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Narrativas webjornalísticas como elemento de inovação: casos de Al Jazeera. Folha de S.Paulo. The Guardian. The New York Times e The Washington Post

Narrativas del periodismo digital como un elemento de innovación: casos de AlJazeera, Folha de S.Paulo, The Guardian, The New York Times y The WashingtonPost

Resumo

O artigo faz uma reflexão sobre a inovação no webjornalismo, com enfoque especial nos conteúdos expressivos e narrativas. Sob esta perspectiva, verifica-se que características como o texto longform, o uso renovador do áudio e conteúdos imersivos, como representações gráficas ou imagéticas em terceira dimensão e, mais recentemente, em realidade virtual (VR), têm se destacado nesse tipo de produto noticioso pelo menos, desde 2012. O trabalho apresenta, ainda, um breve estado da arte de produtos selecionados e media labs existentes em algumas organizações jornalísticas de referência. Com isso, discute-se o conceito de inovação à luz de autores dedicados ao tema, em uma revisão bibliográfica, complementada por descrições de iniciativas como media labs em algumas redações online, e análise de exemplos de narrativas que consideramos inovadoras no webjornalismo.

Palavras-chave
Inovação; Jornalismo de inovação; Narrativas webjornalísticas; Conteúdos expressivos; Media labs

Resumen

El artículo presenta una reflexión sobre la innovación en el periodismo web, con especial atención a los contenidos expresivos y narrativas. Desde esta perspectiva, parece que características como el texto longform, la reanudación del uso de audio y contenido immersivo, como las representaciones gráficas o de imágenes en 3D y, más recientemente, la realidad virtual (VR), se han destacado en este tipo de producto de prensa desde 2012. En este documento también se presenta un estado de la técnica de productos selecionados y laboratorios de los medios de comunicación en algunas organizaciones de noticias más importantes. Se discute el concepto de innovación a la luz de autores dedicados al tema, en una revisión de literatura, complementado con descripciones de iniciativas tales como laboratorios de los medios de comunicación en redacciones web, y el análisis de las narrativas que consideramos innovadoras en periodismo de la red. Palabras clave: Innovación. Periodismo de innovación. Narrativas periodicas Web. Contenidos expresivos. Media labs.

Palabras clave
Innovación; Periodismo de innovación; Narrativas periodicas Web; Contenidos expresivos; Media labs

Abstract

The article presents a reflection about innovation in web journalism, with special focus on the expressive contents and narratives. From this perspective, it appears that features like longform text, the refreshing use of audio and immersive content, such as graphic or imagistic representations in 3D and, more recently, virtual reality (VR), have stood out in this kind of news product at least since 2012. The paper also introduces a state of the art of some existing products and the media labs in some leading news organizations. It discusses the concept of innovation in the light of authors dedicated to the subject, in a literature review, complemented by descriptions of initiatives such as media labs in some online newsrooms, and analysis of narratives that we consider innovative in web journalism.

Keywords
Innovation; Innovative Journalism; Webjournalistic narratives; Expressive contents; Media labs

Introdução

Inovação parece ser a palavra-chave no jornalismo online em 2017, ensaiada a partir de anos anteriores, especialmente no campo das estratégias das organizações para superar a crise no setor. Mais do que ação, a inovação é uma reação, uma resultante ligada a alguma insatisfação, apesar de jamais dever ser entendida como uma mera solução de problemas. A inovação é comumente compreendida a partir de sua aparente vertente tecnológica, porém inovar, por definição, ultrapassa esse recorte.

Em estudo sobre as transformações dos negócios e da sociedade na era da internet, Castells (2001)CASTELLS, Manuel. La Galáxia Internet. Reflexiones sobre internet, empresa y sociedad. Barcelona: Plaza & Janés Editores (colección Areté), 2001. já apontava a função da inovação como componente protagonista no cenário recente das Novas Tecnologias de Informação. Para o autor, a própria inovação é resultado de três fatores centrais: o primeiro, a criação de novos conhecimentos na ciência, na tecnologia e na administração. O segundo diz respeito à disponibilidade de profissionais de alto nível de educação, autoprogramáveis, capazes de usar conhecimento novo para aumentar a produtividade. Já o terceiro fator se refere à existência de empresários capazes e com disposição para assumir os riscos de transformar projetos empresariais inovadores em desempenho empresarial (CASTELLS, 2001CASTELLS, Manuel. La Galáxia Internet. Reflexiones sobre internet, empresa y sociedad. Barcelona: Plaza & Janés Editores (colección Areté), 2001.).

Uma das formas mais interessantes de inovação no Jornalismo tem se verificado em novas abordagens narrativas nos conteúdos noticiosos ciberjornalísticos. Este fenômeno aparece em conteúdos expressivos como o texto longform, o uso renovador do áudio e em características imersivas tais como representações gráficas ou imagéticas em terceira dimensão e, mais recentemente, em realidade virtual (VR).

