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Excesso de autorreferência e falta de heterorreferência: o simbolismo da atuação do STF em direito à saúde

EXCESS OF SELF-REFERENCE AND LACK OF HETEROREFERENCE: THE SYMBOLISM IN THE SUPREME COURT JUDGMENTS ABOUT THE RIGHT TO HEALTH

Resumo

A pesquisa, cujo escopo era identificar se a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) em direito à saúde resulta em efetividade ou em simbolismo, realizou-se mediante investigação teórico-empírica; a teórica foi conduzida pelo processo dedutivo. Centrou-se a coleta de dados em teóricos sociais, com destaque à teoria dos sistemas de Niklas Luhmann. No plano teórico, a conceituação da expressão simbólico é extremamente rica, a tal ponto de rotineiramente se encontrar confusão semântica; para evitá-la, o trabalho adota a tese desenvolvida por Marcelo Neves, no livro A constitucionalização simbólica, em que desenvolve debate em torno do simbolismo das normas constitucionais. Para a pesquisa empírica, por meio dos métodos de pesquisa, utilizou-se investigação documental, coletada de precedentes judiciais do STF. O resultado da pesquisa se configurou num paradoxo: constatou-se que o STF, numa visão restrita à justiça dos litigantes, busca uma efetividade ilusória do direito à saúde, a qual resta simbólica, porquanto julga sob uma racionalidade exclusivamente adjudicatória, negando-se a ver a questão, portanto, de forma distributiva como uma distribuição de riqueza, o que, numa perspectiva macro, provoca o risco da corrupção do sistema político por obrigar a Administração Pública a distribuir riqueza que, muitas vezes, não existe, bem como excluir a maioria da população que não teve acesso à referida Corte ou que indiretamente é prejudicada pelos recursos desviados da saúde para cumprir suas decisões.

Palavras-chave
Direito à saúde; Supremo Tribunal Federal; Teoria dos Sistemas; simbolismo

Abstract

The aim of the research is to identify if the performance of Brazilian Supreme Court (STF) on the right to health results in effectiveness or in symbolism. The research was based on a theoretical and empirical investigation. The collect of data was centered in theoretical sociologists, with respective prominence given to the Niklas Luhmann's Theory of Systems. On the theoretical reference, the conceptualization of the expression symbolic is extremely rich, to the point of routinely finding semantic confusion. To avoid it, this work embraces the thesis developed by Marcelo Neves in his book: A constitucionalização simbólica (The Symbolic Constitutionalization), in which he develops a debate about the symbolism of constitutional norms. The empirical research was based on a documentary investigation, with data collected from Brazilian Supreme Court's leading cases. The research results indicated a paradox. It was found that the Brazilian Supreme Court, in a point of view restricted to the litigants, searches for an illusory effectiveness of the right to health, which is symbolic, since it judges from a rationality exclusively adjudicatory. Therefore, it denies to see the issue as a distributive issue, as a matter of distribution of wealth. This, in a macro perspective, implies in a higher chance of corruption in the political system, for forcing the public administration to distribute a wealth that, sometimes, does not even exist, as well as to exclude most of the population, that does not have access to this Court or that is indirectly impaired by resources diverged from the public health to accomplish the Court's decisions.

Keywords
Right to Health; Brazilian Supreme Court; Theory of Systems; symbolism

I Introdução

O presente artigo é um recorte de uma pesquisa de doutoramento realizada na Faculdade de Direito da PUC-SP com estágio doutoral sanduíche na Universidade de Macerata (UNIMC-Ita) com bolsa da Capes. Investigou-se a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro a fim de constatar se sua racionalidade é simbólica ou efetiva. O trabalho serviu-se de pesquisa teórico-empírica. O levantamento bibliográfico foi realizado com base em autores sistêmicos com destaque a Nilkas Luhmann. Portanto, adota-se como premissa epistemológica, aplicada à leitura das decisões judiciais, a Teoria dos Sistemas de Niklas Luhmann, em razão de que sua cognição aberta simultaneamente a sua operação fechada permitirão relacionar a seletividade das decisões analisadas com os valores sociais da época, bem como identificar o processo evolutivo de positivação do Direito com escopo de concretizar o direito à saúde.

Ainda no plano bibliográfico, consigna-se que os conceitos de simbolismo e efetividade foram extraídos da obra de Marcelo Neves, A constitucionalização simbólica (2007), resultando, para o sentido da pesquisa, que a atuação simbólica do STF caracterizar-se-á quando prevalecer em sua “racionalidade jurídica” o significado “político-ideológico”, aqui materializada pela atuação jurisdicional em desfavor da concretização normativo-social. A decisão simbólica, assim, teria um escopo de álibi social e não de luta pela efetividade dos valores normativos. Álibi entendido como um mecanismo, na verdade, de efeito, como já dito, “político-ideológico” de justificação às pressões sociais (NEVES, 2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 19).1 1 Ver especialmente Neves (2007, p. 30-31): “[…] Porém, o conceito de legislação simbólica deve referir-se abrangentemente ao significado específico do ato de produção e do texto produzido, revelando que o sentido político de ambos prevalece hipertroficamente sobre o aparente sentido normativo-jurídico. A referência deôntico-jurídica de ação e texto à realidade torna-se secundária, passando a ser relevante a referência político-valorativa ou ‘político-ideológica’”. Ver, também, Neves (2004, p. 29, 32). No entanto, o artigo realiza uma mudança de paradigma, haja vista que Neves analisou o simbolismo da Constituição Federal e a pesquisa, a seu turno, centra-se na jurisprudência da Suprema Corte (NEVES, 2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 1-3).2 2 Ainda, sobre a obra de Marcelo Neves, intitulada A constitucionalização simbólica, destaca-se que foi por meio de sua leitura que Niklas Luhmann repensou a ideia de autopoiese para reconhecer a alopoiese. O material empírico foi coletado dos precedentes da referida Corte, bem como do levantamento dos gastos do poder público para atender as decisões judiciais no tema. Os acórdãos em direito à saúde analisados foram coletados do sítio eletrônico do STF: <www.stf.gov.br>, especificamente no link de jurisprudência. Para a busca, foram escolhidas as expressões: “direito à saúde” e “separação dos poderes”, primordialmente de forma isolada e, em seguida, em conjunto. Esse procedimento de pesquisa foi utilizado inúmeras vezes em momentos temporais completamente diversos. Na escolha das decisões a serem pormenorizadamente tratadas na tese, preliminarmente, optou-se por dois critérios: (i) temporal, de ordem objetiva; (ii) enfrentamento do direito à saúde pela óptica explícita, ou implícita, da separação dos poderes, de natureza subjetiva, uma vez que a escolha da decisão reclamou da lente do observador, especialmente na visão implícita.

Na primeira escolha, como regra inicial, optou-se por acórdãos publicados entre 2009 a 2012, com o condão de outorgar ares de atualidade à pesquisa. Depois disso, sem menoscabo do marco temporal, ganharam espaço no material coletado, acórdãos anteriormente julgados e identificados como relevantes à compreensão do raciocínio travado nos estudados. Gradativamente, a quantidade de julgados anteriores à baliza temporal traçada agigantou-se, a ponto de o padrão inicial não mais se tipificar. Por outro lado, restou, no viés metodológico, ainda incólume o outro padrão inicial de pesquisa como critério investigativo: “direito à saúde” e “separação dos poderes”.

Ademais, mesmo com o escopo de objetivar a pesquisa, é inegável que, na escolha final dos precedentes analisados, acabou-se, de certo modo, por subjetivar sua coleta. Nesse aspecto, o pesquisador fez escolhas de ordem pessoal, não obstante, sempre tenha se pautado por buscar o tratamento da temática pesquisada criticamente. Do material coletado, não se excluiu determinado grupo de técnicas processuais, como agravo regimental e pedido de suspensão de segurança, ante o entendimento de que sua mantença traria riqueza à pesquisa, a resultar num material heterogêneo da perspectiva procedimental dos julgamentos. Bem por isso, foram analisados acórdãos de julgamento de recursos extraordinários, de agravos regimentais por indeferimento de recurso extraordinário, de pedidos de suspensão de tutela antecipada, de ação cautelar e recurso ordinário em mandado de segurança.

Após a escolha desses critérios de seleção, a coleta final resultou em 71 acórdãos, os quais foram lidos, relidos e, por fim, estudados minuciosamente, um a um. Desse universo, escolheram-se vinte decisões que tiveram papel significativo no resultado da pesquisa. Os pontos principais desses julgados foram transcritos em notas de rodapé. O resultado é o avante escrito.

2 O levantamento dos dados e a construção dos argumentos: o desenvolvimento da pesquisa

2.1 Lugares-comuns na microjustiça do STF

Como parte do resultado da análise, traçou-se o mapa de alguns lugares-comuns avistados na jurisprudência do STF, a saber.

  1. A separação dos poderes, segundo a jurisprudência em comento, é um dos pilares da democracia moderna. No entanto, consoante o material coletado, por vezes o Estado utilizou-se dessa premissa com o intuito de deslegitimar a intervenção do Poder Judiciário, quando este se mantém inerte e não cumpre suas funções. Mas, ao contrário da semântica outorgada outrora, atualmente a Corte Suprema vê essa justificativa propriamente como uma demonstração de acomodação política, daí não ser passível de se opor à efetivação do direito à saúde pela atuação judicial, nos termos do decidido no Recurso Extraordinário n. 667.882/MG.

