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Injeção de trombina guiada por ultrassom no tratamento de pseudoaneurisma da artéria femoral após procedimento percutâneo em pacientes com síndrome coronária aguda

Resumos

INTRODUÇÃO: A injeção de trombina guiada por ultrassom (IT) é uma opção para o tratamento de pseudoaneurisma da artéria femoral. No entanto, o resultado dessa técnica em pacientes com síndrome coronária aguda (SCA) pode ser comprometido pelo uso de medicações antitrombóticas. Também, o extravasamento de trombina para a circulação sistêmica pode causar aumento de eventos tromboembólicos. MÉTODOS: Foram selecionados todos os pacientes admitidos com SCA que apresentaram pseudoaneurisma da artéria femoral após procedimento percutâneo, tratados com IT, entre janeiro de 2007 e julho de 2011. Características clínicas e laboratoriais, resultado do tratamento e complicações foram avaliados. RESULTADOS: Analisamos 23 pacientes, com idade de 67,1 ± 14,2 anos, 60,9% eram do sexo feminino, com índice de massa corporal de 28,4 ± 4,7 kg/m², e 52,2% eram diabéticos. À apresentação, 87% tinham SCA sem supradesnivelamento do segmento ST e o restante, infarto do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST. Entre os pacientes avaliados, 70% foram submetidos a intervenção coronária percutânea. Todos os pacientes estavam em uso de ácido acetilsalicílico, 78,3% utilizaram inibidores da P2Y12 e 39,1%, inibidores da glicoproteína IIb/IIIa. A IT foi eficaz em ocluir o pseudoaneurisma em 100% dos casos (96,7% após a primeira injeção), sem embolia distal, infecção local ou necessidade de correção cirúrgica em nenhum caso. Não houve infarto, acidente vascular cerebral ou revascularização não-programada. Houve um óbito por choque cardiogênico, 22 dias após a IT, no segundo dia após cirurgia eletiva de revascularização miocárdica. CONCLUSÕES: O tratamento de pseudoaneurisma da artéria femoral com IT é um método seguro e eficaz em pacientes com SCA.

Cateterismo cardíaco; Trombina; Ultrassonografia de intervenção; Síndrome coronariana aguda


BACKGROUND: Ultrasound-guided thrombin injection (TI) is an option for the treatment of femoral artery pseudoaneurysm. Nevertheless, the result of this technique in patients with acute coronary syndrome (ACS) may be compromised by the use of antithrombotic drugs. In addition, thrombin extravasation to systemic circulation could potentially cause an increase in thromboembolic events. METHODS: Patients admitted with ACS who developed femoral artery pseudoaneurysm after a percutaneous procedure and treated by TI between January 2007 and July 2011 were included. Clinical and laboratory characteristics, treatment results and complications were evaluated. RESULTS: We evaluated 23 patients with mean age of 67.1 ± 14.2 years, 60.9% were women, with body mass index of 28.4 ± 4.7 kg/m² and 52.2% were diabetics. At presentation, 87% had non-ST elevation ACS and the remaining had ST elevation myocardial infarction. Of the evaluated patients, 70% were submitted to percutaneous coronary intervention. All patients were receiving aspirin, 78.3% used P2Y12 inhibitors and 39.1% used glycoprotein IIb/IIIa inhibitors. TI was successful in occluding the pseudoaneurysm in 100% of cases (96.7% after the first injection), without distal embolization, local infection or need of surgical correction. There were no cases of myocardial infarction, stroke or unscheduled revascularization. There was one death due to cardiogenic shock 22 days after TI, on the second post-operative day after an elective coronary artery bypass graft surgery. CONCLUSIONS: Treatment of femoral artery pseudoaneurysm by TI is a safe and effective procedure in patients with ACS.

Cardiac catheterization; Thrombin; Ultrasonography, interventional; Acute coronary syndrome


ARTIGO ORIGINAL

Injeção de trombina guiada por ultrassom no tratamento de pseudoaneurisma da artéria femoral após procedimento percutâneo em pacientes com síndrome coronária aguda

Ultrasound-guided thrombin injection in the treatment of femoral artery pseudoaneurysm after percutaneous procedures in patients with acute coronary syndrome

Fábio Augusto PintonI; Alexandre Russo SpósitoII; Vitor de Andrade VahleIII; Paulo Rogério SoaresIV; Silvio ZalcV; Marco Antonio PerinVI; Expedito Eustáquio Ribeiro da SilvaVII; Antonio Esteves FilhoVIII; Pedro Alves Lemos NetoIX