O conceito transcende o aspecto tecnológico, apesar de atravessar, em grande parte, os casos citados neste trabalho. A inovação tem sido reconhecida como um importante elemento para incrementar a qualidade e a aceitação do Jornalismo, fato evidenciado, por exemplo, em premiações internacionais que reforçam seu potencial como diferenciador de um Jornalismo de qualidade. O Online Journalism Awards1 1 “O OJA reconhece a grande mídia, sites internacionais e independentes e indivíduos produzindo trabalhos inovadores em narrativas multimídia. O Comitê do OJA e seus julgadores dão uma ênfase especial para as inscrições que demonstram domínio das características especiais e tecnologias emergentes do jornalismo digital.” (2016 – Tradução nossa). Mais em: http://journalists.org/awards. de 2015, por exemplo, reconhece o trabalho inovador na produção de narrativas jornalísticas de qualidade tanto na mídia de referência, como em sites internacionais e independentes, levando em conta ainda, o uso inovador de tecnologias emergentes no jornalismo digital.

De fato, a inovação tem permeado iniciativas nas perspectivas de negócio, de produção de conteúdos e de distribuição jornalísticas, destacando-se projetos especiais ou a implementação de media labs em organizações jornalísticas online de referência2 2 Ainda que sem uma produção jornalística disponível no momento, vale destacar o exemplo da NBC Universal (NBCU), uma das maiores empresas de mídia do mundo no desenvolvimento, produção e comercialização de entretenimento, notícias e informações para uma audiência global. O media lab da NBCU se define como dedicado à condução de uma cultura colaborativa de inovação. “Estamos comprometidos em criar parcerias com startups, grupos de pesquisa, acadêmicos, criadores de conteúdo e marcas. Nossos laboratórios localizados em Londres, Nova York e Los Angeles estão liderando o caminho com novas ideias e as últimas tecnologias para instigar o futuro da mídia e de contar histórias” (2016). O processo do media lab da NBCU é dividido em quatro etapas básicas: informar, inspirar, engajar e distribuir. Todo o fluxo é permeado pela ideia de inovação e tecnologia. , como Al Jazeera3 3 Disponível em: http://www.ajplus.net/english. Acesso em: 18 mai. 2016. , Folha de S.Paulo4 4 Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/tudosobre. Acesso em: 25 jan. 2016. , The Guardian5 5 Disponível em: http://guardianlabs.theguardian.com. Acesso em: 18 mai. 2016. e The New York Times6 6 Disponível em: http://nytlabs.com. Acesso em: 24 abr. 2016. . Podemos inferir que o crescente número de media labs dos próprios veículos jornalísticos sugere um crescimento das atenções voltadas à inovação, gerando práticas e acompanhamento mais próximos das redações. Dentro deste cenário, o conteúdo tem ocupado um papel fundamental, com destaque para o especial multimídia “Snow Fall”, publicado pelo The New York Times, em 2012. O produto tornou-se um marco no campo da narrativa jornalística digital, a ponto de converter-se em um verbo para a criação de narrativas multimídia, como observou a então editora-executiva do The New York Times, Jill Abramson, em 2013 (MALIK, 2013MALIK, Om. O projeto “Snow Fall” e o futuro do jornalismo, 2013. Disponível em: http://observatoriodaimprensa.com.br/monitor-da-imprensa/ed746-o-projeto-snow-fall-e-a-o-futuro-do-jornalismo. Acesso em: 18 jul. 2015.
http://observatoriodaimprensa.com.br/mon...
). Um bom levantamento a respeito de como as narrativas webjornalísticas têm explorado conteúdos inovadores está no texto assinado por Josh Stearns, intitulado “The best online storytelling and journalism 2014”, publicado em 20157 7 Disponível em: https://goo.gl/mjPj79. Acesso em: 19 ago. 2015. . Nesta sondagem, o autor sublinha o uso inovador de áudio, imagens e histórias imersivas como características inovadoras das narrativas, dentre outros aspectos.

Neste artigo, pretendemos refletir sobre a inovação no webjornalismo com enfoque especial nos conteúdos e narrativas. Pelo menos desde 2012, características como o texto longform, a utilização renovadora do áudio, por exemplo, além de conteúdos imersivos, como as representações visuais em terceira dimensão e, mais recentemente, em realidade virtual, têm se destacado num cenário no qual o Jornalismo procura explorar ao máximo as possibilidades expressivas do meio. Nesta reflexão, fazemos um breve estado da arte dos projetos e media labs existentes em organizações jornalísticas de referência selecionadas, discutimos o conceito de inovação à luz de alguns autores dedicados ao tema e exploramos exemplos de narrativas inovadoras no webjornalismo.

Jornalismo de inovação

O termo “inovação” vem passando pela mesma situação ocorrida com o conceito de “convergência” há poucos anos. Por ser aplicável a inúmeras situações e áreas do conhecimento, é preciso delimitar o contexto no qual se pretende refletir. Originalmente despontada no setor econômico, industrial e capitalista, a inovação surge nessas organizações basicamente para ampliar o rendimento (SCHUMPETER, 1985SCHUMPETER, J.A. Teoria do Desenvolvimento Econômico: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juto e o ciclo econômico. São Paulo: Nova Cultural, 1985.). “No caso de uma inovação em processo produtivo, isto vai proporcionar à empresa uma vantagem competitiva em relação aos seus concorrentes, aumentando-lhe, desta forma, a possibilidade de maior lucro” (SANTOS; FAZION; MEROE, p.4, 2011SANTOS, Adriana B. A.; FAZION, Cíntia B.; MEROE, Giuliano P. Inovação: um estudo sobre a evolução do conceito de Schumpeter. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo/PUC-SP, Caderno de Administração, vol.5, 2011.).

