, sua lógica também era senhorial, também estava num quadro mais amplo de afirmação dos direitos proprietários. Muito tempo depois, no século XVII, quando o Parlamento tomaria medidas contra os enclosures, a Carta Magna seria usada em defesa desses direitos de propriedade. O suposto símbolo de liberdade popular contra o arbítrio, não nos esqueçamos, era a documentação de uma vitória dos proprietários de terra contra a nobreza não-proprietária. Quem sobrava nesse arranjo eram os plebeus não-proprietários, que tiveram de começar a pagar até para caçar ou cortar lenha nas florestas. Em motins violentos contra a restrição, os camponeses começaram a pintar os rostos de negro e sequestrar nobres e seus guardas-florestais. A repressão veio no Black Act, instituindo pena de morte para aqueles que fossem pegos com os rostos pintados. O Common Law se volta contra as comunas e contrapõe-lhes os enclosures, numa jurisprudência cada vez mais ligada à lógica proprietária e seus direitos correlatos.

Uma batalha similar se passou na Alemanha, quando da edição da chamada Lei Sobre o Furto de Madeira (1840), penalizando os camponeses que fossem pegos catando as sobras de lenha cortadas nas florestas. A possibilidade jurídica de catar essas sobras já era um costume, e sua proibição levou a agitações sociais, inclusive levando às primeiras publicações em jornal do jovem Marx.

Apesar disso, nem sempre a leitura da dupla do comum coincide com a marxista. Segundo Marx, a propriedade comum era a forma original de propriedade em vários povos. Esse virou o mito de algumas esquerdas: o comunismo primitivo, o estado de comunhão original a ser restaurado.

Aprofundando esta ideia, Dardot e Larval entram na comparação marxiana entre forma romana e forma germânica de propriedade: 1) nos germanos o ager publicus é visto como um simples complemento da propriedade individual; 2) ao contrário, nos romanos, o domínio público figura como existência econômica particular do Estado junto a proprietários privados.

Em Roma o rico proprietário exclui todos os demais e está mesmo privado do acesso comum. Na Germânia o proprietário individual tem acesso ao comum como proprietário individual. Assim, os germanos tinham algo público que não era estatal e algo privado que não era individual, o que teria se mostrado bastante atrativo para Marx.

Contudo, talvez não tenham sido levados suficientemente em conta por Marx os pressupostos sociais germânicos, o que a relação com as coisas significava dentro desses pressupostos. Existiram comunidades que não reconheciam o rentismo imobiliário. A propriedade era sempre “usufundada”. Hoje nós temos a propriedade fundiária, relativa aos fonds (bens imóveis), que independem conceitualmente do trabalho. De fato, a propriedade nos germanos era mesmo usufundada. Só que a noção de “propriedade usufundada” não se confunde com “propriedade coletiva”. Muito menos com o comum, que é inapropriável. Ela não possibilita um sistema muito complexo de exploração (com classes sociais e etc.), mas ainda possibilita a desigualdade, a partir do acúmulo de força de trabalho. Isto para não falar que há outros fatores de desigualdade social além das baseadas na exploração de recursos naturais.

Então, estamos diante de uma sociedade profundamente desigual que não é, contudo, uma sociedade de classes no sentido de Marx, uma sociedade em que os trabalhadores estão separados dos meios de produção convertidos em propriedade exclusiva dos não-trabalhadores. O exemplo dos antigos germanos passa muito longe do comum. Se é bem certo que havia um comum não estatal, não era o da terra, senão o encarnado por sua assembleia, na medida em que esta não era propriedade de ninguém, não podia ser confiscada por nenhum chefe e implicava certa forma de igualdade em participar.

Desses exemplos e contra-exemplos, podemos concluir o seguinte: o comum não pode ser instituído como apropriável, ele é uma práxis instituinte, uma dinâmica comunitária; a busca pelo comum não pode cair na mistificação; não basta ao comum uma noção diferente de propriedade se ainda há desigualdade, como na acumulação germânica sobre o “uso”; o direito do comum passa por uma coprodução normativa, não dependente da mediação por uma classe de juristas; por isso, o direito do comum certamente não poderia ser um direito legislado, o que não quer dizer que se identifique com o Common Law, em que ainda há mediação por juristas, e apropriação do direito pelos juízes que muitas vezes constroem o costume sob o pretexto de estar restaurando um costume mais antigo.

3. Canudos para além do conselheiro...

É frequente a curiosidade pelas guerras desiguais, em que o lado mais fraco consegue combater um inimigo muito mais poderoso. Nessa linha, tornou-se famosa no Brasil a história da Guerra de Canudos 14 14 Ricamente registrada em: CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. Para sua fortuna crítica e notas sobre as várias alterações que o autor fez no texto, veja-se: CUNHA, Euclides. Os Sertões: edição crítica. Edição elaborada por Walnice Nogueira Galvão et al. São Paulo: Sesc/Ubu, 2016. .

Ocorre que a complexidade não costuma caber na anedota. Ou, para dizer com Vargas Llosa: “o apelido, uma vez conhecido, apaga o nome por essas bandas” 15 15 VARGAS LLOSA, Mario. A guerra no fim do mundo. Tradução de Paulina Wach Ari Roitiman. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010. . Nesse caso, a perspectiva do vencedor ainda dita bastante a narrativa. Canudos ainda é lembrado como um episódio curioso de fanatismo messiânico.

Não se está querendo recusar decisivamente estas características, nem mesmo menosprezando-as. Apenas quer-se lançar luz neste momento sobre outras características. Quer-se ver Canudos além do Conselheiro, nos encontros dos escravos libertos, indígenas, beatos, prostitutas, lavradores, vaqueiros, cangaceiros, artistas de circo, pessoas marginalizadas e que se marginalizavam entre si, que de repente largam tudo para se engajar num outro mundo. Na entrada, doavam seus bens à caixa comunitária.

Nada queriam desta vida. Por isto a propriedade tornou-se-lhes uma forma exagerada do coletivismo tribal dos beduínos: a apropriação pessoal apenas de objetos móveis e das casas, comunidade absoluta da terra, das pastagens, dos rebanhos e dos escassos produtos das culturas, cujos donos recebiam exígua quota parte, revertendo o resto para a companhia. Os recém-vindos entregavam ao Conselheiro noventa e nove por cento do que traziam, incluindo os santos destinados ao santuário comum [...] 16 16 CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 160. .

Mais à frente:

O certo é que abria aos desventurados os celeiros fartos pelas esmolas e produtos do trabalho comum. Compreendia que aquela massa, na aparência inútil, era o cerne vigoroso do arraial. Formavam-na os eleitos, felizes por terem aos ombros os frangalhos imundos, esfiapados sambenitos de uma penitência, que lhes fora a própria vida; bem-aventurados porque o passo trôpego, remorado pelas muletas e pelas anquiloses, lhes era a celeridade máxima, no avançar para a felicidade eterna 17 17 CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 165. .

Além de outros cronistas-testemunhas, ainda o atestam depoimentos de descendentes dos sobreviventes da guerra:

Eles [os conselheiristas] trabalhavam em conjunto. Ninguém tinha nada. Todo mundo fazia roça, todo mundo trabalhava. Colheu... Colheu. Toma o seu... Toma o seu. Ninguém ficava com menos ou com mais (sic). (ADONEL RÉGIS MATOS, canudense, 1932, depoimento dado em Canudos, 4 de fevereiro de 1995)

Vamos trabalhar e se unir. Aqui todos são iguais. Eu [Antônio Conselheiro] sou igual a vocês (sic). (ZEFINHA, canudense, 1916, depoimento concedido em Canudos, 6 de fevereiro de 1995)

As casinhas eram de taipa; construídas nos mutirões. O arraial cresceu em quatro anos porque tinha ajuda de uns aos outros (sic). (JOÃO DE RÉGIS, canudense, 1907, depoimento em Canudos, 4 de fevereiro de 1995)

O povo aqui era todo de mutirão. Fazia as coisas ... Tudo... Ninguém não ganhava dinheiro não (sic). (MADALENA ANTÔNIA DOS SANTOS, canudense, 1950, sobrinha de Manezão - afilhado de Antônio Conselheiro -, Canudos, 4 de fevereiro de 1995)

[Antônio Conselheiro] reunia as pessoas para decidir sobre a vida do arraial. Conselheiro combinava tudo com o seu grupo e partia para a ação (sic). (ZEFINHA, Canudos, 6 de fevereiro de 1995) 18 18 MARTINS, Paulo Emílio Matos. Canudos: organização, poder e o processo de institucionalização de um modelo de governança comunitária. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro , v. 5, n. 4, p. 08, Dec. 2007. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-39512007000400005&lng=en&nrm=iso >. Acesso em: 29 abr. 2017.

Voluntariavam-se para trabalhar segundo suas capacidades e receber segundo suas necessidades 19 19 CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 160, 165, 264. . Passavam a cuidar umas das outras e até se irmanavam a ex-inimigos.

Cabe esclarecer que adotamos como fonte principal aqui a obra Os Sertões (campanha de Canudos) de Euclides da Cunha, com enriquecimentos pontuais. Nosso esforço não é o de trazer novidades historiográficas 20 20 Sobre o modelo historiográfico do próprio Euclides da Cunha e como ele se relaciona na história da disciplina, veja-se: BERNUCCI, Leopoldo M. Pressupostos historiográficos para uma leitura de Os Sertões. REVISTA USP, São Paulo, n.54, p. 6-15, junho/agosto, 2002. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/35140/37867 . Acesso em: 01 mai. 2017. Destaca-se o esforço de Euclides para se libertar do chamado modelo de crônica que imperava aqui, segundo Bernucci refere na p. 15: “No plano argumentativo, para dar a Os Sertões vida historiográfica, o autor trabalha o argumento da história de Canudos de modo que seja percebida como tragédia. Arma o seu argumento em torno da hecatombe final e imprime-lhe um crescendo que anima essa destruição. A força explicativa, ele irá buscá-la nas ciências e nas correntes filosóficas de sua época, fortemente caracterizadas pelas análises de causa e efeito dos fatos, o que, inevitavelmente, confere ao livro um esquema mecanicista, porquanto também este cria um sentido metafórico para a narração: as análises históricas e sociológicas são feitas com base em repetições ou casos já presenciados ao longo das lutas político-religiosas do mundo ocidental”. Por sinal, Os Sertões divide-se em três grandes partes: A Terra, O Homem e A Luta, em que tenta articular deterministicamente esses três elementos na sua narrativa. , mas apenas desencavar, naquilo mesmo que se sabia, o que foi soterrado por outras realidades institucionais, numa genealogia à moda de Dardot e Laval.

Canudos 21 21 Chamava-se assim por causa de uma planta local, que crescia na forma de canudos. foi um arraial que cresceu no pequeno vilarejo de Belo Monte, a partir da chegada de um Beato, um peregrino que vagava pelos sertões dando conselhos religiosos e reformando igrejas e cemitérios. Como passou a juntar uma multidão de seguidores, estabeleceu-se em 1893 neste lugar no interior da Bahia, às margens da fazenda Canudos (propriedade do Barão de Jeremoabo, importante figura política baiana). Passou a atrair cada vez mais seguidores, e quatro anos depois o lugar chegou a ter 25 mil habitantes.