IMédico residente do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

IIMédico residente do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

IIIMédico residente do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

IVDoutor. Médico cardiologista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

VDoutor. Médico cardiologista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

VILivre-docente. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

VIILivre-docente. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

VIIIMédico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

IXLivre-docente. Diretor do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

Correspondência Correspondência: Fábio Augusto Pinton. Av. Dr. Enéas Carvalho de Aguiar, 44 – Cerqueira César São Paulo, SP, Brasil – CEP 05403-900 E-mail: fabiopinton@gmail.com

RESUMO

INTRODUÇÃO: A injeção de trombina guiada por ultrassom (IT) é uma opção para o tratamento de pseudoaneurisma da artéria femoral. No entanto, o resultado dessa técnica em pacientes com síndrome coronária aguda (SCA) pode ser comprometido pelo uso de medicações antitrombóticas. Também, o extravasamento de trombina para a circulação sistêmica pode causar aumento de eventos tromboembólicos.

MÉTODOS: Foram selecionados todos os pacientes admitidos com SCA que apresentaram pseudoaneurisma da artéria femoral após procedimento percutâneo, tratados com IT, entre janeiro de 2007 e julho de 2011. Características clínicas e laboratoriais, resultado do tratamento e complicações foram avaliados.

RESULTADOS: Analisamos 23 pacientes, com idade de 67,1 ± 14,2 anos, 60,9% eram do sexo feminino, com índice de massa corporal de 28,4 ± 4,7 kg/m², e 52,2% eram diabéticos. À apresentação, 87% tinham SCA sem supradesnivelamento do segmento ST e o restante, infarto do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST. Entre os pacientes avaliados, 70% foram submetidos a intervenção coronária percutânea. Todos os pacientes estavam em uso de ácido acetilsalicílico, 78,3% utilizaram inibidores da P2Y12 e 39,1%, inibidores da glicoproteína IIb/IIIa. A IT foi eficaz em ocluir o pseudoaneurisma em 100% dos casos (96,7% após a primeira injeção), sem embolia distal, infecção local ou necessidade de correção cirúrgica em nenhum caso. Não houve infarto, acidente vascular cerebral ou revascularização não-programada. Houve um óbito por choque cardiogênico, 22 dias após a IT, no segundo dia após cirurgia eletiva de revascularização miocárdica.

CONCLUSÕES: O tratamento de pseudoaneurisma da artéria femoral com IT é um método seguro e eficaz em pacientes com SCA.

DESCRITORES: Cateterismo cardíaco. Trombina. Ultrassonografia de intervenção. Síndrome coronariana aguda.

ABSTRACT

BACKGROUND: Ultrasound-guided thrombin injection (TI) is an option for the treatment of femoral artery pseudoaneurysm. Nevertheless, the result of this technique in patients with acute coronary syndrome (ACS) may be compromised by the use of antithrombotic drugs. In addition, thrombin extravasation to systemic circulation could potentially cause an increase in thromboembolic events.

METHODS: Patients admitted with ACS who developed femoral artery pseudoaneurysm after a percutaneous procedure and treated by TI between January 2007 and July 2011 were included. Clinical and laboratory characteristics, treatment results and complications were evaluated.

RESULTS: We evaluated 23 patients with mean age of 67.1 ± 14.2 years, 60.9% were women, with body mass index of 28.4 ± 4.7 kg/m² and 52.2% were diabetics. At presentation, 87% had non-ST elevation ACS and the remaining had ST elevation myocardial infarction. Of the evaluated patients, 70% were submitted to percutaneous coronary intervention. All patients were receiving aspirin, 78.3% used P2Y12 inhibitors and 39.1% used glycoprotein IIb/IIIa inhibitors. TI was successful in occluding the pseudoaneurysm in 100% of cases (96.7% after the first injection), without distal embolization, local infection or need of surgical correction. There were no cases of myocardial infarction, stroke or unscheduled revascularization. There was one death due to cardiogenic shock 22 days after TI, on the second post-operative day after an elective coronary artery bypass graft surgery.

CONCLUSIONS: Treatment of femoral artery pseudoaneurysm by TI is a safe and effective procedure in patients with ACS.

DESCRIPTORS: Cardiac catheterization. Thrombin. Ultrasonography, interventional. Acute coronary syndrome.

A ocorrência de pseudoaneurisma da artéria femoral após cateterismo cardíaco apresenta incidência entre 0,05% e 2%, aumentando para 3% a 8% nos procedimentos terapêuticos, em decorrência do uso de introdutores mais calibrosos e de terapias antiplaquetárias e anticoagulantes mais potentes, especialmente nos pacientes com síndrome coronária aguda.1-4

As três modalidades principais de tratamento para esse tipo de complicação são a correção cirúrgica, a compressão guiada por ultrassom e a injeção de trombina.

