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O fluxo do sistema de justiça como técnica de pesquisa no campo da segurança pública

The flux of the justice system as a technique for empirical research in the field of public security

Resumo

O objetivo deste artigo é revisar a literatura sobre a utilização da técnica de pesquisa conhecida como análise fluxo do Sistema de Justiça Criminal (SJC). Para tanto, procuramos analisar as principais pesquisas publicadas nos últimos anos, que fizeram uso dessa metodologia. Detectamos que os estudos selecionados tinham como objetivo tanto a seletividade relacionada aos acusados e ocorrências pelo SJC como o transcurso do tempo e consequente morosidade processual. Nos últimos anos os estudos vêm se dirigindo à tramitação das investigações, por meio do inquérito policial, e a tramitação dos processos criminais. Notamos que tanto a seletividade quanto o tempo/morosidade foram temas que, em sua grande maioria, foram analisados com base em pesquisas que usaram metodologias predominantemente quantitativas. Há, assim, extenso campo para a realização de pesquisas que contemplem técnicas qualitativas e quantitativas.

Palavras-chave:
Fluxo do Sistema de Justiça; Sistema de justiça criminal; Seletividade; Tempo; Pesquisas quantitativas e qualitativas

Abstract

The objective of this article is to review the literature about the use of a research technique named as the analysis of the flux of the criminal justice system. In order to do that, we analyzed the most relevant published researches that used this methodology. We identified that the selected papers had focused both on the selectivity based on cases and defendants by the criminal justice system and the time spent on the criminal lawsuits. We noticed that the selectivity and the time were topics that, mostly, were analyzed based on this quantitative technique. Recently, we have observed new researches focused on the criminal investigation ( inquérito policial) and on criminal procedures. There is, therefore, a large research Field to be explored by qualitative and quantitative researches.

Keywords:
Flux of the System of Justice; Criminal Justice System; Selectivity; Time; Quantitative and qualitative researches

Introdução

A técnica de pesquisa descrita na literatura como análise do fluxo do sistema de justiça, bastante utilizada nos últimos anos, tem sua origem nas décadas de 1960 e 1970, especialmente no campo de estudos empíricos do direito ( VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , p. 18-30). A utilização da técnica de análise de fluxo do SJC deve ser compreendida em um quadro mais amplo que remete aos estudos pioneiros da sociologia das organizações, da sociologia jurídica e da sociologia do comportamento desviado. O surgimento das primeiras organizações na sociedade industrial foi objeto de análise de autores clássicos como Marx, Weber e Durkheim. A obra de Frederick Winslow Taylor, influente sobretudo durante a chamada segunda revolução industrial (1910/1920), tornou-se um marco da teoria organizacional ( BERNOUX, 1985 BERNOUX, Philippe. La sociologie des organisations. Paris: Éditions du Seuil, 1985. , p. 37-68). A sociologia das organizações consolida-se a partir de raízes weberianas e é responsável pelo impulso dado à sociologia do direito a partir do final da década de 1950 e início da década de 1960 ( WEBER, 1993 WEBER, Max. Economía y Sociedad: Esbozo de sociología comprensiva. Décima reimpresión. Trad.: José Medina Echavarría, Juan Roura Farella et alli. Madrid: Fondo de Cultura Económica, 1993. , p. 701-706). As categorias dessa disciplina foram posteriormente incorporadas para análise dos tribunais ( SANTOS, 2000 SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 7ª ed. São Paulo: Cortez, 2000. , p. 164). No campo da sociologia do crime e do comportamento desviado, a obra seminal “Outsiders” foi um marco dos estudos sobre os processos de criminalização. Na teoria relacional do desvio, o interesse volta-se para a atuação dos diferentes atores e agências que participam do processo de definição das práticas como desviadas ( BECKER, 2008 BECKER, Howard S. Outsiders: estudos de sociologia do desvio. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. ).

No campo da pesquisa empírica no direito, nas décadas de 1960 e 1970, os estudos sobre a justiça criminal se concentraram na produção das sentenças judiciais, notadamente nos fatores que influenciavam o resultado do julgamento, a definição do tipo e quantidade de pena aplicada. Esse tipo de estudo, muito comum nos Estados Unidos, tinha como foco a crítica à neutralidade do julgador, denunciando a influência de determinantes extralegais (como preconceitos de raça e classe) na decisão judicial (HAGAN, 1974 apud VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , p. 18) 1 1 O contexto acadêmico da época foi propício para a consolidação do objeto de estudo. A abordagem de Becker foi influente entre sociólogos e juristas. Na década de 1970, pioneiros da criminologia crítica (ciências sociais e direito) sugeriram que a proposta de Becker fosse reinterpretada a partir de bases marxistas. O caráter ideológico e seletivo do direito penal foi uma das frentes de análise e orientou pesquisas empíricas nas décadas seguintes ( ANITUA, 2008 ; MACHADO, 2012 ). . Posteriormente, o interesse de pesquisa foi redirecionado para as fases de investigação e do processo penal, momento em que parte das pesquisas se voltaram para a produção decisória do sistema sob perspectiva longitudinal, dando início ao que hoje se conhece como análise de fluxo (HAGAN, 1975 apud VARGAS; MAGALHÃES; RIBIEIRO, 2010, p. 46; BURKE; TURK, 1975 apud VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , p. 30, 2006, p. 10).

No Brasil, grande parte das pesquisas que se utilizam da técnica do fluxo do sistema de justiça criminal são realizadas a partir de base documental estatística e visam compreender o funcionamento do sistema de justiça criminal, com o foco direcionado sobre a forma como as organizações processam as demandas sociais e participam na construção dos dados sobre a criminalidade oficial ( BATITUCCI; CRUZ; SILVA, 2006 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira; CRUZ, Marcus Vinícius Gonçalves da; SILVA, Breno Inácio da. Fluxo do crime de homicídio no sistema de justiça criminal de Minas Gerais. In: 30º Encontro Anual da Anpocs. Caxambu/MG, 24 a 28 out. 2006. , p. 2; COELHO, 1986, p. 61-62; COSTA, 2015 COSTA, Arthur Trindade Maranhão. A (in)efetividade da justiça criminal brasileira: uma análise do fluxo de justiça dos homicídios no Distrito Federal. Civitas, Porto Alegre, v. 15, n. 1, p. 11-26, jan-mar. 2015. , p. 12; COSTA; MACHADO; ZACKSESKI, 2015 COSTA, Arthur Trindade Maranhão; MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina Maria. A investigação e a persecução penal da corrupção e dos Delitos econômicos: uma pesquisa empírica no sistema de Justiça federal. Marco legal e criminológico, modelos organizacionais e relatório de análise estatística do fluxo do sistema de justiça federal. Fórum Brasileiro de Segurança Pública. ESMPU. Escola Superior do Ministério Público da União. v. I. Brasília/DF, 2015. ; COSTA; ZACKSESKI; MACIEL, 2016 COSTA, Arthur Trindade Maranhão; ZACKSESKI, Cristina Maria; MACIEL, Welliton Caixeta. Investigação e processamento dos crimes de homicídio na Área Metropolitana de Brasília. Revista Brasileira de Segurança Pública , São Paulo, v. 10, n. 1, p. 36-54, fev-mar. 2016. , p. 37-38; MACHADO; ZACKSESKI; RAUPP, 2016a MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; RAUPP, Rene Mallet. A investigação e a persecução penal da corrupção e dos delitos econômicos: uma análise exploratória do sistema de Justiça Federa. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 118, ano 24, p. 299-329, jan-fev. 2016a. , p. 299-302; RIBEIRO; SILVA, 2010 RIBEIRO, Ludmila; SILVA, Klarissa. Fluxo do sistema de justiça criminal brasileiro: um balanço da literatura. Caderno de Segurança Pública , Rio de Janeiro, ano II, n. 1, p. 14-27, ago. 2010. , p. 15-16; RIFIOTIS; VENTURA, 2007 RIFIOTIS, Theophilus; VENTURA, Andresa Burigo. Fluxo da justiça criminal em casos de homicídios dolosos na Região Metropolitana de Florianópolis – Santa Catarina (2000–2003). In: VII Reunião de Antropologia: Desafios Antropológicos, Porto Alegre, p. 1-19, 2007. , p. 1; RIFIOTIS; VENTURA; CARDOSO, 2010 RIFIOTIS, Theophilus; VENTURA, Andressa Burigo; CARDOSO, Gabriela Ribeiro. Reflexões críticas sobre a metodologia do estudo do fluxo de justiça criminal em casos de homicídios dolosos. Revista de Antropologia, São Paulo, USP, v. 53, n. 2, p. 689-714, 2010. , p. 691-692; SAPORI, 2006 SAPORI, Luis Flávio. A justiça criminal brasileira como um sistema frouxamente articulado. In: SLAKMON, Catherine; MACHADO, Maíra Rocha; BOTTINI, Pierpaolo Cruz (Orgs.). Novas direções na governança da justiça e da segurança. Brasília-DF: Ministério da Justiça, 2006, p. 763-782. , p. 772; VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , p. 6-8, VARGAS, 2006 VARGAS, Joana Domingues. Metodologia de Tratamento do Tempo e da Morosidade Processual na Justiça Criminal. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. , p. 8, VARGAS, 2014 p. 411-412; VARGAS; RIBEIRO, 2008 VARGAS, Joana Domingues; RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes. Estudos de fluxo da Justiça Criminal: Balanço e perspectivas. In: 32º Encontro Anual da Anpocs . Caxambu/MG, 27 a 31 out. 2008. , p. 5-6; VENTURA, 2006 VENTURA, Andresa Burigo. Fluxo do funcionamento da justiça criminal para o crime de homicídio doloso na Região Metropolitana de Florianópolis em 2003. In: Revista Mosaico Social, ano 3, n.3, p. 305-319, dez. 2006. , p. 306).

A técnica, relativamente recente no Brasil, constitui-se em uma forma de se observar o crime a partir da sua reconstrução nas diferentes fases do processo penal e representa uma mudança no objeto das pesquisas sociocriminológicas, antes muito mais voltadas às causas e consequências dos comportamentos delituosos ( ANITUA, 2008 ANITUA, Gabriel Ignacio. Histórias dos pensamentos criminológicos. Trad. Sergio Lamarão. Rio de Janeiro: Revan, 2008. ; MACHADO, 2014 MACHADO, Bruno Amaral. Justiça criminal: diferenciação funcional, interações organizacionais e decisões. São Paulo: Marcial Pons, 2014. ; MACHADO, 2012 MACHADO, Bruno Amaral. Discursos criminológicos sobre o crime e o direito penal: comunicação e diferenciação funcional. Revista de Estudos Criminais, Ano X, nº 45, p. 110-116, 2012. ; MACHADO, 2015 MACHADO, Bruno Amaral. O inquérito policial e a divisão do trabalho jurídico-penal. Revista Brasileira de Segurança Pública, São Paulo, v. 9, n. 1, p. 12-33, 2015. , p. 12-33; VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , p. 19-20;).

O objetivo deste artigo é revisar a literatura sobre a utilização da técnica de pesquisa conhecida como análise fluxo do Sistema de Justiça Criminal (SJC). Para tanto, analisamos as mais relevantes pesquisas publicadas, que fizeram uso desta metodologia, a fim de classificar as principais abordagens e categorias teóricas propostas. Ao final, discutimos o potencial e limites da técnica para a abordagem organizacional. Reconhecemos que a nossa seleção não é exaustiva, mas permite amplo mapeamento que atende aos objetivos do artigo.

1. A análise do fluxo do sistema de justiça: tipologias

Na análise do SJC, usualmente, os dados são obtidos por meio dos registros oficiais da criminalidade noticiada aos órgãos de repressão e pela análise documental de inquéritos e processos judiciais, de acordo com os atos praticados pelos diferentes atores e organizações que participam da divisão do trabalho jurídico-penal 2 2 Sobre a divisão do trabalho jurídico-penal, remetemos a Machado (2014) . ( BATITUCCI; CRUZ; SILVA, 2006 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira; CRUZ, Marcus Vinícius Gonçalves da; SILVA, Breno Inácio da. Fluxo do crime de homicídio no sistema de justiça criminal de Minas Gerais. In: 30º Encontro Anual da Anpocs. Caxambu/MG, 24 a 28 out. 2006. , p. 2; RIBEIRO, 2010 RIBEIRO, Ludmila. A Produção Decisória do Sistema de Justiça Criminal para o Crime de Homicídio: Análise dos Dados do Estado de São Paulo entre 1991 e 1998. DADOS – Revista de Ciências Sociais , Rio de Janeiro, vol. 53, n. 1, p. 159-193, 2010. , p. 162; RIBEIRO; SILVA, 2010 RIBEIRO, Ludmila; SILVA, Klarissa. Fluxo do sistema de justiça criminal brasileiro: um balanço da literatura. Caderno de Segurança Pública , Rio de Janeiro, ano II, n. 1, p. 14-27, ago. 2010. , p. 16; VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , p. 6, 2014, p. 413; VARGAS; RIBEIRO, 2008 VARGAS, Joana Domingues; RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes. Estudos de fluxo da Justiça Criminal: Balanço e perspectivas. In: 32º Encontro Anual da Anpocs . Caxambu/MG, 27 a 31 out. 2008. , p. 5-6).

A forma de organizar esses dados é tradicionalmente descrita em três métodos: “longitudinal ortodoxo/prospectivo”, “longitudinal retrospectivo” e “transversal”. O primeiro é aquele que seleciona ocorrências que entraram no sistema em determinado período e as acompanha em todas as suas fases até o final, estabelecendo taxas e identificando gargalos no processamento. Embora essa seja a forma mais indicada de reconstruir o fluxo, ela demanda tempo e recursos (humanos e financeiros) para manter a pesquisa durante todo o período de processamento da ocorrência, que pode perdurar por muitos anos ( ANDRADE, 2011 ANDRADE, Rayane Maria de Lima. Da criminação à incriminação: O fluxo e o tempo do homicídio doloso no sistema de justiça criminal de Pernambuco. 2011. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011. , p. 44; COSTA, 2015 COSTA, Arthur Trindade Maranhão. A (in)efetividade da justiça criminal brasileira: uma análise do fluxo de justiça dos homicídios no Distrito Federal. Civitas, Porto Alegre, v. 15, n. 1, p. 11-26, jan-mar. 2015. , p. 13; RIBEIRO, 2009 RIBEIRO, Ludmila. O Tempo da Justiça Criminal Brasileira. Homicídios: Políticas de Prevenção e Controle. Coleção Segurança com Cidadania. Brasília, ano I, n. 3, p. 39-67, 2009. , p. 41, 2010, p. 169-170; RIBEIRO; SILVA, 2010 RIBEIRO, Ludmila; SILVA, Klarissa. Fluxo do sistema de justiça criminal brasileiro: um balanço da literatura. Caderno de Segurança Pública , Rio de Janeiro, ano II, n. 1, p. 14-27, ago. 2010. , p. 17; RIFIOTIS; VENTURA; CARDOSO, 2010 RIFIOTIS, Theophilus; VENTURA, Andressa Burigo; CARDOSO, Gabriela Ribeiro. Reflexões críticas sobre a metodologia do estudo do fluxo de justiça criminal em casos de homicídios dolosos. Revista de Antropologia, São Paulo, USP, v. 53, n. 2, p. 689-714, 2010. , p. 691; VARGAS, 2006 VARGAS, Joana Domingues. Metodologia de Tratamento do Tempo e da Morosidade Processual na Justiça Criminal. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. , p. 7-8; VARGAS; MAGALHÃES; RIBIEIRO, 2010, p. 46-48; VARGAS; RIBEIRO, 2008 VARGAS, Joana Domingues; RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes. Estudos de fluxo da Justiça Criminal: Balanço e perspectivas. In: 32º Encontro Anual da Anpocs . Caxambu/MG, 27 a 31 out. 2008. , p. 11-12).

