Acessibilidade / Reportar erro

MICOINSETICIDAS E MICOACARICIDAS NO BRASIL: COMO ESTAMOS APÓS QUATRO DÉCADAS?

MYCOINSECTICIDES AND MYCOACARICIDES IN BRAZIL: HOW ARE WE AFTER FOUR DECADES?

RESUMO

Micoinseticidas e micoacaricidas podem ser definidos como produtos à base de propágulos vivos de fungos entomopatogênicos visando o controle de insetos e ácaros por meio de aplicações inundativas ou inoculativas. A partir de dados recentemente publicados sobre o uso de fungos entomopatogênicos em escala global e proposta para padronização dos diversos tipos de formulações, o presente trabalho tem dois objetivos principais: 1) analisar o “estado da arte” dos micopesticidas (micoinseticidas e micoacaricidas) brasileiros em relação aos produtos já desenvolvidos em escala global e, 2) enquadrar os produtos nacionais à base de fungos entomopatogênicos nesta nova classificação. No ano de 2007, 40 produtos encontravam-se disponíveis no mercado brasileiro e, aproximadamente, 19 empresas em funcionamento. A maioria dos micopesticidas brasileiros não tem registro; 2,5% dos produtos são comercializados na forma de material técnico (conídios puros), 72,5% correspondem aos concentrados técnicos (substratos líquidos ou sólidos colonizados por fungos) e apenas 25% são, de fato, formulações, todas elas do tipo dispersão oleosa. Situação oposta ocorre nos países industrializados, onde se sobressaem os produtos formulados e registrados. No Brasil, a eficiência de controle alcançada com micopesticidas nem sempre tem correspondido às expectativas dos usuários, e a inconsistência dos resultados de campo tem dificultado a maior adoção de tais produtos. No Brasil, embora os avanços tecnológicos após 40 anos de pesquisa tenham sido menores que o esperado, há expectativa de crescente adoção dos fungos entomopatogênicos em razão de nichos de mercado emergentes.

PALAVRAS-CHAVE
Fungos entomopatogênicos; formulações; controle microbiano; incrementação; MIP

ABSTRACT

Mycoinsecticides and mycoacaricides can be defined as biopesticide products based on living propagules of entomopathogenic fungi developed for inundative and inoculative biological control of insects and mites. Based on recently published data on global use of entomopathogenic fungi and a proposal for standardizing the definitions of mycopesticide formulations, the present work had two main objectives: 1) to analyze the state of the art of Brazilian mycopesticides (mycoinsecticides and mycoacaricides) compared to products already developed worldwide and, 2) fit Brazilian products based on entomopathogenic fungi into this new classification. In 2007, 40 products were available in the Brazilian market and, approximately, 19 companies under operation. Most Brazilian mycopesticides are not registered; 2.5% of the products are commercialized as technical material (conidial powders), 72.5% correspond to technical concentrates (liquid or solid fungus-colonized substrates) and only 25% are, indeed, formulations, all of them oil dispersions. The opposite situation takes place in industrialized countries, in which registered and formulated products are more common. In Brazil, usually the control efficiency delivered by mycopesticides has not been able to meet user’s expectations on a regular basis, and inconsistency in field trials from site to site and year to year has imposed limitations for a broader adoption of mycopesticides. In Brazil, although technological advances following 40 years of research were lower than expected, there is an expectation of increasing demand for entomopathogenic fungi due to emergent market niches.

KEY WORDS
Entomopathogenic fungi; formulations; microbial control; augmentation; IPM

A primeira tentativa de controle de um insetopraga por fungo entomopatogênico deu-se no final do século XIX, mas somente na segunda metade do século seguinte os primeiros micoinseticidas e micoacaricidas foram comercialmente disponibilizados (LORD, 2005LORD, J.C. From Metchnikoff to Monsanto and beyond: the path of microbial control. Journal of Invertebrate Pathology, v.89, p.19-29, 2005.; MCCOY, 1986McCOY, C.W. Factors governing the efficacy of Hirsutella thompsonii in the field. In: SAMSON, R.A.; VLAK, J.M.; PETERS, D. (Ed.). Fundamental and applied aspects of invertebrate pathology. Foundation of the International Colloquium of Invertebrate Pathology. Wageningen: Society of Invertebrate Pathology, 1986. p.171-174.).