Castells (2001)CASTELLS, Manuel. La Galáxia Internet. Reflexiones sobre internet, empresa y sociedad. Barcelona: Plaza & Janés Editores (colección Areté), 2001. é categórico em afirmar a importância de profissionais com alto nível de educação, capazes de usar conhecimento novo para aumentar a produtividade para a inovação, colocando, ainda, a interdependência entre um e outro. “(…) se o trabalho é a fonte da produtividade, o poder criativo do trabalho e eficiência da organização empresarial dependem, em última análise, da capacidade de inovação” (CASTELLS, 2001CASTELLS, Manuel. La Galáxia Internet. Reflexiones sobre internet, empresa y sociedad. Barcelona: Plaza & Janés Editores (colección Areté), 2001., p.118 – Tradução nossa). Para o autor, a inovação está em função do trabalho altamente especializado, assim como da existência de organizações capazes de promover a criação de conhecimento (CASTELLS, 2001CASTELLS, Manuel. La Galáxia Internet. Reflexiones sobre internet, empresa y sociedad. Barcelona: Plaza & Janés Editores (colección Areté), 2001.).

Mesmo entre os pesquisadores da área, ainda não parece haver um consenso definido sobre o que de fato é “jornalismo de inovação”. Considerando a definição trazida por Nordfors (2004) como “innovative journalism”, entendemos esta como correspondente ao conceito de “jornalismo de inovação” apresentado no presente artigo, enquanto “innovation journalism” para Nordfors trata do jornalismo sobre inovação técnica, jurídica, de negócios, de aspectos políticos e de sistemas (NORDFORS, 2004NORDFORS, David. Why We Need Innovation Journalism, and Where It May Have a Market. Innovation Journalism, vol.3, n.01, 2004.).

Partimos da premissa de que o Jornalismo pode ser entendido como indústria, no sentido que produz e entrega comercialmente informação noticiosa, conteúdos exclusivos e bens simbólicos. A inovação para a atividade, no entanto, apresenta um discurso voltado para o objetivo de comunicar da melhor maneira possível por meio de experiências novas, completas e comprometidas com o papel inicial da atividade. Com as constantes modificações tanto de cunho tecnológico, como de mercado consumidor no Jornalismo, a inovação já não pode ser vista como um elemento extra, e sim como uma necessidade para a área, que busca alternativas para sobreviver em um cenário de crise.

A inovação no Jornalismo, assim, em nossa perspectiva, vai além da inovação tecnológica e de aparatos e reside em todo o processo de produção e criação jornalística. Concordando com Franciscato (2010):

A inovação tecnológica no jornalismo (...) não pode ser considerada como um investimento isolado em modernização industrial, mas caracterizada também como um aporte que modifica as rotinas e processos de trabalho do jornalista, bem como o perfil e a qualidade do produto jornalístico (FRANCISCATO, 2010FRANCISCATO, Carlos Eduardo. Uma proposta de incorporação dos estudos sobre inovação nas pesquisas em jornalismo. Estudos em Jornalismo e Mídia, Florianópolis, v.7, n.1, p.8-18, abr. 2010. Disponível em: https://goo.gl/J0DzUC. Acesso em: 18 mai. 2016.
https://goo.gl/J0DzUC...
, p.12).

Com isso, entendemos que toda mudança nas técnicas, tecnologias, processos, linguagens, formatos e dispositivos destinados a potencializar a produção e consumo das informações jornalísticas pode ser considerada o que se cunhou jornalismo de inovação (MACHADO, 2010MACHADO, Elias. Creatividad e innovación en el periodismo digital. In: Actas II Congreso Internacional de Ciberperiodismo y Web 2.0. Bilbao: Universidad del País Basco. p.64-72, 2010.). Outro aspecto válido é o trazido por Briggs (2013) ao avaliar produtos jornalísticos que concorriam ao prêmio Scripps Howard, em 2013:

Uma vez que avaliamos todas as inscrições [para o prêmio], a definição de inovação no jornalismo foi se tornando mais clara, ao menos para nós: tentar novas formas de criar uma melhor experiência de jornalismo para o leitor através da tecnologia digital. Ainda melhor quando é jornalismo que realmente interessa. E funciona em todas as plataformas. Os desafios do jornalismo não mudaram. Lidar com histórias e projetos que têm o maior impacto (não é Watergate ainda no topo desta lista?) faz o jornalismo ser importante (BRIGGS, 2013BRIGGS, Mark. What makes journalism ‘innovative’? Lessons from this year’s Scripps Howard Awards, 2013. Disponível em: http://goo.gl/G5yLqf. Acesso em: 18 mai. 2016.
http://goo.gl/G5yLqf...
– Tradução nossa).