Assim, algumas pesquisas têm adotado o método “retrospectivo”, que seleciona casos já encerrados num determinado período e recupera a sua história partindo do fim até o começo. Dessa forma, é possível superar a dificuldade relacionada ao tempo, pois todo o material de análise já se encontra nos autos do processo ( ANTUNES, 2013 ANTUNES, Gilson Macedo. O processo de construção da verdade no tribunal do júri de Recife (2009-2010). 2013. Tese (Doutorado) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2013. , p. 137; RIBEIRO, 2009 RIBEIRO, Ludmila. O Tempo da Justiça Criminal Brasileira. Homicídios: Políticas de Prevenção e Controle. Coleção Segurança com Cidadania. Brasília, ano I, n. 3, p. 39-67, 2009. , p. 41, 2010, p. 171; VENTURA, 2006 VENTURA, Andresa Burigo. Fluxo do funcionamento da justiça criminal para o crime de homicídio doloso na Região Metropolitana de Florianópolis em 2003. In: Revista Mosaico Social, ano 3, n.3, p. 305-319, dez. 2006. , p. 311). Por outro lado, essa forma de observação acaba perdendo dados importantes referentes a casos que se encerraram antes de atingir a fase final do processamento, o que poderia alterar as conclusões da pesquisa. ( VARGAS; RIBEIRO, 2008 VARGAS, Joana Domingues; RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes. Estudos de fluxo da Justiça Criminal: Balanço e perspectivas. In: 32º Encontro Anual da Anpocs . Caxambu/MG, 27 a 31 out. 2008. , p. 15; VARGAS; MAGALHÃES; RIBIEIRO, 2010, p. 65).

Para minimizar esse aspecto negativo, a análise retrospectiva costuma ser complementada com dados coletados em um recorte transversal, caracterizado pela seleção de um determinado período de tempo em que o pesquisador observa quantitativamente a produção de decisões por cada uma das organizações envolvidas na investigação e no processo penal, verificando os filtros que retém as ocorrências que não sobreviveram até a resposta definitiva ( RIBEIRO, 2010 RIBEIRO, Ludmila. A Produção Decisória do Sistema de Justiça Criminal para o Crime de Homicídio: Análise dos Dados do Estado de São Paulo entre 1991 e 1998. DADOS – Revista de Ciências Sociais , Rio de Janeiro, vol. 53, n. 1, p. 159-193, 2010. , p. 170-171; VARGAS; RIBEIRO, 2008 VARGAS, Joana Domingues; RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes. Estudos de fluxo da Justiça Criminal: Balanço e perspectivas. In: 32º Encontro Anual da Anpocs . Caxambu/MG, 27 a 31 out. 2008. , p. 15).

2. A técnica do fluxo e a abordagem organizacional

O objetivo da reconstrução do fluxo do sistema de justiça criminal é observar padrões e tendências na atuação das organizações que operam no SJC, a fim de mapear possíveis critérios de seletividade relacionados às pessoas envolvidas ou à natureza do fato, o que faz com que o processamento das demandas assuma o formato de “funil” (chamado “funil da impunidade”, metáfora que faz alusão ao grande número de ocorrências que entram no sistema e ao baixo número de sentenças que delas resulta) ( ADORNO, 2002 ADORNO, Sérgio. Crise no sistema de justiça criminal. Ciência e cultura, São Paulo, v. 54, n. 1, p. 50-51, 2002. , p. 50; ADORNO; PASINATO, 2010 ADORNO, Sérgio; PASINATO, Wânia. Violência e impunidade penal: Da criminalidade detectada à criminalidade investigada. DILEMAS: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social. v. 3, n. 7, p. 51-84, jan-fev-mar. 2010. , p. 64-65; RIBEIRO, 2010 RIBEIRO, Ludmila. A Produção Decisória do Sistema de Justiça Criminal para o Crime de Homicídio: Análise dos Dados do Estado de São Paulo entre 1991 e 1998. DADOS – Revista de Ciências Sociais , Rio de Janeiro, vol. 53, n. 1, p. 159-193, 2010. , p. 162-163; RIFIOTIS; VENTURA; CARDOSO, 2010 RIFIOTIS, Theophilus; VENTURA, Andressa Burigo; CARDOSO, Gabriela Ribeiro. Reflexões críticas sobre a metodologia do estudo do fluxo de justiça criminal em casos de homicídios dolosos. Revista de Antropologia, São Paulo, USP, v. 53, n. 2, p. 689-714, 2010. , p. 693; SILVA, 2007 SILVA, Klarissa Almeida. O Sistema de Justiça Criminal Brasileiro: discutindo fluxo, morosidade e impunidade com o Ministério Público de Minas Gerais. In: 31º. Encontro Anual da Anpocs. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007. , p. 3; VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , p. 7, VARGAS; MAGALHÃES; RIBIEIRO, 2010, p. 48; VENTURA, 2006 VENTURA, Andresa Burigo. Fluxo do funcionamento da justiça criminal para o crime de homicídio doloso na Região Metropolitana de Florianópolis em 2003. In: Revista Mosaico Social, ano 3, n.3, p. 305-319, dez. 2006. , p. 307), bem como os fatores determinantes do tempo processual ( RIBEIRO, 2010 RIBEIRO, Ludmila. A Produção Decisória do Sistema de Justiça Criminal para o Crime de Homicídio: Análise dos Dados do Estado de São Paulo entre 1991 e 1998. DADOS – Revista de Ciências Sociais , Rio de Janeiro, vol. 53, n. 1, p. 159-193, 2010. , p. 162-163; SAPORI, 2006 SAPORI, Luis Flávio. A justiça criminal brasileira como um sistema frouxamente articulado. In: SLAKMON, Catherine; MACHADO, Maíra Rocha; BOTTINI, Pierpaolo Cruz (Orgs.). Novas direções na governança da justiça e da segurança. Brasília-DF: Ministério da Justiça, 2006, p. 763-782. , p. 772; VARGAS, 2006 VARGAS, Joana Domingues. Metodologia de Tratamento do Tempo e da Morosidade Processual na Justiça Criminal. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. , p. 7, VARGAS; MAGALHÃES; RIBIEIRO, 2010, p. 45; VENTURA, 2006 VENTURA, Andresa Burigo. Fluxo do funcionamento da justiça criminal para o crime de homicídio doloso na Região Metropolitana de Florianópolis em 2003. In: Revista Mosaico Social, ano 3, n.3, p. 305-319, dez. 2006. , p. 309).

Sob esse enfoque, o pesquisador obtém os dados acerca das decisões proferidas e das pessoas processadas, o que possibilita construir indicadores sobre as taxas de esclarecimento, processamento, sentenciamento e condenação, referentes ao crime e à localidade selecionados no estudo. A construção dos dados estatísticos permite inferências sobre a duração do processo, o grau de interação entre os operadores do direito, o perfil das ocorrências, das vítimas e dos acusados ( ADORNO, 2009 ADORNO, Sérgio. Políticas públicas de segurança e justiça penal. Cadernos adenauer. Rio de Janeiro, v. 4, ano IX, p. 9-27, jan. 2009. , p. 20; COELHO, 1986, p. 68-69; RIBEIRO, 2010 RIBEIRO, Ludmila. A Produção Decisória do Sistema de Justiça Criminal para o Crime de Homicídio: Análise dos Dados do Estado de São Paulo entre 1991 e 1998. DADOS – Revista de Ciências Sociais , Rio de Janeiro, vol. 53, n. 1, p. 159-193, 2010. , p. 162-163; RIBEIRO; SILVA, 2010 RIBEIRO, Ludmila; SILVA, Klarissa. Fluxo do sistema de justiça criminal brasileiro: um balanço da literatura. Caderno de Segurança Pública , Rio de Janeiro, ano II, n. 1, p. 14-27, ago. 2010. , p. 16; RIFIOTIS; VENTURA; CARDOSO, 2010 RIFIOTIS, Theophilus; VENTURA, Andressa Burigo; CARDOSO, Gabriela Ribeiro. Reflexões críticas sobre a metodologia do estudo do fluxo de justiça criminal em casos de homicídios dolosos. Revista de Antropologia, São Paulo, USP, v. 53, n. 2, p. 689-714, 2010. , p. 695; VARGAS, 2006 VARGAS, Joana Domingues. Metodologia de Tratamento do Tempo e da Morosidade Processual na Justiça Criminal. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. , p. 8; VARGAS; RIBEIRO, 2008 VARGAS, Joana Domingues; RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes. Estudos de fluxo da Justiça Criminal: Balanço e perspectivas. In: 32º Encontro Anual da Anpocs . Caxambu/MG, 27 a 31 out. 2008. , p. 5-6).

Um pressuposto comumente adotado pelas pesquisas de fluxo é a relação de integração, coordenação ou disjunção entre as organizações que atuam no sistema de justiça criminal. Essa disjunção aparece notadamente na atuação das Polícias em relação ao Ministério Público e ao Judiciário, pois cada uma dessas organizações atua segundo lógicas próprias ( ADORNO, 1994 ADORNO, Sérgio. Cidadania e Administração da Justiça Criminal. In: DINIZ, Eli; LOPES, José Sérgio Leite; PRANDI, Reginaldo. O Brasil no rastro da crise: partidos, sindicatos, movimentos sociais, Estado e cidadania no curso dos anos 90. São Paulo: Hucitec, 1994, p. 304-327. , p. 315; ANDRADE, 2011 ANDRADE, Rayane Maria de Lima. Da criminação à incriminação: O fluxo e o tempo do homicídio doloso no sistema de justiça criminal de Pernambuco. 2011. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011. , p. 26; COELHO, 1986, p. 78-79; MACHADO, 2014 MACHADO, Bruno Amaral. Justiça criminal: diferenciação funcional, interações organizacionais e decisões. São Paulo: Marcial Pons, 2014. , p. 15-16; RIFIOTIS; VENTURA; CARDOSO, 2010 RIFIOTIS, Theophilus; VENTURA, Andressa Burigo; CARDOSO, Gabriela Ribeiro. Reflexões críticas sobre a metodologia do estudo do fluxo de justiça criminal em casos de homicídios dolosos. Revista de Antropologia, São Paulo, USP, v. 53, n. 2, p. 689-714, 2010. , p. 694; SAPORI, 2006 SAPORI, Luis Flávio. A justiça criminal brasileira como um sistema frouxamente articulado. In: SLAKMON, Catherine; MACHADO, Maíra Rocha; BOTTINI, Pierpaolo Cruz (Orgs.). Novas direções na governança da justiça e da segurança. Brasília-DF: Ministério da Justiça, 2006, p. 763-782. , p. 770-771; SILVA, 2013 SILVA, Klarissa Almeida. A Construção Social e Institucional do Homicídio: Da perícia em local de morte à sentença condenatória. 2013. Tese (Doutorado em Ciência Humanas) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013. , p. 41; VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , p. 32; VENTURA, 2006 VENTURA, Andresa Burigo. Fluxo do funcionamento da justiça criminal para o crime de homicídio doloso na Região Metropolitana de Florianópolis em 2003. In: Revista Mosaico Social, ano 3, n.3, p. 305-319, dez. 2006. , p. 308).

Premidas por diferentes realidades e contextos fáticos, as organizações criam rotinas e procedimentos internos próprios para solucionar as questões práticas que lhes são apresentadas. Parte da literatura sugere, a partir dessas premissas, que o sistema de justiça criminal se caracteriza por uma articulação frouxa entre os diferentes atores que desempenham distintas atividades organizacionais ( ADORNO, 1994 ADORNO, Sérgio. Cidadania e Administração da Justiça Criminal. In: DINIZ, Eli; LOPES, José Sérgio Leite; PRANDI, Reginaldo. O Brasil no rastro da crise: partidos, sindicatos, movimentos sociais, Estado e cidadania no curso dos anos 90. São Paulo: Hucitec, 1994, p. 304-327. , p. 317; ADORNO, 2009 ADORNO, Sérgio. Políticas públicas de segurança e justiça penal. Cadernos adenauer. Rio de Janeiro, v. 4, ano IX, p. 9-27, jan. 2009. , p. 22; ANDRADE, 2011 ANDRADE, Rayane Maria de Lima. Da criminação à incriminação: O fluxo e o tempo do homicídio doloso no sistema de justiça criminal de Pernambuco. 2011. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011. , p. 26; ANTUNES, 2013 ANTUNES, Gilson Macedo. O processo de construção da verdade no tribunal do júri de Recife (2009-2010). 2013. Tese (Doutorado) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2013. , p. 18; COELHO, 1986, p. 80; PORTO, 2015 PORTO, Maria Stela Grossi. Fluxos e dinâmicas do sistema de justiça criminal nas representações sociais dos operadores envolvidos. Revista Brasileira de Segurança Pública, São Paulo, v. 9, n. 1, p. 82-100, fev-mar. 2015. , p. 89; RUSCHEL, 2006 RUSCHEL, Aírton José. Análise do tempo dos Processos Penais de homicídio no Fórum de Justiça de Florianópolis julgados em 2004. 2006. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006. , p. 166; SAPORI, 2006 SAPORI, Luis Flávio. A justiça criminal brasileira como um sistema frouxamente articulado. In: SLAKMON, Catherine; MACHADO, Maíra Rocha; BOTTINI, Pierpaolo Cruz (Orgs.). Novas direções na governança da justiça e da segurança. Brasília-DF: Ministério da Justiça, 2006, p. 763-782. , p. 765; SILVA, 2010 SILVA, Klarissa Almeida. O papel dos tipos de homicídios dolosos na construção social da incriminação dos sujeitos pelos promotores de justiça: Belo Horizonte, processos com andamento entre 2007 e 2009. DILEMAS: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social. v. 3, n. 8, p. 101-123, abr-jun. 2010. , p. 107, 2013, p. 13; VARGAS, 2014 VARGAS, Joana Domingues. Fluxo do Sistema de justiça criminal. In: LIMA, Renato Sergio; RATTON, José Luiz; AZEVEDO, Rodrigo Ghiringhelli de. Crime, Justiça e Polícia no Brasil. São Paulo: Contexto, 2014, p. 411-426. , p. 418).