  2. Em muitos casos levados a juízo, realmente não há recursos para o fornecimento de determinado medicamento com o cerne de tratar doença rara. Não obstante esse cenário, a Suprema Corte decidiu pela obrigação de seu fornecimento, mormente porque a saúde é um bem indisponível. Com essa linha de decisão, constrói-se a indisponibilidade do direito à saúde em desfavor de sua não concretude, de modo que a União interpôs Agravo de Despacho Denegatório de Recurso Extraordinário n. 640722/SC em face de decisão do TJSC, em que se deferiu a outorga de medicamentos ao autor (BRASIL, 2011bBRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário com Agravo n. 640722/SC. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Requerente: União. Requerido: Ministério Público Federal. Intimado: Estado de Santa Catarina. Intimado: Município de Videira. Julgado em 24.05.2011. Publicado em 30.05.2011. DJe. Brasília, 2011b. Disponível em: <http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/22936567/recursoextraordinario-com-agravo-are-640722-sc-stf>. Acesso em: 16 out. 2013.
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    ).3 3 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário com Agravo n. 640722/SC. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Requerente: União. Requerido: Ministério Público Federal. Intimado: Estado de Santa Catarina. Intimado: Município de Videira. Julgado em 24.05.2011. Publicado em 30.05.2011. DJe. Brasília, 2011b. Disponível em: <http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/22936567/recurso-extraordinario-com-agravo-are-640722-sc-stf>. Acesso em: 16 out. 2013. Trecho do mesmo julgado, p. 1: “1. A Constituição Federal, com precisão, erige a saúde como um direito de todos e dever do Estado (art. 196). Daí a seguinte conclusão: é obrigação do Estado no sentido genérico (União, Estados e Municípios) assegurar às pessoas desprovidas de recurso financeiro o acesso à medicação necessária para a cura de suas mazelas, em especial, as mais graves”. Trecho do mesmo julgado, p. 1: “2. O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196)”. Trecho do mesmo julgado, p. 1: “3. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não se pode mostrar indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional”.

Na decisão em estudo, teve-se o direito à saúde como inviolável. Na fundamentação, trouxe a lume diversas decisões, justamente para ratificar sua assertiva de que o STF já firmou posicionamento em favor da preservação do referido direito como um direito público indisponível.

No material empírico coletado, (iii) as normas programáticas tomam contorno completamente diverso da composição clássica desenvolvida, na década de 1960, por José Afonso da Silva (2007)SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2007.. Nas decisões, parte-se, sim, do pressuposto de que o direito à saúde está disposto em norma programática. Não obstante, sua interpretação não poderia resultar numa promessa inconsequente.

Essa assertiva é tida como uma premissa inconteste. Bem por isso, é repetida como axioma numa grande quantidade de decisões, nas quais se repete, por exemplo, nos julgados AI n. 662822/RS, AGR no RE n. 393175/RS, e, ilustrativamente, transcreve-se trecho do RE n. 535145/MT:

[…] A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ-LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQUENTE. — O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política — que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro — não pode converter-se em promessa constitucional inconsequente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. […] (BRASIL, 2014BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 535145/CE. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Requerente: União. Requerida: Ministério Público Federal. Julgado em 26.08.2014. Publicado em 04.09.2014. DJe. Brasília, 2014. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28535145%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/zf8eak6>. Acesso em: 18 nov. 2016.
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)4 4 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 535145/CE. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Requerente: União. Requerida: Ministério Público Federal. Julgado em 26.08.2014. Publicado em 04.09.2014. DJe. Brasília, 2014. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28535145%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/zf8eak6>. Acesso em: 18 nov. 2016.

Em outra perspectiva, é uniforme, dentro da jurisprudência analisada, (iv) a responsabilidade solidária dos entes públicos. Sempre foi rotineiro os poderes públicos esquivarem-se do ônus de fornecer uma saúde digna à população com a desculpa de que não se trata de sua responsabilidade. Ilustrativamente, cita-se o caso das ações propostas em face dos estados-membros, os quais, em suas defesas, alegam ser obrigação da União.

Não há, pelo exposto, possibilidade de esse subterfúgio encontrar eco na atual linha adotada em razão da consistência da tese da solidariedade e, até o momento, não há comunicação da alta Corte de Justiça em sentido diverso. Trata-se de uma busca pela efetividade, consoante se pode concluir do Recurso Extraordinário n. 607.385/SC interposto com o mote de ver efetivado o respectivo direito à saúde com a obtenção de medicação. A decisão teve como fundamento a tese de que a saúde é dever de todos os entes federados. Cabe à parte escolher se move demanda em face de um só, de dois ou dos três entes (município, estado e União). No caso em comento, a autora pleiteou somente em face do estado de Santa Catarina. A tutela processual foi deferida (BRASIL, 2011aBRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 607.385/SC. Relatora Ministra Cármen Lúcia. Requerente: Estado de Santa Catarina. Requerida: Elisa Meira Fernandes. Julgado em 19.04.2011. Publicado em 12.05.2011. DJ. Brasília, 2011a. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/diarioJustica/verDiarioProcesso.asp?numDj=88&dataPublicacaoDj=12/05/2011&incidente=3814696&codCapitulo=6&numMateria=68&codMateria=3>. Acesso em: 16 out. 2013.
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).5 5 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 607.385/SC. Relatora Ministra Cármen Lúcia. Requerente: Estado de Santa Catarina. Requerida: Elisa Meira Fernandes. Julgado em 19.04.2011. Publicado em 12.05.2011. DJ. Brasília, 2011a. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/diarioJustica/verDiarioProcesso.asp?numDj=88&dataPublicacaoDj=12/05/2011&incidente=3814696&codCapitulo=6&numMateria=68&codMateria=3>. Acesso em: 16 out. 2013. Trecho do mesmo julgado, p. 2: “A parte-autora ajuizou ação contra o Estado de Santa Catarina objetivando o fornecimento de medicamento essencial ao tratamento da doença que a acomete. À luz da jurisprudência recente do STJ, as três esferas federativas são solidariamente responsáveis por realizar o direito à saúde, conforme se vê nas decisões abaixo transcritas: […]. Por se tratar de obrigação solidária, é possível exigir a prestação de qualquer um ou de todos os entes federativos. A escolha cabe à parte-autora. No caso em tela, a parte-autora optou por acionar o Estado de Santa Catarina, de modo que esse réu, e somente ele, deve integrar o polo passivo da presente demanda” (destaque nosso). Também no prisma da garantia da solidariedade do direito à saúde entre os entes públicos, ver: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 584652/RJ. Relator Ministro Cezar Peluso. Requerente: União. Requerido: Produtos Veterinários Manguinhos LTDA. Julgado em 07.08.2008. Publicado em 02.09.2008. DJe. Brasília, 2008. Disponível em: <http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/14771245/recurso-extraordinario-re-584652-rj-stf>. Acesso em: 16 out. 2013. Trecho do mesmo julgado, p. 2: “Ainda que assim não fosse, a recusa do Estado em fornecer medicamento coloca em risco a saúde de paciente necessitado e representa desrespeito ao disposto no art. 196 da Constituição Federal, que estatui ser a saúde direito de todos e dever do Estado. Essa regra constitucional tem por destinatários todos os entes políticos que compõem a organização federativa do Estado brasileiro”.

Na miríade racional da Suprema Corte, deparamos com a ruptura de obstáculos recentemente tidos como intransponíveis pela jurisprudência, de tal sorte que (v) novos tratamentos ainda não inseridos na lista da ANVISA podem ser feitos, desde que haja comprovação da necessidade ao caso em questão. Por esses precedentes, o que se reconhece é que a evolução da medicina tem sido muito mais ágil do que a burocracia estatal pode acompanhar.

Com isso, o Poder Judiciário e o próprio Estado, por meio de agências ou órgãos ligados à saúde, podem reconhecer que, em um caso específico, faz-se necessário servir-se de outro medicamento ou tratamento ainda não praticado pelo Estado brasileiro, mas que possui o aval da comunidade científica e pode trazer benefícios ao doente. Com o mesmo intuito, tratamentos já disponíveis na rede privada e não praticados pelo poder público, seja pelo alto custo, seja pela inovação tecnológica, quando necessários ao tratamento do jurisdicionado, serão arcados pelo Estado. Além disso, (v) estendeu-se o fornecimento de fraldas descartáveis como direito à saúde, garantindo aos necessitados o mesmo status constitucional reservado à saúde. Nesse acórdão, o Ministério Público do estado de São Paulo ingressou com ação civil pública, com o escopo de obrigar o município de São Paulo a fornecer fraldas descartáveis à adolescente portadora de paralisia cerebral, tetraparesia espática e déficit cognitivo. O pleito foi deferido em primeiro grau de jurisdição e depois mantido em segundo grau. Justamente por isso, o município de São Paulo interpôs o recurso, que resultou no acórdão ora analisado, com fulcro na tese de que fraldas não estariam abrangidas pelo direito à saúde. Não se trataria de direito à saúde, segundo o recorrente. Essa tese foi rechaçada. O recurso foi improvido. Prevaleceu a interpretação extensiva ao direito à saúde com a mantença da decisão anterior, a qual concediante à parte autora a prestação almejada (BRASIL (2011c)BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo em Recurso Extraordinário n. 646.235/SP. Relatora Ministra Cármen Lúcia. Requerente: Município de São Paulo. Requerido: Ministério Público do Estado de São Paulo. Julgado em 01.08.2011. Publicado em 05.08.2011. DJe. Brasília, 2011c. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28ARE%24%2ESCLA%2E+E+646235%2ENUME%2E%29&base=baseMonocraticas&url=http://tinyurl.com/mcc3do2>. Acesso em: 16 out. 2013.
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.6 6 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo em Recurso Extraordinário n. 646.235/SP. Relatora Ministra Cármen Lúcia. Requerente: Município de São Paulo. Requerido: Ministério Público do Estado de São Paulo. Julgado em 01.08.2011. Publicado em 05.08.2011. DJe. Brasília, 2011c. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28ARE%24%2ESCLA%2E+E+646235%2ENUME%2E%29&base=baseMonocraticas&url = http://tinyurl.com/mcc3do2>. Acesso em: 16 out. 2013. Trecho do julgado, p. 2: “O recurso extraordinário foi interposto contra o seguinte julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo: ‘Apelação Cível — Reexame necessário e recurso voluntário pela municipalidade de São Paulo — Ação Civil Pública — Procedência para obrigar a Municipalidade a fornecer fraldas descartáveis à adolescente com paralisia cerebral, tetraparesia espática e déficit cognitivo — Preliminares de ilegitimidade afastadas — A proteção integral, de acordo com a inteligência dos art. 1 e 11, §2°, da Lei 8.069/90 (ECA), à adolescente necessitada, justifica o fornecimento gratuito do item, de acordo com orientação médica — Inadmissibilidade de argumentos que vejam na atuação do Judiciário, ao prestigiar direitos prioritários de crianças e adolescentes, indevida intromissão na esfera de atuação do Executivo — Multa cabível nos termos do art. 213, §2°, do ECA e aplicada com modicidade. Recursos desprovidos’ (fls. 209)”. Trecho do mesmo julgado, p. 2: “Assevera que ‘não há qualquer ligação entre fraldas e direito à saúde e à vida' e que ‘não sendo medicamento, não há que se falar em direito público subjetivo oriundo diretamente da Constituição’ (fl. 328)” (destaque nosso). No plano dogmático, (vi) o debate a respeito da possibilidade ou não de efetivação do direito à saúde pelo Judiciário sempre teve como algoz o postulado da reserva do possível. Resumidamente, significa dizer que os recursos são escassos e as necessidades sociais infinitas. Dessa feita, caberia ao Poder Executivo a análise do que é mais importante. Nessa linha, o Estado-juiz não poderia intervir nessas situações justamente porque não haveria recursos; seriam, pois, escassos, obrigando o gestor público a concretizar a reserva do possível. Essa forte defesa, reiteradas vezes utilizada como álibi, quer na jurisprudência, quer na teoria, quer pela Administração Pública, é completamente desacreditada pela racionalidade do STF. Isso porque, segundo a Corte, estar-se-ia tratando de valores constitucionais.