Para especificar ainda mais, uma visão complementar sobre jornalismo de inovação parece ser necessária. Um estudo interessante realizado por Kauhanen e Noppari pelo Journalism Research and Development Centre, da Universidade de Tampere, na Finlândia, traz um comparativo sobre o “jornalismo tradicional” (“Traditional Journalism”) e o “jornalismo de inovação” (“Innovation Journalism”)8 8 Em sentido diferente do utilizado por Nordfords (2004). . Concordamos com os autores quando afirmam que o jornalismo de inovação não é um gênero separado, e sim, uma aproximação e uma atitude metodológica que pode ser usada em todas as áreas do Jornalismo. É claramente future-oriented, usa métodos e ferramentas conceituais da pesquisa de futuro e segue os resultados dessas pesquisas. Além disso, Kauhanen e Noppari afirmam que o jornalismo de inovação percebe a própria inovação como processo: circular, em cascata, complexa, em multi-camadas e socialmente condicionada. Além disso, o jornalismo de inovação é muito interessado na base do conhecimento científico, tecnológico e de pesquisa e desenvolvimento (R&D); vê ainda a co-produção e a co-inovação tão importantes quanto seu próprio trabalho, percebendo o público também no papel inovador. Considera as inovações sociais e culturais tão importantes quanto as inovações tecnológicas e comerciais (KAUHANEN; NOPPARI, 2007KAUHANEN, Erkki; NOPPARI, Elina. Innovation, Journalism and Future. Final report of the research project Innovation Journalism in Finland. Technology review 200/2007. Helsinki: 2007.).

Depois de compreender como o jornalismo de inovação é tratado nas pesquisas acadêmicas, procuramos entender como se dá efetivamente a inovação no Jornalismo nas redações webjornalísticas por meio de seus produtos. O processo de inovação tende a ser composto por uma série de etapas que inclui experimentação, testes, apostas e até mesmo falhas, dentre diversas estratégias com o objetivo de apresentar novas propostas alinhadas com o intento inicial. No jornalismo, observa-se a inovação não apenas nos produtos finais ou na tecnologia implantada, mas também por meio de uma reorganização das redações, com departamentos voltados à inovação ou, ainda, a criação de laboratórios internos e parcerias externas para a produção de produtos inovativos. Nos casos mais significativos, tudo isso resulta em produtos e conteúdos revolucionários.

Levando em consideração tais dinâmicas mais recentes, nesse sentido, discorremos sobre a forma como algumas organizações jornalísticas, dentre elas, Al Jazeera, Folha de S.Paulo, The Guardian, NBC Universal, The New York Times e The Washington Post se posicionam ao promover iniciativas relacionadas à delimitação de jornalismo de inovação aqui apresentada. A amostra dessas seis organizações jornalísticas, consideradas de referência, visa explorar uma possível tendência em estruturas, conteúdos e narrativas inovadoras no webjornalismo contemporâneo.

Inovação nas organizações jornalísticas

Relacionando-se aos conteúdos, como já citado, a inovação no Jornalismo pode surgir tanto em produtos noticiosos pontuais ou séries especiais como em editorias, media labs próprios ou em parcerias entre jornais e outras empresas de mídia e tecnologia. Há que se ressaltar, neste cenário, a importância do trabalho em equipe para a inovação, como observa Castells (2001, p.120 – Tradução nossa)CASTELLS, Manuel. La Galáxia Internet. Reflexiones sobre internet, empresa y sociedad. Barcelona: Plaza & Janés Editores (colección Areté), 2001. que “(...) a inovação continua sendo o produto da mão de obra inteligente, mas em forma de intelecto coletivo”.

Os cenários das organizações jornalísticas selecionadas neste artigo apontam uma clara preocupação com formatos estratégicos e inovativos para seu público consumidor. Por meio de uma breve pesquisa exploratória, detectamos iniciativas voltadas à produção de conteúdos em alguns webjornais de destaque na América do Norte, América do Sul, Europa e Oriente Médio, assim como alguns resultados em termos de conteúdos inovadores.

Al Jazeera e a cobertura mundial

A rede Al Jazeera (الجزيرة), criada em 1996, é a maior emissora de televisão jornalística do Catar e a mais importante rede de televisão do mundo árabe. A atuação internacional da emissora tomou ainda mais destaque durante as manifestações populares antiamericanas em setembro de 2001. O grupo midiático tem atualmente uma cobertura mundial em televisão e internet, com editorias especiais para interatividade, fotografia, vídeo, podcasts e bastidores, entre outros, disponível em árabe e em inglês.

Dentre o conteúdo inovativo publicado pelo site da Al Jazeera, destacamos a grande reportagem multimídia “Treasured Island. The people of Tangier fear their life, land and heritage could wash away9 9 Disponível em: http://projects.aljazeera.com/2014/tangier-island. Acesso em: 25 abr. 2016. ”, que conta a história de uma comunidade de pescadores na ilha de Tangier, nos Estados Unidos. Nesta reportagem, é possível detectar alguns elementos de inovação narrativa: excertos de áudio em arquivos específicos e os audio portrait são elementos inovativos no tratamento estético do tema. Ainda que o recurso expressivo do áudio esteja sendo muito explorado em narrativas multimídia, inclusive em casos nos quais é o elemento principal, como a narrativa em podcastSerial10 10 Disponível em: https://serialpodcast.org. Acesso em: 23 dez. 2015. , na reportagem da Al Jazeera o mesmo aparece na forma de pequenos portraits, formatos breves nos quais um personagem é apresentado a partir de uma foto e acompanhado de um pequeno registro em áudio (Figura 1).