Alguns dos estudos sugerem, no caso das polícias, o que é descrito como “predisposição policial de incluir o maior número de pessoas no sistema”, prática associada ao pressuposto de que o trabalho policial será avaliado não pelos crimes que conseguiu evitar, mas pelas prisões que conseguiu fazer. Por outro lado, o ministério público e o judiciário são confrontados pela superlotação do sistema penitenciário. Por isso, a sua atuação é pautada pela gestão da escassez, o que faz com que se tornem mais exigentes quanto à prova necessária para a condenação ( ADORNO, 1994 ADORNO, Sérgio. Cidadania e Administração da Justiça Criminal. In: DINIZ, Eli; LOPES, José Sérgio Leite; PRANDI, Reginaldo. O Brasil no rastro da crise: partidos, sindicatos, movimentos sociais, Estado e cidadania no curso dos anos 90. São Paulo: Hucitec, 1994, p. 304-327. , p. 315, COELHO, 1986, p. 78-79).

Grande parte dos estudos de fluxo do sistema de justiça criminal se utiliza da análise quantitativa para categorizar o perfil das ocorrências, vítimas e acusados. Em sua maioria, a investigação sobre padrões, tendências e fatores determinantes da sobrevivência de uma ocorrência no SJC é um objetivo primordial da pesquisa, ora direcionado ao estudo do fluxo global de um tipo ou tipos específicos de crime pelo sistema, ora direcionado à observação da sobrevivência de ocorrências em pontos estratégicos do fluxo, como a transformação da ocorrência em inquérito, do inquérito em denúncia, e da denúncia em sentença. ( ADORNO, 2009 ADORNO, Sérgio. Políticas públicas de segurança e justiça penal. Cadernos adenauer. Rio de Janeiro, v. 4, ano IX, p. 9-27, jan. 2009. , p. 20; ADORNO; PASINATO, 2010 ADORNO, Sérgio; PASINATO, Wânia. Violência e impunidade penal: Da criminalidade detectada à criminalidade investigada. DILEMAS: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social. v. 3, n. 7, p. 51-84, jan-fev-mar. 2010. , p. 60-62; BATITUCCI; CRUZ; SILVA, 2006 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira; CRUZ, Marcus Vinícius Gonçalves da; SILVA, Breno Inácio da. Fluxo do crime de homicídio no sistema de justiça criminal de Minas Gerais. In: 30º Encontro Anual da Anpocs. Caxambu/MG, 24 a 28 out. 2006. , p. 4; COELHO, 1986, p. 62; COSTA, 2015 COSTA, Arthur Trindade Maranhão. A (in)efetividade da justiça criminal brasileira: uma análise do fluxo de justiça dos homicídios no Distrito Federal. Civitas, Porto Alegre, v. 15, n. 1, p. 11-26, jan-mar. 2015. , p. 12; MACHADO, 2015 MACHADO, Bruno Amaral. O inquérito policial e a divisão do trabalho jurídico-penal. Revista Brasileira de Segurança Pública, São Paulo, v. 9, n. 1, p. 12-33, 2015. , p. 12-33; MACHADO; ZACKSESKI; RAUPP, 2016a MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; RAUPP, Rene Mallet. A investigação e a persecução penal da corrupção e dos delitos econômicos: uma análise exploratória do sistema de Justiça Federa. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 118, ano 24, p. 299-329, jan-fev. 2016a. , p. 299-303; MISSE; VARGAS, 2007 MISSE, Michel; VARGAS, Joana Domingues. O fluxo do processo de incriminação no Rio de Janeiro na década de 50 e no período 1997-2001: comparação e análise. In: XIII Congresso Brasileiro de Sociologia. Recife, 2007. , p. 2; RIBEIRO, 2010 RIBEIRO, Ludmila. A Produção Decisória do Sistema de Justiça Criminal para o Crime de Homicídio: Análise dos Dados do Estado de São Paulo entre 1991 e 1998. DADOS – Revista de Ciências Sociais , Rio de Janeiro, vol. 53, n. 1, p. 159-193, 2010. , p. 162; RIFIOTIS; VENTURA, 2007 RIFIOTIS, Theophilus; VENTURA, Andresa Burigo. Fluxo da justiça criminal em casos de homicídios dolosos na Região Metropolitana de Florianópolis – Santa Catarina (2000–2003). In: VII Reunião de Antropologia: Desafios Antropológicos, Porto Alegre, p. 1-19, 2007. , p. 3; RIFIOTIS; VENTURA; CARDOSO, 2010 RIFIOTIS, Theophilus; VENTURA, Andressa Burigo; CARDOSO, Gabriela Ribeiro. Reflexões críticas sobre a metodologia do estudo do fluxo de justiça criminal em casos de homicídios dolosos. Revista de Antropologia, São Paulo, USP, v. 53, n. 2, p. 689-714, 2010. , p. 691; VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , p. 7, 2006, p. 7; VARGAS; MAGALHÃES; RIBIEIRO, 2010, p. 45).

Porém, embora tomem como ponto de partida a disjunção organizacional e procurem determinar as condições ou razões que interferem no fluxo, muitas pesquisas acabaram esbarrando nas limitações da abordagem quantitativa, que não permite uma compreensão mais ampla acerca das premissas decisórias que orientam as organizações ( MACHADO, 2014 MACHADO, Bruno Amaral. Justiça criminal: diferenciação funcional, interações organizacionais e decisões. São Paulo: Marcial Pons, 2014. ). As poucas ilações sobre as premissas decisórias não são evidenciadas por técnicas quantitativas. Não raramente, alguns pesquisadores reconhecem que o estudo do fluxo ainda carece de pesquisas direcionadas à compreensão mais ampla sobre a forma como interagem as organizações (COELHO, 1986, p. 77; COSTA, 2015 COSTA, Arthur Trindade Maranhão. A (in)efetividade da justiça criminal brasileira: uma análise do fluxo de justiça dos homicídios no Distrito Federal. Civitas, Porto Alegre, v. 15, n. 1, p. 11-26, jan-mar. 2015. , p. 16; MACHADO, 2014 MACHADO, Bruno Amaral. Justiça criminal: diferenciação funcional, interações organizacionais e decisões. São Paulo: Marcial Pons, 2014. , p. 1-41; MACHADO, 2015 MACHADO, Bruno Amaral. O inquérito policial e a divisão do trabalho jurídico-penal. Revista Brasileira de Segurança Pública, São Paulo, v. 9, n. 1, p. 12-33, 2015. , p. 12-33; RIBEIRO; SILVA, 2010 RIBEIRO, Ludmila; SILVA, Klarissa. Fluxo do sistema de justiça criminal brasileiro: um balanço da literatura. Caderno de Segurança Pública , Rio de Janeiro, ano II, n. 1, p. 14-27, ago. 2010. , p. 26; SAPORI, 2006 SAPORI, Luis Flávio. A justiça criminal brasileira como um sistema frouxamente articulado. In: SLAKMON, Catherine; MACHADO, Maíra Rocha; BOTTINI, Pierpaolo Cruz (Orgs.). Novas direções na governança da justiça e da segurança. Brasília-DF: Ministério da Justiça, 2006, p. 763-782. , p. 772; VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , p. 8, 2014, p. 422).

Essa constatação tem despertado a atenção para a necessidade de complementar o estudo do fluxo, ainda restrita a pesquisas de grande vulto, que combinam a análise quantitativa com ferramentas de observação qualitativa, como a análise documental e as abordagens etnográficas ( RIFIOTIS; VENTURA; CARDOSO, 2010 RIFIOTIS, Theophilus; VENTURA, Andressa Burigo; CARDOSO, Gabriela Ribeiro. Reflexões críticas sobre a metodologia do estudo do fluxo de justiça criminal em casos de homicídios dolosos. Revista de Antropologia, São Paulo, USP, v. 53, n. 2, p. 689-714, 2010. ), a análise de representações sociais dos atores do sistema de justiça criminal ( MACHADO, 2015 MACHADO, Bruno Amaral. O inquérito policial e a divisão do trabalho jurídico-penal. Revista Brasileira de Segurança Pública, São Paulo, v. 9, n. 1, p. 12-33, 2015. ; PORTO; MACHADO, 2015 PORTO, Maria Stela Grossi; MACHADO, Bruno Amaral. Homicídio na área metropolitana de Brasília: Representações Sociais dos Delegados de Polícia, Promotores de Justiça e Magistrados. Sociologias, Porto Alegre, ano 17, n. 40, p. 294-325, set-dez. 2015. ; PORTO, 2015 PORTO, Maria Stela Grossi. Fluxos e dinâmicas do sistema de justiça criminal nas representações sociais dos operadores envolvidos. Revista Brasileira de Segurança Pública, São Paulo, v. 9, n. 1, p. 82-100, fev-mar. 2015. ), e a análise de discurso a partir de grupos focais ( COSTA; MACHADO; ZACKSESKI, 2015 COSTA, Arthur Trindade Maranhão; MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina Maria. A investigação e a persecução penal da corrupção e dos Delitos econômicos: uma pesquisa empírica no sistema de Justiça federal. Marco legal e criminológico, modelos organizacionais e relatório de análise estatística do fluxo do sistema de justiça federal. Fórum Brasileiro de Segurança Pública. ESMPU. Escola Superior do Ministério Público da União. v. I. Brasília/DF, 2015. ; MACHADO; ZACKSESKI; RAUPP, 2016a MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; RAUPP, Rene Mallet. A investigação e a persecução penal da corrupção e dos delitos econômicos: uma análise exploratória do sistema de Justiça Federa. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 118, ano 24, p. 299-329, jan-fev. 2016a. ; MACHADO; ZACKSESKI; RAUPP 2016b MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; RAUPP, Rene Mallet. Tempos da investigação: o transcurso do inquérito policial no sistema de Justiça Federal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 124, ano 24, p. 143-181, out. 2016b. ).

Certamente, a análise de fluxo tem potencial para permitir a compreensão dos fatores determinantes da sobrevivência de determinadas ocorrências em detrimento de outras, partindo-se do pressuposto de que as premissas decisórias adotadas por cada organização que atua no sistema de justiça criminal têm grande influência no processamento subsequente ( SAPORI, 2006 SAPORI, Luis Flávio. A justiça criminal brasileira como um sistema frouxamente articulado. In: SLAKMON, Catherine; MACHADO, Maíra Rocha; BOTTINI, Pierpaolo Cruz (Orgs.). Novas direções na governança da justiça e da segurança. Brasília-DF: Ministério da Justiça, 2006, p. 763-782. , p. 771). O que supõe associar técnicas de pesquisa quantitativa e qualitativa, aptas, conjuntamente, a desvelar os critérios que norteiam a atuação das organizações no fluxo do sistema de justiça criminal.

Nos itens seguintes pretendemos sintetizar os principais achados nas pesquisas do SJC que fizeram uso da análise do fluxo, os quais podem ser divididos em dois grandes grupos de interesses de pesquisa: a seletividade de acusados e de ocorrências pelo SJC; e o tempo e a morosidade processual. Ao final, indicamos a utilização da técnica em recentes estudos sobre a prática do inquérito policial no Brasil.

3. A seletividade das organizações do SJC

A literatura aponta o estudo seminal realizado por Edmundo Campos Coelho (1986) como uns dos responsáveis pela introdução da pesquisa de fluxo no Brasil. ( COSTA, 2015 COSTA, Arthur Trindade Maranhão. A (in)efetividade da justiça criminal brasileira: uma análise do fluxo de justiça dos homicídios no Distrito Federal. Civitas, Porto Alegre, v. 15, n. 1, p. 11-26, jan-mar. 2015. , p. 12; MISSE; VARGAS, 2007 MISSE, Michel; VARGAS, Joana Domingues. O fluxo do processo de incriminação no Rio de Janeiro na década de 50 e no período 1997-2001: comparação e análise. In: XIII Congresso Brasileiro de Sociologia. Recife, 2007. , p. 3; RIBEIRO; SILVA, 2010 RIBEIRO, Ludmila; SILVA, Klarissa. Fluxo do sistema de justiça criminal brasileiro: um balanço da literatura. Caderno de Segurança Pública , Rio de Janeiro, ano II, n. 1, p. 14-27, ago. 2010. , p. 18; RIFIOTIS; VENTURA; CARDOSO, 2010 RIFIOTIS, Theophilus; VENTURA, Andressa Burigo; CARDOSO, Gabriela Ribeiro. Reflexões críticas sobre a metodologia do estudo do fluxo de justiça criminal em casos de homicídios dolosos. Revista de Antropologia, São Paulo, USP, v. 53, n. 2, p. 689-714, 2010. , p. 690; SILVA, 2007 SILVA, Klarissa Almeida. O Sistema de Justiça Criminal Brasileiro: discutindo fluxo, morosidade e impunidade com o Ministério Público de Minas Gerais. In: 31º. Encontro Anual da Anpocs. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007. , p. 1, 2013, p. 12; VARGAS, 2006 VARGAS, Joana Domingues. Metodologia de Tratamento do Tempo e da Morosidade Processual na Justiça Criminal. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. , p. 11, 2014, p. 414; VARGAS; MAGALHÃES; RIBIEIRO, 2010, p. 46; VARGAS; RIBEIRO, 2008 VARGAS, Joana Domingues; RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes. Estudos de fluxo da Justiça Criminal: Balanço e perspectivas. In: 32º Encontro Anual da Anpocs . Caxambu/MG, 27 a 31 out. 2008. , p. 16). Nessa pesquisa, a partir de dados quantitativos sobre inquéritos e processos criminais no Rio de Janeiro, entre 1942 e 1967, o autor indicou o fluxo de pessoas pelas fases do processamento de uma ocorrência, apontando a seletividade do sistema de justiça criminal, baseada no perfil do acusado (cor e nível de instrução), no tipo de ocorrência (modalidade de crime) e na interação descoordenada das organizações (polícia, ministério público e judiciário). Concluiu que, no ano de 1967, aproximadamente 16% dos inquéritos chegaram a uma condenação à pena privativa de liberdade (COELHO, 1986, p. 69). Quanto aos homicídios, embora a taxa de denúncia fosse de 87%, a taxa de condenação ficou em 54,7% dos casos (COELHO, 1986, p. 74).