2.2 Adjudicação e simbolismo

Historicamente, não há que se falar em direitos de segunda dimensão, como os sociais, sem a atuação do Estado. Os direitos sociais ventilam-se em prestações positivas, com o espeque de alcançar o bem comum e a justiça social (TAVARES, 2008, p. 769, 772). Uma coisa é implícita à outra. Com efeito, ou os citados direitos existem realmente, o que resultaria numa obrigação de atuação do Estado, ou simplesmente não existem, e, nessa segunda hipótese, como estão tipificados em norma constitucional, restará qualificá-la de norma simbólica, ao menos no que diz respeito à temática em questão.

Os direitos sociais positivados pela legislação resultam em programas fins ao Estado em face de outros direitos já previamente existentes. Alterar uma ordem constituída não é tarefa fácil, notadamente quando esse processo deve ser feito sem um rompimento drástico com a ordem anterior (como sucederia numa revolução), mediante implementação de políticas públicas ou, quando ineficazes, da atuação jurisdicional. Esse processo distributivo exige um raciocínio diverso do tradicional processo de adjudicação. Pede-se racionalidade ao julgar de forma mais refinada do que o simples certo ou errado, de modo que se reclamará do juiz uma análise global da situação, a qual foge do binômio referido (certo ou errado) a fim de se aproximar de uma decisão equânime (LOPES, 2006LOPES, José Reinaldo de Lima. Direitos sociais: teoria e prática. São Paulo: Método, 2006., p. 233-235).7 7 Na mesma obra: “Por tais características não é de se admirar que seja ainda difícil uma discussão mais detalhada dos direitos sociais dentro dos trabalhos dos juristas e que saiam do lugar-comum da invocação da ‘dignidade da pessoa humana’, espécie de abracadabra jurídico de uma sociedade em que a discussão moral — da qual procede o próprio conceito de dignidade humana — não é feita em público”. Extrai-se, ainda, p. 291: “[…] O ponto relevante sempre é este: podem direitos presentes de sujeitos individuais ser qualificados em nome de direitos futuros de outros sujeitos, entre os quais estarão incluídos os direitos ‘prejudicados’? Em outras palavras, é possível redistribuir os direitos?” (LOPES, 2006, p. 237)

Por decorrência desse conceito, há um todo; um bem comum que necessitará ser dividido para apontar a parte de cada um. Resta ao magistrado, dentro do processo judicial, o mister de rever esse critério de divisão feito pela Administração Pública, de tal sorte que provoque uma nova partilha de forma a atender melhor a vontade da lei.8 8 “A distribuição consiste em partilhar algo comum. Distribuir é tomar algo que é um todo e dividi-lo” (LOPES, 2006, p. 142). Também sobre os direitos sociais como bens coletivos, ver Neves (2005, p. 8). Bom lembrar, nessa linha, que os direitos subjetivos — como o direito à saúde — são construções históricas. Sua positivação também é uma aquisição evolutiva da sociedade moderna. Por outro lado, entendê-lo como direito completamente objetivo, por assim dizer, posto e imposto a tudo e a todos não fornece indicação sobre sua função na sociedade atual, num contexto de racionalidade sustentável a longo prazo. Por esse motivo, essa perspectiva de análise dos direitos subjetivos, desprovida de um equilíbrio social, motivou Luhmann (1990LUHMANN, Niklas. La differerenziazione del diritto. Org. Rafaelle de Giorgi. Milano: Mulino, 1990., p. 299, 305) a rotulá-los como direitos injustos.

A racionalidade da Suprema Corte no que diz respeito ao direito público subjetivo à saúde como direito individual, indisponível, é muito bem definida no sentido de sua efetividade em casos individuais. Isso se torna incontroverso com a análise dos precedentes elencados na pesquisa. Por outro lado, a questão do direito à saúde como direito público social ainda está muito incipiente, sendo ainda utilizada como retórica para justificar o individual, mas a questão global, complexa, que gira em torno desse problema, encontra-se muito longe de qualquer encaminhamento. Nesse escopo, seu universalismo social é inócuo, restando observar se as partes romperão ou não as barreiras impostas pela jurisprudência defensiva do STF para resultar no julgamento do seu recurso. No entanto, a igualdade de cada indivíduo de receber sua parte ao direito à saúde acaba que aviltada, como se não existisse (LOPES, 2006LOPES, José Reinaldo de Lima. Direitos sociais: teoria e prática. São Paulo: Método, 2006., p. 256-259).9 9 Na mesma obra: “[…] O direito foi percebido como instrumento de engenharia social. Para tanto era preciso superar a tradição liberal de (a) não-intervenção nos contratos, e (b) separação de poderes de modo rígido, muito especialmente de isolamento do Legislativo e do Judiciário” (LOPES, 2006, p. 280).

O problema em julgar casos de direito à saúde tangencia as justiças comutativas e distributivas. Entre os juristas, muito em razão de uma formação teórica tradicional, é comum não aceitarem enfrentar questões de distribuição das riquezas. Ao inverso disso, é rotineira a resolução das questões comutativas praticamente como um processo de adjudicação. Nesses termos, os tribunais não estão preparados para uma análise global dos direitos e dos recursos para efetivá-los, obviamente pela necessidade de se repensar a questão de forma interdisciplinar em sintonia, por exemplo, com a economia e com a Administração Pública. Essa dificuldade de enfrentar o problema sob uma perspectiva distributiva também pode ser justificada em razão de um óbice cultural, fruto de uma educação liberal e, no caso do Brasil, ainda como resquício de uma herança social tradicional em que por muitos anos só os filhos da elite cursavam as faculdades de direito. Esse cenário influencia a Excelsa Corte a ser reticente em raciocinar de forma distributiva.10 10 Sobre a capacidade institucional dos juízes na análise dos efeitos sistêmicos da sua decisão, ver Barroso (2012, p. 375): “[…], a doutrina constitucional tem explorado duas ideias destinadas a ingerência judicial: a de capacidade institucional e a de efeitos sistêmicos. Capacidade institucional envolve a determinação de qual Poder está mais habilitado a produzir a melhor decisão em determinada matéria. […] Também o risco de efeitos sistêmicos imprevisíveis e indesejáveis podem recomendar uma posição de cautela e de referência por parte do Judiciário. O juiz, por vocação e treinamento, normalmente estará preparado para realizar a justiça do caso concreto, a microjustiça, sem condições, muitas vezes, de avaliar o impacto de suas decisões sobre um segmento econômico ou sobre a prestação de um serviço público”.

É verdade, porém, que a mesma Corte já enfrentou situação similar de mudança de paradigma quando, na República Velha, julgou inúmeros pedidos de vedação à atividade estatal de saúde pública, comandados pelo então impopular Osvaldo Cruz. Naquele momento, valores liberais tão em voga à época, como a própria liberdade, surgiram com o intento de combater inúmeras doenças contagiosas resultado do grave processo epidêmico que enfrentava o Brasil. O julgamento ficou conhecido como “Revolta da Vacina”, julgado no STF sob a classificação de RHC 2.244 (BRASIL, 1905BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso de Habeas Corpus n. 2.244. Relator Ministro Hermínio Espírito Santo. Julgado em 31.01.1905. Publicado em 03.02.1905. DOU. Rio de Janeiro, 1905. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=sobreStfConhecaStfJulgamentoHistorico&pagina=STFPaginaPrincipal1>. Acesso em: 9 out. 2013.
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verText...
).11 11 “A Revolta da Vacina foi um movimento ocorrido entre 10 e 16 de novembro de 1904, na cidade do Rio de Janeiro, contra a campanha obrigatória de vacinação imposta pelo governo federal”. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso de Habeas Corpus n. 2.244. Relator Ministro Hermínio Espírito Santo. Julgado em 31.01.1905. Publicado em 03.02.1905. DOU. Rio de Janeiro, 1905. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=sobreStfConhecaStfJulgamentoHistorico&pagina=STFPaginaPrincipal1>. Acesso em: 9 out. 2013. Ver, sobre o tema, Lopes, Queiroz e Acca (2006, p. 489). Com esse mesmo plexo, pode-se analisar o início do processo histórico do controle de constitucionalidade, notadamente a atribuição ao Senado francês do mencionado controle, em 1799. No entanto, como era um órgão político, não comprometido também com a técnica, não teve utilidade prática naquele momento, inclusive em face dos atos praticados por Napoleão Bonaparte. Um resultado frutífero, porém, historicamente visto, mas que à época gerou tensão foi a atuação da Suprema Corte americana no célebre caso Marbury versus Madison, de 1803, no qual se declarou, pela primeira vez, a inconstitucionalidade de uma lei, bem como se perfilharam os contornos do controle de constitucionalidade americano, em cujas premissas se embebedou grande parte do constitucionalismo moderno.

Assenta-se, outrossim, que o processo de positivação jurisdicional pressupõe, como consequência inafastável, a hermenêutica da norma legal, ou das normas legais aplicadas ao caso, bem como dos fatos narrados pelas partes. Tudo isso, inicialmente, numa vertente individualizada para depois portar os fatos ao processo de subsunção. Durante esse processo não linear, o intérprete realiza um processo intelectual cujo escopo é conduzir esse raciocínio, que é influenciado por sua ideologia.