Eram tempos de grande seca e miséria. Boa parte dos sertanejos vivia sob formas semi-feudais de trabalho, servindo algum nobre, coronel, ou “padrinho”, quando o batismo sacralizava uma relação de servidão e proteção. A agricultura era a principal força da economia, e a forma predominante era o latifúndio, com arrendamento de pequenas porções de terra aos apadrinhados, protegidas por jagunços, pequenos exércitos particulares dos grandes fazendeiros.

Nesse momento, mudanças iniciadas em lugares distantes viriam a agitar o imaginário sertanejo. A escravidão fora abolida há pouco. Mudavam certas práticas escravagistas, mas a mão-de-obra precarizada era reabsorvida em condições análogas de trabalho pelo sistema do latifúndio. A República era proclamada, destronando-se Dom Pedro II. O Estado vinha se desvinculando da Igreja Católica. Representasse algo bom ou mau, a notícia desses eventos chegava sem vantagens práticas imediatas para os sertanejos. A vida política ainda se passava nas Capitais, onde disputavam monarquistas adeptos da restauração e republicanos (militaristas ou civis latifundiários). Lá estavam os jornais e círculos intelectuais. No interior havia sujeição aos poderes constituídos (Igreja, polícia, coronéis, cobradores de impostos), que funcionavam para a manutenção da ordem.

Nas brechas dessa autoridade, surgiam movimentos de banditismo social, os cangaceiros que saqueavam cidades e fazendas pouco protegidas. Para enfrentá-los, além dos jagunços pagos diretamente pelos coronéis, o Estado recrutava milícias populares, as volantes.

De outro lado, passaram a surgir por todo sertão várias comunas auto-organizadas. Canudos não foi o único ajuntamento espontâneo a ser reprimido, foi apenas o maior e mais famoso 22 22 CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 119. . Seu elã foi se constituindo nos conselhos e caridades do Beato Antônio. Lembrado muitas vezes de modo caricatural, seu discurso ativava sensibilidades dos sertanejos pobres. Merece ser compreendido em sua coerência interna.

A estranha profecia “o sertão vai virar mar e o mar vai virar sertão” deixava-se entender mundanamente como subversão das relações entre interior e capital (no litoral) 23 23 Enfatizando a dialética entre o litoral e o sertão na narrativa de Euclides da Cunha: MARTINS, Paulo Emílio Matos. Canudos: organização, poder e o processo de institucionalização de um modelo de governança comunitária. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro , v. 5, n. 4, p. 2, Dec. 2007 . Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-39512007000400005&lng=en&nrm=iso >. Acesso em: 29 abr. 2017. . A república era o Anti-Cristo porque queria se desgarrar da Igreja, única referência de solidariedade conhecida naquele mundo. Aliás, qual seria a legitimidade dessa tal República proclamada numa terra distante? Pela tradição, os sertanejos conseguiam se relacionar com o monarquismo, ainda embebido no pressuposto direito divino de governar de Dom Pedro II. Mas essa forma moderna não parecia lhes dizer nada. O republicanismo acontecia em outro mundo, no qual não se sentiam bem-vindos.

A república trazia cobradores de impostos para confiscar as criações de animais. Trazia o tal censo demográfico, que, segundo boatos, viria descobrir quem era descendente de escravos para restabelecer a escravidão. Criticava-se até mesmo a implantação do sistema decimal. Vê-se que está em jogo mais do que uma mudança na forma de governo; está em jogo a desapropriação de um jeito de viver, de dar sentido às coisas.

As representações sociais eram no sentido do progresso dos industriais, das capitais, contra o arcaísmo do interior, representado de modo pejorativo, como repleto de ignorantes, fanáticos e submissos à dominação. Vejam-se os jornais da época, moldando a opinião pública 24 24 O próprio Euclides era correspondente de um jornal e cita várias reportagens ao longo de sua obra. Registra as relações entre os jornais e a opinião pública durante a campanha, desde reportagens moldando a opinião pública contra Canudos (CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 298 e 301), até o empastelamento de jornais monarquistas depois da derrota de uma expedição (p. 119). Para um consagrado “corpus das reportagens sobre a guerra de Canudos”, subdivididas em galhofeiras, sensacionalistas e ponderadas, veja-se: GALVÃO, Walnice Nogueira. No calor da hora: a guerra de canudos nos jornais, 4ª expedição. 2. ed. São Paulo: Ática, 1977. . Revoltosos, quando noticiados, eram sob pesadas caricaturas. As repressões, por mais violentas que fossem, envolvessem decapitações e até o (pouco noticiado) uso de aviação militar contra seus próprios cidadãos 25 25 Caso do controverso massacre de Caldeirão da Santa Cruz do Deserto em 1937. FACÓ, Rui. Cangaceiros e fanáticos: gênese e lutas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1963. p. 192. , eram celebradas como triunfos do progresso.

Por tudo isso, compreende-se porque Canudos se tornou um refúgio para os pobres sertanejos, atraindo gente de vários estados vizinhos além da Bahia. Funcionou sem maiores incidentes até 1896.

Os conflitos começam quando a comunidade tenta fazer uma compra de madeira na cidade de Juazeiro/BA, para erguer uma igreja. O valor teria sido pago, mas a mercadoria não foi entregue. Começaram a correr boatos de que Canudos viria tomar a madeira à força, levando o juiz local a oficiar junto ao Exército uma expedição militar ao arraial, que estaria ameaçando a manutenção da ordem. A dar ouvidos a Euclides da Cunha, as razões do juiz eram nada “republicanas”. O distrato na madeira foi tramado por ele, para gerar uma reação dos canudenses que justificasse a expedição militar. Isso tudo como vingança, por ter sido coagido a deixar a comarca de Bom Conselho/BA depois de uma invasão de canudenses em protesto violento contra o casamento civil 26 26 CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 189. .

A expedição militar foi derrotada ainda longe do arraial, em Uauá/BA, quando o que parecia uma procissão pacífica de canudenses de repente atacou os soldados com paus, pedras, foices e enxadas. Alguns romeiros se lançavam sobre os soldados com as mãos nuas, levando boa parte destes a fugir ao cenário de horror abandonando as armas.

Foi organizada uma segunda expedição, agora com seiscentos homens. Contudo, encontraram resistência organizada, fortalecida com algumas armas abandonadas pelos soldados da primeira expedição. Foi derrotada já às portas de Belo Monte. A violência e o horror aumentavam. Cadáveres de soldados foram pendurados à beira da estrada.

Então, uma intervenção federal é aprovada. No comando, o Coronel Moreira César (conhecido como “o corta-cabeças”), herói da guerra no Paraguai e responsável pela repressão de movimentos insurgentes no sul do Brasil. Era o nome que os republicanos ditatoriais esperavam fortalecer para a presidência, ora sucedida por um civil, Prudente de Morais, que estava doente e era visto como fraco por certos setores republicanos que temiam a restauração monarquista. Canudos devia ser feita de exemplo. O presidente ordenou sua destruição total. Os fanáticos deviam ser massacrados. O Conselheiro deveria ser trazido enjaulado para a Capital, exposto como maltrapilho fanático para ridicularizar a causa monarquista. Cogitava-se até que a organização do arraial não poderia ser obra destes simplórios.

Para fugir destas leituras, é importante atentar para o relato histórico feito por Euclides da Cunha, engenheiro do exército que serviu também como correspondente de guerra na ocasião. Partiu do Rio de Janeiro esperando achar em Canudos um reduto monarquista. Acreditava que seu apego a essas formas tradicionais eram fruto de fanatismo religioso e ignorância, de uma raça fraca, submissa que se degenerou pela miscigenação e miséria.

Ao chegar em Canudos, ele muda totalmente de ideia, e o registro de seu espanto termina gerando Os Sertões: campanha de canudos 27 27 CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. , publicado em 1901, uma das obras-primas da literatura brasileira. Agora se convence de que Canudos não tem nada a ver com a polarização entre monarquia e república vivida na capital. Era outra coisa, impressionante, inominável. Até sua tese racista vira de cabeça para baixo: “o sertanejo é, antes de tudo, um forte”, dirá 28 28 Embora não deixe de ser racista, mesmo em suas tentativas de elogio aos sertanejos. CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 89-103. . E o fanatismo lhe aparece também na obsessão modernizadora dos republicanos.

Na verdade, Canudos atraía a antipatia tanto dos republicanos progressistas da Capital quanto dos monarquistas locais. Os monarquistas baianos lamentavam o episódio, por ter dado a justificativa para uma intervenção federal a que tanto se opuseram. O Barão de Jeremoabo, cujo título nobiliárquico era ameaçado pela República, torna-se um dos “coiteiros” do Exército nas suas expedições, para dar exemplo de civismo. Os demais coronéis fazem o mesmo. Lamentam a fuga da mão-de-obra para o arraial. Trabalhadores vão embora levando colheitas e criações para se juntar a Canudos. Algumas fazendas são saqueadas e incendiadas para “purificação” dos pecados.

A terceira expedição militar a Canudos foi organizada com guias e coiteiros locais, canhões e fuzis importados e soldados vindos de quase todos os estados da federação. Seus uniformes de pano grosso e muitos botões transitando na caatinga simbolizam bem a inadequação da máquina estatal naqueles rincões 29 29 Metáfora sugerida por Lenio Luiz Streck em: STRECK, Lenio Luiz; ROSENFIELD, Denis; PAIXÃO, Cristiano. Direito & Literatura: A guerra do fim do mundo, do escritor peruano Mario Vargas Llosa. São Leopoldo: TV Unisinos, 27 jun. 2014. Programa de TV. (27 min). Disponível em: < https://vimeo.com/32530111 >. Acesso em: 26 jun 2016. . Canudos montou seu pequeno exército, chamado de guarda-católica. Liderada por cangaceiros, trazia também mulheres e crianças. Além das armas, usavam balestras rudimentares feitas originalmente para caçar passarinhos.

A expedição foi um desastre administrativo. Os soldados se viram famintos, sedentos, sem munição, exaustos, e vitimados por estratégias militares arrogantes. Foi derrotada, inclusive com baixas dos seus comandantes.

Uma quarte expedição foi montada, agora com 6 brigadas militares, divididas em duas colunas. No primeiro ataque, uma das colunas é salva pela outra. Mais de mil baixas. Da imprudência, passa-se à covardia. Faz-se um cerco, atirando de longe nas mulheres do arraial que iam buscar água no rio e bombardeando-o dia e noite com canhões. Põe-se abaixo inclusive a igreja. Depois, jogava-se dinamite nas trincheiras. Executado o hino nacional e hasteada a bandeira às suas portas, Canudos foi destruída e milhares de sobreviventes foram degolados.

O extermínio não alavancou a transformação; apenas manteve as coisas como estavam. A monarquia não voltaria, mas o Estado moderno também não se estabeleceria por aquelas bandas. Os Barões e Coronéis seguiriam, sem títulos nobiliárquicos ou patentes compradas, traduzidos democraticamente no voto de cabresto. Segue o latifúndio e trabalho análogo à escravidão. Na verdade, tudo foi achando seu sucedâneo. Outras comunas menores surgiriam, mas seriam rapidamente reprimidas por forças locais, espelhadas no exemplo de Canudos.