Na década de 1990, estudos no campo da segurança pública evidenciaram a seletividade das organizações do sistema, focando principalmente em questões de gênero e raça das vítimas e dos agressores ( ADORNO, 1994 ADORNO, Sérgio. Cidadania e Administração da Justiça Criminal. In: DINIZ, Eli; LOPES, José Sérgio Leite; PRANDI, Reginaldo. O Brasil no rastro da crise: partidos, sindicatos, movimentos sociais, Estado e cidadania no curso dos anos 90. São Paulo: Hucitec, 1994, p. 304-327. , 1995 ADORNO, Sérgio. Discriminação racial e justiça criminal em São Paulo. Novos Estudos CEBRAP, n. 43, p. 45-63, nov. 1995. ; VARGAS, 1997 VARGAS, Joana Domingues. Fluxo do sistema de justiça criminal para crimes sexuais: A organização policial. 1997. Dissertação (Mestrado em Antropologia) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP, 1997. ). Sergio Adorno, em pesquisa pioneira, apontou que a população carcerária do estado do Rio de Janeiro, em 1988, era composta de 67,75% de negros, e de 63,51% de pessoas sem o primeiro grau completo ( ADORNO, 1994 ADORNO, Sérgio. Cidadania e Administração da Justiça Criminal. In: DINIZ, Eli; LOPES, José Sérgio Leite; PRANDI, Reginaldo. O Brasil no rastro da crise: partidos, sindicatos, movimentos sociais, Estado e cidadania no curso dos anos 90. São Paulo: Hucitec, 1994, p. 304-327. , p. 312). Em 1993, indicou que “dois terços da população carcerária do país é constituída de negros e pardos; 76% são analfabetos ou semialfabetizados; 95% considerados absolutamente pobres; 98% impossibilitados de contratar defensoria própria” ( ADORNO, 1994 ADORNO, Sérgio. Cidadania e Administração da Justiça Criminal. In: DINIZ, Eli; LOPES, José Sérgio Leite; PRANDI, Reginaldo. O Brasil no rastro da crise: partidos, sindicatos, movimentos sociais, Estado e cidadania no curso dos anos 90. São Paulo: Hucitec, 1994, p. 304-327. , p. 322).

Em outro trabalho, ainda voltado para o estudo da seletividade étnica, a partir dos dados do fluxo do crime de roubo qualificado no SJC da Comarca de São Paulo, Adorno (1995 ADORNO, Sérgio. Discriminação racial e justiça criminal em São Paulo. Novos Estudos CEBRAP, n. 43, p. 45-63, nov. 1995. , p. 59) mostrou que, nos processos encerrados no ano de 1990, a proporção de réus negros condenados (68,8%) era significativamente maior que de réus brancos (59,4%).

Quanto à seleção de ocorrências, Adorno também apontou o funcionamento da justiça em forma de funil, onde a base representava o número de ocorrências noticiadas, e o gargalo o número de sentenças proferidas pelo judiciário, de modo que, no período entre 1980 e 1987, na região metropolitana de São Paulo, somente cerca 30% das ocorrências de crimes violentos geraram inquéritos, e um número ainda menor chegaram à sentença ( ADORNO, 1994 ADORNO, Sérgio. Cidadania e Administração da Justiça Criminal. In: DINIZ, Eli; LOPES, José Sérgio Leite; PRANDI, Reginaldo. O Brasil no rastro da crise: partidos, sindicatos, movimentos sociais, Estado e cidadania no curso dos anos 90. São Paulo: Hucitec, 1994, p. 304-327. , p. 310-314).

Ainda na década de 1990, Joana Domingues Vargas chegou a números semelhantes em análise do fluxo dos crimes sexuais no SJC da Comarca de Campinas-SP. Entre os anos de 1988 e 1992, dos casos cuja solução foi conhecida, apenas 31% dos boletins de ocorrência de estupro geraram inquéritos policiais ( VARGAS, 1997 VARGAS, Joana Domingues. Fluxo do sistema de justiça criminal para crimes sexuais: A organização policial. 1997. Dissertação (Mestrado em Antropologia) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP, 1997. , p. 59). Embora o índice de sentenças condenatórias por estupro fosse alto, aproximadamente 73% das denúncias com desfecho conhecido, do total de 441 ocorrências apenas 37 casos haviam alcançado essa fase ( VARGAS, 1997 VARGAS, Joana Domingues. Fluxo do sistema de justiça criminal para crimes sexuais: A organização policial. 1997. Dissertação (Mestrado em Antropologia) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP, 1997. , p. 64-66). Com relação ao perfil dos acusados, a autora conclui que 53% das ocorrências envolviam pessoas de cor branca; contudo, entre as 37 condenações, apenas 12 indicavam acusados brancos (32% do total) ( VARGAS, 1997 VARGAS, Joana Domingues. Fluxo do sistema de justiça criminal para crimes sexuais: A organização policial. 1997. Dissertação (Mestrado em Antropologia) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP, 1997. , p. 90).

No início dos anos 2000, as pesquisas que se utilizaram da análise de fluxo foram em grande parte redirecionadas para o estudo dos homicídios, tendência que se manteve até os dias atuais, proliferando-se trabalhos dessa natureza por todo o país ( ANDRADE, 2011 ANDRADE, Rayane Maria de Lima. Da criminação à incriminação: O fluxo e o tempo do homicídio doloso no sistema de justiça criminal de Pernambuco. 2011. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011. ; CANO, 2006 CANO, Ignacio. Mensurando a impunidade no sistema de justiça criminal do Rio de Janeiro. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. ; CANO; DUARTE, 2010 CANO, Ignacio; DUARTE, Thais Lemos. A mensuração da impunidade no sistema de justiça criminal do Rio de Janeiro. Segurança, justiça e cidadania, Brasília, ano II, n. 04, p. 9-44, 2010. ; CIRENO; RATTON, 2007 CIRENO, Flávio. RATTON, José Luiz. Homicídios no Fluxo do Sistema de Justiça Criminal em Pernambuco (2003-2004). In: 31° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007 ; COSTA, 2015 COSTA, Arthur Trindade Maranhão. A (in)efetividade da justiça criminal brasileira: uma análise do fluxo de justiça dos homicídios no Distrito Federal. Civitas, Porto Alegre, v. 15, n. 1, p. 11-26, jan-mar. 2015. ; COSTA; ZACKSESKI; MACIEL, 2016 COSTA, Arthur Trindade Maranhão; ZACKSESKI, Cristina Maria; MACIEL, Welliton Caixeta. Investigação e processamento dos crimes de homicídio na Área Metropolitana de Brasília. Revista Brasileira de Segurança Pública , São Paulo, v. 10, n. 1, p. 36-54, fev-mar. 2016. ; MISSE; VARGAS, 2007 MISSE, Michel; VARGAS, Joana Domingues. O fluxo do processo de incriminação no Rio de Janeiro na década de 50 e no período 1997-2001: comparação e análise. In: XIII Congresso Brasileiro de Sociologia. Recife, 2007. ; RUSCHEL, 2006 RUSCHEL, Aírton José. Análise do tempo dos Processos Penais de homicídio no Fórum de Justiça de Florianópolis julgados em 2004. 2006. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006. ; RIBEIRO, 2010 RIBEIRO, Ludmila. A Produção Decisória do Sistema de Justiça Criminal para o Crime de Homicídio: Análise dos Dados do Estado de São Paulo entre 1991 e 1998. DADOS – Revista de Ciências Sociais , Rio de Janeiro, vol. 53, n. 1, p. 159-193, 2010. ; RIFIOTIS; VENTURA, 2007 RIFIOTIS, Theophilus; VENTURA, Andresa Burigo. Fluxo da justiça criminal em casos de homicídios dolosos na Região Metropolitana de Florianópolis – Santa Catarina (2000–2003). In: VII Reunião de Antropologia: Desafios Antropológicos, Porto Alegre, p. 1-19, 2007. ; SILVA, 2007 SILVA, Klarissa Almeida. O Sistema de Justiça Criminal Brasileiro: discutindo fluxo, morosidade e impunidade com o Ministério Público de Minas Gerais. In: 31º. Encontro Anual da Anpocs. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007. , 2010 SILVA, Klarissa Almeida. O papel dos tipos de homicídios dolosos na construção social da incriminação dos sujeitos pelos promotores de justiça: Belo Horizonte, processos com andamento entre 2007 e 2009. DILEMAS: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social. v. 3, n. 8, p. 101-123, abr-jun. 2010. ; 2013 SILVA, Klarissa Almeida. A Construção Social e Institucional do Homicídio: Da perícia em local de morte à sentença condenatória. 2013. Tese (Doutorado em Ciência Humanas) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013. ; VENTURA, 2006 VENTURA, Andresa Burigo. Fluxo do funcionamento da justiça criminal para o crime de homicídio doloso na Região Metropolitana de Florianópolis em 2003. In: Revista Mosaico Social, ano 3, n.3, p. 305-319, dez. 2006. ). Esse redirecionamento se deve, principalmente, ao baixo índice de subnotificação que esse crime apresenta, bem como à possibilidade de comparação com dados de outros países e da Organização Mundial da Saúde ( PAES, 2010 PAES, Vívian Ferreira. Como se contam crimes: um estudo sobre a construção social do crime no Brasil e na França. 2010. Tese (Doutorado em Ciências Humanas) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 138).

Em um esforço de síntese das diferentes abordagens, o objeto foi usualmente direcionado para os filtros por que passaram as ocorrências até a fase final de julgamento. Em estudo realizado na Região Metropolitana de Florianópolis, observou-se que de 183 processos penais de homicídios dolosos ocorridos entre os anos 2000 e 2003, apenas 20% dos casos (37) foram julgados até junho de 2006 ( RIFIOTIS; VENTURA, 2007 RIFIOTIS, Theophilus; VENTURA, Andresa Burigo. Fluxo da justiça criminal em casos de homicídios dolosos na Região Metropolitana de Florianópolis – Santa Catarina (2000–2003). In: VII Reunião de Antropologia: Desafios Antropológicos, Porto Alegre, p. 1-19, 2007. , p. 16). Tomando-se como base o número total de homicídios registrados pelo órgão de saúde daquela localidade, o percentual de condenações caiu para meros 3% ( VENTURA, 2006 VENTURA, Andresa Burigo. Fluxo do funcionamento da justiça criminal para o crime de homicídio doloso na Região Metropolitana de Florianópolis em 2003. In: Revista Mosaico Social, ano 3, n.3, p. 305-319, dez. 2006. , p. 312-313). No ano de 2004, fazendo um recorte transversal do período, enquanto que a Delegacia de Polícia Técnica da Capital registrou 120 homicídios em Florianópolis, o Tribunal do Júri da Comarca realizou apenas 17 sessões de julgamento ( RUSCHEL, 2006 RUSCHEL, Aírton José. Análise do tempo dos Processos Penais de homicídio no Fórum de Justiça de Florianópolis julgados em 2004. 2006. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006. , p. 5-7).

Aproximadamente no mesmo período, de 2003 a 2004, pesquisa realizada na cidade de Recife apontou que apenas 0,8% dos 2114 casos de homicídio noticiados pelo órgão de saúde foram julgados até 8 de novembro 2005 ( CIRENO; RATTON, 2007 CIRENO, Flávio. RATTON, José Luiz. Homicídios no Fluxo do Sistema de Justiça Criminal em Pernambuco (2003-2004). In: 31° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007 , p. 4-5). Anos depois, outra pesquisa em Recife verificou que de 657 inquéritos de homicídio doloso recebidos pelo Ministério Público, em 2007, apenas em 173 foi oferecida a denúncia (26%), e somente 43 (6.54%) haviam sido julgados até janeiro de 2011 ( ANDRADE, 2011 ANDRADE, Rayane Maria de Lima. Da criminação à incriminação: O fluxo e o tempo do homicídio doloso no sistema de justiça criminal de Pernambuco. 2011. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011. , p. 107-112).

Em pesquisa realizada no Rio de Janeiro, constatou-se que a taxa média de esclarecimento dos homicídios noticiados à Polícia Civil, entre os anos de 1998 e 2001, foi inferior a 35%, considerando-se esclarecidas as ocorrências que se transformaram em ação penal ( MISSE; VARGAS, 2007 MISSE, Michel; VARGAS, Joana Domingues. O fluxo do processo de incriminação no Rio de Janeiro na década de 50 e no período 1997-2001: comparação e análise. In: XIII Congresso Brasileiro de Sociologia. Recife, 2007. , p. 13-14). Analisando dados de 2003 e 2005, outro estudo indicou que, considerando todas as etapas do fluxo do SJC, menos de 10% dos homicídios ocorridos no Rio de Janeiro resultaram em punição para algum de seus autores ( CANO, 2006 CANO, Ignacio. Mensurando a impunidade no sistema de justiça criminal do Rio de Janeiro. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. , p. 18-19; CANO; DUARTE, 2010 CANO, Ignacio; DUARTE, Thais Lemos. A mensuração da impunidade no sistema de justiça criminal do Rio de Janeiro. Segurança, justiça e cidadania, Brasília, ano II, n. 04, p. 9-44, 2010. , p. 28-29). Com relação ao crime de roubo, a mesma pesquisa averiguou que das mais de 110.000 ocorrências registradas anualmente no estado do Rio de Janeiro, entre 2004 e 2006, menos de 3% geraram condenações ( CANO; DUARTE, 2010 CANO, Ignacio; DUARTE, Thais Lemos. A mensuração da impunidade no sistema de justiça criminal do Rio de Janeiro. Segurança, justiça e cidadania, Brasília, ano II, n. 04, p. 9-44, 2010. , p. 29-30).

Tomando por base período análogo, a partir de dados do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro, do Ministério Público do Rio de Janeiro e do Tribunal de Justiça do mesmo estado, Paes (2010 PAES, Vívian Ferreira. Como se contam crimes: um estudo sobre a construção social do crime no Brasil e na França. 2010. Tese (Doutorado em Ciências Humanas) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 220) realizou pesquisa com a análise de fluxo, seguindo o recorte transversal, e concentrando-se nos dados de 2005 referentes ao crime de homicídio doloso. Assim, foi possível conhecer a quantidade de casos recebidos por cada organização e o percentual de casos decididos no mesmo período. Para a polícia, de 3.186 casos noticiados, foram concluídos 229 (7,2%) ( PAES, 2010 PAES, Vívian Ferreira. Como se contam crimes: um estudo sobre a construção social do crime no Brasil e na França. 2010. Tese (Doutorado em Ciências Humanas) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 220). Em relação ao Ministério Público, de 2.004 inquéritos registrados em 2005, 74 resultaram em denúncia (3,7%) e outros 280 em pedido de arquivamento (14%). ( PAES, 2010 PAES, Vívian Ferreira. Como se contam crimes: um estudo sobre a construção social do crime no Brasil e na França. 2010. Tese (Doutorado em Ciências Humanas) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 221). Quanto ao Poder Judiciário, do total de 259 registros no tribunal do júri, 25, 6% resultou em condenação ( PAES, 2010 PAES, Vívian Ferreira. Como se contam crimes: um estudo sobre a construção social do crime no Brasil e na França. 2010. Tese (Doutorado em Ciências Humanas) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 222).