Figura 1
Audio portrait na grande reportagem “Treasured Island. The people of Tangier fear their life, land and heritage could wash away”, da Al Jazeera.

Além de reportagens com elementos inovadores, um dos destaques da Al Jazeera é o AJ+ (Figura 2). O AJ+ é uma aposta lançada em 2013, tendo como perspectiva o crescimento e a centralidade do uso de smartphones. A proposta é ser mais do que um site de notícias e apresentar um aplicativo focado fortemente em vídeo com uma estratégia de crescimento de audiência integrada às redes sociais na internet. A definição apresentada pelo aplicativo em seu site oficial dá conta de que o AJ+ é uma comunidade global de notícias para a geração conectada, com destaque para “trazer as histórias que estão moldando o nosso mundo” (Tradução nossa)11 11 Disponível em: http://www.ajplus.net/english. Acesso em: 18 mai. 2015. . A proposta é inovadora do ponto de vista que apresenta um discurso e um empacotamento voltado ao visual e ao público jovem, considerando ferramentas de edição, modo de apresentação, tratamento de pautas polêmicas e de temas sociais e, certamente, a abertura colaborativa e conectada ao Facebook, Twitter e You Tube.

Figura 2
Telas do aplicativo AJ+ para smartphones

Folha de S.Paulo e os especiais em série

A Folha de S.Paulo está entre os jornais de maior circulação12 12 A Folha de S.Paulo é o terceiro jornal impresso de maior circulação no país, segundo dados da ANJ referentes ao ano de 2015. Mais em: http://www.anj.org.br/maiores-jornais-do-brasil. Acesso em: 24 abr. 2015. no Brasil e desde 2013 vem publicando a série Tudo Sobre, que apresenta especiais multimídia em seu website, aplicativos e demais plataformas de acesso ao conteúdo do jornal. O primeiro especial publicado tratou da construção da Usina de Belo Monte, no Pará, resultado de dez meses de trabalho, com a veiculação de diversos dossiês digitais precedendo a grande reportagem. “‘A Batalha de Belo Monte’ possui cinco capítulos, 55 fotografias, 24 vídeos, 18 infográficos, aproximadamente 15 mil palavras e um game sobre a hidrelétrica brasileira” (LONGHI; WINQUES, 2015LONGHI, Raquel Ritter; WINQUES, Kérley. O lugar do longform no jornalismo online. Qualidade versus quantidade e algumas considerações sobre o consumo. In.: XXIV ENCONTRO ANUAL DA COMPÓS. Brasília: UCB/Compós, 2015, Anais..., p.10). O especial mais recente publicado pelo veículo questiona o impacto do desflorestamento no Brasil sob a perspectiva de desenvolvimento versus destruição das florestas. “A Folha vasculhou a Amazônia para mostrar em quatro capítulos, com 65 fotos, 26 infográficos e oito vídeos, que zerar a devastação pode ser bom negócio para todos” (2016)13 13 Dados publicados em: http://arte.folha.uol.com.br/tudo-sobre/desmatamento-zero. Acesso em: 24 abr. 2015. . O especial Tudo Sobre: “Desmatamento Zero – Floresta Sem Fim”14 14 Disponível em: http://arte.folha.uol.com.br/tudo-sobre/desmatamento-zero. Acesso em: 24 abr. 2015. , no entanto, traz uma característica diferente das demais reportagens publicadas pela Folha de S.Paulo, pois consta como conteúdo patrocinado pela ONG Climate and Land Use Alliance (CLUA), uma aliança entre Climate Works Foundation, The David & Lucile Packard Foundation, Ford Foundation e Gordon e Betty Moore Foundation15.

Um dos mais interessantes recursos expressivos trazidos pela série de reportagens, entretanto, está nos seus infográficos, para os quais a Folha criou uma nova definição: videográficos. O termo foi concebido pela própria Folha, para definir as infografias em vídeo que começaram a ser produzidas a partir de 2011, num momento em que a obsolecência da ferramenta Flash impunha novas soluções, segundo Ducroquet (2013)DUCROQUET, Simon. Videos infográficos. Online, 2013. Disponível em: http://goo.gl/LyUuYK. Acesso em: 03 mar. 2016.
http://goo.gl/LyUuYK...
. Mais recentemente, a Folha de S.Paulo lançou o Folhacóptero, um recurso expressivo que combina simulação de vôos sobre pontos geográficos com a interação do usuário. Isso acontece, por exemplo, no já citado “A Batalha de Belo Monte” (Figura 3), sendo necessário baixar um plug-in para que o conteúdo reproduza normalmente. Já no especial “O Rio em Transformação”, os infográficos variam de simulação em terceira dimensão dos locais dos jogos olímpicos até um sobrevoo em asa delta da cidade do Rio de Janeiro16, com sonorização ambiente.