Certa seletividade, portanto, é inerente à referida operação intelectual de interpretação. Lógico, porém, que no momento da análise técnica da norma, as peculiaridades da respectiva espécie normativa vêm à tona, quiçá da constitucional, a qual, segundo Luhmann (1996LUHMANN, Niklas. La costituizione come acquizione evolutiva. In: ZAGREBELSKY, Gustavo; PORTINARO, Pier Paolo; LUTHER, Jörger (Orgs.). Il futuro della costituzione. Torino: Giulio Einaudi, 1996.b, p. 100), é a abertura para o futuro ao permitir que o sistema jurídico preveja sua própria alteração por meio de nova comunicação diferenciada nos limites da autorreferencialidade de seu respectivo binarismo.12 12 Sobre os direitos fundamentais como abertura para o futuro, ver Neves (2005, p. 8).

Além do mais, na própria jurisprudência analisada, observou-se a garantia do direito à saúde como um bem inalienável, indisponível, propriamente como direito público subjetivo. Por óbvio, como já grafado, a Suprema Corte, muito pelos votos do Ministro Celso de Melo, forjou tal garantia em sua jurisprudência. Sem menoscabo dessa conquista histórica, ora se ventila que a prática reiterada por todos os tribunais brasileiros dessa visão comutativa, seguramente portará a ruptura do sistema político, a levar o Estado a uma quebra generalizada por flagrante escassez de recursos. Isso sem mencionar que ao assim julgar reduz-se, e muito, a força reflexiva que deveria ser proporcionada pela Constituição Federal (NEVES, 2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 69-74, 95).

Com essa perspectiva, não há como não levantar o ideário em torno da metodologia de julgar um litígio dessa natureza, uma vez que se poderia simplesmente decidir a favor do referido direito, despreocupado com as consequências disso ou, de outra forma, sem desconsiderar o direito, promover uma análise global da situação (LOPES, 2006LOPES, José Reinaldo de Lima. Direitos sociais: teoria e prática. São Paulo: Método, 2006., p. 137, 155).13 13 Em texto voltado a abordar a Constituição como aquisição evolutiva da sociedade moderna, Luhmann expõe que a própria Constituição deve interromper o círculo da autorreferencialidade a fim de traduzir a simetria em assimetria. Cf. Luhmann (1996, p. 97). Além disso, modernamente, a função do direito reside em sua eficiência seletiva, numa relação ininterrupta com a sociedade, em paráfrase a Luhmann. A evolução do direito dependerá muito de como o próprio direito reagirá às modificações da sociedade ao longo do tempo (LUHMANN, 1983LUHMANN, Niklas. Teoria politica nello Stato del benessere. Org. Raffaella Sutter. Milano: Franco Angeli, 1983., p. 116).

Em rigor, ainda, as atuações da Suprema Corte no tema de direito à saúde, enfrentado como uma questão distributiva, estão longe do ideal, com a justa menção à audiência pública realizada por seu então Presidente Ministro Gilmar Ferreira Mendes, oportunidade em que se buscou entender o problema de forma global. Mesmo que os julgamentos — a partir de então — continuem a ser de forma comutativa, já se deu o primeiro passo. Nesse cenário, só resta ao jurisdicionado continuar a pressionar o STF por meio de reiterados reclames processuais a sua alçada, o que gradativamente originará nova comunicação do sistema, chegando assim a novos processos de seleção, a resultar em decisão diferente da anterior.

O processo de alteração das normas constitucionais deriva da alteração da Constituição mediante emenda constitucional ou da alteração do significado constitucional outorgado no momento da concretização da norma constitucional. Nesse processo de concretização, Marcelo Neves (2004NEVES, Marcelo da Costa Pinto. Costituzionalizzazione simbólica e decostituzionalizzazione di fatto. Trad. Michele Carducci. Lecce: Pensa, 2004., p. 13, 15-17) indica duas formas de alteração constitucional, sendo uma delas a promovida pela política, que agiria em determinado sentido, com base em dispositivo constitucional específico. A política alterou a sua forma de agir com base no idêntico dispositivo constitucional. Por esse proceder, fala-se que o sistema político reinterpretou a referida norma. Na outra forma, o Judiciário a interpreta ao aplicar a Constituição Federal para dirimir um conflito no caso concreto. Em ambos os casos, porém, o processo de alteração é influenciado por interesses, expectativas e valores envolvidos no momento da interpretação-aplicação da norma.

Configurada a alteração da norma constitucional, adota-se, nesse quesito, a tese sistêmica de que a evolução se configura a partir de nova comunicação, cujo conteúdo obrigatoriamente não significaria uma coisa boa. Dessa maneira, novas racionalidades vieram e outras tantas virão com o passar dos anos, em interface contínua entre a referida tricotomia, ou talvez, quem sabe, as demais que o futuro reservará. Talvez, e por isso mesmo, chegue-se no futuro à compreensão de que essa postura de julgamento, com óptica coletiva, trata-se de complemento à atuação da política e não de uma usurpação de poderes.14 14 A respeito da atuação judicial como um complemento da política com destaque para julgamentos comutativos, ver Lopes (2006, p. 181). Sobre justiça distributiva e comutativa, ver Lopes (2006, p. 282-283). Para uma análise, no Brasil, de alguns casos de justiça distributiva sob o enfoque do direito do consumidor, ver Lopes (2006, p. 141-161). Mesmo porque, na classificação constitucional, o direito à saúde está inserido numa subdivisão dos direitos sociais, precisamente direitos da seguridade social, que aponta como seus princípios a universalidade e a uniformidade.

Em linhas gerais, não há como ratificar que a Suprema Corte julgue um direito de ordem distributiva de forma exclusivamente adjudicatória sob pena de as emblemáticas afirmações da Excelsa Corte — “Cumpre não perder de perspectiva que o direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República. […]” (BRASIL, 2000BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental em Recurso Extraordinário n. 271.286-8—RS. Relator Ministro Celso de Mello. Agravante: Município de Porto Alegre. Agravada: Cândida Silveira Saibert. Agravada: Dina Rosa Vieira. Julgado em 12.09.2000. Publicado em 24.11.2000. DJ. Brasília, 2000. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=335538>. Acesso em: 24 out. 2013.
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)15 15 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental em Recurso Extraordinário n. 271.286-8—RS. Relator Ministro Celso de Mello. Agravante: Município de Porto Alegre. Agravada: Cândida Silveira Saibert. Agravada: Dina Rosa Vieira. Julgado em 12.09.2000. Publicado em 24.11.2000. DJ. Trecho, p. 1.419. Brasília, 2000. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP = AC&docID=335538>. Acesso em: 24 out. 2013. e “A interpretação da norma programática não pode transformá-la em promessa constitucional inconsequente” (BRASIL, 2007BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental em Recurso Extraordinário n. 393.175-O— RS. Relator Ministro Celso de Mello. Agravante: Estado do Rio Grande do Sul. Agravado: Luiz Marcelo Dias e outro (A/S). Julgado em: 12.12.2006. Publicado em 02.02.2007. DJe. Brasília, 2007. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=402582>. Acesso em: 24 out. 2013.
http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/pag...
)16 16 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental em Recurso Extraordinário n. 393.175-O—RS. Relator Ministro Celso de Mello. Agravante: Estado do Rio Grande do Sul. Agravado: Luiz Marcelo Dias e outro (A/S). Julgado em: 12.12.2006. Publicado em 02.02.2007. DJe. Trecho, p. 1.524. Brasília, 2007. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=402582>. Acesso em: 24 out. 2013. —, tornarem-se simbólicas em contexto nacional. Exemplifica-se com uma ilustração: imagine que sua casa está infectada por uma grande quantidade de formigas. Muitas formigas tomam conta do lugar. Você não conseguiu resolver. Contrata uma empresa especializada. No dia da dedetização, a equipe explana um discurso forte, persuasivo de que sua família ficará livre das formigas. Durante a prestação do serviço, com grande vigor, matam-se todas as formigas que se encontram visíveis. No entanto, no dia seguinte, seu cachorro morre envenenado e, uma semana depois, as formigas estão todas de volta. O que aconteceu? A empresa é séria. Dedicou-se ao trabalho! Porém, enfrentou a questão de forma adjudicatória, condenando aquelas formigas à morte sem pensar na questão de forma macro, com a análise do conjunto (origem, consequências etc.) para buscar atingir o resultado de forma global. Por isso, a empresa, por mais que se tenha esforçado, teve uma atuação simbólica.

Obviamente, com as devidas adaptações, o resultado da pesquisa é muito similar à ilustração esboçada acima. O STF, na medida em que não julga o direito à saúde por um prisma distributivo, outras vezes é muito mais generoso com casos (demandas) individuais do que nos processos coletivos, promove a continuidade de uma exclusão gigantesca dos indivíduos à saúde. Dessa forma, acaba tendo uma atuação simbólica, como um “álibi”. Fez-se o que se podia. Argumentou-se com teses lindas — que inegavelmente consolidam um direito no plano jurídico — mas que sua não resolução, pelo enfoque distributivo, configura como simbólica, a despeito do bem entregue àqueles litigantes que obtiveram a decisão favorável — uma nova elite.17 17 “Embora do ponto de vista jurídico a constitucionalização simbólica seja caracterizada negativamente pela ausência de concretização normativa do texto constitucional, ela também tem um sentido positivo, na medida em que a atividade constituinte e a linguagem constitucional desempenham um relevante papel político-ideológico. Nesse sentido, exige um tratamento diferenciado das abordagens tradicionais referentes à ‘ineficácia’ ou ‘não-realização’ das normas constitucionais”. (NEVES, 2007, p. 95). Ver, ainda, Neves (2007, p. 96): “Já no caso da constitucionalização simbólica, à atividade constituinte e à emissão do texto constitucional não se segue uma normatividade jurídica generalizada, uma abrangente concretização normativa do texto constitucional”.

2.3 Irritações sistêmicas causadas pela judicialização da saúde

A elevadíssima quantidade de tutelas jurisdicionais deferidas com a finalidade de obrigar o Poder Público a oferecer determinados fármacos é alarmante. Normalmente os pedidos são de produtos inseridos há pouco tempo no mercado farmacêutico cujo valor é muito mais elevado do que os já oferecidos pelo Estado. Há também muitos processos com requerimentos de produtos não reconhecidos como remédios, visto ainda estarem em fase de experimentação pela Agência Nacional de Saúde (ANS) e, por isso mesmo, não terem sido liberados ao comércio.