A partir de dados constantes em base única para o estado de São Paulo, organizada pela Fundação SEADE, Ribeiro (2010) RIBEIRO, Ludmila. A Produção Decisória do Sistema de Justiça Criminal para o Crime de Homicídio: Análise dos Dados do Estado de São Paulo entre 1991 e 1998. DADOS – Revista de Ciências Sociais , Rio de Janeiro, vol. 53, n. 1, p. 159-193, 2010. sistematizou informações de homicídios registrados entre 1991 e 1998, seguindo a tipologia longitudinal, e estabeleceu as taxas de esclarecimento (22%), sentenciamento (14%) e condenação (8%), demonstrando certa similitude com os números apontados, anteriormente, para o Rio de Janeiro ( RIBEIRO, 2010 RIBEIRO, Ludmila. A Produção Decisória do Sistema de Justiça Criminal para o Crime de Homicídio: Análise dos Dados do Estado de São Paulo entre 1991 e 1998. DADOS – Revista de Ciências Sociais , Rio de Janeiro, vol. 53, n. 1, p. 159-193, 2010. , p. 175-176).

Acerca do processamento de homicídios em Minas Gerais, Silva (2007) SILVA, Klarissa Almeida. O Sistema de Justiça Criminal Brasileiro: discutindo fluxo, morosidade e impunidade com o Ministério Público de Minas Gerais. In: 31º. Encontro Anual da Anpocs. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007. realizou pesquisa a partir das denúncias oferecidas pelo Ministério Público, entre os anos de 2003 a 2005. Com isso, consultando os dados dos processos no banco de dados do TJMG, concluiu-se que, no ano de 2003, 33.3% das denúncias haviam sido julgadas até 2007, e esse percentual caia significativamente em relação a 2004 e 2005, cuja taxa de sentenciamento ficou em 26.4% e 21.4%, respectivamente, resultando na taxa global de 23% ( SILVA, 2007 SILVA, Klarissa Almeida. O Sistema de Justiça Criminal Brasileiro: discutindo fluxo, morosidade e impunidade com o Ministério Público de Minas Gerais. In: 31º. Encontro Anual da Anpocs. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007. , p. 19). Posteriormente, Silva (2010 SILVA, Klarissa Almeida. O papel dos tipos de homicídios dolosos na construção social da incriminação dos sujeitos pelos promotores de justiça: Belo Horizonte, processos com andamento entre 2007 e 2009. DILEMAS: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social. v. 3, n. 8, p. 101-123, abr-jun. 2010. , p. 110) identificou que o percentual global de casos julgados subiu para 52.8% em 2008, e 62,2% em 2009. Já em 2013, 78,6% das denúncias pesquisadas já haviam sido sentenciadas em definitivo, o que demonstrou o funcionamento longitudinal do sistema de justiça criminal e evidenciou a necessidade de se recortar períodos significativos de tempo para compreender o fluxo de produção decisória ( SILVA, 2013 SILVA, Klarissa Almeida. A Construção Social e Institucional do Homicídio: Da perícia em local de morte à sentença condenatória. 2013. Tese (Doutorado em Ciência Humanas) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013. , p. 121-123).

O Distrito Federal e sua área metropolitana também foram objeto de pesquisas relacionadas ao fluxo do SJC. Analisando processos de homicídios dolosos em 2004, ocorridos no Distrito Federal, importante estudo observou que 32,4% dos casos analisados resultou em condenação ( COSTA, 2015 COSTA, Arthur Trindade Maranhão. A (in)efetividade da justiça criminal brasileira: uma análise do fluxo de justiça dos homicídios no Distrito Federal. Civitas, Porto Alegre, v. 15, n. 1, p. 11-26, jan-mar. 2015. , p. 20).

Embora o número referente ao DF seja bem mais alto em relação a outras capitais, esse desempenho não se repete nos municípios que compõem a sua área metropolitana (municípios goianos que fazem fronteira com o DF). Tomando como base os dados referentes a 2010, outra pesquisa indicou a taxa média de 8,1% de elucidação de homicídios, que corresponde os casos em que a ocorrência foi convertida em denúncia pelo Ministério Público ( COSTA et al, 2014 COSTA, Arthur Trindade Maranhão; BATISTA, Analia Soria; MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; PORTO, Maria Stela Grossi. Avaliação dos homicídios na área metropolitana de Brasília. In: LIMA, Cristiane do Socorro Loureiro; BAPTISTA, Gustavo Camilo; FIGUEIREDO, Isabel Seixas de (Orgs.). Avaliações, diagnósticos e análises de ações, programas e projetos em segurança pública. Brasília-DF: Ministério da Justiça, 2014, p. 93-121. (Coleção pensando a segurança pública, v.4). , p. 109; COSTA; ZACKSESKI; MACIEL, 2016 COSTA, Arthur Trindade Maranhão; ZACKSESKI, Cristina Maria; MACIEL, Welliton Caixeta. Investigação e processamento dos crimes de homicídio na Área Metropolitana de Brasília. Revista Brasileira de Segurança Pública , São Paulo, v. 10, n. 1, p. 36-54, fev-mar. 2016. , p. 41). Esse número ainda é mais baixo quando são observados os casos que são concluídos pelo julgamento no Tribunal do Júri, cujo percentual encontrado variou entre os municípios pesquisados, mas nenhum foi superior a 3% ( COSTA et al, 2014 COSTA, Arthur Trindade Maranhão; BATISTA, Analia Soria; MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; PORTO, Maria Stela Grossi. Avaliação dos homicídios na área metropolitana de Brasília. In: LIMA, Cristiane do Socorro Loureiro; BAPTISTA, Gustavo Camilo; FIGUEIREDO, Isabel Seixas de (Orgs.). Avaliações, diagnósticos e análises de ações, programas e projetos em segurança pública. Brasília-DF: Ministério da Justiça, 2014, p. 93-121. (Coleção pensando a segurança pública, v.4). , p. 110; COSTA; ZACKSESKI; MACIEL, 2016 COSTA, Arthur Trindade Maranhão; ZACKSESKI, Cristina Maria; MACIEL, Welliton Caixeta. Investigação e processamento dos crimes de homicídio na Área Metropolitana de Brasília. Revista Brasileira de Segurança Pública , São Paulo, v. 10, n. 1, p. 36-54, fev-mar. 2016. , p. 41-42).

Grande parte dos estudos selecionados vale-se de fluxo do SJC para identificar as formas de atuação das distintas organizações envolvidas. Certamente, a análise quantitativa não explicita critérios ou premissas decisórias, mas sugere divergências quantitativas nas séries históricas, segundo o recorte espacial e temporal de cada estudo. Algumas pesquisas indicam hipóteses explicativas para os resultados encontrados. Por exemplo, muitas pesquisas apostam na disjunção das organizações que atuam no SJC ( ADORNO, 1994 ADORNO, Sérgio. Cidadania e Administração da Justiça Criminal. In: DINIZ, Eli; LOPES, José Sérgio Leite; PRANDI, Reginaldo. O Brasil no rastro da crise: partidos, sindicatos, movimentos sociais, Estado e cidadania no curso dos anos 90. São Paulo: Hucitec, 1994, p. 304-327. ; ANDRADE, 2011 ANDRADE, Rayane Maria de Lima. Da criminação à incriminação: O fluxo e o tempo do homicídio doloso no sistema de justiça criminal de Pernambuco. 2011. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011. ; COELHO, 1986; MACHADO, 2014 MACHADO, Bruno Amaral. Justiça criminal: diferenciação funcional, interações organizacionais e decisões. São Paulo: Marcial Pons, 2014. ; MACHADO, 2015 MACHADO, Bruno Amaral. O inquérito policial e a divisão do trabalho jurídico-penal. Revista Brasileira de Segurança Pública, São Paulo, v. 9, n. 1, p. 12-33, 2015. ; RIFIOTIS; VENTURA; 2007 RIFIOTIS, Theophilus; VENTURA, Andresa Burigo. Fluxo da justiça criminal em casos de homicídios dolosos na Região Metropolitana de Florianópolis – Santa Catarina (2000–2003). In: VII Reunião de Antropologia: Desafios Antropológicos, Porto Alegre, p. 1-19, 2007. ; RUSCHEL, 2006 RUSCHEL, Aírton José. Análise do tempo dos Processos Penais de homicídio no Fórum de Justiça de Florianópolis julgados em 2004. 2006. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006. ; SAPORI, 2006 SAPORI, Luis Flávio. A justiça criminal brasileira como um sistema frouxamente articulado. In: SLAKMON, Catherine; MACHADO, Maíra Rocha; BOTTINI, Pierpaolo Cruz (Orgs.). Novas direções na governança da justiça e da segurança. Brasília-DF: Ministério da Justiça, 2006, p. 763-782. ; SILVA, 2013 SILVA, Klarissa Almeida. A Construção Social e Institucional do Homicídio: Da perícia em local de morte à sentença condenatória. 2013. Tese (Doutorado em Ciência Humanas) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013. ; VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. ; VENTURA, 2006 VENTURA, Andresa Burigo. Fluxo do funcionamento da justiça criminal para o crime de homicídio doloso na Região Metropolitana de Florianópolis em 2003. In: Revista Mosaico Social, ano 3, n.3, p. 305-319, dez. 2006. ), mas reconhecem a dificuldade em construir explicações detalhadas sobre a forma como o fenômeno se manifestaria. Igualmente, há trabalhos que apontam a desconfiança dos promotores e juízes na atuação da polícia ( COSTA, 2015 COSTA, Arthur Trindade Maranhão. A (in)efetividade da justiça criminal brasileira: uma análise do fluxo de justiça dos homicídios no Distrito Federal. Civitas, Porto Alegre, v. 15, n. 1, p. 11-26, jan-mar. 2015. ; MACHADO, 2015 MACHADO, Bruno Amaral. O inquérito policial e a divisão do trabalho jurídico-penal. Revista Brasileira de Segurança Pública, São Paulo, v. 9, n. 1, p. 12-33, 2015. ), a utilização de estereótipos e tipificações de criminosos como forma de conferir veracidade aos fatos noticiados ( VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. ), o acesso diferencial à justiça ( VENTURA, 2006 VENTURA, Andresa Burigo. Fluxo do funcionamento da justiça criminal para o crime de homicídio doloso na Região Metropolitana de Florianópolis em 2003. In: Revista Mosaico Social, ano 3, n.3, p. 305-319, dez. 2006. ), como causas de seleção de ocorrências.

4. O transcurso do tempo e a morosidade do SJC

Embora a morosidade seja apontada, há décadas, como um dos principais problemas do acesso à justiça ( CAPPELLETTI; GARTH, 1988 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1988. , p. 7), há apenas alguns anos os estudos baseados no fluxo se voltaram para o transcurso do tempo no sistema de justiça criminal ( ADORNO; PASINATO, 2007 ADORNO, Sérgio; PASINATO, Wânia. A justiça no tempo, o tempo da justiça. Tempo social, revista de sociologia da USP. São Paulo, v. 19, n. 2, p. 131-155, nov. 2007. ; ANDRADE, 2011 ANDRADE, Rayane Maria de Lima. Da criminação à incriminação: O fluxo e o tempo do homicídio doloso no sistema de justiça criminal de Pernambuco. 2011. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011. ; ANTUNES, 2013 ANTUNES, Gilson Macedo. O processo de construção da verdade no tribunal do júri de Recife (2009-2010). 2013. Tese (Doutorado) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2013. ; BATITUCCI, 2008 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira. Sistema de Justiça Criminal em Belo Horizonte: diagnóstico e perspectivas. Revista Pensar BH – Política Social, Belo Horizonte, n. 21, p. 17-22, nov. 2008. ; BATITUCCI; CRUZ; SILVA, 2006 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira; CRUZ, Marcus Vinícius Gonçalves da; SILVA, Breno Inácio da. Fluxo do crime de homicídio no sistema de justiça criminal de Minas Gerais. In: 30º Encontro Anual da Anpocs. Caxambu/MG, 24 a 28 out. 2006. ; BATITUCCI et al, 2010 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira; CRUZ, Marcus Vinícius Gonçalves da; SANTOS, Andréia dos; RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes; SOUZA, Letícia Godinho de. A justiça informal em linha de montagem: Estudo de caso da dinâmica de atuação do JECrim de Belo Horizonte. Civitas, Porto Alegre, v. 10, n. 2, p. 245-269, maio-ago. 2010. ; CIRENO; RATTON, 2007 CIRENO, Flávio. RATTON, José Luiz. Homicídios no Fluxo do Sistema de Justiça Criminal em Pernambuco (2003-2004). In: 31° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007 ; MACHADO; ZACKSESKI, RAUPP, 2016b MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; RAUPP, Rene Mallet. Tempos da investigação: o transcurso do inquérito policial no sistema de Justiça Federal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 124, ano 24, p. 143-181, out. 2016b. ; RIBEIRO, 2009 RIBEIRO, Ludmila. O Tempo da Justiça Criminal Brasileira. Homicídios: Políticas de Prevenção e Controle. Coleção Segurança com Cidadania. Brasília, ano I, n. 3, p. 39-67, 2009. , RIBEIRO; CRUZ; BATITUCCI, 2009 RIBEIRO, Ludmila; CRUZ, Marcus Vinícius; BATITUCCI, Eduardo Cerqueira. Morosidade necessária ou impunidade? O tempo dos Tribunais do Júri em Minas Gerais. Grupo de Trabalho “Violência e Sociedade”. In: XIV Congresso da Sociedade Brasileira de Sociologia, 2009. ; RIBEIRO; DUARTE, 2008 RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes; DUARTE, Thais Lemos. Padrões de seleção no processamento dos homicídios dolosos: o tempo dos casos julgados pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro entre os anos 2000 e 2007. In: 32° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 27 a 31 out. 2008. ; RUSCHEL, 2006 RUSCHEL, Aírton José. Análise do tempo dos Processos Penais de homicídio no Fórum de Justiça de Florianópolis julgados em 2004. 2006. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006. ; SANTOS, 2010 SANTOS, Andreia dos. Morreu na contramão atrapalhando o tráfego: Estudo sobre a Justiça para Crimes de Trânsito em Belo Horizonte/MG. 2010. Tese (Doutorado em Sociologia) – Universidade Federal do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010. ; SILVA, 2010 SILVA, Klarissa Almeida. O papel dos tipos de homicídios dolosos na construção social da incriminação dos sujeitos pelos promotores de justiça: Belo Horizonte, processos com andamento entre 2007 e 2009. DILEMAS: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social. v. 3, n. 8, p. 101-123, abr-jun. 2010. ; VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , 2006 VARGAS, Joana Domingues. Metodologia de Tratamento do Tempo e da Morosidade Processual na Justiça Criminal. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. ).