Pouco depois de Canudos, cresceria a alternativa do banditismo social, chegando ao auge do cangaço com Lampião e outros tantos. Alguns seriam até aliciados pelo Estado para combater a Coluna Prestes. Outras vezes, sobre movimentações parecidas a Canudos viria então a pecha de comunista, o inimigo externo da vez depois do monarquismo inglês.

4. Alguns problemas com as leituras revolucionárias de Canudos até aqui

Tornou-se comum durante a ditadura brasileira uma releitura revolucionária de Canudos, que a via como uma espécie de proto-socialismo. Sua complexidade religiosa, cultural e social, seria na verdade um amontoado de elementos acidentais na revolução, ou até mesmo manipulações dos sertanejos pelo Conselheiro, ganhando sua simpatia para esse fim. A grande questão seria, no fundo, a luta de classes.

Encantado pela história após a leitura do clássico de Euclides da Cunha, o escritor peruano Mario Vargas Llosa vem à Bahia realizar pesquisas para escrever um romance sobre Canudos. Foi recebido e acompanhado por Renato Ferraz, antropólogo e sertanista, além de vários outros intelectuais brasileiros. Andou pelos vários vilarejos por onde o Conselheiro passou, entrevistou sobreviventes e seus descendentes, foi aos arquivos do governo no Rio de Janeiro.

Tenta recontar Os Sertões, e o resultado foi a publicação em Barcelona, no ano de 1981, de A guerra no fim do Mundo. O livro foi sucesso internacional de venda e de crítica, atraindo os olhos de todos para esta epopeia sertaneja. Os principais jornais do mundo publicaram notas a respeito 30 30 GUIMARÃES LEITE, Leonardo. A guerra do fim do mundo chega ao Brasil: interpretações e disputas de memória em torno de Antônio Conselheiro e Canudos. In: III encontro baiano de estudos em Cultura. Disponível em: http://www3.ufrb.edu.br/ebecult/wp-content/uploads/2012/04/A-guerra-do-fim-do-mundo-chega-a-o-Brasil-interpretac%C3%83%C3%9Fo%C3%83%C3%89es-e-disputas-dememo%C3%83%C3%85ria-em-torno-de-Anto%C3%83%C3%87nio-Conselheiro-e-Canudos.pdf >. Acesso em: 27 jul 2016. .

Á sua época, Euclides esteve às voltas com seu próprio modernismo, republicanismo, cientificismo e racismo em seu relato. Na revisitação de Llosa (conhecido pela guinada política à direita), ele se depara com a leitura de esquerda muito difundida. Para satirizá-la, cria o personagem Galileo Gal, um revolucionário internacional de passagem pelo Brasil que se sente atraído por Canudos. Escreve a jornais europeus revolucionários que está em curso algo extraordinário naquele lugar, e tenta de toda maneira se integrar ao “movimento”. Termina criando mais problemas para todos e para si mesmo do que ajudando alguém. Constantemente Gal se queixa da inaplicabilidade de suas categorias de pensamento para refletir sobre o que acontece ali. Quase apanha ao tentar se apresentar como vanguarda para aqueles que supõe serem rebeldes primitivos. Esse vanguardismo parece ser inteiramente diluído no método geral do livro, que reconstrói os acontecimentos num discurso polifônico 31 31 GUIMARÃES LEITE, Leonardo. A guerra do fim do mundo chega ao Brasil: interpretações e disputas de memória em torno de Antônio Conselheiro e Canudos. In: III encontro baiano de estudos em Cultura. Disponível em: http://www3.ufrb.edu.br/ebecult/wp-content/uploads/2012/04/A-guerra-do-fim-do-mundo-chega-a-o-Brasil-interpretac%C3%83%C3%9Fo%C3%83%C3%89es-e-disputas-dememo%C3%83%C3%85ria-em-torno-de-Anto%C3%83%C3%87nio-Conselheiro-e-Canudos.pdf >. Acesso em: 27 jul 2016. , dando voz aos vários atores envolvidos.

Contudo, o livro de Llosa foi duramente criticado pelos historiadores marxistas brasileiros. Edmundo Moniz diz que a literatura não lhe dava liberdades para o que considera a adulteração de fatos centrais da história, sobretudo na importância dada ao elemento monarquista dos canudenses. Llosa responde ironicamente que a obra científica de Moniz [ Guerra Social em Canudos] é mais novelesca do que sua novela, com a caracterização do Conselheiro como um Lênin do Sertão 32 32 GUIMARÃES LEITE, Leonardo. A guerra do fim do mundo chega ao Brasil: interpretações e disputas de memória em torno de Antônio Conselheiro e Canudos. In: III encontro baiano de estudos em Cultura. Disponível em: http://www3.ufrb.edu.br/ebecult/wp-content/uploads/2012/04/A-guerra-do-fim-do-mundo-chega-a-o-Brasil-interpretac%C3%83%C3%9Fo%C3%83%C3%89es-e-disputas-dememo%C3%83%C3%85ria-em-torno-de-Anto%C3%83%C3%87nio-Conselheiro-e-Canudos.pdf >. Acesso em: 27 jul 2016. Tentando situar Canudos na linha das utopias (proto)socialistas, Edmundo Moniz chegaria a dizer: “[...] que Antônio Conselheiro teria buscado na Utopia (1516?) de Thomas More o modelo teórico para seu projeto social. Essa afirmativa polêmica tem suscitado a indignação de alguns historiadores. Em uma das entrevistas que aquele professor (hoje falecido) concedeu a este pesquisador, quando interpelado sobre o assunto, Moniz destacou que, ao tempo de Antônio Conselheiro, o grande clássico do pensamento utópico, escrito originalmente em latim, já fora traduzido para o francês; que o beato-peregrino havia estudado esses dois idiomas na sua infância em Quixeramobim; que, tendo sido o autor da Utopia canonizado, era muito provável que a mesma fosse acessível ao pregador sertanejo, entre os textos sagrados existentes nas prelazias por onde peregrinou e, finalmente, que o demiurgo do sertão, em suas prédicas, refere-se, textualmente, ao pensador inglês, ao incluí-lo entre os "varões sábios e prudentes", cujo destino "era encher as religiões, povoar os desertos, deixar as riquezas e desprezar o mundo" (MONIZ, 1987, p.100)” MARTINS, Paulo Emílio Matos. Canudos: organização, poder e o processo de institucionalização de um modelo de governança comunitária. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro , v. 5, n. 4, p. 5, Dec. 2007 . Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-39512007000400005&lng=en&nrm=iso >. Acesso em: 29 abr. 2017. .

Sem adentrar no mérito artístico/historiográfico da discussão, a polêmica serve para alertar sobre leituras sociais que reduzem os sentidos em jogo para adequá-la a um esquema teórico prévio. Assim como os contemporâneos de Euclides leram Canudos como um atraso a ser vencido pela modernização republicana, também soa redutora sua releitura proto-socialista.

Mesmo a tese mais sofisticada de que Canudos teria sido desarmada por uma “revolução democrática burguesa”, que realizasse a reforma agrária, é questionável. Talvez a criação de uma classe de pequenos proprietários interferisse num dos principais fatores da formação de Canudos. Talvez não. Em todo caso, isso não explica o tipo de integração desenvolvido em Canudos, que não era o de pequenos proprietários, tampouco era um socialismo.

Talvez estivesse se expressando em Canudos justamente uma sociabilidade alternativa à proprietária, que não poderia ser redirecionada para esse arranjo da França do século XVIII. Talvez, ainda, isso não representasse um evento da escatologia comunista, uma necessidade histórica em curso, mas apenas uma possibilidade observável em outros lugares e momentos da história, e muito observável na cultura sertaneja, onde até hoje são fortes as criações compartilhadas, o compáscuo e etc 33 33 “Esta solidariedade de esforços evidencia-se melhor na vaquejada, trabalho consistindo essencialmente no reunir, e discriminar depois, os gados de diferentes fazendas convizinhas que por ali vivem em comum, de mistura, em um compáscuo único e enorme, sem cercas e sem valos”. CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 103. . Como observa Paulo Emílio Matos Martins:

Resumindo, o modelo de trabalho cooperativo de ajuda mútua, originário do meio rural e presente, como vimos, nos três vetores de formação cultural de nosso povo, sincretizaria-se, nos sertões brasileiros, nas formas regionais do adjunto ou adjutório cearense (experiência social do, também trágico, episódio do Caldeirão), nas arrelias da Paraíba, nas faxinas do Rio Grande do Norte, nas tapagens (fechamento de um braço do rio para pesca coletiva), nas juntas pernambucanas, no batalhão ou adjunto, na traição ou roubo e nos bois-roubados (essas duas últimas denominações devidas ao sentido de surpresa que esses modelos de ajuda mútua assumem), largamente empregados na região da caatinga, conforme Caldeira (1956). Em outras palavras, são esses os traços ideológicos que processaram a semiose do referente estudo na comunidade conselheirista, a qual se desenvolveria com a prática disseminada do modelo mutualista de produção, o que equivale dizer: Canudos foi um grande mutirão e Antônio Conselheiro seu organizador e gestor 34 34 MARTINS, Paulo Emílio Matos. Canudos: organização, poder e o processo de institucionalização de um modelo de governança comunitária. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro , v. 5, n. 4, p. 05, Dec. 2007 . Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-39512007000400005&lng=en&nrm=iso >. Acesso em: 29 abr. 2017. .

Por sinal, já havia várias comunidades desse tipo bem antes de Canudos e depois dela, como a Pedra do Reino, no ano de 1830, em São José do Belmonte/PE e Caldeirão da Santa Cruz do Deserto, no ano de 1937, no Crato/CE. Isto desprende essa forma de vida da defesa do monarquismo. Pelo mesmo motivo, a desprende de ser apenas uma contraposição ao republicanismo, que não era um problema à época.

Contudo, respeitadas todas essas particularidades, chama atenção aqui uma característica, sufocada por muitos esquemas teóricos, mas que o comum pode relacionar com outras experiências: em Canudos não havia lógica proprietária estrita, não havia uma comunhão de tudo o tempo todo, só que havia um pôr em comum, uma atividade contínua de coprodução (para dizer no léxico de Dardot e Laval). O trabalho tinha mais a ver com as relações vivas entre as pessoas, com a interação de suas capacidades e necessidades, do que com produção de mais-valor e acumulação. Havia também uma carnavalização do mundo (para dizer com Bakthin 35 35 Além dessa associação que fazemos via Negri e Hardt (que se apropriam da carnavalização de Mikhail Bakhtin em NEGRI, Antonio; HARDT, Michael. Multidão: guerra e democracia na era do Império. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2012, p. 273), vale conferir a aproximação direta entre o livro de Vargas LLosa e a carnavalização de Bakhtin: BARBOSA DE OLIVEIRA, Daniela. A Guerra do Fim do Mundo de Mario Vargas Llosa apresenta a Carnavalização de Canudos. In: Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH. São Paulo, julho 2011. Disponível em: http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1300888303_ARQUIVO_TextoAnpuh.pdf . Acesso em: 01 mai 2017. , via Negri e Hardt), em que os marginalizados assumiam as funções de prestígio, ex-inimigos se ajudavam, o sertão virava mar e o mar virava sertão (Cunha e Lllosa nos fazem saber de tudo isso ao contar a arregimentação dos canudenses, sobretudo por personagens como o Beatinho, o Leão de Natuba, as mulheres do hospital, os cangaceiros da “Guarda Católica” e etc...).