Nos últimos anos os esforços de pesquisa e desenvolvimento tecnológico têm aumentado significativamente e um número considerável de biopesticidas à base destes fungos tem sido disponibilizado em diversas partes do mundo para controle de insetos e acarinos (ácaros e carrapatos) na agricultura, silvicultura, pecuária e meio urbano (ALVES; LOPES, 2008; FARIA; WRAIGHT, 2007). Tal fato tem sido estimulado pela crescente pressão da sociedade por alimentos mais saudáveis; exigência dos mercados importadores por alimentos com baixos teores de resíduos tóxicos; conscientização de profissionais do setor agropecuário quanto às adversidades causadas pelo uso abusivo de agrotóxicos e quanto à necessidade de inclusão do controle biológico em estratégias de manejo de resistência de artrópodes pragas; pela implantação de legislações cada vez mais restritivas ao emprego de produtos químicos de amplo espectro de ação e, pelo surgimento de nichos de mercado que, no Brasil, correspondem, principalmente, à expansão do agronegócio da cana-de-açúcar e da bovinocultura de corte (FARIA; MAGALHÃES, 2001FARIA, M.R.; MAGALHÃES, B.P. O uso de fungos entomopatogênicos no Brasil. Biotecnologia, Ciência & Desenvolvimento, v.4, p.18-21, 2001.; FARIA; WRAIGHT, 2007FARIA, M.R. de; WRAIGHT, S.P. Mycoinsecticides and mycoacaricides: a comprehensive list with worldwide coverage and international classification of formulation types. Biological Control, v.43, p.237-256, 2007.).

O primeiro programa brasileiro de controle microbiano, em ampla escala, surgiu no início da década de 1970, com a liberação do fungo M. anisopliae var. anisopliae para controle da cigarrinha Mahanarva posticata Stål, 1855 (Hemiptera: Cercopidae), em canaviais da região Nordeste. O sucesso alcançado permitiu redução de 90% na área tratada com inseticidas sintéticos, favorecendo ainda o uso de insetos parasitoides para controle biológico da broca da cana-de-açúcar (ALVES, 1998ALVES, S.B. Fungos entomopatogênicos. In: . Controle microbiano de insetos. 2.ed. Piracicaba: FEALQ, 1998. p.289-381.).

Atualmente, os fungos M. anisopliae, B. bassiana, Lecanicillium spp. e aqueles identificados como Sporothrix insectorum são utilizados como micopesticidas para controle de vários artrópodes no Brasil, incluindo cigarrinhas, percevejo-de-renda, cochonilhas, besouros e ácaros fitófagos (ALVES, 1998ALVES, S.B. Fungos entomopatogênicos. In: . Controle microbiano de insetos. 2.ed. Piracicaba: FEALQ, 1998. p.289-381.; NARDO; CAPALBO, 1998NARDO, E.A.B. de; CAPALBO, D.M.F. Utilização de agentes microbianos de controle de pragas: mercado, riscos e regulamentações. In: MELO, I.S. de; AZEVEDO, J.L. de (Ed.). Controle biológico. Jaguariúna: Embrapa, 1998. v1, p.231-262.; BATISTA FILHO et al., 1999BATISTA FILHO, A.; BARROS, B.C.; COSTA, V.A.; PATRÍCIO, F.R.A.; OLIVEIRA, S.H.F. de; OLIVEIRA, C.M.G. de; RAGA, A.; RAMIRO, Z.A. Conceitos e técnicas do manejo integrado de pragas e doenças das culturas. São Paulo: Secretaria de Agricultura e Abastecimento, 1999. v.1, 40p. (Manual Técnico, Série Especial).; ALVES et al., 2003ALVES, S.B.; PEREIRA, R.M.; LOPES, R.B.; TAMAI, M.A. Use of entomopathogenic fungi in Latin America. In: UPADHYAY, R.K. (Ed.). Advances in microbial control of insect pests. New York: Kluwer Academic, 2003. p.193-211.; LEITE et al., 2005LEITE, M.S.P.; PENTEADO, S.R.C.; ZALESKI, S.R.M.; CAMARGO, J.M.M.; RIBEIRO, R.D. Seleção de isolados de Verticillium lecanii para o controle de Cinara atlantica. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.40, p.1141-1144, 2005.; ALMEIDA; BATISTA FILHO, 2007aALMEIDA, J.E.M.; BATISTA FILHO, A. Uso de micopesticidas no Brasil: programas e números recentes. In: SIMPÓSIO DE CONTROLE BIOLÓGICO, 10., 2007, Brasília, DF. Resumos. Brasília, 2007a. 1 CDROM.; ALVES; LOPES, 2008ALVES, S.B.; LOPES, R.B. (Ed.). Controle microbiano de pragas na América Latina: avanços e desafios. Piracicaba: FEALQ, 2008. p.69-110.).