Em esforço de síntese, constata-se que a estratégia utilizada por grande parte dos estudos do tempo é confrontar os prazos processuais estabelecidos na legislação, ao que se denomina morosidade ideal, com a duração efetiva dos inquéritos e processos ( ADORNO; PASINATO, 2007 ADORNO, Sérgio; PASINATO, Wânia. A justiça no tempo, o tempo da justiça. Tempo social, revista de sociologia da USP. São Paulo, v. 19, n. 2, p. 131-155, nov. 2007. , p. 141; RIBEIRO, 2009 RIBEIRO, Ludmila. O Tempo da Justiça Criminal Brasileira. Homicídios: Políticas de Prevenção e Controle. Coleção Segurança com Cidadania. Brasília, ano I, n. 3, p. 39-67, 2009. , p. 44; RIBEIRO; CRUZ; BATITUCCI, 2009 RIBEIRO, Ludmila; CRUZ, Marcus Vinícius; BATITUCCI, Eduardo Cerqueira. Morosidade necessária ou impunidade? O tempo dos Tribunais do Júri em Minas Gerais. Grupo de Trabalho “Violência e Sociedade”. In: XIV Congresso da Sociedade Brasileira de Sociologia, 2009. , p. 7; RIBEIRO; DUARTE, 2008 RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes; DUARTE, Thais Lemos. Padrões de seleção no processamento dos homicídios dolosos: o tempo dos casos julgados pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro entre os anos 2000 e 2007. In: 32° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 27 a 31 out. 2008. , p. 9; SANTOS, 2010 SANTOS, Andreia dos. Morreu na contramão atrapalhando o tráfego: Estudo sobre a Justiça para Crimes de Trânsito em Belo Horizonte/MG. 2010. Tese (Doutorado em Sociologia) – Universidade Federal do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010. , p. 167; VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , p. 207, 2006, p. 43-44; VARGAS; MAGALHÃES; RIBEIRO, 2010 VARGAS, Joana Domingues; MAGALHÃES, Ismênia Blavatsky de; RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes. Tempo da Justiça. Metodologia de Tratamento do Tempo e da Morosidade Processual na Justiça Criminal. Segurança, Justiça e Cidadania, Brasília, ano II, n. 04, 2010, p. 45-72. , p. 53). As pesquisas discriminam o tempo gasto para cada tomada de decisão pelos atores que integram as diferentes organizações envolvidas. Não apenas os atos praticados pelos delegados de polícia, promotores de justiça e juízes, mas também pelos peritos criminais, servidores, agentes de polícias, entre outros.

A celeridade/morosidade da resposta estatal ao crime vem sendo discutida sob dois pontos de vista: de um lado, interessa aos envolvidos que o processamento seja célere, evitando o perecimento das provas e garantindo o que, no jargão jurídico, é descrito como a “busca da verdade real”; por outro lado, as “decisões sumárias”, alertam os estudos, podem comprometer a segurança jurídica e violar direitos e garantias historicamente conquistados pelos cidadãos ( ADORNO; PASINATO, 2007 ADORNO, Sérgio; PASINATO, Wânia. A justiça no tempo, o tempo da justiça. Tempo social, revista de sociologia da USP. São Paulo, v. 19, n. 2, p. 131-155, nov. 2007. , p. 142; RIBEIRO, 2009 RIBEIRO, Ludmila. O Tempo da Justiça Criminal Brasileira. Homicídios: Políticas de Prevenção e Controle. Coleção Segurança com Cidadania. Brasília, ano I, n. 3, p. 39-67, 2009. , p. 38; SANTOS, 2010 SANTOS, Andreia dos. Morreu na contramão atrapalhando o tráfego: Estudo sobre a Justiça para Crimes de Trânsito em Belo Horizonte/MG. 2010. Tese (Doutorado em Sociologia) – Universidade Federal do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010. , p. 172; SAPORI, 2006 SAPORI, Luis Flávio. A justiça criminal brasileira como um sistema frouxamente articulado. In: SLAKMON, Catherine; MACHADO, Maíra Rocha; BOTTINI, Pierpaolo Cruz (Orgs.). Novas direções na governança da justiça e da segurança. Brasília-DF: Ministério da Justiça, 2006, p. 763-782. , p. 776). Assim, a fim de conciliar a celeridade processual com os direitos e garantias das pessoas investigadas e acusadas, as pesquisas sugerem que há um intervalo de tempo necessário para a prática dos atos processuais entendido como morosidade necessária ( ADORNO; PASINATO, 2007 ADORNO, Sérgio; PASINATO, Wânia. A justiça no tempo, o tempo da justiça. Tempo social, revista de sociologia da USP. São Paulo, v. 19, n. 2, p. 131-155, nov. 2007. , p. 142; ANDRADE, 2011 ANDRADE, Rayane Maria de Lima. Da criminação à incriminação: O fluxo e o tempo do homicídio doloso no sistema de justiça criminal de Pernambuco. 2011. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011. , p. 73; MACHADO; ZACKSESKI; RAUPP, 2016b MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; RAUPP, Rene Mallet. Tempos da investigação: o transcurso do inquérito policial no sistema de Justiça Federal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 124, ano 24, p. 143-181, out. 2016b. , p. 143-150; RIBEIRO, 2009 RIBEIRO, Ludmila. O Tempo da Justiça Criminal Brasileira. Homicídios: Políticas de Prevenção e Controle. Coleção Segurança com Cidadania. Brasília, ano I, n. 3, p. 39-67, 2009. , p. 38; SILVA, 2007 SILVA, Klarissa Almeida. O Sistema de Justiça Criminal Brasileiro: discutindo fluxo, morosidade e impunidade com o Ministério Público de Minas Gerais. In: 31º. Encontro Anual da Anpocs. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007. , p. 6-7; VARGAS; MAGALHÃES; RIBIEIRO, 2010, p. 47).

Em análise rápida dos principais estudos que contemplam a categoria tempo/morosidade e sua repercussão no processo penal, notamos que os homicídios ocupam grande parte da atenção dos pesquisadores. Mais recentemente, houve a diversificação dos interesses no campo, e a ampliação para outros crimes, como estupro, crimes de menor potencial ofensivo, delitos de trânsito e, muito recentemente, as pesquisas se ocuparam também dos delitos econômicos e da corrupção.

Em pesquisa cujo objeto recaiu nos processos que apuraram a prática de linchamentos no estado de São Paulo, no período compreendido entre 1980 e 1989, foi constatado que 100% dos casos analisados excediam a morosidade legal, e em 70% dos casos o tempo de tramitação excedeu o que foi estabelecido como “morosidade necessária”, que seria de 52.36 meses ( ADORNO; PASINATO, 2007 ADORNO, Sérgio; PASINATO, Wânia. A justiça no tempo, o tempo da justiça. Tempo social, revista de sociologia da USP. São Paulo, v. 19, n. 2, p. 131-155, nov. 2007. , p. 144-146). Adorno e Pasinato (2007 ADORNO, Sérgio; PASINATO, Wânia. A justiça no tempo, o tempo da justiça. Tempo social, revista de sociologia da USP. São Paulo, v. 19, n. 2, p. 131-155, nov. 2007. , p. 148-149) também trazem dados de outra pesquisa sobre homicídios realizada no município de São Paulo. De acordo com os autores, partindo-se de 297 ocorrências de homicídio registradas entre 1984 e 1989, constatou-se que 83.49% dos casos foram julgados em até 24 meses, o que levou à conclusão de que a morosidade nos crimes que envolvem violações aos direitos humanos (como é o caso dos linchamentos) foi sensivelmente maior em relação à criminalidade tradicional ( ADORNO; PASINATO, 2007 ADORNO, Sérgio; PASINATO, Wânia. A justiça no tempo, o tempo da justiça. Tempo social, revista de sociologia da USP. São Paulo, v. 19, n. 2, p. 131-155, nov. 2007. , p. 150).

Outra pesquisa realizada em São Paulo, utilizando-se de dados acerca dos processos que tramitaram entre os anos de 1991 e 1998, chegou ao tempo médio de 983 dias (2,70 anos) para o processamento de homicídios, apontando que a fase mais morosa do fluxo foi o intervalo entre a pronúncia e a sentença do júri, cuja duração média foi de 518 dias ( VARGAS, 2006 VARGAS, Joana Domingues. Metodologia de Tratamento do Tempo e da Morosidade Processual na Justiça Criminal. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. , p. 43). Em relação ao município de Campinas-SP, Vargas (2006) VARGAS, Joana Domingues. Metodologia de Tratamento do Tempo e da Morosidade Processual na Justiça Criminal. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. analisou 93 processos de homicídio arquivados no ano de 2003, seguindo a tipologia longitudinal retrospectiva. Nessa localidade, observou os prazos médios de 358 dias entre a abertura e o encerramento do inquérito policial, e 202 dias para o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público ( VARGAS, 2006 VARGAS, Joana Domingues. Metodologia de Tratamento do Tempo e da Morosidade Processual na Justiça Criminal. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. , p. 94-100). Somando-se esse prazo ao tempo de processamento pelo judiciário, tem-se as médias de 1.344 dias até a pronúncia ( VARGAS, 2006 VARGAS, Joana Domingues. Metodologia de Tratamento do Tempo e da Morosidade Processual na Justiça Criminal. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. , p. 108), de 2.048 dias até o julgamento para réu solto, de 3052 dias até o julgamento para réu preso, e de 5.855 dias para réu preso por pronúncia ( VARGAS, 2006 VARGAS, Joana Domingues. Metodologia de Tratamento do Tempo e da Morosidade Processual na Justiça Criminal. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. , p. 114).

Em Minas Gerais, Batitucci, Cruz e Silva (2006 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira; CRUZ, Marcus Vinícius Gonçalves da; SILVA, Breno Inácio da. Fluxo do crime de homicídio no sistema de justiça criminal de Minas Gerais. In: 30º Encontro Anual da Anpocs. Caxambu/MG, 24 a 28 out. 2006. , p. 6) examinaram 146 casos de crimes de homicídio ocorridos entre 1985 e 2003 na cidade de Belo Horizonte, Ipatinga e Coronel Fabriciano. De forma breve, a pesquisa apontou o tempo médio de 1.611 dias entre a data do fato e o julgamento pelo júri, o que pode aumentar para 1.840 dias em caso de recurso à 2ª instância ( BATITUCCI, 2008 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira. Sistema de Justiça Criminal em Belo Horizonte: diagnóstico e perspectivas. Revista Pensar BH – Política Social, Belo Horizonte, n. 21, p. 17-22, nov. 2008. , p. 20; BATITUCCI; CRUZ; SILVA, 2006 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira; CRUZ, Marcus Vinícius Gonçalves da; SILVA, Breno Inácio da. Fluxo do crime de homicídio no sistema de justiça criminal de Minas Gerais. In: 30º Encontro Anual da Anpocs. Caxambu/MG, 24 a 28 out. 2006. , p. 19). Se considerados apenas os dados relativos a Belo Horizonte, embora se verifiquem algumas distorções, o tempo médio de processamento do homicídio, analisando-se 51 casos registrados entre 1978 e 2002 e julgados entre os anos de 1982 e 2002, se mostrou basicamente o mesmo (em média, 1.580 dias entre a ocorrência e a sentença do júri) (RIBEIRO; CRUZ; BATITUCCI, 2010, p. 14). Alinhando-se às constatações de Vargas (2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , 2006 VARGAS, Joana Domingues. Metodologia de Tratamento do Tempo e da Morosidade Processual na Justiça Criminal. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. ), verificou-se que o maior tempo foi dispendido no judiciário, visto que entre a data do fato e o encerramento do inquérito policial consumiu-se, em média, 304 dias, e até a data da denúncia o tempo médio foi de 403 dias ( BATITUCCI, 2008 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira. Sistema de Justiça Criminal em Belo Horizonte: diagnóstico e perspectivas. Revista Pensar BH – Política Social, Belo Horizonte, n. 21, p. 17-22, nov. 2008. , p. 20; BATITUCCI; CRUZ; SILVA, 2006 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira; CRUZ, Marcus Vinícius Gonçalves da; SILVA, Breno Inácio da. Fluxo do crime de homicídio no sistema de justiça criminal de Minas Gerais. In: 30º Encontro Anual da Anpocs. Caxambu/MG, 24 a 28 out. 2006. , p. 13-14; RIBEIRO; CRUZ; BATITUCCI, 2010, p. 14). Embora o grande lapso temporal pudesse sugerir que eventual melhora ou piora na atuação do SJC ficasse escondida em razão da não diferenciação em séries históricas menores, a pesquisa apontou que o problema da morosidade é estrutural, não apresentado variação significativa em razão da época do fato (se cometido nos anos 80, na década de 1990, ou em 2000) ( BATITUCCI, 2008 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira. Sistema de Justiça Criminal em Belo Horizonte: diagnóstico e perspectivas. Revista Pensar BH – Política Social, Belo Horizonte, n. 21, p. 17-22, nov. 2008. , p. 20). Silva (2010 SILVA, Klarissa Almeida. O papel dos tipos de homicídios dolosos na construção social da incriminação dos sujeitos pelos promotores de justiça: Belo Horizonte, processos com andamento entre 2007 e 2009. DILEMAS: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social. v. 3, n. 8, p. 101-123, abr-jun. 2010. , p. 109) também se concentrou na investigação do fluxo do homicídio no sistema de justiça criminal de Belo Horizonte, e para tanto tomou por base as informações de 245 ocorrências de homicídio doloso denunciadas pelo Ministério Público entre 2003 e 2005. Nessa perspectiva, o tempo médio total do processamento do homicídio foi de 1.266 dias, dos quais 63 dias foram consumidos pela investigação policial, e 221 dias foram gastos entre o encerramento do inquérito e o oferecimento da denúncia, o que evidenciou a maior influência da fase judicial na morosidade do processo ( SILVA, 2010 SILVA, Klarissa Almeida. O papel dos tipos de homicídios dolosos na construção social da incriminação dos sujeitos pelos promotores de justiça: Belo Horizonte, processos com andamento entre 2007 e 2009. DILEMAS: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social. v. 3, n. 8, p. 101-123, abr-jun. 2010. , p. 112).

No Rio de Janeiro, pesquisa realizada a partir da base de dados do Tribunal de Justiça (TJRJ), referentes aos homicídios noticiados e julgados entre 2000 e 2007, indicou um tempo de duração médio de 707 dias de processamento, entre a data do fato e a decisão do júri ( RIBEIRO; DUARTE, 2008 RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes; DUARTE, Thais Lemos. Padrões de seleção no processamento dos homicídios dolosos: o tempo dos casos julgados pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro entre os anos 2000 e 2007. In: 32° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 27 a 31 out. 2008. , p. 25). De acordo com os dados dessa pesquisa, um dos fatores determinantes para a redução do tempo foi a prisão em flagrante do suspeito, que reduziu o tempo médio para 565 dias, o que representou diminuição de 80% frente ao tempo médio dos processos em que o flagrante não ocorreu, tomados isoladamente (1.193 dias) ( RIBEIRO; DUARTE, 2008 RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes; DUARTE, Thais Lemos. Padrões de seleção no processamento dos homicídios dolosos: o tempo dos casos julgados pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro entre os anos 2000 e 2007. In: 32° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 27 a 31 out. 2008. , p. 25-27). Ainda a respeito da morosidade indicada no Rio de Janeiro, Ribeiro (2009 RIBEIRO, Ludmila. O Tempo da Justiça Criminal Brasileira. Homicídios: Políticas de Prevenção e Controle. Coleção Segurança com Cidadania. Brasília, ano I, n. 3, p. 39-67, 2009. , p. 54) analisou 131 casos de homicídio doloso ocorridos entre 1977 e 1992, e arquivados em 1996, utilizando-se da tipologia longitudinal retrospectiva. Nesse estudo, revelou-se que o tempo médio da fase pré-processual, que se inicia na data do fato e termina com o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público, passando por toda a investigação no inquérito policial, foi de 469 dias, enquanto que a fase processual (do recebimento da denúncia até o julgamento pelo júri) durou, em média, 1.516 dias, resultando no tempo médio global de 1.915 dias ( RIBEIRO, 2009 RIBEIRO, Ludmila. O Tempo da Justiça Criminal Brasileira. Homicídios: Políticas de Prevenção e Controle. Coleção Segurança com Cidadania. Brasília, ano I, n. 3, p. 39-67, 2009. , p. 55).

