Acessibilidade / Reportar erro

O Complexo processo de incorporação de tecnologias em saúde no Brasil

EDITORIAL

O implante transcateter da válvula aórtica (TAVI, do inglês transcatheter aortic valve implantation, ou TAVR, transcatheter aortic valve replacement), tratamento de escolha para pacientes portadores de estenose aórtica grave e considerados inoperáveis (classe I, nível de evidência B) e estratégia alternativa para a cirurgia de troca valvar nos indivíduos com alto risco cirúrgico (classe IIa, nível de evidência B), foi empregado, até o momento, em mais de 700 pacientes no Brasil. Esse procedimento recebeu a liberação do Conselho Federal de Medicina em janeiro de 2012, após avaliar essa prática como não experimental. Essa fase foi subsequente à aprovação do dispositivo utilizado no procedimento pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).

Em nosso sistema de incorporação de tecnologias em saúde, o cumprimento dessas duas primeiras etapas não assegura o reembolso pela Saúde Suplementar ou pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Para o reembolso obrigatório pelos planos de saúde é necessário que o procedimento integre o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde elaborado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que é renovado a cada 2 anos. Para reembolso do SUS, é necessária a aprovação pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (CONITEC), que deve se pronunciar após 180 dias da solicitação da incorporação.

No caso do TAVI, por três oportunidades a ANS não incluiu a técnica no Rol de Procedimentos. Na última atualização, que vigorará a partir de 2014, foi criado o Grupo Técnico Permanente, o qual poderá deliberar pela inclusão de novos procedimentos antes dos 2 anos regulamentares. Na CONITEC, a Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista (SBHCI) pleiteou a inclusão do TAVI em março de 2013 e recentemente a comissão colocou em consulta pública a incorporação do TAVI com a recomendação, em grau fraco, de não incorporar esse procedimento. Esse parecer, no entanto, pode ser modificado após consulta pública ou ser passível de contestação, em grau de recurso, junto ao ministro da Saúde.

Há algum tempo a ANS adicionou entre os critérios para inclusão no Rol a avaliação econômica do procedimento. No âmbito do SUS, apesar do princípio constitucional de que a saúde é um direito de todos e dever do Estado, o acesso à saúde está condicionado à existência de dotação orçamentária.

Com o propósito de pleitear novamente a inclusão do TAVI na Saúde Suplementar, Queiroga et al., representando a SBHCI, fizeram um estudo de custo-efetividade com a finalidade de incluir essa intervenção no Rol de Procedimentos. Desenvolveram um modelo preditivo para avaliar o custo-efetividade do procedimento em longo prazo. Observaram que a incorporação do TAVI pela ANS acarretaria impacto orçamentário incremental nos próximos 5 anos compatível com o de outras tecnologias já incorporadas pela Saúde Suplementar. Siqueira e Abizaid, do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, em São Paulo (SP), e Kodali e Leon, do Columbia University Medical Center/New York-Presbiterian Hospital e da Cardiovascular Research Foundation, em Nova Iorque, Estados Unidos, em editorial correspondente, estimam que mais de 45 mil pacientes poderiam se beneficiar da intervenção no Brasil, fato que esbarra na falta de reembolso pela Saúde Suplementar e pelo SUS. Apresentam as evidências do valor clínico do TAVI, em especial nos pacientes com risco cirúrgico proibitivo, do aumento da expectativa e da qualidade de vida, da manutenção dos resultados do procedimento em 5 anos e da diminuição das complicações associadas à intervenção com os dispositivos de novas gerações. Complementam sua análise mostrando resultados de estudos de custo-efetividade de países como Estados Unidos, Canadá e Inglaterra que, juntamente do publicado nessa edição, exibem custos que assemelham-se aos de outros tratamentos médicos já incorporados por essas instituições.

Em outra publicação de destaque, Andrade et al., da Santa Casa de Marília, em Marília (SP), trazem os resultados de pacientes com infarto agudo do miocárdio (IAM) submetidos à intervenção coronária percutânea (ICP) primária, comparando aqueles com e sem resolução do segmento ST. Identificaram a frequência, o perfil de pacientes e a consequência clínica daqueles que desenvolveram esse fenômeno. Abelin e Quadros, do Instituto de Cardiologia da Fundação Universitária de Cardiologia, em Porto Alegre (RS), em editorial relacionado, explicam que a análise da resolução do segmento ST após a terapia de reperfusão é ferramenta útil, simples e de baixo custo para avaliar a reperfusão em nível microvascular e que auxilia a reclassificar o risco do paciente, principalmente naqueles com fluxo TIMI 3 pós-ICP primária. Lembram as metodologias empregadas e seu papel como indicador prognóstico e ferramenta de pesquisa na era contemporânea.

Complementam o fascículo outros artigos importantes que abordam os preditores de insucesso de tromboaspiração na ICP primária; a influência da localização das lesões em enxertos de veia safena nos desfechos clínicos após ICP; os resultados da ICP por via radial em pacientes com doença arterial coronária estável e instável; os resultados de diabéticos tratados com stents farmacológicos do Registro Safira; as mudanças no perfil populacional e resultados da ICP do Registro Angiocardio; a evolução de pacientes com choque cardiogênico por IAM com supradesnivelamento do segmento ST; a valvuloplastia aórtica em pacientes em condição clínica in extremis; a interferência de introdutores reprocessados na oclusão da artéria radial após cateterismo cardíaco e a utilidade da angiografia coronária e da ressonância nuclear magnética no diagnóstico da cardiomiopatia isquêmica.

Boa leitura!

Á urea J. Chaves

Editora

  • O Complexo processo de incorporação de tecnologias em saúde no Brasil

    Áurea J. Chaves
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Nov 2013
    • Data do Fascículo
      2013
    Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista - SBHCI R. Beira Rio, 45, 7o andar - Cj 71, 04548-050 São Paulo – SP, Tel. (55 11) 3849-5034, Fax (55 11) 4081-8727 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: sbhci@sbhci.org.br