Octávio Ferraz e Fabíola Vieira promovem um interessante raciocínio a respeito do desequilíbrio que as escolhas tomadas pelo Judiciário provocam na saúde pública, mediante decisões judiciais em favor do fornecimento de quatro medicamentos (Interferon peguilhado, Infliximabe, Etanercepte e Adalimumabe) com a finalidade de combater duas doenças crônicas (hepatite viral e artrite reumatoide) que atingem 1% da população. Nessa linha, se o Sistema Único de Saúde (SUS) resolvesse oferecer esses mesmos quatro remédios, para o 1% dos cidadãos que têm o idêntico direito daquela minoria que entrou com ação judicial, custaria mais que todo o orçamento do SUS, incluído todos os gastos com remédios, estrutura e serviços (FERRAZ; VIEIRA, 2009FERRAZ, Octávio Luiz Motta; VIEIRA, Fabiola Sulpino. Direito à saúde, recursos escassos e equidade: os riscos da interpretação judicial dominante. Dados. Rio de Janeiro, v. 52, n. 1, p. 223-251, mar. 2009. Disponível em: <http://ref.scielo.org/vwpq5p>. Acesso em: 11 set. 2016.
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, p. 223-251).

Não é de hoje que a Administração Pública já demonstra séria preocupação com a elevada quantidade de decisões que desorganizam o caótico sistema de saúde brasileiro. Motivada por esse cenário, a academia tem produzido inúmeros estudos sobre a judicialização da saúde sob as mais diversas abordagens; como conclusão, há diversos vereditos, contudo, quando o objeto de estudo se trata justamente de pesquisar os efeitos das decisões no orçamento público, o coro se reforça no sentido do enorme abismo que se encontra entre as decisões judiciais e os recursos públicos.

Em outra pesquisa empírica, Daniel Wang e outros apontam que 55% dos recursos gastos pelo município de São Paulo para atender ordens judiciais se destinam a prestar medicamentos ou serviços de competência do estado de São Paulo ou da União, ou seja, a jurisprudência consolidada no STF de que há solidariedade entre os entes federados na prestação do direito à saúde — citada no item 2.1 deste artigo — tem prejudicado o sistema de saúde municipal que, por natureza institucional, possui menores recursos que o estado e a União e, por isso mesmo, teve sua competência dividida conforme sua fatia do orçamento. A judicialização desorganiza completamente qualquer tentativa de planejamento pelos agentes da saúde dos municípios, a exemplo do pequeno município de Buritama (SP), onde mais da metade do orçamento anual da saúde está comprometido com o atendimento de ações judiciais, tendo inclusive 16% de todo o seu orçamento comprometido por uma única ação judicial (WANG et al., 2014WANG, Daniel Wei L. et al. Os impactos da judicialização da saúde no município de São Paulo: gasto público e organização federativa. Revista de Administração Pública. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, set.-out. 2014, p. 1191-1206., p. 1191-1206). A situação do estado de São Paulo também é preocupante. São inúmeras as situações de ativismo que preocupam por seu potencial nocivo ao sistema de saúde. Cita-se uma na qual o Judiciário determinou o fornecimento de um remédio que anualmente custa em torno R$ 800.00,00 a fim de dar qualidade de vida a um doente que não tem cura. O fato até motivou uma matéria na revista Época (SEGATTO, 2012SEGATTO, Cristiane. O paciente de R$ 800 mil. Revista Época, 16 mar. 2012. Disponível em: <http://revistaepoca.globo.com/tempo/noticia/2012/03/o-paciente-de-r-800-mil.html>. Acesso em: 11 set. 2016.
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).

Nessa perspectiva, ressalta-se que a postura de agir como um “álibi” do STF contribui de forma significativa para o cenário de um “ativismo irracional”, cujas consequências podem também ser medidas pelos dados coletados pela Advocacia Geral da União (AGU), a seguir apresentados, extraídos somente das ações propostas em face da União.

Aumento significativo dos medicamentos adquiridos em razão de ações judiciais. Enquanto em 2005 gastou-se R$ 2.441.041,95, no ano de 2012 a compra de medicamento resultou em R$ 287.844.968,16, conforme se pode visualizar no Gráfico 1.

GRÁFICO 1
Evolução dos gastos da União com a compra de medicamentos em atendimento a ordens judiciais

Irracionalidade na distribuição dos medicamentos: 523 pessoas, judicialmente, resultaram num gasto de R$ 278.904.639,71 à União. A essa elite o Judiciário outorgou dezoito novas tecnológicas, conforme demonstra o Quadro 1, a seguir.

QUADRO 1
Nome e custo dos medicamentos mais concedidos judicialmente em desfavor da União

Necessidade de a União ajudar financeiramente estados e municípios porque não conseguiram atender as ordens judiciais. O valor pulou de R$ 116.504,54, no ano de 2005, para R$ 68.002.152,43, em 2012. No Gráfico 2, a seguir, observa-se a evolução dos gastos da União nesse sentido.

GRÁFICO 2
Evolução dos gastos da União para auxiliar estados e municípios

No ano de 2012, a União gastou com depósitos judiciais e compra de remédios mais de R$ 350.000.000,00, enquanto em 2005 o gasto foi de R$ 2.557.546,49. A evolução dos gastos, conforme se depreende do Gráfico 3, é elevadíssima.

GRÁFICO 3
Evolução dos gastos da União para atender ordens judiciais

Os gastos da União a fim de atender as decisões judiciais são elevadíssimos, contudo, a situação dos estados-membros é pior, haja vista que no Brasil a distribuição da arrecadação tributária beneficia a União em grande escala. A despeito de a União ter mais dinheiro, o montante de gastos dos estados no ano de 2010 é alarmante. O panorama dá conta que: (i) o estado de São Paulo gastou R$ 700.000.000,00; (ii) o estado de Pernambuco, para atender apenas seiscentas ações, teve de desembolsar R$ 40.000.000,00; (iii) o estado do Pará gastou para atender apenas seis demandas judiciais R$ 913.073,81; (iv) Minas Gerais declarou ter retirado dinheiro das políticas públicas, promovidas por meio dos programas Farmácia de Minas e Saúde da Família (PSF), para obedecer a ordens judiciais (BRASIL, 2013BRASIL. Advocacia Geral da União. Consultoria Jurídica/Ministério da Saúde. Intervenção Judicial na saúde pública: panorama no âmbito da Justiça Federal e apontamentos na seara das Justiças Estaduais. Brasília, 2013. Disponível em: <http://u.saude.gov.br/images/pdf/2014/maio/29/Panorama-dajudicializa——o—-2012—-modificado-em-junho-de-2013.pdf>. Acesso em: 11 set. 2013.
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).

Ademais, é muito emblemático o exemplo da cidade de Campinas, um município rico, que teve que redirecionar 16% de todo seu orçamento para a compra de remédios a fim de atender 89 ações propostas em 2009. Ou seja, 89 jurisdicionados gastaram R$ 2.505.762,00, enquanto mais de 1 milhão de habitantes tiveram de se contentar com o restante do orçamento (FINATTI; VECHINI, 2009FINATTI, Deise Barbieri; VECHINI, Priscila Garbin. O perfil dos gastos destinados ao cumprimento de determinações judiciais no município de Campinas. XXIV Congresso de Secretários Municipais de Saúde do Estado de São Paulo. Anais… Campinas, São Paulo, 2009. Disponível em: <http://2009.campinas.sp.gov.br/saude/biblioteca/XXIV_Congresso_de_Secretarios_Municipais_de_Saude_do_Estado_SP/Complexidadedaatencaobasica/O_Perfil_dos_gastos_Deise.pdf>. Acesso em: 11 set. 2016.
http://2009.campinas.sp.gov.br/saude/bib...
).

Diante do cenário aqui descrito, com o crescente dispêndio para atender ações propostas em face da União, importantes questões emergem: a saúde é realmente efetiva no Brasil? Ou mais se aproxima de uma atuação jurisdicional “álibi”, cuja efetividade do caso concreto coloca o sistema imunológico — o direito — como emissor de mais infecção, em vez de imunizar a sociedade, como disse Luhmann (2005LUHMANN, Niklas. EI derecho de la sociedad. Trad. Javier Nafarrate Torres. 2. ed. Mexico: Universidad Iberoamericana, 2005., p. 219; 1977, p. 115), e, por isso, tornar-se-ia um paradoxo que no lugar de proteger destruiria, como ensina Guerra Filho (2001GUERRA FILHO, Willis Santiago. Teoria da ciência jurídica. São Paulo: Saraiva, 2001., p. 186-187; 2012GUERRA FILHO, Willis Santiago. Luhmann and Derrida: Immunology and Autopoiesis. In: LA COUR, Anders; PHILIPPOPOULOS-MIHALOPOULOS, Andreas (Eds.). Luhmann Observed: Radical Theoretical Encounters. Basingstoke: Palgrave, 2012., p. 3)?

2.4 Simbolismo como atuação político-ideológica

A conceituação do vocábulo simbólico, no plano teórico, é heterogênea. Como já frisado, o trabalho adota a desenvolvida por Marcelo Neves no livro A constitucionalização simbólica. Precisamente para o sentido da pesquisa, a atuação simbólica do STF, a priori, caracterizar-se-á quando prevalecer em sua “racionalidade jurídica” o significado “político-ideológico”, aqui materializada pela atuação jurisdicional em desfavor da concretização normativo-jurídica.

A decisão simbólica teria, portanto, um escopo de álibi social e não de luta pela efetividade dos valores normativos. Álibi entendido como um mecanismo, na verdade, de efeito, como já dito, “político-ideológico” de justificação às pressões sociais (NEVES, 2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 19, 30-31).18 18 Ver especialmente Neves (2007, p. 30-31): “[…] Porém, o conceito de legislação simbólica deve referir-se abrangentemente ao significado específico do ato de produção e do texto produzido, revelando que o sentido político de ambos prevalece hipertroficamente sobre o aparente sentido normativo-jurídico. A referência deôntico-jurídica de ação e texto à realidade torna-se secundária, passando a ser relevante a referência político-valorativa ou ‘político-ideológica’”. Ver, também, Neves (2004. p. 29, 32). No entanto, na pesquisa se realiza uma mudança de paradigma, haja vista que Neves analisou o simbolismo da Constituição Federal e a pesquisa, a seu turno, centra-se na jurisprudência da Suprema Corte (NEVES, 2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 1-3).19 19 Ainda, sobre a obra de Marcelo Neves, intitulada A constitucionalização simbólica, destaca-se que foi por meio de sua leitura que Niklas Luhmann repensou a ideia de autopoiese para reconhecer a alopoiese.