Não se pode ignorar que toda essa articulação multitudinária não se processa de uma maneira orgânica, ela é constitutivamente cheia de contradições violentas, de uma verdadeira fissão das subjetividades e seus afetos. Havia violências absurdas dos canudenses com os outros e entre si 36 36 Segundo Euclides da Cunha, a justiça lá era administrada violentamente pelos “valentões” que se juntavam ao arraial. Havia uma cadeia, punindo-se com penas graves aqueles que faltassem às rezas ou que ingerissem bebida alcóolica. Além disso, relata: “Em dilatado raio em torno de Canudos, talavam-se fazendas, saqueavam-se lugarejos, conquistavam-se cidades! No Bom Conselho, uma horda atrevida, depois de se apossar da vila, pô-la em estado de sítio, dispersou as autoridades, a começar pelo juiz da comarca e, como entreato hilariante na razzia escandalosa, torturou o escrivão dos casamentos que se viu em palpos de aranhas para impedir que os crentes sarcásticos lhe abrissem, tosquiando-o, uma coroa larga, que lhe justificasse o invadir as atribuições sagradas do vigário” (CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. 162-164). Também referindo alguns problemas sociais de Canudos: MARTINS, Paulo Emílio Matos. Canudos: organização, poder e o processo de institucionalização de um modelo de governança comunitária. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro , v. 5, n. 4, p. 8-9, Dec. 2007 . Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S167939512007000400005&lng=en&nrm=iso >. Acesso em: 29 abr. 2017. . Contudo, uma pergunta resiste: por que Canudos? Por que assim? Mesmo com todos os transtornos, a comunidade se mantinha unida, a partir de dentro, de seus próprios laços biopolíticos, com as características que levantamos. Por quê?

Sob tais advertências, exploremos as trilhas abertas.

5. Pensando Canudos a partir do comum, com Negri e Cocco

Uma diferença que o referencial dos Common Studies tem a oferecer para a análise do caso é o anti-dogmatismo, um olhar para a imanência contínua das relações sociais e para a construção de sentidos a partir de baixo.

Nesse sentido, Antonio Negri e Giuseppe Cocco referem-se a Canudos, rapidamente mas com grande importância, em Glob(Al): biopoder e lutas em uma América Latina Globalizada 37 37 NEGRI, Antonio; COCCO, Giuseppe. Glob(Al): biopoder e lutas em uma América Latina Globalizada. Tradução de Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Record, 2005. .

Constatam a vontade, à época, de se forjar um povo para o Brasil 38 38 NEGRI, Antonio; COCCO, Giuseppe. Glob(Al): biopoder e lutas em uma América Latina Globalizada. Tradução de Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Record, 2005. p. 146-147. . Euclides da Cunha o busca longamente, e Os Sertões mostra sua reviravolta, das teses da degeneração dos sertanejos à celebração de sua força e resistência. Aqui é preciso romper com qualquer condescendência, para observar como o racismo colonial, o científico-positivista, o nazifascista, e até o “mito da democracia racial” foram achando lugar numa certa gestão racial, na medida necessária à manutenção do (bio)Poder da época. A recepção do mestiço tem um efeito domesticador de uma nova classe cidadã para a República.

De sua parte, Negri e Hardt tentam celebrar a mestiçagem como potência constituinte, como produção biopolítica de sujeitos em eterna recomposição identitária.

Desse esforço, assim como da continuidade das revoltas dos escravos e, em seguida e sobretudo, da mestiçagem (não mais simples mestiçagem da carne, mas aquela que se construiu através do trabalho, através da miséria e da pobreza combatidas lado a lado), surge a constituição de um novo terreno de recomposição a partir de baixo e de uma possibilidade material de democracia 39 39 NEGRI, Antonio; COCCO, Giuseppe. Glob(Al): biopoder e lutas em uma América Latina Globalizada. Tradução de Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Record, 2005. p. 201. .

E, por aí, chegam num diagnóstico surpreendente: “Canudos venceu”!

Na América Latina, como em alguns outros países do Terceiro Mundo, existe uma situação que permite que uma espécie de antimodernidade se expresse sob formas que a pós-modernidade pode acolher como perspectiva eficaz – bem, este é o tema da libertação dos escravos e dos servos. A antimodernidade que o pós-moderno pode recuperar como programa é aquela da “marcha da liberdade”, da libertação dos escravos e dos servos. A “comuna” de Canudos, ordenada (exterminada) em nome do progresso durante a “guerra do fim do mundo”, reaparece hoje em toda sua potente antecipação como alternativa irredutível à modernidade. Dentro dela encontra-se uma outra tensão, que se pode definir como cosmopolita: ela atravessa o mundo em que vivemos e nos ensina a urgência de libertar todos aqueles que o biopoder restringe nas correntes de seu comando. Como dissemos, na história brasileira, há um magnífico paradigma desse domínio continental europeu, continuado e eficientemente transfigurado por governos autóctones e burgueses herdados do século XIX. Ele consiste em mostrar-nos como a potência do êxodo de Canudos venceu, no final de contas, os projetos do colonialismo branco (fosse ele de origem europeia ou brasileira). A potência da mestiçagem biopolítica enfrenta a gestão dos fluxos por parte do biopoder. Diferente de tudo que aconteceu na América do Norte, a multidão que troca entre a África e o Novo Continente criou sobrevida na derrota – e, mantendo forte o espírito de rebelião, constitui a forma viva do desenvolvimento. Assim, um primeiro novo elemento ontológico está na base da respiração política da multidão latino-americana e configura-se na construção de uma mestiçagem potente que liberta sua ascendência (de um ponto de vista histórico) de qualquer condição eurocêntrica, burguesa e capitalista [...] 40 40 NEGRI, Antonio; COCCO, Giuseppe. Glob(Al): biopoder e lutas em uma América Latina Globalizada. Tradução de Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Record, 2005. p. 199-200. .

É importante não nos perdermos na estilização. Outras vezes já se declarou que Canudos venceu, uma “vitória moral”, por combater um adversário muito mais poderoso, por resistir até o fim, até a sua completa destruição. Coco e Negri avançam em outro sentido: Canudos mostra a própria ontologia da resistência. Ela não é só o vazio de autoridade, a falta da revolução burguesa ou comunista, a carestia; qualificada no “aqui e agora”, ela traz sua própria riqueza e positividade, que faz sentir seus efeitos até mesmo na narrativa oficial do vencedor.

Mesmo com a repressão militar, Canudos conformou biopoliticamente a República. A mestiçagem da carne e das instituições se impôs como condição de dominação, e a narrativa do Brasil oficial teve que se se recompor muito para encobrir essas manifestações.

Podemos fazer carga nessa leitura com a perspectiva mais “institucional” de Dardot-Laval. Nota-se aqui a articulação de uma determinada forma comunitária, uma cooperação produtiva e normativa.

Outros pensadores já vêm chamando atenção para o fenômeno organizacional diferenciado que foi Canudos, de certa maneira, convergindo com o que trabalhamos aqui. No diagnóstico de Paulo Emílio Matos Martins, tal sociedade parecia conhecer...

[...] os três níveis clássicos de estruturação do poder dos sistemas sociais complexos, isto é, o estratégico ou institucional, o tático ou gerencial e o operacional, e, na sua dimensão departamental, um já considerável grau de especialização/funcionalização na distribuição das tarefas de gestão da vida comunitária” 41 41 MARTINS, Paulo Emílio Matos. Canudos: organização, poder e o processo de institucionalização de um modelo de governança comunitária. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro , v. 5, n. 4, p. 12, Dec. 2007 . Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-39512007000400005&lng=en&nrm=iso >. Acesso em: 29 abr. 2017. .

Martins destaca a “práxis do modelo produtivo mutualista” e o “sistema colegiado-participativo de processo decisório” de Canudos. Para conciliar essas características com sua sustentação nos mesmos laços de compadrio dos coronéis, cunha a expressão “coronelismo pelo avesso”.

Talvez o Comum venha agregar em nível político-filosófico a esse diagnóstico, colocando experiências particulares como essa num sentido mais amplo de práxis instituintes — sem, contudo, achatá-las sob o peso de alguma dogmática de esquerda ou de direita.

6. Repercussões institucionais: pensando a crise do estado brasileiro a partir de Canudos

Em A guerra do fim do mundo, de Llosa, o caráter autoritário da modernização do Estado brasileiro é muito bem descrito pelo escritor peruano, ao demonstrar alguns traços marcantes de uma das maiores tragédias ocorridas após a proclamação da República, que foi a guerra de Canudos. Um movimento mal compreendido, formado por pessoas que viviam à margem da sociedade e que sofriam cotidianamente com a seca e com a violência, ora do policial (os volantes), ora do banditismo local (o cangaço e os jagunços a serviço do latifúndio), é duramente sufocado pelo Exército brasileiro. A partir dessa tragédia, o romance retrata alguns elementos fundamentais na organização da jovem República e na implementação de um projeto autoritário de construção da nação, percebidos no idealismo militar do Coronel Moreira Cesar e, também, na presença do poder tradicional e personalista de personagens como o “Barão de Canabrava” (personagem de Vargas Llosa inspirado no Barão de Jeremoabo 42 42 “O romance de Llosa preserva o esquema temporal presente em Os sertões. Os sucessos das expedições militares são narrados com certa fidelidade ao relato de Euclides. É a inclusão de personagens fictícios e a troca de nomes de alguns personagens históricos – como o barão de Canabrava, protótipo do barão de Jeremoabo – que demonstram a operação de desconstrução do livro vingador [...]”NOVAIS FILHO, Joaquim Antônio. A reconstrução da memória de canudos no romance realista-fantástico. In: Anais do IV Encontro Estadual de História - ANPUH-BA História: Sujeitos, Saberes e Práticas. Vitória da Conquista, 2008. p. 3. Disponível em: http://www.uesb.br/anpuhba/anais_eletronicos/Joaquim%20Antonio%20de%20Novais%20Filho.pdf . Acesso em: 01 mai 2015. ), líder dos monarquistas, e de Epaminondas Gonçalves, principal representante do partido republicano. Se no primeiro caso temos um representante do projeto positivista de uma ditadura militar – tanto que Moreira Cesar foi um grande aliado de Floriano Peixoto –, os dois últimos personagens representam o velho estilo com que as elites brasileiras sempre procuram sequestrar a agenda política, ao tratar os assuntos públicos como questões pertencentes à esfera doméstica. Pois foi nesse sentido que o Barão e Epaminondas Gonçalves, antigos adversários políticos, organizaram a “nova” ordem política na Bahia durante o conflito com Canudos. Num diálogo imaginado por Vargas Llosa, diria o Barão, “[...] É hora de fazer as pazes, Epaminondas. Esqueça as divergências jacobinas [...]. Assuma o governo e defendamos juntos, nesta hecatombe, a ordem civil” 43 43 VARGAS LLOSA, Mario. A guerra no fim do mundo. Tradução de Paulina Wach Ari Roitiman. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010. p. 378. .