Os estudos que se valem da análise do fluxo nos casos de homicídio disseminaram-se entre grupos de pesquisas de distintas regiões do país. Na região Sul, Ruschel (2006) RUSCHEL, Aírton José. Análise do tempo dos Processos Penais de homicídio no Fórum de Justiça de Florianópolis julgados em 2004. 2006. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006. observou o processamento do crime de homicídio pelo sistema de justiça criminal de Florianópolis, tomando por base os casos julgados em 2004. Nesse estudo, verificou-se uma enorme variação do tempo entre os casos julgados, entre 303 dias (o mais célere) e 2.378 dias (o mais moroso), sendo de 784 dias o tempo médio desde a ocorrência até o julgamento pelo júri ( RUSCHEL, 2006 RUSCHEL, Aírton José. Análise do tempo dos Processos Penais de homicídio no Fórum de Justiça de Florianópolis julgados em 2004. 2006. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006. , p. 51). Uma importante constatação foi a diferença entre o tempo de tramitação de processos de réus presos e soltos, na mesma linha do que apresentou Vargas (2004) VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. . De acordo com Ruschel (2006 RUSCHEL, Aírton José. Análise do tempo dos Processos Penais de homicídio no Fórum de Justiça de Florianópolis julgados em 2004. 2006. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006. , p. 55-56), o tempo dos processos com réu preso variou entre 303 dias (mínimo) e 900 dias (máximo), enquanto que os processos com réu solto tiveram variação de tempo entre 1.499 dias (mínimo) e 2.378 dias (máximo).

Pesquisadores radicados em centros de pesquisa do Nordeste também vêm utilizando a técnica do fluxo para a pesquisa dos homicídios, o que permite ampliar o foco para os contextos locais. O tempo médio de permanência de uma ocorrência nas diversas organizações que compõem o sistema de justiça criminal também foi estudado por Cireno e Ratton (2007) CIRENO, Flávio. RATTON, José Luiz. Homicídios no Fluxo do Sistema de Justiça Criminal em Pernambuco (2003-2004). In: 31° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007 , que investigaram os processos de homicídio noticiados em 2003 e 2004 na cidade de Recife-PE. De acordo com a pesquisa, o tempo médio do inquérito policial foi de 138 dias, ao qual se somaram mais 33 dias para o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público ( CIRENO; RATTON, 2007 CIRENO, Flávio. RATTON, José Luiz. Homicídios no Fluxo do Sistema de Justiça Criminal em Pernambuco (2003-2004). In: 31° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007 , p. 9-11). De maneira sucinta, a pesquisa apontou para dois grandes fatores de influência na morosidade, que foram a prisão em flagrante e o pedido de novas diligências realizado pelo Ministério Público. Nos casos de prisão em flagrante do suspeito, o tempo médio do inquérito caiu para 29 dias, sendo que 50% casos terminou em 9 dias ( CIRENO; RATTON, 2007 CIRENO, Flávio. RATTON, José Luiz. Homicídios no Fluxo do Sistema de Justiça Criminal em Pernambuco (2003-2004). In: 31° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007 , p. 10-11). Igualmente, o tempo médio para o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público também diminuiu, passando para 16 dias ( CIRENO; RATTON, 2007 CIRENO, Flávio. RATTON, José Luiz. Homicídios no Fluxo do Sistema de Justiça Criminal em Pernambuco (2003-2004). In: 31° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007 , p. 12-13). Por outro lado, nos casos em que o Ministério Público requereu novas diligências investigativas antes do oferecimento da denúncia, o tempo médio dos processos aumentou mais de três vezes, para 128 dias ( CIRENO; RATTON, 2007 CIRENO, Flávio. RATTON, José Luiz. Homicídios no Fluxo do Sistema de Justiça Criminal em Pernambuco (2003-2004). In: 31° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007 , p. 13). Com relação ao tempo do judiciário, dos 2.000 casos de homicídio noticiados entre 2003 e 2004, apenas 8 haviam resultado em condenação até novembro de 2005, o que, na visão dos autores, demonstrou a existência de um duplo funil (polícia e judiciário) no fluxo dos casos de homicídio em Recife ( CIRENO; RATTON, 2007 CIRENO, Flávio. RATTON, José Luiz. Homicídios no Fluxo do Sistema de Justiça Criminal em Pernambuco (2003-2004). In: 31° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007 , p. 14).

Os números acima foram posteriormente confirmados com a análise feita por Andrade (2011) ANDRADE, Rayane Maria de Lima. Da criminação à incriminação: O fluxo e o tempo do homicídio doloso no sistema de justiça criminal de Pernambuco. 2011. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011. em 124 processos julgados entre 2008 e 2009 pelo Tribunal do Júri de Recife. Nessa investigação, apurou-se que, nos casos de prisão em flagrante, o inquérito policial demorou em média 24 dias para ser concluído, ao passo que, considerando-se o total de ocorrências, o tempo médio do inquérito foi de 206 dias ( ANDRADE, 2011 ANDRADE, Rayane Maria de Lima. Da criminação à incriminação: O fluxo e o tempo do homicídio doloso no sistema de justiça criminal de Pernambuco. 2011. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011. , p. 78-79). Com relação à atuação do Ministério Público, esta pesquisa encontrou um quadro mais ajustado aos prazos processuais do que o citado acima ( CIRENO; RATTON, 2007 CIRENO, Flávio. RATTON, José Luiz. Homicídios no Fluxo do Sistema de Justiça Criminal em Pernambuco (2003-2004). In: 31° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007 ), pois o tempo médio para o oferecimento da denúncia caiu para 17 dias no período estudado, havendo uma pequena diferença em relação aos acusados presos, cuja média foi de 10 dias ( ANDRADE, 2011 ANDRADE, Rayane Maria de Lima. Da criminação à incriminação: O fluxo e o tempo do homicídio doloso no sistema de justiça criminal de Pernambuco. 2011. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011. , p. 81-82). Por fim, com relação à fase judicial, o tempo médio registrado foi de 2.708 dias, o que mostrou que a fase judicial foi a que mais influenciou no tempo do processamento, cuja média total foi de 3.062 dias entre a abertura do inquérito e a sentença do júri ( ANDRADE, 2011 ANDRADE, Rayane Maria de Lima. Da criminação à incriminação: O fluxo e o tempo do homicídio doloso no sistema de justiça criminal de Pernambuco. 2011. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011. , p. 84-88). Embora a média de tempo dos processos com réus presos tenha sido um pouco mais baixa (2.148 dias), a morosidade judicial foi bastante impactante, evidenciando-se a incapacidade do Judiciário em responder em prazos razoáveis, as denúncias ofertadas por homicídios, o que já havia sido constatado por Cireno e Ratton (2007 CIRENO, Flávio. RATTON, José Luiz. Homicídios no Fluxo do Sistema de Justiça Criminal em Pernambuco (2003-2004). In: 31° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007 , p. 14-15). Analisando apenas os processos julgados pelo Tribunal do Júri de Recife em 2009 (75 processos analisados no total), Antunes (2013) ANTUNES, Gilson Macedo. O processo de construção da verdade no tribunal do júri de Recife (2009-2010). 2013. Tese (Doutorado) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2013. encontrou médias bem próximas àquelas identificadas por Andrade (2011) ANDRADE, Rayane Maria de Lima. Da criminação à incriminação: O fluxo e o tempo do homicídio doloso no sistema de justiça criminal de Pernambuco. 2011. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011. e por Cireno e Ratton (2007) CIRENO, Flávio. RATTON, José Luiz. Homicídios no Fluxo do Sistema de Justiça Criminal em Pernambuco (2003-2004). In: 31° Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu/MG, 22 a 26 out. 2007 . Com relação ao tempo do inquérito, a média para a sua conclusão foi de 289 dias ( ANTUNES, 2013 ANTUNES, Gilson Macedo. O processo de construção da verdade no tribunal do júri de Recife (2009-2010). 2013. Tese (Doutorado) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2013. , p. 175), aos quais se somaram, em média, mais 20 dias para o oferecimento da denúncia ( ANTUNES, 2013 ANTUNES, Gilson Macedo. O processo de construção da verdade no tribunal do júri de Recife (2009-2010). 2013. Tese (Doutorado) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2013. , p. 215-216).

A difusão das pesquisas com análise do fluxo diversificou os interesses de estudo para outros crimes. Vargas capitaneou pesquisa sobre o tempo de resposta do SJC, a partir da análise da tramitação de 446 ocorrências de prática do crime de estupro, registradas em Campinas, entre 1988 e 1992 ( VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , p. 210). Vargas (2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , p. 224-225) concluiu que o tempo médio gasto entre o registro da ocorrência e a abertura do inquérito foi de 47 dias, seguido pelo prazo médio de 516 dias para o seu encerramento (89 dias se o réu é preso provisoriamente), e de mais 149 dias até o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público (25 dias se o réu estiver preso). Entre o oferecimento da denúncia e a sentença transcorreram mais 768 dias (379 nos casos de réu preso) ( VARGAS, 2004 VARGAS, Joana Domingues. Estupro: que justiça? Fluxo do funcionamento e análise do tempo da justiça criminal para o crime de estupro. 2004. Tese (Doutorado em Sociologia) - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Rio de Janeiro, 2004. , p. 226-227, 2006, p. 69-70). Embora sejam propostos padrões estatísticos de correspondência entre variáveis como residência, situação, estado civil da vítima, relação, idade, prisão etc. e o tempo do processo, é preciso reconhecer que as correlações não permitiram inferências seguras a respeito dos fatores determinantes para o transcurso do tempo observado. Salvo o fator idade da vítima, em que foi detectada tramitação até quatro vezes mais rápida nos processos envolvendo vítimas com idade inferior a 14 anos ( VARGAS, 2006 VARGAS, Joana Domingues. Metodologia de Tratamento do Tempo e da Morosidade Processual na Justiça Criminal. Relatório Final Pesquisa Aplicada em Segurança Pública e Justiça Criminal. Senasp, abr. 2006. , p. 82), e o fator prisão durante o processo, que reduz o tempo do processo pela metade, os resultados obtidos sugerem a necessidade de complementação e aprofundamento das pesquisas nessa área, o que poderá ser feito com a utilização de técnicas qualitativas para maior compreensão da morosidade processual detectada.

Embora o procedimento seja diferente e idealmente marcado pela celeridade, a morosidade também foi detectada nos crimes processados no Juizado Especial Criminal (JECrim), como apontou a pesquisa realizada por Batitucci et al (2010) BATITUCCI, Eduardo Cerqueira; CRUZ, Marcus Vinícius Gonçalves da; SANTOS, Andréia dos; RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes; SOUZA, Letícia Godinho de. A justiça informal em linha de montagem: Estudo de caso da dinâmica de atuação do JECrim de Belo Horizonte. Civitas, Porto Alegre, v. 10, n. 2, p. 245-269, maio-ago. 2010. , a partir da análise de 603 processos baixados, em 2006, na Comarca de Belo Horizonte. Nesse estudo, constatou-se que a morosidade do processo foi uma das razões para o baixo percentual de casos com transação penal (3,1% do total), cuja duração média foi de 172 dias ( BATITUCCI et al, 2010 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira; CRUZ, Marcus Vinícius Gonçalves da; SANTOS, Andréia dos; RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes; SOUZA, Letícia Godinho de. A justiça informal em linha de montagem: Estudo de caso da dinâmica de atuação do JECrim de Belo Horizonte. Civitas, Porto Alegre, v. 10, n. 2, p. 245-269, maio-ago. 2010. , p. 256). Também se constatou, mas uma vez, que o maior tempo foi gasto com o trâmite burocrático do judiciário, cuja média foi de 110 dias ( BATITUCCI et al, 2010 BATITUCCI, Eduardo Cerqueira; CRUZ, Marcus Vinícius Gonçalves da; SANTOS, Andréia dos; RIBEIRO, Ludmila Mendonça Lopes; SOUZA, Letícia Godinho de. A justiça informal em linha de montagem: Estudo de caso da dinâmica de atuação do JECrim de Belo Horizonte. Civitas, Porto Alegre, v. 10, n. 2, p. 245-269, maio-ago. 2010. , p. 256-257).

Em outra pesquisa, Santos (2010 SANTOS, Andreia dos. Morreu na contramão atrapalhando o tráfego: Estudo sobre a Justiça para Crimes de Trânsito em Belo Horizonte/MG. 2010. Tese (Doutorado em Sociologia) – Universidade Federal do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010. , p. 119) analisou 209 casos de crimes de trânsito arquivados após o julgamento em 2006 na Comarca de Belo Horizonte. Embora a pesquisa fosse ampla, com emprego de diversas técnicas e com variados objetivos, uma das preocupações foi a mensuração do tempo de processamento desse tipo específico de demanda. Utilizando a tipologia longitudinal retrospectiva, apurou-se o tempo médio de 1.519 dias entre a data do fato e o arquivamento após a sentença ( SANTOS, 2010 SANTOS, Andreia dos. Morreu na contramão atrapalhando o tráfego: Estudo sobre a Justiça para Crimes de Trânsito em Belo Horizonte/MG. 2010. Tese (Doutorado em Sociologia) – Universidade Federal do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010. , p. 168-169). Destacou-se que um importante fator de morosidade foi a presença de testemunhas na fase judicial, que elevou o tempo médio entre a denúncia e a sentença de 376 dias (média geral) para 838 dias (casos com testemunhas considerados isoladamente) ( SANTOS, 2010 SANTOS, Andreia dos. Morreu na contramão atrapalhando o tráfego: Estudo sobre a Justiça para Crimes de Trânsito em Belo Horizonte/MG. 2010. Tese (Doutorado em Sociologia) – Universidade Federal do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010. , p. 171).