Por trás do ideário simbólico de Neves há toda uma construção teórica, alicerçada, sobretudo, em Kindermann e em Gusfield, com nítido objetivo de sistematização. Nessa senda, depara-se com uma classificação das leis simbólicas no seguinte formato: (i) legislação como confirmação de valores sociais; (ii) legislação como álibi; (iii) legislação como compromisso futuro. A primeira situação surge quando há uma forte polarização ideológica conduzida por grupos sociais obviamente antagônicos e ideologicamente conflituosos. A rivalidade é levada ao parlamento a fim de que um lado saia vencedor na votação de determinado projeto de lei. Em algumas situações, trata-se até mesmo de um litígio religioso, como ocorreu entre protestantes e católicos no caso da Lei Seca nos Estados Unidos da América. A aprovação da lei com vedação à venda de bebidas alcoólicas foi para os nativos (protestantes) uma grande vitória contra os imigrantes (católicos), independentemente da efetividade social da norma (NEVES, 2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 33-36).

A legislação como confirmação de valores sociais é o primeiro exemplo de legislação simbólica demonstrado por Marcelo Neves. E o mais curioso, porquanto parece inusitado que os movimentos sociais se satisfaçam com a vitória legislativa e não se preocupem com a efetivação dos valores contemplados. Neves elenca exemplos como o caso da Lei Seca norte-americana, em que os protestantes a favor da lei travaram uma batalha política com os católicos contrários à sua aprovação. Fundamentando-se em Gusfield, Neves defende que os protestantes almejavam a aprovação da lei muito mais num sentido de duelo de forças do que a concretização no mundo fático desses valores (NEVES, 2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 33-34).20 20 Ver na mesma obra, p. 34-35, mais dois exemplos sobre essa situação de confirmação de valores sociais, ambos na Europa; um a respeito do aborto, outro de legislação estrangeira. Talvez, a situação, por outro olhar, não seja de desinteresse pela efetividade social, porém estaria num segundo plano, pois que, no primeiro, estaria a vitória política, em total derrocada do outro grupo social.

A segunda hipótese pontuada por Neves diz respeito à legislação-álibi. Nesta, o legislador teve o escopo de conquistar a opinião pública. Muitas vezes, cobram-se do parlamento atitudes até mesmo imediatas para sanar problemas sociais, sejam de qualquer ordem, mesmo que a produção normativa não possa, como um passe de mágica, solver o problema. Essa expressão: “legislação-álibi”, como suprarreferida, foi cunhada por Kindermann. Abrange situações como as que ocorrem nos processos eleitorais, em que os políticos propagandeiam seus atos como forma de angariar eleitorado ou mesmo manter o do pleito anterior (NEVES, 2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 36-37).

Ainda, sob o aspecto do simbolismo, Marcelo Neves, escorado em Freud e Gusfield, cada qual em seu contexto teórico, desenvolve raciocínio sobre o significado latente e manifesto das normas jurídicas, imbricando em agudo conceito sobre a legislação simbólica, a qual seria, por outro vernáculo, um mandamento com a ilusão de uma função manifesta. Por sua edição, não se pretendeu, realmente, que os valores nela assentados fossem efetivados. Almejou-se, de forma latente — escondida —, outra finalidade, como de origem político-ideológica (NEVES, 2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 22-33).21 21 Ver sobretudo Neves (2007, p. 33): “Kidermann propôs um modelo tricotômico para a tipologia da legislação simbólica, cuja sistematicidade o torna teoricamente frutífero: ‘Conteúdo de legislação simbólica pode ser: a) confirmar valores sociais, b) demonstrar a capacidade de ação do Estado e c) adiar a solução de conflitos sociais através de compromissos dilatórios’”. Como se aduz da transcrição, Neves, baseado em Kindermann, expôs um modelo com tríplice divisão do intuito latente dessa legislação simbólica: (i) confirmação de valores sociais; (ii) legislação-álibi; (iii) legislação como fórmula de compromisso dilatório. Cf. Neves (2004, p. 27-28).

A cobrança social face ao sistema político provoca uma reação comunicativa. No caso da produção legiferante, novas leis serão votadas e aprovadas diante dos clamores sociais. O curioso é que, em algumas situações, os legisladores têm consciência da ineficácia social dessa nova lei. Ela será aprovada, porém socialmente terá pouca ou nenhuma força coercitiva. Sem embargo dessa consciência, como ela se faz necessária, é criada como um “álibi” com o mote de reforçar momentaneamente a confiança popular no governo. Contudo, a prática sucessiva de tal artifício pode gerar o efeito inverso, fortalecendo o descrédito em relação aos políticos (NEVES, 2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 36-41).22 22 Cita-se literalmente Neves (2007, p. 33): “[…] Quando, porém, a nova legislação constitui apenas mais uma tentativa de apresentar o Estado como identificado com os valores ou fins por ela formalmente protegidos, sem qualquer novo resultado quanto à concretização normativa, evidentemente estaremos diante de um caso de legislação simbólica”. Cf. também Neves (2004, p. 28-29).

A ideia de dilação da resolução de um problema social é relacionada, regra geral, à gravidade do problema em questão. Como é um problema grave, de difícil resolução, procurase postergá-lo mediante a criação de medidas paliativas. A exemplo disso, no Brasil existem, em algumas regiões, verdadeiros bolsões de miséria; uma situação oriunda de uma realidade econômico-social negativa muito forte, não resolúvel em curto prazo. Por isso, o governo brasileiro cunhou diversos planos assistenciais, rotulados de “bolsas”, os quais, no senso acima mencionado, amenizam, mas não resolvem a situação. Sem menoscabo a essa análise, a ideia aqui é outra: o parlamento vê a necessidade de dar uma resposta aos eleitores, todavia, não há consenso em relação às medidas que devem ser tomadas para resolver a questão. Desse modo, diante da necessidade imediata de uma resposta, chega-se a um acordo em produzir determinada norma que sabem que não resolverá a situação. No entanto, como não há acordo sobre as medidas necessárias, edita-se a lei propriamente como uma dilação do problema. É uma forma de dar uma resposta (ainda que estéril) aos reclamos da sociedade (NEVES, 2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 41-42).

As decisões analisadas contêm em seu bojo um nítido intento de outorgar aos respectivos jurisdicionados a plenitude do direito à saúde, todavia, parte significativa das mesmas decisões baseou-se em argumentação padrão, na qual não se utiliza heterorreferência com a comunicação trazida pelo Estado, fechando-se, dessa forma, à cognição com a comunicação oriunda de outros sistemas e, sobretudo, às consequências da judicialização da saúde na sociedade. Essa postura judicial é identificada, por exemplo, quando fármacos caríssimos são concedidos com base em receitas simples, sem nenhuma justificativa a favor dos novos medicamentos ou em desfavor dos disponíveis pelo SUS. Pontua-se, nesse sentido, que não há na maioria dos processos analisados fundamento fático para legitimar determinado tratamento em detrimento de mais barato ou que simplesmente já faz parte dos fornecidos pelo Estado.

Nessa mesma linha, depara-se com processos sem instrução probatória, ou seja, o médico de confiança da família — quase sempre particular — receita determinado remédio, sem comprovação de vantagem na eficácia. Nos autos não há debate argumentativo entre as vantagens e as desvantagens da sua utilização; os experts judiciais pouco são utilizados e, talvez por isso mesmo, nega-se o diálogo sob o verte da linguagem médico-sanitária, de modo que argumentos como ineficácia do tratamento, riscos, custo-benefício e, por que não, as consequências das decisões judiciais no plano da distributividade dos direitos sociais quase nunca são levados em conta na dialética travada entre os argumentos pró e contra a concessão da tutela jurisdicional pretendida pela parte autora.23 23 A pesquisa de Mirian Ventura (2012. p. 8, 164, 166 e 167) também identifica nas decisões judiciais cujo tema é a saúde processos mal instruídos, fundamentados muitas vezes somente em receitas médicas simplórias, sem nenhuma justificava para a escolha desse ou daquele remédio.

3 Da atuação simbólica do STF em direito à saúde

Conforme posto no item 2.4, a segunda hipótese desenvolvida por Marcelo Neves, no livro A constitucionalização simbólica, é chamada de legislação-álibi. Aplicando-a aqui, todavia, com a mudança de paradigma proposta neste trabalho, consta-se que a Corte agiu mais com o escopo de conquistar a opinião pública do que em buscar a efetivação do direito à saúde. Muitas vezes, a população cobra atitudes de efeito imediato para sanar problemas sociais. Por esse enredo, seria possível com um passe de mágica solver o problema. A expressão “legislação-álibi”, como suprarreferida, foi cunhada por Kindermann, justamente para descrever situações similares às que ocorrem nos processos eleitorais, em que os políticos propagandeiam seus atos como forma de angariar eleitorado e não com a intenção de resolver de forma efetiva o problema (NEVES, 2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 36-37).

A cobrança social ante o sistema jurídico provoca uma reação comunicativa: decisões judiciais são tomadas despreocupadas com seus efeitos concretos na sociedade. O STF tem consciência da ineficácia social nacional de suas decisões. Elas até podem vir a ser individualmente efetivas, porém essa efetividade do caso concreto terá pouca ou nenhuma força coercitiva no plano nacional. Cria-se um “álibi” com o mote de reforçar momentaneamente a confiança popular na judicialização da saúde, todavia a prática sucessiva de tal artifício não se sustenta, o descrédito é eminente, notadamente porque o Tribunal reduziu a complexidade social a tal ponto que nem ao menos dialoga com fatores sociais fortíssimos (NEVES, 2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 36-41).24 24 Cita-se literalmente Neves (2007, p. 33): “[…] Quando, porém, a nova legislação constitui apenas mais uma tentativa de apresentar o Estado como identificado com os valores ou fins por ela formalmente protegidos, sem qualquer novo resultado quanto à concretização normativa, evidentemente estaremos diante de um caso de legislação simbólica”. Cf. também Neves (2004, p. 28-29).