Inúmeras compilações de micoinseticidas e micoacaricidas comerciais foram publicadas no passado, porém bastante incompletas ou de caráter regional (HAJEK et al., 2001HAJEK, A.E.; WRAIGHT, S.P.; VANDENBERG, J.D. Control of arthropods using pathogenic fungi. In: POINTING, S.B.; HYDE, K.D. (Ed.). Bio-Exploitation of Filamentous Fungi. Hong Kong: Fungal Diversity Press, 2001. p.309-347. (Fungal Diversity Research Series, 6).; LEITE et al., 2003aLEITE, L.G.; BATISTA FILHO, A.; ALMEIDA, J.E.M. de; ALVES, S.B. Produção de fungos entomopatogênicos. Ribeirão Preto: A.S. Pinto, 2003b. 92p.; COPPING, 2004COPPING, L.G. The Manual of Biocontrol Agents. 3rd ed. Aston: British Crop Protection Council, 2004. 758p.).

Recentemente, a situação corrente quanto ao uso de fungos entomopatogênicos em escala global, assim como uma proposta de padronização da nomenclatura de formulações para micoinseticidas, foi abordada por FARIA; WRAIGHT (2007)FARIA, M.R. de; WRAIGHT, S.P. Mycoinsecticides and mycoacaricides: a comprehensive list with worldwide coverage and international classification of formulation types. Biological Control, v.43, p.237-256, 2007.. O presente trabalho teve como objetivo principal apresentar em língua portuguesa as definições de diversos tipos de formulações e o enquadramento dos produtos nacionais à base de fungos entomopatogênicos nesta nova classificação. Adicionalmente, visa analisar o “estado da arte” dos micopesticidas (micoinseticidas e micoacaricidas) brasileiros em relação aos demais produtos já desenvolvidos e em uso no mundo. Por último, algumas propostas e ações inovadoras que permitiriam avanços tecnológicos na qualidade dos micoinseticidas e micoacaricidas são discutidas.

PRODUTOS E FORMULAÇÕES À BASE DE FUNGOS ENTOMOPATOGÊNICOS

Produtos

Micopesticidas podem ser definidos como produtos à base de propágulos vivos de fungos visando o controle de pragas por meio de aplicações inundativas e inoculativas (FARIA; WRAIGHT, 2007FARIA, M.R. de; WRAIGHT, S.P. Mycoinsecticides and mycoacaricides: a comprehensive list with worldwide coverage and international classification of formulation types. Biological Control, v.43, p.237-256, 2007.). Os tipos de propágulos presentes em muitos tipos de produtos à base de fungos entomopatogênicos são classificados como hifas (micélio), blastosporos ou conídios, podendo estes últimos ser aéreos ou submersos (WRAIGHT et al., 2001WRAIGHT, S.P.; JACKSON, M.A.; KOCK, S.L. Production, stabilization and formulation of fungal biocontrol agents. In: BUTT, T.M.; JACKSON, C.; MAGAN, N. (Ed.). Fungi as biocontrol Agents: progress, problems and potential. Wallingford: CAB International, 2001. p.253-287.; LEITE et al., 2003bLEITE, L.G.; ALVES, S.B.; PEREIRA, R.M. Insecticidas Microbianos. In: AGUAYO, G.S.; GALLO, R.H. (Ed.). Bases para el manejo racional de insecticidas. Chillán: Universidad de Conception/Fundación para la Innovación Agraria (FIA), 2003a. p.115-155.).

