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Comunicação Pública na esfera social hiperconectada

MAINIERI, Tiago. Um peso, duas medidas. : desvelando a comunicação pública na sociedade midiatizada. Coleção Rupturas Metodológicas para uma Leitura Crítica da Mídia. 6. Goiânia: Gráfica UFG, 2016.

Sem pretensão de esgotar o tema, o livro traz reflexões sobre a Comunicação Pública na sociedade midiatizada sob a égide das redes online, considerada por diversos autores como uma nova esfera pública. O conceito ampliado de Comunicação Pública é defendido nos primeiros capítulos e, durante os demais, é desenvolvido a partir da discussão sobre os processos de mediação comunicacional da sociedade contemporânea com o estabelecimento de um bios midiático.

A obra é estruturada em quatro capítulos, que vão se entrelaçando e contextualizam a subárea da Comunicação Pública, cuja centralidade deve ser o interesse público, este sim, o peso a ser cogitado em um processo que se expande e se complexifica, e no qual as medidas não mais podem ser fixadas, pois tornaram-se fluidas e de contornos imprecisos, daí o sugestivo título “Um peso, duas medidas”.

O primeiro capítulo “Comunicação – a polissemia do termo e seus contornos” se apoia nos argumentos de Luiz Martino e Muniz Sodré para destacar o sentido relacional, de conversação e vinculação dos processos sócio-comunicativos. É o caráter relacional da comunicação que estabelece os limites, por vezes, imprecisos e intercambiáveis da sociedade informacional midiatizada.

A discussão é aprofundada no segundo capítulo “A emergência do Comunicacional e seu imbricamento com as estruturas midiáticas”. Citando, dentre outros, José Luiz Braga e John Thompson, o autor desafia os leitores a deslocar o pensamento dos produtos midiáticos para o cerne da questão: os sentidos. Ele propõe que ao “invés de considerarmos unicamente seus atributos técnicos e componentes tecnológicos, devemos apreciar o papel das mídias a partir das interações [...] devemos considerar não apenas a circulação, mas a produção de sentidos na sociedade contemporânea” (p.49).

O autor faz ressalvas quanto à democratização de conteúdos que circulam na esfera pública por meio dos processos midiáticos, inclusive na nova ambiência, a Internet. “Na sociedade contemporânea, a mídia constitui-se num importante espaço de interlocução. Não significa dizer que seja um espaço democrático, plural, transparente, livre de amarras ideológicas, despretensioso e sem intencionalidades subjacentes. Há interlocução sem dúvida, mas entre forças díspares e sujeitos que disputam e produzem sentido” (p.21).

Utilizando os termos “integrados e apocalípticos” de Umberto Eco, a obra traz as visões otimistas e pessimistas sobre a comunicação midiática para o terceiro capítulo que trata da “Sociedade tecida pela comunicação versus sociedade tecida pela (in)comunicação em rede”. Os integrados, para Mainieri, são os defensores de que o advento da Internet trouxe uma sociedade mais conectada, mais plural e participativa, especialmente com as redes sociais online. Já os apocalípticos, segundo o autor, acreditam que a sociedade midiatizada em rede produz, entre outros, isolamento ou “individualização passiva” (p.65). Também causa “narcisismo digital” com a hipervisibilidade e autoexposição, tornando-se “uma sala de espelhos” (p.68), o que a obra sugere ser (in)comunicação.

Por fim, o último capítulo “Os desdobramentos da Dimensão Pública da Comunicação – o Interesse Público como Amálgama da Comunicação Pública” aborda a esfera pública como conceito fundante para o tema proposto. Ele apresenta as ideias de Habermas, Arendt e Bobbio para defender a centralidade da Comunicação Pública na esfera social midiatizada, cujos elementos visibilidade, informação, conversação e sociabilidade se aproximam, ora no âmbito público, ora no privado, em uma dimensão cada vez mais líquida e porosa.

Os três teóricos que embasam o capítulo ampliam o debate sobre Comunicação Pública travado nesta promissora área de estudos, onde o autor destaca, a partir de Pierre Zémor, os pioneiros Elizabeth Brandão, Graça Monteiro, Heloiza Matos e Jorge Duarte. Uma das contribuições de Mainieri nesta obra é oferecer uma definição que expande o conceito de Comunicação Pública para além daquele que a entende como “diálogo entre estado, governo e sociedade”, ou seja, para uma prática cidadã, onde atores sociais antes não vistos passem a ser protagonistas das ações, participativos a partir da conversação ambientada em rede online e para além desta. A ideia pode ser sintetizada no pensamento de Mainieri quando argumenta que “aproximamo-nos da prática da Comunicação Pública quando as múltiplas vozes da sociedade ecoam e constituem a própria esfera pública” (p.93).

Os questionamentos feitos durante a obra suscitam novos e instigantes temas para que pesquisas sobre a Comunicação Pública adquiram um novo foco, agora sob a premissa de que o conceito que melhor a define deve ser o do interesse público, em prol da coletividade e da cidadania participativa na sociedade informacional. Algumas indagações que se destacam são: Como a sociedade conversa consigo mesma a partir do olhar da Comunicação Pública? Como garantir a Comunicação Pública como espaço plural para a intervenção do cidadão no debate de questões de interesse público? São as mídias as ágoras contemporâneas?

A obra faz parte da coleção “Rupturas Metodológicas para uma Leitura Crítica da Mídia”, resultado do Casadinho/Procad entre os programas de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Goiás (UFG) e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que publicou as pesquisas realizadas pelos integrantes do grupo, sob curadoria das professoras Raquel Paiva e Simone Tuzzo. O professor Tiago Mainieri, com esta obra, condensa conhecimento teórico e pesquisa reunidos em sua carreira acadêmica, coroada nos estudos de pós-doutoramento. Igualmente, junta-se aos pesquisadores brasileiros que pensam a Comunicação Pública a partir da sociedade conectada em redes, centrando-se no interesse coletivo com vistas à interlocução dos atores sociais.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2017

Histórico

  • Recebido
    07 Dez 2016
  • Aceito
    28 Jun 2017
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