A cirurgia tem sido tradicionalmente considerada padrão de referência, porém, pelo seu caráter invasivo, está associada a maior taxa de complicações, dentre elas infecção de ferida operatória, sangramento e deiscência de sutura. Além disso, está também associada a maior tempo de internação hospitalar e maior custo.5,6

No início da década de 1990, a compressão guiada por ultrassom foi introduzida por Fellmeth et al.7 como um dos primeiros métodos não-invasivos para a correção de pseudoaneurisma. Tem como vantagem o fato de ser não-invasiva e de baixo custo, porém na maioria das vezes é preciso compressão prolongada para se obter sucesso, muitos pacientes não a toleram por causa da dor e sua eficácia é menor, principalmente no contexto das síndromes coronárias agudas.8,9

Recentemente, a injeção de trombina tem se tornado o método de escolha no tratamento dessa complicação.10 Diversos estudos, nacionais e internacionais, têm demonstrado altas taxas de sucesso com uso da trombina para a correção de pseudoaneurisma da artéria femoral.11-15 No entanto, poucos dados são hoje disponíveis sobre a segurança e a eficácia do uso de trombina local em pacientes com síndrome coronária aguda. Nessa população, poder-se-ia especular que o frequente uso de antiplaquetários e anticoagulantes poderia reduzir a eficácia da técnica. Por outro lado, um eventual extravasamento de pequena quantidade de trombina para a circulação sistêmica poderia determinar aumento de eventos adversos nesse subgrupo de maior risco aterotrombótico.

O objetivo deste estudo foi avaliar o desempenho clínico da injeção de trombina guiada pelo ultrassom em pacientes com síndrome coronária aguda e que desenvolveram pseudoaneurisma da artéria femoral após procedimento percutâneo cardíaco.

MÉTODOS

Foram selecionados, por meio de prontuário eletrônico, todos os pacientes que apresentaram pseudoaneurisma da artéria femoral após cateterismo cardíaco diagnóstico ou terapêutico decorrente de quadro de síndrome coronária aguda [angina instável, síndrome coronária aguda sem supradesnivelamento do segmento ST (SCASSST) e infarto do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAMCSST)], tratados com injeção de trombina guiada por ultrassom no Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (São Paulo, SP, Brasil), no período compreendido entre janeiro de 2007 e julho de 2011.

O introdutor arterial foi retirado por meio de compressão manual por pelo menos 15 minutos, 6 horas após a administração de heparina não-fracionada ou 10 horas a 12 horas após a última administração de heparina de baixo peso molecular. Após curativo compressivo local, o paciente permanecia em repouso no leito, com restrição de movimentação do membro inferior por pelo menos 6 horas após a retirada do introdutor.

O diagnóstico de pseudoaneurisma foi feito pelo exame clínico (presença de hematoma doloroso, pulsátil, com sopro) e confirmado com ultrassom Doppler. A indicação de tratamento do pseudoaneurisma com trombina ficou a critério do médico assistente.

Todos os procedimentos de injeção de trombina foram realizados pela equipe de radiologia intervencionista de nossa instituição. Após a administração da trombina e a confirmação da ausência de fluxo, era realizado curativo compressivo local e o paciente permanecia em repouso por 24 horas.

A eficácia do método foi avaliada por meio do sucesso do procedimento, definido por ausência de fluxo no interior do pseudoaneurisma após a injeção de trombina.

Para a análise de segurança, foi pesquisada a presença de complicações no período intra-hospitalar, definidas por embolia distal no membro tratado, infecção local, necessidade de correção cirúrgica, necessidade de transfusão de hemoderivados, infarto agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral, nova revascularização não-planejada após o procedimento índice e óbito.

Dados sobre características clínicas, laboratoriais, medicamentos em uso, eficácia e segurança do procedimento foram coletados no prontuário eletrônico.

RESULTADOS

Do total de 31 pacientes que desenvolveram pseudoaneurisma da artéria femoral após a realização de cateterismo e/ou intervenção coronária percutânea e que foram tratados por injeção de trombina guiada pelo ultrassom, 23 apresentavam diagnóstico de síndrome coronária aguda e foram considerados para a análise.