Formulações

Formulação refere-se à mistura do ingrediente ativo (propágulo vivo do fungo) com adjuvantes, e que no caso de produtos biológicos visa: a) estabilizar o agente biológico durante a produção, distribuição e armazenamento; b) facilitar o manuseio e aplicação do produto; c) proteger o agente biológico contra fatores ambientais adversos (UV, baixa umidade, temperaturas elevadas) aumentando sua persistência no ambiente; d) aumentar a atividade do agente biológico, incrementando sua reprodução, contato e interação com a praga-alvo ou, e) aumentar a segurança do produto ao usuário, reduzindo, dentre outros, os riscos de inalação e irritação aos olhos (JONES; BURGES, 1998JONES, K.A.; BURGES, H.D. Technology of formulation and application. In: BURGES, H.D. (Ed.). Formulation of microbial pesticides – beneficial microorganisms, nematodes and seed treatments. Dordrecht: Kluwer Academic, 1998. p.7-30.; BATISTA FILHO et al., 1998BATISTA FILHO, A.; ALVES, S.B.; ALVES, L.F.A.; PEREIRA, R.M.; AUGUSTO, N.T. Formulação de entomopatógenos. In: ALVES, S.B. (Ed.). Controle microbiano de insetos. 2.ed. Piracicaba: FEALQ, 1998. p.917-965.).

Dois requisitos críticos para formulações são as características do fungo envolvido, bem como do ambiente onde será armazenado e aplicado. Como o ingrediente ativo é um organismo vivo, sua sobrevivência deverá ser mantida de forma satisfatória para que no campo o efeito esperado seja adequado (JONES; BURGES, 1998JONES, K.A.; BURGES, H.D. Technology of formulation and application. In: BURGES, H.D. (Ed.). Formulation of microbial pesticides – beneficial microorganisms, nematodes and seed treatments. Dordrecht: Kluwer Academic, 1998. p.7-30.). Devido à diversidade de condições climáticas, alvos e preferência dos usuários, um único micro-organismo poderá ser formulado de maneiras distintas para atender a diferentes mercados.

O modo de ação dos fungos entomopatogênicos e as características dos insetos-alvo são outros fatores a serem considerados. Em razão de atuarem por contato, a aplicação do micopesticida deve garantir o encontro entre as unidades infectivas eo alvo (BATEMAN et al., 2000BATEMAN, R.P.; MATHEWS, G.A.; HALL, F.R. Ground-based application equipment. In: LACEY, L.A.; KAYA, H.K. (Ed.). Field manual of techniques in invertebrate pathology. Dordrecht: Kluwer Academic Publishers, 2000. p.77-112.). Formulações que contribuam para maior adesão das estruturas infectivas ao alvo são igualmente importantes para o sucesso do controle.

Quanto à nomenclatura, FARIA; WRAIGHT (2007)FARIA, M.R. de; WRAIGHT, S.P. Mycoinsecticides and mycoacaricides: a comprehensive list with worldwide coverage and international classification of formulation types. Biological Control, v.43, p.237-256, 2007. propuseram a padronização para os tipos de formulações mais utilizadas com fungos entomopatogênicos, baseando-se no sistema de código de duas letras da CropLife International para pesticidas técnicos e formulados (CROPLIFE INTERNATIONAL, 2002CROPLIFE INTENATIONAL. Catalogue of pesticide formulation types and international coding system. 5th.ed.2002. (Technical Monograph, n.2). Disponível em <http://www.croplife.org/monographs.aspx>. Acesso em: 9 set. 2006.
http://www.croplife.org/monographs.aspx...
) e nas definições utilizadas pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura FAO e pela Organização Mundial da Saúde – OMS, para classificar biopesticidas à base de bactérias entomopatogências. Nas seções subsequentes são apresentadas definições conforme FARIA; WRAIGHT (2007)FARIA, M.R. de; WRAIGHT, S.P. Mycoinsecticides and mycoacaricides: a comprehensive list with worldwide coverage and international classification of formulation types. Biological Control, v.43, p.237-256, 2007..