Figura 3
Captura de tela do Folhacóptero, simulação de um sobrevoo em forma de game

The Guardian – Foco em conteúdo mobile

O jornal britânico The Guardian – com edições internacionais norte-americana e australiana, lançou recentemente um laboratório de inovação voltado exclusivamente para as notícias em plataformas móveis. O The Guardian Mobile Innovation Lab (Figura 4) é basicamente um time de inovação alocado na redação do jornal nos Estados Unidos com três editores e três repórteres, lançado em 2015 no Medium17 17 O Medium é uma plataforma social de publicação desenvolvida por um dos fundadores do Twitter, Ev Williams. Construída para o foco em escrita e multimídia, é conhecida por ser user friendly e responsivo. O Medium encoraja a diversidade de opiniões por meio de sua rede e conecta ideias por meio de curadoria. Disponível em: www.medium.com. Acesso em: 17 mar. 2016. . O objetivo é explorar a maneira de contar e distribuir notícias em telas pequenas. O projeto foi uma iniciativa da John S. and James L. Knight Foundation, uma fundação privada e sem fins lucrativos dedicada a apoiar ideias transformadoras que promovem o Jornalismo de qualidade, inovação e avanço da mídia.

Figura 4
Página inicial do perfil do The Guardian Mobile Innovation Lab no Medium

O laboratório no The Guardian pretende explorar cinco grandes áreas: cobertura ao vivo, vídeo, notícias contextualizadas, interação de conteúdo e notificações. Em entrevista ao site IJNet18 18 Na íntegra: http://goo.gl/2KmfPy. Acesso em: 03 mar. 2016. – Rede de Jornalistas Internacionais, uma das editoras do projeto, Sasha Koren, explica como o trabalho pretende ser desenvolvido no laboratório:

As experiências vão ser projetadas para revelar como os usuários respondem e o que é interessante para eles que não estamos pensando ou usando tanto assim. Eu acho que se formos bem sucedidos na nossa missão, vamos fazer coisas que não funcionam, que as pessoas não respondem ou não dão certo, que é uma forma estranha de dizer que o sucesso é o fracasso (KOREN, 2016KOREN, Sasha. Jornal Guardian lança laboratório de inovação para experimentar com tecnologia móvel. Entrevista concedida à BERKHEAD, Sam. Online, 2016. Disponível em: http://goo.gl/2KmfPy. Acesso em: 27 jan. 2016.
http://goo.gl/2KmfPy...
).

O The Guardian mantém ainda o Guardian Labs19 19 Disponível em: www.guardianlabs.theguardian.com. Acesso em: 27 jan. 2016. , um braço de inovação, porém voltado exclusivamente a conteúdo patrocinado (branded content) com histórias envolventes e esteticamente refinadas. No site também é possível acompanhar os bastidores dos desafios de produção de matérias de cunho jornalístico e relevantes para empresas e produtos como Unilever, UPS, Visa, Rolex, entre outros.

Seguindo a tendência das narrativas em realidade virtual (VR), o The Guardian lançou seu primeiro conteúdo com essa característica, “6x9: a virtual experience of solitary confinement”, publicado em abril de 201620 20 Disponível em: http://www.theguardian.com/world/ng-interactive/2016/apr/27/6x9-a-virtual-experience-of-solitary-confinement. Acesso em: 27 jan. 2016. . A produção, em parceria com o coletivo de artistas The Mill, é uma grande reportagem multimídia dividida em materiais contendo linguagem imersiva, que podem ser experimentados na tela do computador, utilizando o mouse ou não, e nas telas de dispositivos móveis, com ou sem a utilização de óculos para realidade virtual, como o Google Cardboard. Além desse conjunto, inclui reportagens e testemunhos com detentos ou com outras pessoas que experimentaram a sensação de viver confinadas por algumas horas. Interessante observar que há também meta-conteúdo, quando o próprio The Guardian fala do significado e da importância de conteúdos em realidade virtual para o Jornalismo contemporâneo.

The New York Times, laboratório e conteúdo imersivo

O norte-americano The New York Times (NYT), lançou o NYT Labs ou The New York Times Research & Development group em 2006 (Figura 5), com o objetivo de trazer um olhar precursor para novos produtos jornalísticos, identificando tendências e tecnologias que ocupariam maior espaço no mercado com uma antecedência de três a cinco anos. “Desenvolvemos aplicativos e protótipos que projetam os impactos futuros dessas mudanças, e nós compartilhamos esses protótipos para facilitar a inovação com uma cuidadosa consideração pelo futuro da mídia” (Tradução nossa)21 21 Disponível em: www.nytlabs.com. Acesso em: 02 fev. 2016. .

Figura 5
Página inicial do The New York Times Research & Development

Em março de 2014, o relatório “Innovation”, documento confidencial do NYT divulgado (leaked) na internet pelo BuzzFeed News norte-americano, analisava e fazia uma autocrítica do desempenho da organização jornalística focado em grande parte na sua redação. Captar novos leitores por meio de um Jornalismo de qualidade norteia o documento, além de questões similares; o destaque e centralidade do relatório, assim como seu nome já evidencia, é o termo “inovação”, central, especialmente no que se refere a conteúdo noticioso. O já citado “Snow Fall” é considerado, no documento, um exemplo de “inovação sustentável” (Figura 6).