A maioria era do sexo feminino (60,9%), com idade de 67,1 ± 14,2 anos (32,6 anos a 92,8 anos) e índice de massa corporal de 28,4 ± 4,7 kg/m². Hipertensão arterial sistêmica estava presente em 91,3% dos pacientes, diabetes em 52,2%, tabagismo em 17,4% e insuficiência cardíaca em 30,4%. Um terço da população tinha sido submetido a intervenção coronária percutânea prévia e 8,7%, a revascularização do miocárdio.

Os valores de hemoglobina e hematócrito na ocasião do procedimento percutâneo eram de 12,4 ± 2,1 mg/dl e 37,9 ± 6,3%, respectivamente. A média do clearance de creatinina calculado pela fórmula de Cockroft e Gault foi de 62,1 ± 34,5 ml/min. Todos os pacientes estavam em uso de ácido acetilsalicílico, 78,3% utilizaram inibidores P2Y12, 39,1%, inibidores da glicoproteína IIb/IIIa, 65,2%, heparina de baixo peso molecular, e 17,4%, heparina não-fracionada. Apenas 1 paciente (4,3%) recebeu trombolítico (Tabela).

Com relação ao quadro clínico, 87% dos pacientes tinham diagnóstico de angina instável ou SCASSST e o restante, de IAMCSST. Cateterismo diagnóstico foi realizado em 30,4% e procedimento terapêutico, em 69,6% dos casos. O introdutor 7 F foi utilizado em 73,9% dos procedimentos e o 6 F, nos demais.

O tempo médio do procedimento percutâneo até o diagnóstico do pseudoaneurisma foi de 2,7 ± 2,5 dias (mediana de 2 dias) e até a realização do ultrassom, de 3,2 ± 0,8 dias. Os pseudoaneurismas tinham colo variando de 0,2 cm a 3,7 cm (média de 1 ± 0,9 cm) e o maior diâmetro entre 1,3 cm e 6 cm (média de 2,7 ± 1,8 cm), sendo multiloculados em 17,4% dos pacientes.

O sucesso do procedimento foi alcançado em 96,7% dos pacientes na primeira injeção de trombina e em 100% na segunda injeção (realizada 48 horas após a primeira tentativa). A maioria dos pacientes (78,3%) estava em uso de terapia antiplaquetária dupla e mais da metade (56,5%) em uso de heparina profilática durante o procedimento para correção do pseudoaneurisma. Não houve relato de complicação embólica distal, reação alérgica, infecção local, necessidade de correção cirúrgica, necessidade de transfusão de hemoderivados ou infarto agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral e nova revascularização após o procedimento índice.

Houve apenas um óbito na população estudada, decorrente de choque cardiogênico, no segundo dia após cirurgia eletiva de revascularização do miocárdico, 22 dias após a injeção de trombina.

DISCUSSÃO

Pseudoaneurisma após procedimentos cardiológicos percutâneos é uma das complicações vasculares mais comuns. Os principais fatores de risco para sua ocorrência são idade > 65 anos, hipertensão, obesidade, insuficiência arterial periférica, introdutores calibrosos, e uso de antiplaquetários e anticoagulantes.10 Em nossa casuística, a média de idades foi de 67,1 anos, 91,3% eram hipertensos, 73,9% utilizaram introdutor 7 F e 69,6% estavam em uso de terapia antiplaquetária dupla associada a heparina em dose terapêutica.

Até 1990, o único tratamento disponível para pseudoaneurisma era a correção cirúrgica. Embora muito eficaz, esse procedimento apresenta uma série de complicações. San Norberto García et al.16 estudaram 79 pacientes que realizaram cirurgia para correção de pseudoaneurisma. Nesse estudo, 71% dos pacientes apresentaram algum tipo de complicação em 30 dias, sendo a necessidade de transfusão a mais frequente (53%), seguida por infecção (19%) e deiscência de sutura (12,7%). A mortalidade relacionada à cirurgia foi de 3,8%. O uso de terapia antiplaquetária ou anticoagulante após a realização do cateterismo cardíaco foi um fator de risco independente para o aumento da morbidade pós-operatória.16

Em 1991, Fellmeth et al.7 descreveram o tratamento de pseudoaneurisma por meio da compressão guiada por ultrassom. Esse método apresenta taxas de sucesso entre 75% e 98% e baixas taxas de complicações.17,18 No entanto, na maioria das vezes, é um procedimento prolongado e doloroso, com aproximadamente 80% dos casos necessitando de 60 minutos de compressão.8 Além disso, em pacientes em uso de antiagregantes plaquetários e anticoagulantes, as taxas de recorrência de pseudoaneurisma podem chegar a 30%.19