A predominância desse modelo personalista e tradicional de dominação política, somado com a atividade constante do Exército nos assuntos e nas disputas políticas – já que, após o fim do Império, esta instituição foi elevada a uma espécie de poder moderador entre os partidos –, explicam os fundamentos autoritários da construção do Estado nacional brasileiro. Sua organização está baseada na marginalização e repressão de setores significativos da sociedade, que sempre são impedidos de participarem efetivamente dos debates e das discussões que influenciam as principais decisões políticas. É uma maneira de excluir a sociedade civil de qualquer participação mais destacada dentro do sistema político. Assim, essa concepção autoritária de modernização do Estado segue o mesmo sentido do que foi propugnado por autores importantes do pensamento político brasileiro, como são os casos de Oliveira Viana e Francisco Campos. Ambos depositavam toda sua confiança numa espécie de Estado demiurgo que, ao se sobrepor à sociedade, seria o único responsável pela construção da nação. Ou seja, a recepção de padrões mais modernos de organização social, presentes em países pertencentes ao centro do capitalismo, não deveria vir acompanhada de reformas democráticas.

Essa situação ajuda a compreender como se dá a construção da cidadania no Brasil. O caráter estatalista da afirmação histórica dos direitos fundamentais, bem observado por José Murilo de Carvalho, faz com que ela seja percebida muito mais como concessão do Estado, do que propriamente como uma conquista política alcançada por meio das lutas sociais 44 44 CARVALHO, José Murilo. Cidadania no Brasil. O longo Caminho. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. . Nessa perspectiva, para analisar a experiência brasileira Murilo de Carvalho inverte a leitura que T. H. Marshall fez sobre a afirmação da cidadania na Inglaterra. De acordo com este autor, a afirmação dos direitos e a construção da cidadania no contexto inglês teria seguido o seguinte sentido: a) no século XVIII primeiramente teria absorvido os direitos civis, fruto das revoluções liberais contra o despotismo monárquico, já que nesse momento setores oriundos da burguesia buscavam uma maior proteção em relação às intervenções indevidas do Leviatã na vida dos indivíduos; b) mais tarde, no século XIX, teria assimilado os direitos políticos, a partir do fortalecimento do movimento sindical e da ampliação da participação política dos trabalhadores por meio do Partido Trabalhista; c) por fim, já no século XX, a ampliação da participação no processo político fez com que os trabalhadores ingleses alcançassem o reconhecimento dos direitos sociais 45 45 MARSHALL, Thomas Humphrey. Cidadania, classe social e status. Rio de Janeiro: Zahar, 1967. . Assim, a estrutura oferecida por Marshall apresenta a cidadania a partir da existência simultânea desses três tipos de direitos, que, no caso, correspondem respectivamente à limitação do poder político e à defesa dos direitos individuais; à participação das pessoas na ordem política da comunidade; e à participação do conjunto da comunidade na riqueza produzida pela mesma.

Ao se apoiar no modelo introduzido por Marshall, a análise de Murilo de Carvalho joga luz na problemática construção da cidadania em um país marcado pela modernização autoritária. De acordo com ele, o Brasil primeiramente teria recepcionado alguns direitos sociais em plena Ditadura Vargas, como foi o caso do reconhecimento dos direitos trabalhistas; depois, o surgimento dos direitos políticos, em momentos marcados por grave instabilidade institucional, fez com que a participação política ficasse marcada por um grave déficit democrático; por fim, a dificuldade em fazer com que os direitos civis alcancem maior eficácia perante o Estado sempre foi um enorme problema para a sociedade brasileira, principalmente para os setores marginalizados que sofrem com a violência policial em seu cotidiano 46 46 CARVALHO, José Murilo. Cidadania no Brasil. O longo Caminho. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. . Certamente isso tem dificultado a construção da cidadania enquanto mecanismo de inclusão social do conjunto da comunidade e favorecido a presença de subintegrados e sobreintegrados na sociedade brasileira 47 47 NEVES, Marcelo. Entre Têmis e Leviatã: uma relação difícil. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008. .

Isso corrobora a análise que Florestan Fernandes faz sobre a ausência de um caráter democrático na revolução burguesa brasileira, que, após romper com o estatuto colonial, não consegue superar diversos aspectos presentes na dominação senhorial e acaba por gerar um modelo dependente de desenvolvimento capitalista 48 48 FERNANDES, Florestan; MARTINS, José de Souza. A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica. 5. ed. São Paulo: Globo, 2006. . De acordo com ele, o peso da escravidão e do poder exercido pela casa-grande atravessa o processo de independência e, por meio de novas roupagens, não menos violentas e segregacionistas que aquelas que estavam presentes no Brasil colônia, continuam a deixar de fora uma camada significativa da população brasileira, formada majoritariamente por negros e pobres que não têm acesso aos direitos de cidadania.

A permanência de formas tradicionais de dominação numa ordem social que, em tese, deveria representar um momento de ruptura com a estrutura política anterior, também é apresentado por outros nomes do pensamento social brasileiro, como é o caso de Raymundo Faoro, em seu Os donos do poder49 49 FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. 5. ed. São Paulo: Biblioteca Azul, 2012. . O seu longo ensaio, que começa na Revolução de Avis, em Portugal, e depois atravessa todo o período colonial e o Império, até chegar à República e terminar em 1930, na ditadura Vargas, é uma tese que demonstra a longa permanência de uma dominação tradicional no Brasil. Por meio de um estamento patrimonialista que se coloca acima das classes sociais e de instituições políticas instrumentalizadas por pessoas que se arrogam na condição de donos do poder. Ou seja, os assuntos do Estado são vistos como questões pertencentes à esfera privada, causando a deturpação da ordem constitucional. Nesse sentido, a interpretação de Faoro toma como traço dominante da história do Brasil a tutela autoritária da sociedade pelo Estado. Dessa forma, o Estado brasileiro é visto como uma instituição política dominada por um estamento patrimonialista, capaz de se amoldar a todos os momentos de transição e perpetuar uma dominação onde o exercício do poder não é considerado como uma função pública, mas simplesmente como objeto de apropriação por interesses meramente privados.

Nesse sentido, depois da incursão por Canudos devemos fazer o caminho de volta e nos perguntar o que o arraial baiano tem a agregar às discussões contemporâneas sobre a crise do Estado. Sintetizando as preocupações com esta figura, no tempo e no espaço, Bolzan de Morais nos lembra:

[...] esta instituição jurídico-política (o Estado) tem como uma de suas referências a história. É uma instituição “histórica”. Tem origem, um desenrolar e...um fim(?), sem que isso possa, por óbvio, ser entendido maniqueisticamente ou que se esteja, aqui, adotando uma perspectiva da história como um desenrolar “evolutivo” e sequencial de fatos e acontecimentos. O que se quer demarcar com isso é o caráter “não natural” desta instituição, o seu sentido instrumental e, correlatamente, contingencial. Há, também, que se ter presente que, de outro lado, esta é, também, uma instituição “geográfica”, seja por suas origens, o que nos leva a ter presente seu fator colonial(ista), seja por sua pretensão à universalidade, seja, por fim, à sua demarcação geográfica, como territorialidade o que também serve como delimitador da potência estatal – soberania -, tanto quanto à sua superioridade interna, quanto na sua igualdade externa. Ou seja, havemos de reconhecer que o Estado não esteve sempre no “entre nós”, sequer está presente em todos os “recantos” do planeta Terra, apesar do “sucesso” e da força atrativa que esta instituição carrega consigo 50 50 BOLZAN DE MORAIS, Jose Luis. A importância de se compreender o Estado e suas circunstâncias.... No prelo, 2016. .

Mas como pensar nessa forma de vida comunitária de Canudos num contexto de complexidade e globalização?

Nos exemplos de Dardot e Laval sobre o Comum, há também a limitação dessas experiências quase de “clã”. Sua solução é pensar a articulação local subindo até o nível de uma federação dos comuns, o que Negri maldiz como “associativismo” 51 51 NEGRI, Antonio. Comum, entre Marx e Proudhon. UniNômade Brasil , 21 jul. 2014. Disponível em: http://uninomade.net/tenda/comum-entre-marx-e-proudhon/ . Acesso em: 30 jul. 2016. . De sua parte, Negri e Hardt não se arriscam muito propositivamente sobre o Comum, deixando-o à experiência concreta multitudinária.

Contudo, se o associativismo pode despotenciar o Comum, a falta de incubadoras pode levar à dispersão dessas potências, como se têm visto nos vários exemplos celebrados como ciclo de lutas globais.

Certamente, Canudos não daria uma fórmula pronta para o que fazer hoje. Na sua própria época, passava longe de uma sociedade ideal. Mas uma lição que deixa, tanto na via Dardot-Laval quanto na Negri-Hardt, é a necessidade de olhar de baixo para cima, de voltar às bases na práxis instituinte. Isso segue sendo verdade em sociedades complexas e globalizadas.

Mesmo soluções teóricas elegantes e sofisticadas, concebidas nesses cenários, são forçadas a questionar radicalmente seus pressupostos. Nesse sentido, retomemos a tragédia dos commons, para ver a crítica que fazem Dardot-Laval.

O século XXI começa marcado por várias crises sociais, sobretudo no que se refere ao arranjo das instituições. A radicalização das formas modernas de convivência e produção, com a potencialização do capitalismo pelas novas tecnologias, pode cumprir uma antiga profecia: o esgotamento dos recursos naturais por conta de demandas geradas pelo próprio sistema. Esta tragédia anunciada, a grande crise, já não pode ser contornada pela simples alternância (ou combinação) entre Estado e Mercado. Nela não há mais economia para remediar, mas colapso da própria sociedade. Garret Hardin pergunta: Qual o sentido de apelar à “consciência social” dos agentes econômicos para que diminuam o ritmo produtivo diante da escassez de recursos, quando deles se espera justamente a busca individual pelo lucro? Condenaríamos quem não lutasse pelo máximo de “pirão” diante da “farinha pouca”. Mesmo que isso acabasse com a farinha de uma vez por todas.

A abordagem de viés econômico aos common studies, na linha de Elianore Ostrom, veria uma saída criativa: incentivos institucionais aos comportamentos cooperativos para a preservação desses recursos. A rigor, trata-se de sofisticar as sanções estatais já existentes, tanto na sua versão punitiva quanto premial. Ocorre que isto pode não ser o suficiente para barrar o avanço de determinados agentes aventureiros. Além de aumentar os custos com fiscalização, a tributação, a administração pública, e, com mais burocracia, mais desafios democráticos, mais dificuldades de participação popular, de representação política e etc. Enfim, termina não se superando o dilema de Hardin, voltando o desafio da auto-organização de uma gestão racional coletiva. Apesar de Ostrom romper com os postulados econômicos neoclássicos, Dardot e Larval a criticam por não chegar a colocar o comum como o princípio geral de reorganização da sociedade. Ela não teria vislumbrado isso justamente pelo tipo de racionalidade a que se apega: “segun Ostrom, son los indivíduos egoístas racionales los que crean los mercados, apelan al Estado o construyen los comunes para responder mejor a situaciones distintas” 52 52 DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. Común: ensayo sobre la revolución em el siglo XXI. Tradução de Alfonso Diez. Paris: Gediza, 2014. p. 177. ( DARDOT; LAVAL, 2014 ) . Poder-se ia dizer que sua gestão racional coletiva não passa de racionalidades individuais agregadas. Assim, sua opção pela gestão dos common goods ainda parte de um indivíduo egoísta, que apenas inclui a possibilidade de ações coordenadas como meio de maximização dos seus próprios resultados. Além disso, “permanece prisionera del postulado según el cual la forma y el marco de la producción de los bienes debem depender de las cualidades intrínsecas de los próprios bienes” 53 53 DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. Común: ensayo sobre la revolución em el siglo XXI. Tradução de Alfonso Diez. Paris: Gediza, 2014. p. 178. . Haveria os common goods e os não common por natureza. Costurando essas duas pontas: trata-se de uma racionalidade moderna, dependente de um sujeito que domina um objeto.