Figura 6
Gráfico sobre inovação e disrupção, no relatório “Innovation”, do New York Times

O setor de inovação do NYT passou recentemente por um processo de rebranding22 22 Rebranding é a reformulação estratégica que pode significar um novo nome, uma nova filosofia operacional ou de relacionamento com o mercado; uma nova logomarca, um design diferenciado ou a combinação de todos esses elementos no sentido de estabelecer uma nova estratégia corporativa ou criar um diferencial que se traduza em um novo posicionamento da empresa frente aos clientes, fornecedores, funcionários, mídia e concorrentes. , agora chamado de Times Story[X] (ainda sem website oficial), conforme anunciado em nota por Wilson (2016 – Tradução nossa), editor de inovação e estratégia do jornal:

(...) Eu tenho o prazer de anunciar Times Story[X], um renascimento do nosso laboratório R&D. Times Story[X] fará parte da redação do The New York Times e das equipes de produto. Nosso objetivo é conectar os melhores designers e desenvolvedores do mundo no Times com pesquisa e experimentação que olhe além do breaking news, produtos e ciclos de publicidade para antecipar como as inovações emergentes na tecnologia irão transformar a maneira como nos comunicamos e nos expressamos.

Este departamento dentro da redação do jornal passou a última década explorando possibilidades e maneiras inovativas de contar e apresentar histórias jornalísticas, e agora, aposta ainda mais em tecnologia que o NYT e seus anunciantes podem usar em futuro próximo, tais como realidade aumentada, aplicativos de mensagem instantâneas, bots que funcionem com a Amazon Echo23 23 O Amazon Eco é um assistente virtual que funciona por comando de voz, com alto-falante e sem fio da Amazon.com. O dispositivo consiste de um cilindro de 23.5 cm com um agrupamento de microfones e responde ao nome de “Alexa”. e, até mesmo, carros conectados.

O The New York Times foi um dos primeiros a produzir em VR, incluindo a criação de um aplicativo para smartphones, o NYTVR, e lançando vários conteúdos em realidade virtual. Em abril de 2015, o New York Times Magazine (NYTMag), em parceria com a Vrse, produziu um conteúdo em realidade virtual sobre street art, “Walking New York24 24 Disponível em: http://vrse.com/watch/nyt-mag-vr-walking-new-york. Acesso em: 03 mar. 2016. . Mas foi com “Displaced25 25 Disponível em: http://www.nytimes.com/2015/11/08/magazine/the-displaced-introduction.html?_r=0. Acesso em: 03. mar. 2016. , em novembro do mesmo ano, que o jornal propiciou uma experiência mais completa em relação à VR: com o lançamento do conteúdo, o jornal distribuiu aos seus assinantes mais de um milhão de exemplares26 26 Disponível em: http://migre.me/u6VTV. Acesso em: 02 fev. 2016. de Google Cardboards, dispositivo para visualização em VR.

Contando com investimentos pesados na produção de conteúdo, o The New York Times também tem experimentado produções realizadas com o auxílio de drones na captação de imagens. De fato, o uso de drones no Jornalismo marcou 2014 e 2015, sendo uma forte tendência também para os próximos anos, juntamente com a realidade virtual. Uma gama de conteúdos com esse tipo de imagens foi produzida, e ainda continua sendo captada e disponibilizada. Ainda em 2015, o The New York Times lançou um dos exemplos mais contundentes, nesse sentido: “Greenland is melting away27 27 Disponível em: http://www.nytimes.com/interactive/2015/10/27/world/greenland-is-melting-away.html. Acesso em: 02 fev. 2016. . Publicada em outubro, pouco antes da COP21 – Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas – em Paris, esta grande reportagem multimídia utiliza drones e imagens de satélite para contar sobre o trabalho de um grupo de cientistas na Groenlândia e o aquecimento global. A abertura apresenta um deslumbrante sobrevoo da paisagem gélida obtido por drone ao longo de um rio formado pelo descongelamento das geleiras, resultado direto das mudanças climáticas abordadas na reportagem. Já as imagens de satélite são usadas de uma forma inovadora ao criar imersão na narrativa e no espaço, em que o zoom do espaço sideral para a pequena base de cientistas no gelo da Groenlândia, é dado pelo scroll da página. Um exemplo de imbricação expressiva sem par, até então, entre a leitura e a imagem.

The Washington Post, popularidade da realidade virtual

Um dos veículos mais tradicionais dos Estados Unidos, o The Washington Post (WP), fundado em 1987, é um dos diários que vem se mostrando mais inovadores em ações pontuais e parcerias especializadas. Nos últimos cinco anos, o WP apostou nas facilidades de acesso ao público via Facebook, com The Washington Post Social Reader, um aplicativo para ler notícias dentro da plataforma da rede social. Apesar de já descontinuado, o aplicativo não trazia apenas conteúdo produzido e publicado pelo jornal norte-americano, mantendo parcerias com mais de 80 outros veículos como agências de notícias, jornais locais, webjornais, portais jornalísticos e especializados. (LONGHI; FLORES, 2012LONGHI, Raquel Ritter; FLORES, Ana Marta M. Notícia e convergências nas RSIs: uma experiência social. In: Anais do 10º Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo – SBPJor. Curitiba, 2012.).