Recente pesquisa fomentada pela Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU) indica a tendência que mencionamos de diversificação e ampliação dos estudos empíricos no direito, e esta, particularmente, destoa do tradicional campo de pesquisa em segurança pública no Brasil. A pesquisa teve por objeto a investigação criminal realizada por meio do inquérito policial, no sistema de justiça federal, e o foco dirigiu-se aos delitos econômicos e corrupção. A partir da base de dados do sistema único do MPF, no ano de 2012, foram identificados 60.582 inquéritos policiais concluídos na área federal. Desses, 17.259 originaram denúncias e 43.323 foram arquivamentos, extraindo-se a taxa de denúncias de 28,49%. Destacou-se grande variação entre as justiças federais nos estados. Particularmente, chama a atenção São Paulo, com taxa de 5,78% de denúncias, do total de 12.922 inquéritos policiais concluídos. O estudo indicou que, do total de 60.582 procedimentos 7.108 se enquadraram no foco da pesquisa (delitos econômicos e corrupção). Desses, 5.140 foram arquivados e 1.968 geraram denúncias, cuja taxa foi de 27,70%. As piores médias de denúncias em inquérito policiais que investigaram crimes econômicos e corrupção foram encontradas nas justiças federais nos estados de São Paulo (8,13%), Acre (5,88%) e Roraima (2,56%) ( MACHADO; ZACKSESKI; RAUPP, 2016a MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; RAUPP, Rene Mallet. A investigação e a persecução penal da corrupção e dos delitos econômicos: uma análise exploratória do sistema de Justiça Federa. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 118, ano 24, p. 299-329, jan-fev. 2016a. , p. 299-315).

A pesquisa cotejou os tempos de investigação dos procedimentos e o oferecimento da denúncia. Extraiu-se os tempos médios de 787,16 dias para os inquéritos arquivados e de 643,48 dias para os inquéritos que geraram denúncia. Em relação aos inquéritos policiais que investigaram delitos econômicos e corrupção, o estudo indiciou os tempos médios de 948,11 dias para a finalização e oferecimento da denúncia e 1.178,90 dias para o arquivamento. Evidenciou-se que os inquéritos que tramitam por mais de 3 anos tendem a gerar mais arquivamentos que denúncias nos casos de corrupção e de delitos econômicos ( MACHADO; ZACKSESKI; RAUPP, 2016b MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; RAUPP, Rene Mallet. Tempos da investigação: o transcurso do inquérito policial no sistema de Justiça Federal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 124, ano 24, p. 143-181, out. 2016b. , p. 155-158).

Das publicações analisadas, é possível inferir que o SJC revela dificuldade em responder às demandas que recebe. Quanto às organizações que o compõem, o Judiciário parece enfrentar maior dificuldade no processamento dos crimes, pois a fase judicial se mostrou a mais morosa. No que tange aos fatores determinantes do tempo do processo, existem algumas conclusões acerca de fatores organizacionais, sugerindo-se que a prisão provisória do réu é um dos principais fatores de redução do tempo de tramitação. Porém, percebe-se que as premissas decisórias que orientam cada um dos atores envolvidos no fluxo do sistema criminal ainda não foram suficientemente esclarecidas, o que revela amplo espaço para pesquisas que se concentrem nessa análise.

5. Os estudos sobre o inquérito policial no SJC dos estados e federal

Nos últimos anos, as pesquisas empíricas no direito e no campo da segurança pública vem direcionando o foco para as práticas processuais, particularmente no inquérito policial ( ADORNO, 2009 ADORNO, Sérgio. Políticas públicas de segurança e justiça penal. Cadernos adenauer. Rio de Janeiro, v. 4, ano IX, p. 9-27, jan. 2009. , p. 20-21; ADORNO; PASINATO, 2010 ADORNO, Sérgio; PASINATO, Wânia. Violência e impunidade penal: Da criminalidade detectada à criminalidade investigada. DILEMAS: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social. v. 3, n. 7, p. 51-84, jan-fev-mar. 2010. , p. 54). O procedimento é objeto de críticas de especialistas e de diferentes setores sociais, pois é retratado como burocrático e ineficiente ( MACHADO, 2014 MACHADO, Bruno Amaral. Justiça criminal: diferenciação funcional, interações organizacionais e decisões. São Paulo: Marcial Pons, 2014. ; MISSE, 2010 MISSE, Michel (Org.). O inquérito policial no Brasil. Rio de Janeiro: NECVU/IFCS/UFRJ, 2010. ).

O estudo coordenado por Misse tornou-se referência do redirecionamento do objeto de análise da área de segurança pública. A pesquisa contemplou as distintas realidades e práticas do inquérito policial nas capitais do Rio de Janeiro, Pernambuco, Pará, Rio Grande do Sul e Distrito Federal e valeu-se de distintas técnicas, tanto quantitativas quanto qualitativas. A análise do fluxo do SJC constituiu-se em ferramenta importante para o mapeamento inicial das práticas do inquérito policial em alguns dos estados selecionados. O transcurso do tempo da investigação policial constituiu-se em categoria-chave para identificar a morosidade do procedimento e para lançar possíveis fatores envolvidos ( MISSE, 2010 MISSE, Michel (Org.). O inquérito policial no Brasil. Rio de Janeiro: NECVU/IFCS/UFRJ, 2010. ).

As pesquisas foram complementadas com técnicas qualitativas, como etnografias, grupos focais e entrevistas em profundidade e análises de conteúdo. O estudo evidenciou conflitos entre agentes de Polícia, delegados de Polícia, assim como entre delegados, promotores de justiça e magistrados. O estudo explicitou as distintas visões de profissionais que integram organizações, como a Polícia Civil, o Ministério Público e o Judiciário, sobre o inquérito policial. Além disso, evidenciou as limitações e o potencial do inquérito policial como instrumento jurídico-policial para o esclarecimento dos crimes ( MISSE, 2010 MISSE, Michel (Org.). O inquérito policial no Brasil. Rio de Janeiro: NECVU/IFCS/UFRJ, 2010. ).

Mais recentemente, a referida pesquisa financiada pela ESMPU teve como objeto a investigação e a persecução penal da corrupção e dos delitos econômicos no SJC federal. A análise do fluxo constituiu-se também no ponto de partida, vez que um dos objetivos foi evidenciar o transcurso do tempo da investigação policial. As análises sobre a morosidade do inquérito policial e as correlações entre o tempo da investigação e o oferecimento de denúncias ou arquivamento dos procedimentos foram um dos parâmetros para compreender as práticas do inquérito no âmbito federal. ( MACHADO; ZACKSESKI; RAUPP, 2016a MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; RAUPP, Rene Mallet. A investigação e a persecução penal da corrupção e dos delitos econômicos: uma análise exploratória do sistema de Justiça Federa. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 118, ano 24, p. 299-329, jan-fev. 2016a. , p. 299-329; MACHADO; ZACKSESKI; RAUPP, 2016b MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; RAUPP, Rene Mallet. Tempos da investigação: o transcurso do inquérito policial no sistema de Justiça Federal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 124, ano 24, p. 143-181, out. 2016b. , p. 143-181).

Da mesma forma, a pesquisa contou com técnicas qualitativas como grupos focais, entrevistas em profundidade e análise de conteúdo de documentos oficiais das organizações pesquisadas. A utilização de técnicas qualitativas e quantitativas permitiu adensar a compreensão sobre as múltiplas realidades vivenciadas pela prática do inquérito policial, os limites do procedimento e as variadas visões de servidores públicos de distintas agências federais, policiais federais, procuradores da República e magistrados federais ( MACHADO; ZACKSESKI; RAUPP, 2016a MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; RAUPP, Rene Mallet. A investigação e a persecução penal da corrupção e dos delitos econômicos: uma análise exploratória do sistema de Justiça Federa. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 118, ano 24, p. 299-329, jan-fev. 2016a. ; MACHADO; ZACKSESKI; RAUPP, 2016b MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; RAUPP, Rene Mallet. Tempos da investigação: o transcurso do inquérito policial no sistema de Justiça Federal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 124, ano 24, p. 143-181, out. 2016b. ).

A técnica de fluxo revela-se particularmente importante para a análise de procedimentos processuais e, no caso, para compreender as práticas do inquérito policial. Estudos evidenciam que o instituto assume especial relevância para os delegados de polícia, profissional do campo jurídico que se encarrega da direção das investigações policiais, e expõem as diferentes visões dos agentes de polícia e peritos, os quais se mostram críticos em relação à excessiva burocratização do procedimento ( MACHADO, 2014 MACHADO, Bruno Amaral. Justiça criminal: diferenciação funcional, interações organizacionais e decisões. São Paulo: Marcial Pons, 2014. ). Em que pesem variações regionais detectadas nas pesquisas em relação às atividades desempenhadas pelas polícias civis em diferentes unidades da federação ( MISSE, 2010 MISSE, Michel (Org.). O inquérito policial no Brasil. Rio de Janeiro: NECVU/IFCS/UFRJ, 2010. ) e às práticas do inquérito policial conduzido pela polícia federal ( MACHADO; ZACKSESKI; RAUPP, 2016a MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; RAUPP, Rene Mallet. A investigação e a persecução penal da corrupção e dos delitos econômicos: uma análise exploratória do sistema de Justiça Federa. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 118, ano 24, p. 299-329, jan-fev. 2016a. ; MACHADO; ZACKSESKI; RAUPP, 2016b MACHADO, Bruno Amaral; ZACKSESKI, Cristina; RAUPP, Rene Mallet. Tempos da investigação: o transcurso do inquérito policial no sistema de Justiça Federal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 124, ano 24, p. 143-181, out. 2016b. ), alguns achados devem ser destacados, pois remetem à análise organizacional, bem como à seletividade e à morosidade verificadas nos procedimentos. Os critérios determinantes para que os policiais instaurem inquéritos policiais em razão das ocorrências notificadas explicitam a seletividade em relação ao status do autor ou à natureza do fato investigado. Além disso, trazem à tona a diversidade de premissas decisórias no que tange às prioridades do Ministério Público e do Judiciário ( MACHADO, 2014 MACHADO, Bruno Amaral. Justiça criminal: diferenciação funcional, interações organizacionais e decisões. São Paulo: Marcial Pons, 2014. ). Essas variáveis também devem ser levadas em conta nas análises sobre o tempo de tramitação dos procedimentos, morosidade das investigações ou instruções, que acarretam impactos nas decisões judiciais.

Conclusão

A breve revisão da literatura permite extrair algumas considerações relevantes sobre a análise do fluxo do sistema de justiça criminal como ferramenta metodológica que tem sido utilizada de forma crescente nas pesquisas empíricas no direito e no campo da segurança pública. As tipologias de análise do fluxo (análise longitudinal ortodoxa, longitudinal retrospectiva e transversal) mostram-se adequadas para distintas abordagens. O dispositivo metodológico revela-se particularmente útil para categorizar a seletividade das organizações do SJC segundo o tipo penal, o lugar da infração, ou até mesmo o perfil do investigado. As regularidades identificadas sugerem padrões de atuação de atores e organizações segundo critérios não explicitados juridicamente. A análise do fluxo também é relevante para a mensuração dos tempos da investigação, da persecução penal e do julgamento. A abordagem mostra-se pertinente quando se consideram os efeitos do tempo na qualidade da prova produzida e nas taxas de esclarecimento dos crimes. Os estudos ganham em densidade quando podem cotejar os tempos de tramitação com outras variáveis, como os procedimentos previstos legalmente, os tipos penais e os perfis dos acusados e vítimas.

As pesquisas que se utilizam do fluxo no campo do direito e da segurança pública propiciam extenso material para análise. As abordagens organizacionais sugerem que a polícia, o ministério público e o judiciário atuam segundo diferentes premissas decisórias (racionalidades), o que se explica, em parte, pela diversidade de critérios em relação à instauração dos procedimentos de investigação (inquéritos policiais) e ao oferecimento das denúncias ou promoção de arquivamentos. A análise das premissas decisórias desvela que, na criminalidade tradicional, a cor da pele, o gênero e a posição social, bem como a natureza do tipo penal, são relevantes para compreender a seletividade do sistema de justiça criminal. A técnica de pesquisa mostra-se útil para aferir a morosidade da justiça, tema que vem ocupando a atenção de pesquisadores e especialistas. Nota-se especial interesse em mensurar os tempos de investigação e de tramitação processual nos casos de homicídios, já que o transcurso do tempo entre a data do fato e o início das investigações, o tempo consumido para a conclusão do inquérito policial, bem como o lapso temporal entre a denúncia e o trânsito em julgado da sentença são fatores cruciais para o baixo grau de esclarecimento dos crimes ou para a deficiência probatória na fase de instrução. Em síntese, a morosidade apresenta-se como variável relevante para análise da impunidade, em especial nos casos de mortes violentas.

A análise do fluxo é igualmente adequada para os estudos organizacionais, vez que propiciam dados objetivos sobre a forma como atuam diferentes atores e organizações do SJC. Uma das frentes promissoras de pesquisa é compreender as distintas racionalidades que orientam as organizações em seus processos decisórios. Explicitar a forma como decidem as organizações sugere investir no campo de estudo das diferentes premissas decisórias. Não apenas os programas condicionais - na forma estabelecida na legislação, tratados e atos normativos internos -, os programas finalísticos, consubstanciados em planos estratégicos ou prioridades estabelecidas, muitas vezes de forma contingente, mas também a cultura organizacional, na forma de rotinas cognitivas consolidadas para lidar com as diferentes tarefas submetidas às organizações ( MACHADO, 2014 MACHADO, Bruno Amaral. Justiça criminal: diferenciação funcional, interações organizacionais e decisões. São Paulo: Marcial Pons, 2014. ). Para tal objetivo, o fluxo constitui-se em valioso ponto de partida, mas supõe, certamente, contemplar técnicas qualitativas que permitam aprofundar eventuais regularidades nos processos decisórios, adensar a compreensão dos critérios decisórios, eventuais interações e disputas e conflitos organizacionais.

  • 1
    O contexto acadêmico da época foi propício para a consolidação do objeto de estudo. A abordagem de Becker foi influente entre sociólogos e juristas. Na década de 1970, pioneiros da criminologia crítica (ciências sociais e direito) sugeriram que a proposta de Becker fosse reinterpretada a partir de bases marxistas. O caráter ideológico e seletivo do direito penal foi uma das frentes de análise e orientou pesquisas empíricas nas décadas seguintes ( ANITUA, 2008 ANITUA, Gabriel Ignacio. Histórias dos pensamentos criminológicos. Trad. Sergio Lamarão. Rio de Janeiro: Revan, 2008. ; MACHADO, 2012 MACHADO, Bruno Amaral. Discursos criminológicos sobre o crime e o direito penal: comunicação e diferenciação funcional. Revista de Estudos Criminais, Ano X, nº 45, p. 110-116, 2012. ).
  • 2
    Sobre a divisão do trabalho jurídico-penal, remetemos a Machado (2014) MACHADO, Bruno Amaral. Justiça criminal: diferenciação funcional, interações organizacionais e decisões. São Paulo: Marcial Pons, 2014. .

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2018
  • Data do Fascículo
    Jun 2018

Histórico

  • Recebido
    19 Dez 2016
  • Aceito
    02 Jun 2017
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