A saída que Dardot-Larval vislumbram não estaria restrita à Teoria dos Jogos, a um sujeito que apenas inclui outros sujeitos no cálculo. Haveria de se discutir os próprios pressupostos que transformam a sociedade no Dilema do Prisioneiro: “Lo común no se decreta desde el exterior, ni es resultado de um agregado de decisiones individuales tomadas aisladamente, sino que depende em realidade de um processo social que tiene su lógica própria”.

No impulso que recebem de Antonio Negri e Michael Hardt, vai ser incontornável falar de outra subjetividade política. E de outra relação com as coisas além da lógica proprietária, seja ela pública ou privada. Ou, pelo menos, de um público que não é estatal e de um privado que não é individual. Essas outras lógicas sociais teriam sido encobertas pelas instituições modernas, que se acham naturalizadas, como se tratassem do único mundo possível. Daí o recurso de Dardot-Larval a desencavar outros sentidos de “comum” em outros limiares epistemológicos, sem cair no mito do comunismo primitivo, como se houvesse um comum originário, essencial, a ser resgatado. Houve diferentes arranjos que não este que temos hoje. Há a possibilidade e a necessidade de outro arranjo que não este, a tal “revolução no século XXI”.

Talvez Negri-Hardt se contentassem com favorecer esse comum, identificar suas condições e cultivá-las, sem que se pudesse conduzi-las ativamente por novas vias institucionais. Dardot-Larval parecem ousar mais, arrisca-se dizer: desnaturalizar este arranjo e relembrar outros pode trazer novas perspectivas sobre a emergência do comum, para se reorganizar a sociedade segundo esse “pôr em comum”. Em todo caso, sem um olhar de baixo para cima não há jeito. O sertão já o provou.

Mais de um século depois de Canudos, as políticas de assentamento e de irrigação continuam tendo problemas por trazerem projetos externos, desenhados numa prancheta, muitas vezes insensíveis às necessidades e aos desejos dessa multidão sertaneja. A gestão comunitária nem sempre faz sentido para o Estado ou para o Mercado. A vontade de estar juntos ocupando um determinado lugar, colaborando e vivendo de uma determinada maneira, muitas vezes passa ao largo das conveniências administrativas ou do lucro. E isto é uma força real, palpável, capaz levar as pessoas a se arriscarem no meio do nada, edificarem cidades inteiras sem ajuda, mesmo à revelia dos Poderes Constituídos, e resistir à sua repressão violenta.

7. Considerações finais

O Direito do Comum traz recursos reflexivos que desafiam dogmatismos sociais, tanto os reacionários quanto os revolucionários. O olhar para a gestão comunitária como uma atividade posta em comum, a dimensão afetiva do trabalho, o investimento de sentido nas redes colaborativas, tudo isso evita as armadilhas de se impor às movimentações sociais juízos segundo uma escala exterior de razão, como a que representou Canudos como seita fanática ou rebeldia primitiva.

Os exemplos da luta campesina contra o “cercamento”, dados por Dardot e Laval, são importantes para desnaturalizar os direitos fundiários, violentamente construídos e impostos aos pobres com a mediação normalizadora dos juristas. Os contra-exemplos que dão à teoria marxista desnaturalizam também os mitos do comum originário, mostrando os riscos da acumulação da propriedade usufundada, para além do rentismo imobiliário.

Tudo isso adverte contra a apropriação da movimentação, por uma teoria, por uma vanguarda, pelos juristas, por uma instituição formatada a partir de fora. Negri e Hardt sinalizarão no sentido de perceber a anomalia que brota nesse mundo, cultivá-la e deixá-la frutificar. Dardot e Laval talvez sejam mais otimistas quanto à possibilidade de conduzir ativamente a mudança por entre as vias institucionais, embora dependam de um alto nível de associativismo para costurar o comum desde baixo, subindo até o nível das federações de comuns, sem perder a característica genuína da coprodução normativa.

Contudo, o exemplo de Canudos é encorajador. A vontade de estar juntos ocupando um determinado lugar, colaborando e vivendo de uma determinada maneira, se mostra como uma força real, palpável, capaz levar as pessoas a se arriscarem no meio do nada, edificarem cidades inteiras sem ajuda, mesmo à revelia dos Poderes Constituídos, e resistir à sua repressão violenta.

Não se podem esquecer todas as outras dimensões de Canudos, sua complexidade religiosa e cultural, que são elementos centrais do elã canudense. Além disso, mesmo enfocando a análise na sua gestão comunitária, não se podem esquecer as suas dificuldades internas, suas ambiguidades, violências e disfuncionalidades.

Em todo caso, uma pergunta ainda resiste: por que Canudos? Por que assim? Mesmo com todos os transtornos, a comunidade se mantinha unida, a partir de dentro, de seus próprios laços biopolíticos, com as características que levantamos. Por quê?

Como resultado desta pesquisa, conclui-se que analisar Canudos a partir do Direito do Comum permite o descobrimento de traços invisibilizados no seu arranjo sócio-institucional: não foi só a falta de Estado que produziu Canudos. Isso ainda seria reproduzir a narrativa determinista que muitos tentaram lhe impor. Não foi pura causalidade que a edificou, mas uma movimentação social capaz de “constituir” sentido próprio e um arranjo institucional alternativo, baseado numa gestão comunitária. E, mesmo com todos os seus problemas e ambiguidades, o arraial de Canudos teve força suficiente para mudar o projeto republicano, passando-se a tentar incluir potenciais insurgentes em posições controláveis, ao invés de pagar o preço de combatê-los. Da inferiorização da mestiçagem passa-se ao mito da democracia racial. E da crítica aos mitos, crescem as demandas por uma democracia efetiva. Afinal, Canudos mostra como os avanços democráticos não surgem de concessões espontâneas das elites, mas como conquistas de lutas históricas.

No vocabulário do Comum: Canudos não é só o vazio de autoridade, a falta da revolução burguesa ou comunista, a carestia; qualificada no “aqui e agora”, Canudos traz sua própria riqueza e positividade, sua potência constituinte. Negri e Cocco dirão até que Canudos venceu, na sua mestiçagem da carne e das instituições, na sua conformação biopolítica do projeto homogeinizador dos republicanos.

Nesse sentido, um retorno às bases da articulação da multidão, à práxis instituinte, ao local que atravessa o global, é incontornável. Mesmo teorias concebidas para dar conta desses grandes players são forçadas a voltar aos pressupostos das relações entre pessoas e coisas, à raiz da lógica proprietária e das subjetividades políticas legadas pela modernidade.