Ademais, em termos de resultado da pesquisa, as duas hipóteses iniciais — atuação efetiva ou atuação simbólica — restaram, quando vistas isoladamente, inconclusivas, inconsistentes e, especialmente, simplistas demais para descrever um ambiente tão complexo como demonstrou a coleta de dados empíricos. Dessa maneira, o problema de pesquisa teve de dar vazão a uma descrição menos nominalista, positiva, rotulista, a fim de propiciar um resultado mais contextual, analítico e sensitivo.

Com efeito, é inegável que, na Suprema Corte, existe sim uma racionalidade jurídica definida no sentido da concretização do direito à saúde, quando a observação se atém à visão da microjustiça (justiça entre as partes), a qual, entretanto, aproxima-se de uma atuação simbólica porquanto se forja uma nova elite que possui instrumentos técnicos para chegar ao STF. E mergulha de cabeça no simbolismo-álibi ao negar um acesso à justiça distributiva e a continuar a enfrentar a situação somente pelo viés adjudicatório, o que ratifica as assertivas de que não cabe ao juiz se preocupar com o orçamento público e, muito menos, deixar que interesses menores, como a ausência de recursos, tolham exatamente direitos sociais que nada mais são do que a busca de uma igualdade econômica, sobretudo porque, se é verdade que para a análise do signo em torno do STF deve levar-se em conta o gigantesco aumento da complexidade, não é menos verdade que, se a Corte, ao julgar, não levar em conta, para formar sua racionalidade, essa mesma complexidade, forjará uma gradual significação simbólica, em sintonia com a ideia de um álibi ante sua incapacidade de manter as expectativas ao longo do tempo

A longo prazo essa racionalidade da Corte não se sustentará, porque, em vez de imunizar a sociedade com sua comunicação, o Direito está irritando os sistemas político (Administração Pública) e econômico de forma a subverter a ordem desses subsistemas, levando-os à quebra de autonomia e, portanto, corrompendo sua binariedade, que funciona como unidade comunicacional. Como consequência, a desordem comunicacional trará mais malefícios ao sistema social global (a sociedade) do que a microefetividade ofertada pela judicialização.

A atuação simbólica da Suprema Corte também é identificada ao se negar a observar os observadores (a atuação jurisdicional dos outros juízes) para, dessa forma, exercer o papel de ser “o observador de segunda ordem”. Para tanto, deveria (i) analisar a complexidade social gerada pelos processos judiciais em interface com os demais subsistemas sociais com o escopo de regular a consistência teórica das decisões em face da adequação social, tomando, se necessário, medidas de revisão da jurisprudência e até mesmo propondo a edição de medidas de regulação da atividade estatal em caráter nacional como a edição de súmula vinculante e/ou (ii) julgar com boa-vontade processos coletivos.