A injeção de trombina guiada por ultrassom para o tratamento de pseudoaneurisma ganhou destaque após as publicações de Liau et al.20 e Kang et al.21, com taxas de sucesso de 100% e 95%, respectivamente. Posteriormente, diversos estudos surgiram na literatura, reportando taxas de sucesso entre 93% e 100%.11-15 Quando comparada à compressão guiada por ultrassom, a injeção de trombina apresentou maior taxa de sucesso (100% vs. 87%; P < 0,05) com menor custo hospitalar.22 Krüger et al.11 observaram também que as taxas de sucesso eram maiores nos pseudoaneurismas simples, quando comparadas às taxas de pseudoaneurismas multiloculados (97% vs. 61%). No entanto, em nossa população, em que 17,5% dos pseudoaneurismas eram multiloculados, a taxa de sucesso foi de 100%, independentemente da característica do pseudoaneurisma.

A injeção de trombina em pacientes em uso de antiagregantes e anticoagulantes também foi avaliada em alguns estudos. A taxa de falência é maior em pacientes em uso concomitante de antiagregantes e anticoagulantes (6,3% vs. 1,3%; P = 0,026).12 Em um estudo com 30 pacientes, dos quais 18 estavam anticoagulados, a taxa de sucesso foi de 100%.23 Em outro estudo com 274 pacientes em uso de antiagregantes e/ou anticoagulantes, a taxa de sucesso com o uso de trombina foi de 97%.24 Em nossa casuística, em que 78,3% dos pacientes estavam em uso de terapia antiplaquetária dupla e em 56,5% associada ao uso de heparina profilática na ocasião do tratamento com a trombina, a taxa de sucesso foi de 100%.

No entanto, a maioria dos trabalhos não especifica o número de pacientes com síndrome coronária aguda que realizaram injeção de trombina para correção de pseudoaneurisma. Em um estudo nacional com 15 pacientes tratados com injeção de trombina e todos com sucesso, 10 deles tinham diagnóstico de síndrome coronária aguda à admissão.14 Até o momento, não há trabalhos avaliando o uso da injeção de trombina apenas em pacientes com síndrome coronária aguda.

Embora raras, o procedimento não é isento de complicações. Em um estudo multicêntrico realizado na Alemanha, com 595 pacientes, a incidência de formação de trombo na artéria femoral após injeção de trombina foi de 0,5%, com relato de trombose venosa profunda em 0,5% e de tromboembolismo pulmonar em 0,2% da população.12 Ohlow et al.25 relataram um caso de isquemia distal do membro após injeção de trombina, que evoluiu com necessidade de amputação do membro afetado. Nos pacientes tratados com trombina em nosso serviço não houve relato de complicações. Houve apenas um óbito por choque cardiogênico após cirurgia eletiva de revascularização do miocárdio, sem relação causal com a injeção de trombina.

O presente estudo demonstra a efetividade e a segurança da injeção de trombina guiada por ultrassom no tratamento de pseudoaneurisma da artéria femoral em pacientes com síndrome coronária aguda. O sucesso foi alcançado em 100% dos casos, independentemente da complexidade do pseudoaneurisma e do uso de antiagregantes plaquetários. Além disso, não houve complicações relacionadas com o uso dessa terapia.

Limitações do estudo

Este é um estudo pioneiro em demonstrar o resultado da injeção de trombina para tratamento de pseudoaneurisma da artéria femoral em pacientes com síndrome coronária aguda. No entanto, seu caráter observacional, a ausência de um grupo controle para fins de comparação, bem como o pequeno número de pacientes não nos permitem tirar conclusões definitivas e abrangentes sobre o tema, sendo necessários estudos randomizados e envolvendo maior número de pacientes para tal.

CONCLUSÕES

Nossos dados sugerem que a injeção de trombina guiada por ultrassom é um método eficaz e seguro para o tratamento de pseudoaneurismas da artéria femoral ocorridos após cateterismo cardíaco diagnóstico ou terapêutico em pacientes com síndrome coronária aguda.

CONFLITO DE INTERRESES

Os autores declaram não haver conflito de interesses relacionado a este manuscrito.

Recebido em: 2/1/2013

Aceito em: 28/2/2013

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  • Correspondência:

    Fábio Augusto Pinton.
    Av. Dr. Enéas Carvalho de Aguiar, 44 – Cerqueira César
    São Paulo, SP, Brasil – CEP 05403-900
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Maio 2013
    • Data do Fascículo
      Mar 2013

    Histórico

    • Recebido
      02 Jan 2013
    • Aceito
      28 Fev 2013
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