  • 1
    DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. Común: ensayo sobre la revolución em el siglo XXI. Tradução de Alfonso Diez. Paris: Gediza, 2014. . Común: ensayo sobre la revolución em el siglo XXI. Tradução de Alfonso Diez. Paris: Gediza, 2014.
  • 2
    Para uma análise de como a organização autoritária do Estado brasileiro serviu como um sério obstáculo à construção da cidadania, ver: CARVALHO, José Murilo. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2014.
  • 3
    Essa situação foi observada por Marcos Nobre em seu livro Imobilismo em movimento , ao utilizar um novo conceito para compreender o modus operandi do sistema político brasileiro. Segundo ele, após a redemocratização o sistema passou a operar de forma autônoma em relação à sociedade, buscando arrefecer os conflitos sociais e as disputas políticas que ocorrem naturalmente numa democracia. Esse fenômeno foi denominado por Nobre como “peemedebismo”. Nesse ambiente dominado pelo peemedebismo, as pautas reivindicatórias de setores marginalizados da sociedade brasileira não encontram espaço no Parlamento. São sufocadas prematuramente por grupos de pressão que alcançam maioria entre os parlamentares, e impedem que as minorias consigam debater suas posições. Ou seja, a redemocratização não foi capaz de abrir por completo as instituições políticas brasileiras, pois manteve um grau significativo de blindagem do sistema político em relação à sociedade. Apesar desse conceito fazer referência ao PMDB, Nobre destaca que o fenômeno do peemedebismo não se reduz somente a esta organização partidária, mas é utilizado em sua obra para explicar o funcionamento do sistema político brasileiro. (NOBRE, Marcos NOBRE, Marcos. Imobilismo em Movimento: da abertura democrática ao governo Dilma. São Paulo. Companhia das Letras, 2013. . Imobilismo em Movimento: da abertura democrática ao governo Dilma. São Paulo. Companhia das Letras, 2013.)
  • 4
    IANNI, Otavio IANNI, Otavio. Pensamento Social no Brasil. Bauru, SP: Edusc, 2004. . Pensamento Social no Brasil. Bauru, SP: Edusc, 2004. pp. 120-121.
  • 5
    FUKUYAMA, Francis FUKUYAMA, Francis. O fim da história e o último homem. Rio de Janeiro: Rocco, 1992. . O fim da história e o último homem. Rio de Janeiro: Rocco, 1992.
  • 6
    BOLZAN DE MORAIS, José Luiz BOLZAN DE MORAIS, José Luiz. O Estado e seus limites: reflexões iniciais sobre a profanação do estado social e a dessacralização da modernidade. In: Francisco José R. de O. Neto; Jacinto N. de M. Coutinho; Orides Mezzaroba; Paulo de T. Brandão (Orgs.) Constituição e Estado Social: Os obstáculos à concretização da Constituição. Coimbra: Coimbra 2008. . O Estado e seus limites: reflexões iniciais sobre a profanação do estado social e a dessacralização da modernidade. In: Francisco José R. de O. Neto; Jacinto N. de M. Coutinho; Orides Mezzaroba; Paulo de T. Brandão (Orgs.) Constituição e Estado Social: Os obstáculos à concretização da Constituição. Coimbra: Coimbra 2008.
  • 7
    BOLZAN DE MORAIS, José Luiz ______. REPE&C 20 – O Estado de Direito não sobrevive com sujeitos mediatizados. Empório do Direito. Florianópolis, 23 mar. 2016. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/repec-20-o-estado-de-direito-nao-sobrevive-com-sujeitos-mediatizados/. Acesso em: 01 mai. 2017.
    http://emporiododireito.com.br/repec-20...
    . REPE&C 20 – O Estado de Direito não sobrevive com sujeitos mediatizados. Empório do Direito. Florianópolis, 23 mar. 2016. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/repec-20-o-estado-de-direito-nao-sobrevive-com-sujeitos-mediatizados/ . Acesso em: 01 mai. 2017.
  • 8
    Em especial, referimo-nos ao vocabulário de Jürgen Habermas, conjugando expressões de Max Weber, Karl Max e tantos outros. HABERMAS, Jürgen HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade. Tradução de Flavio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. v. I e II. . Direito e Democracia: entre facticidade e validade. Tradução de Flavio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. v. I e II.
  • 9
    Fazemos essa referência, sem pretensão de aprofundar este diálogo aqui, por julgá-la representativa de uma concepção “reformista”.
  • 10
    NEGRI, Antonio; HARDT, Michael ______; HARDT, Michael. Multidão: guerra e democracia na era do Império. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2012. . Multidão: guerra e democracia na era do Império. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2012.
  • 11
    NEGRI, Antonio; HARDT, Michael ______; HARDT, Michael. Multidão: guerra e democracia na era do Império. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2012. . Multidão: guerra e democracia na era do Império. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2012, p 268.
  • 12
    DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. Común: ensayo sobre la revolución em el siglo XXI. Tradução de Alfonso Diez. Paris: Gediza, 2014. Común: ensayo sobre la revolución em el siglo XXI. Tradução de Alfonso Diez. Paris: Gediza, 2014. p. 303.
  • 13
    HARDIN, Garret HARDIN, Garret. The Tragedy of the Commons. Science: Vol. 162, Issue 3859, 13 Dec 1968. pp. 1243-1248. Disponível em: http://science.sciencemag.org/content/162/3859/1243. Acesso em 29 jul. 2016.
    http://science.sciencemag.org/content/1...
    . The Tragedy of the Commons. Science: Vol. 162, Issue 3859, 13 Dec 1968. pp. 1243-1248. Disponível em: http://science.sciencemag.org/content/162/3859/1243 . Acesso em 29 jul. 2016.
  • 14
    Ricamente registrada em: CUNHA, Euclides da CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. . Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. Para sua fortuna crítica e notas sobre as várias alterações que o autor fez no texto, veja-se: CUNHA, Euclides ______. Os Sertões: edição crítica. Edição elaborada por Walnice Nogueira Galvão et al . São Paulo: Sesc/Ubu, 2016. . Os Sertões: edição crítica. Edição elaborada por Walnice Nogueira Galvão et al. São Paulo: Sesc/Ubu, 2016.
  • 15
    VARGAS LLOSA, Mario VARGAS LLOSA, Mario. A guerra no fim do mundo. Tradução de Paulina Wach Ari Roitiman. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010. . A guerra no fim do mundo. Tradução de Paulina Wach Ari Roitiman. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010.
  • 16
    CUNHA, Euclides da CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. . Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 160.
  • 17
    CUNHA, Euclides da CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. . Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 165.
  • 18
    MARTINS, Paulo Emílio Matos MARTINS, Paulo Emílio Matos. Canudos: organização, poder e o processo de institucionalização de um modelo de governança comunitária. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro, v. 5, n. 4, p. 01-16, Dec. 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S167939512007000400005&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 29 abr. 2017.
    http://www.scielo.br/scielo.php?script=...
    . Canudos: organização, poder e o processo de institucionalização de um modelo de governança comunitária. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro , v. 5, n. 4, p. 08, Dec. 2007. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-39512007000400005&lng=en&nrm=iso >. Acesso em: 29 abr. 2017.
  • 19
    CUNHA, Euclides da CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. . Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 160, 165, 264.
  • 20
    Sobre o modelo historiográfico do próprio Euclides da Cunha e como ele se relaciona na história da disciplina, veja-se: BERNUCCI, Leopoldo M BERNUCCI, Leopoldo M. Pressupostos historiográficos para uma leitura de Os Sertões. REVISTA USP, São Paulo, n.54, p. 6-15, junho/agosto, 2002. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/35140/37867. Acesso em: 01 mai. 2017.
    http://www.revistas.usp.br/revusp/artic...
    . Pressupostos historiográficos para uma leitura de Os Sertões. REVISTA USP, São Paulo, n.54, p. 6-15, junho/agosto, 2002. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/35140/37867 . Acesso em: 01 mai. 2017. Destaca-se o esforço de Euclides para se libertar do chamado modelo de crônica que imperava aqui, segundo Bernucci refere na p. 15: “No plano argumentativo, para dar a Os Sertões vida historiográfica, o autor trabalha o argumento da história de Canudos de modo que seja percebida como tragédia. Arma o seu argumento em torno da hecatombe final e imprime-lhe um crescendo que anima essa destruição. A força explicativa, ele irá buscá-la nas ciências e nas correntes filosóficas de sua época, fortemente caracterizadas pelas análises de causa e efeito dos fatos, o que, inevitavelmente, confere ao livro um esquema mecanicista, porquanto também este cria um sentido metafórico para a narração: as análises históricas e sociológicas são feitas com base em repetições ou casos já presenciados ao longo das lutas político-religiosas do mundo ocidental”. Por sinal, Os Sertões divide-se em três grandes partes: A Terra, O Homem e A Luta, em que tenta articular deterministicamente esses três elementos na sua narrativa.
  • 21
    Chamava-se assim por causa de uma planta local, que crescia na forma de canudos.
  • 22
    CUNHA, Euclides da CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. . Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 119.
  • 23
    Enfatizando a dialética entre o litoral e o sertão na narrativa de Euclides da Cunha: MARTINS, Paulo Emílio Matos. Canudos: organização, poder e o processo de institucionalização de um modelo de governança comunitária. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro , v. 5, n. 4, p. 2, Dec. 2007 . Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-39512007000400005&lng=en&nrm=iso >. Acesso em: 29 abr. 2017.
  • 24
    O próprio Euclides era correspondente de um jornal e cita várias reportagens ao longo de sua obra. Registra as relações entre os jornais e a opinião pública durante a campanha, desde reportagens moldando a opinião pública contra Canudos (CUNHA, Euclides da CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. . Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 298 e 301), até o empastelamento de jornais monarquistas depois da derrota de uma expedição (p. 119). Para um consagrado “corpus das reportagens sobre a guerra de Canudos”, subdivididas em galhofeiras, sensacionalistas e ponderadas, veja-se: GALVÃO, Walnice Nogueira GALVÃO, Walnice Nogueira. No calor da hora: a guerra de canudos nos jornais, 4ª expedição. 2. ed. São Paulo: Ática, 1977. . No calor da hora: a guerra de canudos nos jornais, 4ª expedição. 2. ed. São Paulo: Ática, 1977.
  • 25
    Caso do controverso massacre de Caldeirão da Santa Cruz do Deserto em 1937. FACÓ, Rui FACÓ, Rui. Cangaceiros e fanáticos: gênese e lutas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1963. . Cangaceiros e fanáticos: gênese e lutas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1963. p. 192.
  • 26
    CUNHA, Euclides da CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. . Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 189.
  • 27
    CUNHA, Euclides da CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. . Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979.
  • 28
    Embora não deixe de ser racista, mesmo em suas tentativas de elogio aos sertanejos. CUNHA, Euclides da CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. . Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 89-103.
  • 29
    Metáfora sugerida por Lenio Luiz Streck em: STRECK, Lenio Luiz; ROSENFIELD, Denis; PAIXÃO, Cristiano STRECK, Lenio Luiz; ROSENFIELD, Denis; PAIXÃO, Cristiano. Direito & Literatura: A guerra do fim do mundo, do escritor peruano Mario Vargas Llosa. São Leopoldo: TV Unisinos, 27 jun. 2014. Programa de TV. (27 min). Disponível em: < https://vimeo.com/32530111>. Acesso em: 26 jun 2016.
    https://vimeo.com/32530111 ...
    . Direito & Literatura: A guerra do fim do mundo, do escritor peruano Mario Vargas Llosa. São Leopoldo: TV Unisinos, 27 jun. 2014. Programa de TV. (27 min). Disponível em: < https://vimeo.com/32530111 >. Acesso em: 26 jun 2016.
  • 30
    GUIMARÃES LEITE, Leonardo GUIMARÃES LEITE, Leonardo. A guerra do fim do mundo chega ao Brasil: interpretações e disputas de memória em torno de Antônio Conselheiro e Canudos. In: III encontro baiano de estudos em Cultura. Disponível em: http://www3.ufrb.edu.br/ebecult/wp-content/uploads/2012/04/A-guerra-do-fim-do-mundo-chega-a-o-Brasil-interpretac%C3%83% C3%9Fo%C3%83%C3%89es-e-disputas-de-memo%C3%83%C3%85ria-em-torno-de-Anto% C3%83%C3%87nio-Conselheiro-e-Canudos.pdf>. Acesso em: 27 jul 2016.
    http://www3.ufrb.edu.br/ebecult/wp-cont...
    . A guerra do fim do mundo chega ao Brasil: interpretações e disputas de memória em torno de Antônio Conselheiro e Canudos. In: III encontro baiano de estudos em Cultura. Disponível em: http://www3.ufrb.edu.br/ebecult/wp-content/uploads/2012/04/A-guerra-do-fim-do-mundo-chega-a-o-Brasil-interpretac%C3%83%C3%9Fo%C3%83%C3%89es-e-disputas-dememo%C3%83%C3%85ria-em-torno-de-Anto%C3%83%C3%87nio-Conselheiro-e-Canudos.pdf >. Acesso em: 27 jul 2016.
  • 31