  • 1
    Ver especialmente Neves (2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 30-31): “[…] Porém, o conceito de legislação simbólica deve referir-se abrangentemente ao significado específico do ato de produção e do texto produzido, revelando que o sentido político de ambos prevalece hipertroficamente sobre o aparente sentido normativo-jurídico. A referência deôntico-jurídica de ação e texto à realidade torna-se secundária, passando a ser relevante a referência político-valorativa ou ‘político-ideológica’”. Ver, também, Neves (2004NEVES, Marcelo da Costa Pinto. Costituzionalizzazione simbólica e decostituzionalizzazione di fatto. Trad. Michele Carducci. Lecce: Pensa, 2004., p. 29, 32).
  • 2
    Ainda, sobre a obra de Marcelo Neves, intitulada A constitucionalização simbólica, destaca-se que foi por meio de sua leitura que Niklas Luhmann repensou a ideia de autopoiese para reconhecer a alopoiese.
  • 3
    BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário com Agravo n. 640722/SC. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Requerente: União. Requerido: Ministério Público Federal. Intimado: Estado de Santa Catarina. Intimado: Município de Videira. Julgado em 24.05.2011. Publicado em 30.05.2011. DJe. Brasília, 2011b. Disponível em: <http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/22936567/recurso-extraordinario-com-agravo-are-640722-sc-stf>. Acesso em: 16 out. 2013. Trecho do mesmo julgado, p. 1: “1. A Constituição Federal, com precisão, erige a saúde como um direito de todos e dever do Estado (art. 196). Daí a seguinte conclusão: é obrigação do Estado no sentido genérico (União, Estados e Municípios) assegurar às pessoas desprovidas de recurso financeiro o acesso à medicação necessária para a cura de suas mazelas, em especial, as mais graves”. Trecho do mesmo julgado, p. 1: “2. O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196)”. Trecho do mesmo julgado, p. 1: “3. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não se pode mostrar indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional”.
  • 4
    BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 535145/CE. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Requerente: União. Requerida: Ministério Público Federal. Julgado em 26.08.2014. Publicado em 04.09.2014. DJe. Brasília, 2014. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28535145%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/zf8eak6>. Acesso em: 18 nov. 2016.
  • 5
    BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 607.385/SC. Relatora Ministra Cármen Lúcia. Requerente: Estado de Santa Catarina. Requerida: Elisa Meira Fernandes. Julgado em 19.04.2011. Publicado em 12.05.2011. DJ. Brasília, 2011a. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/diarioJustica/verDiarioProcesso.asp?numDj=88&dataPublicacaoDj=12/05/2011&incidente=3814696&codCapitulo=6&numMateria=68&codMateria=3>. Acesso em: 16 out. 2013. Trecho do mesmo julgado, p. 2: “A parte-autora ajuizou ação contra o Estado de Santa Catarina objetivando o fornecimento de medicamento essencial ao tratamento da doença que a acomete. À luz da jurisprudência recente do STJ, as três esferas federativas são solidariamente responsáveis por realizar o direito à saúde, conforme se vê nas decisões abaixo transcritas: […]. Por se tratar de obrigação solidária, é possível exigir a prestação de qualquer um ou de todos os entes federativos. A escolha cabe à parte-autora. No caso em tela, a parte-autora optou por acionar o Estado de Santa Catarina, de modo que esse réu, e somente ele, deve integrar o polo passivo da presente demanda” (destaque nosso). Também no prisma da garantia da solidariedade do direito à saúde entre os entes públicos, ver: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 584652/RJ. Relator Ministro Cezar Peluso. Requerente: União. Requerido: Produtos Veterinários Manguinhos LTDA. Julgado em 07.08.2008. Publicado em 02.09.2008. DJe. Brasília, 2008. Disponível em: <http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/14771245/recurso-extraordinario-re-584652-rj-stf>. Acesso em: 16 out. 2013. Trecho do mesmo julgado, p. 2: “Ainda que assim não fosse, a recusa do Estado em fornecer medicamento coloca em risco a saúde de paciente necessitado e representa desrespeito ao disposto no art. 196 da Constituição Federal, que estatui ser a saúde direito de todos e dever do Estado. Essa regra constitucional tem por destinatários todos os entes políticos que compõem a organização federativa do Estado brasileiro”.
  • 6
    BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo em Recurso Extraordinário n. 646.235/SP. Relatora Ministra Cármen Lúcia. Requerente: Município de São Paulo. Requerido: Ministério Público do Estado de São Paulo. Julgado em 01.08.2011. Publicado em 05.08.2011. DJe. Brasília, 2011c. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28ARE%24%2ESCLA%2E+E+646235%2ENUME%2E%29&base=baseMonocraticas&url = http://tinyurl.com/mcc3do2>. Acesso em: 16 out. 2013. Trecho do julgado, p. 2: “O recurso extraordinário foi interposto contra o seguinte julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo: ‘Apelação Cível — Reexame necessário e recurso voluntário pela municipalidade de São Paulo — Ação Civil Pública — Procedência para obrigar a Municipalidade a fornecer fraldas descartáveis à adolescente com paralisia cerebral, tetraparesia espática e déficit cognitivo — Preliminares de ilegitimidade afastadas — A proteção integral, de acordo com a inteligência dos art. 1 e 11, §2°, da Lei 8.069/90 (ECA), à adolescente necessitada, justifica o fornecimento gratuito do item, de acordo com orientação médica — Inadmissibilidade de argumentos que vejam na atuação do Judiciário, ao prestigiar direitos prioritários de crianças e adolescentes, indevida intromissão na esfera de atuação do Executivo — Multa cabível nos termos do art. 213, §2°, do ECA e aplicada com modicidade. Recursos desprovidos’ (fls. 209)”. Trecho do mesmo julgado, p. 2: “Assevera que ‘não há qualquer ligação entre fraldas e direito à saúde e à vida' e que ‘não sendo medicamento, não há que se falar em direito público subjetivo oriundo diretamente da Constituição’ (fl. 328)” (destaque nosso).
  • 7
    Na mesma obra: “Por tais características não é de se admirar que seja ainda difícil uma discussão mais detalhada dos direitos sociais dentro dos trabalhos dos juristas e que saiam do lugar-comum da invocação da ‘dignidade da pessoa humana’, espécie de abracadabra jurídico de uma sociedade em que a discussão moral — da qual procede o próprio conceito de dignidade humana — não é feita em público”. Extrai-se, ainda, p. 291: “[…] O ponto relevante sempre é este: podem direitos presentes de sujeitos individuais ser qualificados em nome de direitos futuros de outros sujeitos, entre os quais estarão incluídos os direitos ‘prejudicados’? Em outras palavras, é possível redistribuir os direitos?” (LOPES, 2006LOPES, José Reinaldo de Lima. Direitos sociais: teoria e prática. São Paulo: Método, 2006., p. 237)
  • 8
    “A distribuição consiste em partilhar algo comum. Distribuir é tomar algo que é um todo e dividi-lo” (LOPES, 2006LOPES, José Reinaldo de Lima. Direitos sociais: teoria e prática. São Paulo: Método, 2006., p. 142). Também sobre os direitos sociais como bens coletivos, ver Neves (2005NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A força simbólica dos direitos humanos. Revista Eletrônica de Direito de Estado. Salvador, n. 4, p. 1-35, out./nov./dez. 2005. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com.br/artigo/marceloneves/a-forca-simbolica-dos-direitos-humanos>. Acesso em: 25 out. 2011.
    http://www.direitodoestado.com.br/artigo...
    , p. 8).
  • 9
    Na mesma obra: “[…] O direito foi percebido como instrumento de engenharia social. Para tanto era preciso superar a tradição liberal de (a) não-intervenção nos contratos, e (b) separação de poderes de modo rígido, muito especialmente de isolamento do Legislativo e do Judiciário” (LOPES, 2006LOPES, José Reinaldo de Lima. Direitos sociais: teoria e prática. São Paulo: Método, 2006., p. 280).
  • 10
    Sobre a capacidade institucional dos juízes na análise dos efeitos sistêmicos da sua decisão, ver Barroso (2012BARROSO, Luís Roberto. Constituição, democracia e supremacia judicial: direito e política no Brasil contemporâneo. In: LEITE, George Salomão; SALET, Ingo Wolfgang (Orgs.). Jurisdição constitucional, democracia e direitos fundamentais. Salvador: JusPodivm, 2012. p. 363-406., p. 375): “[…], a doutrina constitucional tem explorado duas ideias destinadas a ingerência judicial: a de capacidade institucional e a de efeitos sistêmicos. Capacidade institucional envolve a determinação de qual Poder está mais habilitado a produzir a melhor decisão em determinada matéria. […] Também o risco de efeitos sistêmicos imprevisíveis e indesejáveis podem recomendar uma posição de cautela e de referência por parte do Judiciário. O juiz, por vocação e treinamento, normalmente estará preparado para realizar a justiça do caso concreto, a microjustiça, sem condições, muitas vezes, de avaliar o impacto de suas decisões sobre um segmento econômico ou sobre a prestação de um serviço público”.
  • 11
    “A Revolta da Vacina foi um movimento ocorrido entre 10 e 16 de novembro de 1904, na cidade do Rio de Janeiro, contra a campanha obrigatória de vacinação imposta pelo governo federal”. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso de Habeas Corpus n. 2.244. Relator Ministro Hermínio Espírito Santo. Julgado em 31.01.1905. Publicado em 03.02.1905. DOU. Rio de Janeiro, 1905. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=sobreStfConhecaStfJulgamentoHistorico&pagina=STFPaginaPrincipal1>. Acesso em: 9 out. 2013. Ver, sobre o tema, Lopes, Queiroz e Acca (2006, p. 489). Com esse mesmo plexo, pode-se analisar o início do processo histórico do controle de constitucionalidade, notadamente a atribuição ao Senado francês do mencionado controle, em 1799. No entanto, como era um órgão político, não comprometido também com a técnica, não teve utilidade prática naquele momento, inclusive em face dos atos praticados por Napoleão Bonaparte. Um resultado frutífero, porém, historicamente visto, mas que à época gerou tensão foi a atuação da Suprema Corte americana no célebre caso Marbury versus Madison, de 1803, no qual se declarou, pela primeira vez, a inconstitucionalidade de uma lei, bem como se perfilharam os contornos do controle de constitucionalidade americano, em cujas premissas se embebedou grande parte do constitucionalismo moderno.
  • 12
    Sobre os direitos fundamentais como abertura para o futuro, ver Neves (2005NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A força simbólica dos direitos humanos. Revista Eletrônica de Direito de Estado. Salvador, n. 4, p. 1-35, out./nov./dez. 2005. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com.br/artigo/marceloneves/a-forca-simbolica-dos-direitos-humanos>. Acesso em: 25 out. 2011.
    http://www.direitodoestado.com.br/artigo...
    , p. 8).
  • 13
    Em texto voltado a abordar a Constituição como aquisição evolutiva da sociedade moderna, Luhmann expõe que a própria Constituição deve interromper o círculo da autorreferencialidade a fim de traduzir a simetria em assimetria. Cf. Luhmann (1996LUHMANN, Niklas. La costituizione come acquizione evolutiva. In: ZAGREBELSKY, Gustavo; PORTINARO, Pier Paolo; LUTHER, Jörger (Orgs.). Il futuro della costituzione. Torino: Giulio Einaudi, 1996., p. 97).
  • 14
    A respeito da atuação judicial como um complemento da política com destaque para julgamentos comutativos, ver Lopes (2006LOPES, José Reinaldo de Lima. QUEIROZ, Rafael Mafei Rabelo; ACCA, Thiago dos Santos. Curso de História do Direito. São Paulo: Método, 2006. p. 489., p. 181). Sobre justiça distributiva e comutativa, ver Lopes (2006LOPES, José Reinaldo de Lima. QUEIROZ, Rafael Mafei Rabelo; ACCA, Thiago dos Santos. Curso de História do Direito. São Paulo: Método, 2006. p. 489., p. 282-283). Para uma análise, no Brasil, de alguns casos de justiça distributiva sob o enfoque do direito do consumidor, ver Lopes (2006LOPES, José Reinaldo de Lima. QUEIROZ, Rafael Mafei Rabelo; ACCA, Thiago dos Santos. Curso de História do Direito. São Paulo: Método, 2006. p. 489., p. 141-161).
  • 15
    BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental em Recurso Extraordinário n. 271.286-8—RS. Relator Ministro Celso de Mello. Agravante: Município de Porto Alegre. Agravada: Cândida Silveira Saibert. Agravada: Dina Rosa Vieira. Julgado em 12.09.2000. Publicado em 24.11.2000. DJ. Trecho, p. 1.419. Brasília, 2000. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP = AC&docID=335538>. Acesso em: 24 out. 2013.
  • 16
    BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental em Recurso Extraordinário n. 393.175-O—RS. Relator Ministro Celso de Mello. Agravante: Estado do Rio Grande do Sul. Agravado: Luiz Marcelo Dias e outro (A/S). Julgado em: 12.12.2006. Publicado em 02.02.2007. DJe. Trecho, p. 1.524. Brasília, 2007. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=402582>. Acesso em: 24 out. 2013.
  • 17
    “Embora do ponto de vista jurídico a constitucionalização simbólica seja caracterizada negativamente pela ausência de concretização normativa do texto constitucional, ela também tem um sentido positivo, na medida em que a atividade constituinte e a linguagem constitucional desempenham um relevante papel político-ideológico. Nesse sentido, exige um tratamento diferenciado das abordagens tradicionais referentes à ‘ineficácia’ ou ‘não-realização’ das normas constitucionais”. (NEVES, 2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 95). Ver, ainda, Neves (2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 96): “Já no caso da constitucionalização simbólica, à atividade constituinte e à emissão do texto constitucional não se segue uma normatividade jurídica generalizada, uma abrangente concretização normativa do texto constitucional”.
  • 18
    Ver especialmente Neves (2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 30-31): “[…] Porém, o conceito de legislação simbólica deve referir-se abrangentemente ao significado específico do ato de produção e do texto produzido, revelando que o sentido político de ambos prevalece hipertroficamente sobre o aparente sentido normativo-jurídico. A referência deôntico-jurídica de ação e texto à realidade torna-se secundária, passando a ser relevante a referência político-valorativa ou ‘político-ideológica’”. Ver, também, Neves (2004NEVES, Marcelo da Costa Pinto. Costituzionalizzazione simbólica e decostituzionalizzazione di fatto. Trad. Michele Carducci. Lecce: Pensa, 2004.. p. 29, 32).
  • 19
    Ainda, sobre a obra de Marcelo Neves, intitulada A constitucionalização simbólica, destaca-se que foi por meio de sua leitura que Niklas Luhmann repensou a ideia de autopoiese para reconhecer a alopoiese.
  • 20
    Ver na mesma obra, p. 34-35, mais dois exemplos sobre essa situação de confirmação de valores sociais, ambos na Europa; um a respeito do aborto, outro de legislação estrangeira.
  • 21
    Ver sobretudo Neves (2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 33): “Kidermann propôs um modelo tricotômico para a tipologia da legislação simbólica, cuja sistematicidade o torna teoricamente frutífero: ‘Conteúdo de legislação simbólica pode ser: a) confirmar valores sociais, b) demonstrar a capacidade de ação do Estado e c) adiar a solução de conflitos sociais através de compromissos dilatórios’”. Como se aduz da transcrição, Neves, baseado em Kindermann, expôs um modelo com tríplice divisão do intuito latente dessa legislação simbólica: (i) confirmação de valores sociais; (ii) legislação-álibi; (iii) legislação como fórmula de compromisso dilatório. Cf. Neves (2004NEVES, Marcelo da Costa Pinto. Costituzionalizzazione simbólica e decostituzionalizzazione di fatto. Trad. Michele Carducci. Lecce: Pensa, 2004., p. 27-28).
  • 22
    Cita-se literalmente Neves (2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 33): “[…] Quando, porém, a nova legislação constitui apenas mais uma tentativa de apresentar o Estado como identificado com os valores ou fins por ela formalmente protegidos, sem qualquer novo resultado quanto à concretização normativa, evidentemente estaremos diante de um caso de legislação simbólica”. Cf. também Neves (2004NEVES, Marcelo da Costa Pinto. Costituzionalizzazione simbólica e decostituzionalizzazione di fatto. Trad. Michele Carducci. Lecce: Pensa, 2004., p. 28-29).
  • 23
    A pesquisa de Mirian Ventura (2012VENTURA, Miriam. O processo decisório judicial e a assessoria técnica: a argumentação jurídica e médico-sanitária na garantia do direito à assistência terapêutica no Sistema Único de Saúde. Tese (Doutorado) — Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Rio de Janeiro, 2012.. p. 8, 164, 166 e 167) também identifica nas decisões judiciais cujo tema é a saúde processos mal instruídos, fundamentados muitas vezes somente em receitas médicas simplórias, sem nenhuma justificava para a escolha desse ou daquele remédio.
  • 24
    Cita-se literalmente Neves (2007NEVES, Marcelo da Costa Pinto. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007., p. 33): “[…] Quando, porém, a nova legislação constitui apenas mais uma tentativa de apresentar o Estado como identificado com os valores ou fins por ela formalmente protegidos, sem qualquer novo resultado quanto à concretização normativa, evidentemente estaremos diante de um caso de legislação simbólica”. Cf. também Neves (2004NEVES, Marcelo da Costa Pinto. Costituzionalizzazione simbólica e decostituzionalizzazione di fatto. Trad. Michele Carducci. Lecce: Pensa, 2004., p. 28-29).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    06 Dez 2014
  • Aceito
    23 Mar 2016
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