Em março de 2016, o The Washington Post apostou no jornalismo imersivo com a produção de conteúdo em realidade virtual28 28 O periódico já havia experimentado narrativas com VR em uma experiência com imagem em 360º no salão oval, escritório oficial do presidente dos Estados Unidos, apresentada em um evento da Associação dos Correspondentes da Casa Branca, em 2015. Disponível em: http://migre.me/u6Wqf. Acesso em: 24 abr. 2016. . O especial “Mars, an interactive Journey29 29 Disponível em: http://www.washingtonpost.com/graphics/business/mars-journey. Acesso em: 18 jun. 2016. (Figura 7) é responsivo – acessível por meio de diferentes plataformas seja desktop, tablet ou smartphone – e adaptável para uso opcional de óculos de VR, prática comum nos exemplos de narrativa publicados atualmente.

Figura 7
Captura de tela de Mars, an interactive Journey, do The Washington Post

O diretor de iniciativas estratégicas do jornal, Jeremy Gilbert, explica que tornar acessível um conteúdo especializado é um dos objetivos do WP: “Somente uma pequena percentagem de nossos usuários devem ter a aparelhagem de RV completa, então nós asseguramos que o ‘passaporte virtual para o espaço’ irá funcionar em todos os lugares” (2016 – Tradução nossa). Ainda para Gilbert, algumas histórias são melhor contadas por meio de um formato imersivo como a VR, especialmente as que exploram a fronteira do espaço. O projeto foi criado e realizado em parceria com a Moody College of Communication at the University of Texas, em Austin. Pesquisadores e estudantes do Visualization Laboratory of the Texas Advanced Computing Center forneceram o apoio de programação e script. Interessante observar que este especial foi patrocinado pela Amazon Web Services, o que pode sugerir uma tendência de modelo de negócio para o jornalismo de inovação, conforme também observado no NYT, na Folha de S.Paulo e no The Guardian.

Considerações Finais

Inovação é um conceito muito presente em qualquer levantamento a respeito da evolução das estratégias narrativas no jornalismo online em anos recentes. Em geral, esta concepção aparece associada à utilização de formas expressivas de maneira mais inovativa, abrangendo áudio, infografia, texto e imagem. Organizações de mídia de referência no jornalismo online, privadas ou não, têm se destacado neste campo, apresentando conteúdos inovadores em um ritmo mais intenso. Considerando exemplos no Brasil, Estados Unidos, Inglaterra e mundo árabe, comentamos brevemente alguns casos ilustrativos, apontando aspectos relacionados à inovação no cenário contemporâneo.

De fato, a exploração das potencialidades expressivas da hipermídia pelo jornalismo online vem crescendo ao longo de pouco mais de 20 anos de Jornalismo na internet, mas configura-se como inovadora a partir do momento em que efetivamente trabalha as características intrínsecas do meio para garantir conteúdos próprios. O caso da grande reportagem multimídia é exemplar nesse sentido, pois evidencia um ponto de virada entre dois momentos, especialmente pelo uso de conteúdos mais imersivos, seja em texto ou em imagens, conforme observa Longhi (2014)LONGHI, Raquel Ritter. O turning point da grande reportagem multimídia. Revista Famecos. Porto Alegre, Pontifício Universidade Católica, vol.21, n.3, p.897-917, setembro-dezembro de 2014..

Mais recentemente, as narrativas imersivas tomam a frente dos conteúdos inovadores. Fotografias e vídeos em 360º e narrativas em realidade virtual tem se mostrado recursos altamente atraentes para a audiência. A rede árabe Al Jazeera tem produzido conteúdo inovador do ponto de vista expressivo, no qual a exploração da linguagem multimídia é central.

Por outro lado, a presença de media labs próprios, ou seja, inseridos nas estruturas jornalísticas organizacionais, é uma tendência de mercado a se expandir em diferentes níveis, especialmente da grande mídia para as redações locais. Desde já podemos inferir que parte dessas linguagens inovadoras com conteúdo imersivo em realidade virtual, infográficos interativos ou o resgate do áudio como elemento-guia de histórias jornalísticas já destacadas neste artigo, são produto de estudos e testes realizados via media labs. O exemplo do The New York Times é bastante ilustrativo neste sentido. Pioneiro em muitas ocasiões, o jornal que já investe em um espaço real de inovação há dez anos, agora toma um novo rumo ao recriar seu laboratório e formar ainda mais parcerias colaborativas com engenheiros, designers e desenvolvedores web com o objetivo de entregar produtos cada vez mais inovadores e de conteúdo refinado. O caso do AJ+, da rede Al Jazeera, é também emblemático, pois aposta em um público específico – jovens – e em uma plataforma e linguagens técnicas de alta aderência a esses usuários. Além disso, percebe-se que há um nível de investimento contundente quando consideramos o conteúdo patrocinado por grandes empresas midiáticas, como destacado no caso do Guardian Labs. Nesse sentido, é possível observar uma espécie de segmentação da própria inovação em uma dinâmica próxima da cauda longa e da comunicação de nicho. Com isso, os veículos midiáticos parecem estar criando seus próprios centros de inovação, estudando seus públicos para compreender quais formatos ou linguagens têm mais apelo e investindo em um Jornalismo entre o segmentado e o personalizado, ao invés de se manter necessariamente como uma mídia de massa homogeneizada que procura equilíbrio para atingir o maior número de pessoas possível.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2017

Histórico

  • Recebido
    23 Jun 2016
  • Aceito
    25 Fev 2017
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