    GUIMARÃES LEITE, Leonardo GUIMARÃES LEITE, Leonardo. A guerra do fim do mundo chega ao Brasil: interpretações e disputas de memória em torno de Antônio Conselheiro e Canudos. In: III encontro baiano de estudos em Cultura. Disponível em: http://www3.ufrb.edu.br/ebecult/wp-content/uploads/2012/04/A-guerra-do-fim-do-mundo-chega-a-o-Brasil-interpretac%C3%83% C3%9Fo%C3%83%C3%89es-e-disputas-de-memo%C3%83%C3%85ria-em-torno-de-Anto% C3%83%C3%87nio-Conselheiro-e-Canudos.pdf>. Acesso em: 27 jul 2016.
    http://www3.ufrb.edu.br/ebecult/wp-cont...
    . A guerra do fim do mundo chega ao Brasil: interpretações e disputas de memória em torno de Antônio Conselheiro e Canudos. In: III encontro baiano de estudos em Cultura. Disponível em: http://www3.ufrb.edu.br/ebecult/wp-content/uploads/2012/04/A-guerra-do-fim-do-mundo-chega-a-o-Brasil-interpretac%C3%83%C3%9Fo%C3%83%C3%89es-e-disputas-dememo%C3%83%C3%85ria-em-torno-de-Anto%C3%83%C3%87nio-Conselheiro-e-Canudos.pdf >. Acesso em: 27 jul 2016.
  • 32
    GUIMARÃES LEITE, Leonardo GUIMARÃES LEITE, Leonardo. A guerra do fim do mundo chega ao Brasil: interpretações e disputas de memória em torno de Antônio Conselheiro e Canudos. In: III encontro baiano de estudos em Cultura. Disponível em: http://www3.ufrb.edu.br/ebecult/wp-content/uploads/2012/04/A-guerra-do-fim-do-mundo-chega-a-o-Brasil-interpretac%C3%83% C3%9Fo%C3%83%C3%89es-e-disputas-de-memo%C3%83%C3%85ria-em-torno-de-Anto% C3%83%C3%87nio-Conselheiro-e-Canudos.pdf>. Acesso em: 27 jul 2016.
    http://www3.ufrb.edu.br/ebecult/wp-cont...
    . A guerra do fim do mundo chega ao Brasil: interpretações e disputas de memória em torno de Antônio Conselheiro e Canudos. In: III encontro baiano de estudos em Cultura. Disponível em: http://www3.ufrb.edu.br/ebecult/wp-content/uploads/2012/04/A-guerra-do-fim-do-mundo-chega-a-o-Brasil-interpretac%C3%83%C3%9Fo%C3%83%C3%89es-e-disputas-dememo%C3%83%C3%85ria-em-torno-de-Anto%C3%83%C3%87nio-Conselheiro-e-Canudos.pdf >. Acesso em: 27 jul 2016. Tentando situar Canudos na linha das utopias (proto)socialistas, Edmundo Moniz chegaria a dizer: “[...] que Antônio Conselheiro teria buscado na Utopia (1516?) de Thomas More o modelo teórico para seu projeto social. Essa afirmativa polêmica tem suscitado a indignação de alguns historiadores. Em uma das entrevistas que aquele professor (hoje falecido) concedeu a este pesquisador, quando interpelado sobre o assunto, Moniz destacou que, ao tempo de Antônio Conselheiro, o grande clássico do pensamento utópico, escrito originalmente em latim, já fora traduzido para o francês; que o beato-peregrino havia estudado esses dois idiomas na sua infância em Quixeramobim; que, tendo sido o autor da Utopia canonizado, era muito provável que a mesma fosse acessível ao pregador sertanejo, entre os textos sagrados existentes nas prelazias por onde peregrinou e, finalmente, que o demiurgo do sertão, em suas prédicas, refere-se, textualmente, ao pensador inglês, ao incluí-lo entre os "varões sábios e prudentes", cujo destino "era encher as religiões, povoar os desertos, deixar as riquezas e desprezar o mundo" (MONIZ, 1987, p.100)” MARTINS, Paulo Emílio Matos. Canudos: organização, poder e o processo de institucionalização de um modelo de governança comunitária. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro , v. 5, n. 4, p. 5, Dec. 2007 . Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-39512007000400005&lng=en&nrm=iso >. Acesso em: 29 abr. 2017.
  • 33
    “Esta solidariedade de esforços evidencia-se melhor na vaquejada, trabalho consistindo essencialmente no reunir, e discriminar depois, os gados de diferentes fazendas convizinhas que por ali vivem em comum, de mistura, em um compáscuo único e enorme, sem cercas e sem valos”. CUNHA, Euclides da CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. . Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 103.
  • 34
    MARTINS, Paulo Emílio Matos. Canudos: organização, poder e o processo de institucionalização de um modelo de governança comunitária. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro , v. 5, n. 4, p. 05, Dec. 2007 . Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-39512007000400005&lng=en&nrm=iso >. Acesso em: 29 abr. 2017.
  • 35
    Além dessa associação que fazemos via Negri e Hardt (que se apropriam da carnavalização de Mikhail Bakhtin em NEGRI, Antonio; HARDT, Michael. Multidão: guerra e democracia na era do Império. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2012, p. 273), vale conferir a aproximação direta entre o livro de Vargas LLosa e a carnavalização de Bakhtin: BARBOSA DE OLIVEIRA, Daniela BARBOSA DE OLIVEIRA, Daniela. A Guerra do Fim do Mundo de Mario Vargas Llosa apresenta a Carnavalização de Canudos. In: Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH. São Paulo, julho 2011. Disponível em: http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1300888303_ARQUIVO_TextoAnpu h.pdf. Acesso em: 01 mai 2017.
    http://www.snh2011.anpuh.org/resources/...
    . A Guerra do Fim do Mundo de Mario Vargas Llosa apresenta a Carnavalização de Canudos. In: Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH. São Paulo, julho 2011. Disponível em: http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1300888303_ARQUIVO_TextoAnpuh.pdf . Acesso em: 01 mai 2017.
  • 36
    Segundo Euclides da Cunha, a justiça lá era administrada violentamente pelos “valentões” que se juntavam ao arraial. Havia uma cadeia, punindo-se com penas graves aqueles que faltassem às rezas ou que ingerissem bebida alcóolica. Além disso, relata: “Em dilatado raio em torno de Canudos, talavam-se fazendas, saqueavam-se lugarejos, conquistavam-se cidades! No Bom Conselho, uma horda atrevida, depois de se apossar da vila, pô-la em estado de sítio, dispersou as autoridades, a começar pelo juiz da comarca e, como entreato hilariante na razzia escandalosa, torturou o escrivão dos casamentos que se viu em palpos de aranhas para impedir que os crentes sarcásticos lhe abrissem, tosquiando-o, uma coroa larga, que lhe justificasse o invadir as atribuições sagradas do vigário” (CUNHA, Euclides da CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. . Os sertões: campanha de canudos. São Paulo: Abril Cultural, 1979. 162-164). Também referindo alguns problemas sociais de Canudos: MARTINS, Paulo Emílio Matos. Canudos: organização, poder e o processo de institucionalização de um modelo de governança comunitária. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro , v. 5, n. 4, p. 8-9, Dec. 2007 . Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S167939512007000400005&lng=en&nrm=iso >. Acesso em: 29 abr. 2017.
  • 37
    NEGRI, Antonio; COCCO, Giuseppe ______; COCCO, Giuseppe. Glob(Al): biopoder e lutas em uma América Latina Globalizada. Tradução de Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Record, 2005. . Glob(Al): biopoder e lutas em uma América Latina Globalizada. Tradução de Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Record, 2005.
  • 38
    NEGRI, Antonio; COCCO, Giuseppe ______; COCCO, Giuseppe. Glob(Al): biopoder e lutas em uma América Latina Globalizada. Tradução de Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Record, 2005. . Glob(Al): biopoder e lutas em uma América Latina Globalizada. Tradução de Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Record, 2005. p. 146-147.
  • 39
    NEGRI, Antonio; COCCO, Giuseppe ______; COCCO, Giuseppe. Glob(Al): biopoder e lutas em uma América Latina Globalizada. Tradução de Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Record, 2005. . Glob(Al): biopoder e lutas em uma América Latina Globalizada. Tradução de Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Record, 2005. p. 201.
  • 40
    NEGRI, Antonio; COCCO, Giuseppe ______; COCCO, Giuseppe. Glob(Al): biopoder e lutas em uma América Latina Globalizada. Tradução de Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Record, 2005. . Glob(Al): biopoder e lutas em uma América Latina Globalizada. Tradução de Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Record, 2005. p. 199-200.
  • 41
    MARTINS, Paulo Emílio Matos. Canudos: organização, poder e o processo de institucionalização de um modelo de governança comunitária. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro , v. 5, n. 4, p. 12, Dec. 2007 . Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-39512007000400005&lng=en&nrm=iso >. Acesso em: 29 abr. 2017.
  • 42
    “O romance de Llosa preserva o esquema temporal presente em Os sertões. Os sucessos das expedições militares são narrados com certa fidelidade ao relato de Euclides. É a inclusão de personagens fictícios e a troca de nomes de alguns personagens históricos – como o barão de Canabrava, protótipo do barão de Jeremoabo – que demonstram a operação de desconstrução do livro vingador [...]”NOVAIS FILHO, Joaquim Antônio NOVAIS FILHO, Joaquim Antônio. A reconstrução da memória de canudos no romance realista-fantástico. In: Anais do IV Encontro Estadual de História - ANPUH-BA História: Sujeitos, Saberes E Práticas . Vitória da Conquista, 2008. Disponível em: http://www.uesb.br/anpuhba/anais_eletronicos/Joaquim%20Antonio%20de%20Novais%20Filho.pdf. Acesso em: 01 mai 2015.
    http://www.uesb.br/anpuhba/anais_eletro...
    . A reconstrução da memória de canudos no romance realista-fantástico. In: Anais do IV Encontro Estadual de História - ANPUH-BA História: Sujeitos, Saberes e Práticas. Vitória da Conquista, 2008. p. 3. Disponível em: http://www.uesb.br/anpuhba/anais_eletronicos/Joaquim%20Antonio%20de%20Novais%20Filho.pdf . Acesso em: 01 mai 2015.
  • 43
    VARGAS LLOSA, Mario. A guerra no fim do mundo. Tradução de Paulina Wach Ari Roitiman. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010. p. 378.
  • 44
    CARVALHO, José Murilo CARVALHO, José Murilo. Cidadania no Brasil. O longo Caminho. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. . Cidadania no Brasil. O longo Caminho. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.
  • 45
    MARSHALL, Thomas Humphrey MARSHALL, Thomas Humphrey. Cidadania, classe social e status. Rio de Janeiro: Zahar, 1967. . Cidadania, classe social e status. Rio de Janeiro: Zahar, 1967.
  • 46
    CARVALHO, José Murilo CARVALHO, José Murilo. Cidadania no Brasil. O longo Caminho. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. . Cidadania no Brasil. O longo Caminho. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.
  • 47
    NEVES, Marcelo NEVES, Marcelo. Entre Têmis e Leviatã: uma relação difícil. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008. . Entre Têmis e Leviatã: uma relação difícil. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008.
  • 48
    FERNANDES, Florestan; MARTINS, José de Souza FERNANDES, Florestan; MARTINS, José de Souza. A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica. 5. ed. São Paulo: Globo, 2006. . A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica. 5. ed. São Paulo: Globo, 2006.
  • 49
    FAORO, Raymundo FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. 5. ed. São Paulo: Biblioteca Azul, 2012. . Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. 5. ed. São Paulo: Biblioteca Azul, 2012.
  • 50
    BOLZAN DE MORAIS, Jose Luis ______. A importância de se compreender o Estado e suas circunstâncias.... No prelo, 2016. . A importância de se compreender o Estado e suas circunstâncias.... No prelo, 2016.
  • 51
    NEGRI, Antonio NEGRI, Antonio. Comum, entre Marx e Proudhon. UniNômade Brasil, 21 jul. 2014. Disponível em: http://uninomade.net/tenda/comum-entre-marx-e-proudhon/. Acesso em: 30 jul. 2016.
    http://uninomade.net/tenda/comum-entre-...
    . Comum, entre Marx e Proudhon. UniNômade Brasil , 21 jul. 2014. Disponível em: http://uninomade.net/tenda/comum-entre-marx-e-proudhon/ . Acesso em: 30 jul. 2016.
  • 52
    DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. Común: ensayo sobre la revolución em el siglo XXI. Tradução de Alfonso Diez. Paris: Gediza, 2014. p. 177. ( DARDOT; LAVAL, 2014 DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. Común: ensayo sobre la revolución em el siglo XXI. Tradução de Alfonso Diez. Paris: Gediza, 2014. )
  • 53
    DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. Común: ensayo sobre la revolución em el siglo XXI. Tradução de Alfonso Diez. Paris: Gediza, 2014. p. 178.

Referências bibliográficas

  • BARBOSA DE OLIVEIRA, Daniela. A Guerra do Fim do Mundo de Mario Vargas Llosa apresenta a Carnavalização de Canudos. In: Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH. São Paulo, julho 2011. Disponível em: http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1300888303_ARQUIVO_TextoAnpu h.pdf. Acesso em: 01 mai 2017.
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  • BERNUCCI, Leopoldo M. Pressupostos historiográficos para uma leitura de Os Sertões. REVISTA USP, São Paulo, n.54, p. 6-15, junho/agosto, 2002. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/35140/37867. Acesso em: 01 mai. 2017.
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  • CARVALHO, José Murilo. Cidadania no Brasil. O longo Caminho. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.
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  • ______. Os Sertões: edição crítica. Edição elaborada por Walnice Nogueira Galvão et al . São Paulo: Sesc/Ubu, 2016.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2018
  • Data do Fascículo
    Jun 2018

Histórico

  • Recebido
    16 Dez 2016
  • Aceito
    16 Maio 2017
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