Ingredientes ativos de grau técnico (produtos técnicos)

Produtos técnicos são empregados para o preparo de formulações, embora em algumas situações sejam empregados como produto final. O termo genérico “ingrediente ativo de grau técnico” pode ser aplicado tanto para um material técnico quanto para um concentrado técnico (FAO/WHO, 2002FAO/WHO. Manual on development of FAO and WHO specifications for pesticides. Rome: FAO/WHO, 2002. 275p. (FAO Plant Production and Protection Papers, n.173).).

Material técnico (TC): um ingrediente ativo isolado a partir de matérias-primas, solventes, etc., utilizados para produzi-lo (FAO/WHO, 2002FAO/WHO. Manual on development of FAO and WHO specifications for pesticides. Rome: FAO/WHO, 2002. 275p. (FAO Plant Production and Protection Papers, n.173).). Para a produção de fungos entomopatogênicos empregam-se basicamente substratos de cultura líquidos ou sólidos. Geralmente os materiais técnicos são a base para todos os outros tipos de formulações, embora em algumas circunstâncias eles também possam ser utilizados como produtos finais; havendo neste caso elevada concentração de propágulos do fungo no micopesticida. Conforme a definição da CropLife, materiais técnicos podem incluir “impurezas associadas e pequenas quantidades de aditivos necessários”, de tal forma que os produtos não devam possuir resíduos de impureza maior que 10% do seu peso (T.S. WOODS, coordenador do Specifications Expert Group, CropLife International, comunicação pessoal). Portanto, conídios ou outro tipo de propágulo isolado do substrato, juntamente com impurezas associadas, deveriam ser incluídos nesta categoria.

Concentrado técnico (TK): um material consistindo do ingrediente ativo juntamente com subprodutos oriundos do processo da produção e livre da adição de agentes modificantes. Esta definição ajusta-se a biopesticidas que incluem componentes do meio de cultura como, por exemplo, grãos de cereais colonizados ou meio de cultura líquido contendo estruturas fúngicas. Nestes casos, nenhum processo é utilizado para separar o ingrediente ativo do substrato no estágio final da produção do fungo; os substratos sólidos colonizados pelo fungo podem conter proporções variáveis de micélio em processo de esporulação e esporos assexuados (conídios ou blastosporos), dependendo de fatores como idade da cultura e lote.

Em alguns países os concentrados técnicos são utilizados como produtos finais. Alternativamente, o ingrediente ativo pode ser extraído antes da aplicação por lavagem e/ou peneiração, no primeiro caso com a adição de surfactantes para garantir a suspensabilidade do princípio ativo na calda (FARIA; MAGALHÃES, 2001). Nos concentrados técnicos baseados em substratos sólidos, os propágulos consistem em conídios e hifas (C + H), enquanto nos produtos produzidos em meio líquido, misturas de conídios submersos, blastosporos ou hifas podem estar presentes.

Tipos de formulação

Pó molhável (WP): formulação em pó para aplicação como suspensão após diluição em água; pronta para uso, ou seja, dispensam-se aditivos no preparo e aplicação da calda. Assim, um material técnico hidrofóbico que não inclue aditivos que possibilitem sua mistura com água (tais como surfactantes ou argilas) não se enquadram nesta definição.

Grânulo (GR): formulação sólida do tipo “freeflowing” com partículas de tamanho definido e pronta para uso. Embora concentrados técnicos constituídos por substratos sólidos possam assemelhar-se e funcionar como formulações granulares, o termo grânulo geralmente refere-se a formulações mais elaboradas com partículas de tamanho uniforme e com o ingrediente ativo fortemente aderido ou incorporado ao grânulo. Portanto, grãos de cereais colonizados por fungos não estariam incluídos nesta definição.

Grânulos dispersíveis em água (WG): formulação consistindo de grânulos a serem aplicados após sua desintegração e dispersão em água.

Isca (pronto uso) (RB): formulação desenvolvida para atrair e ser consumida pela(s) praga(s)-alvo. Esta definição é geralmente aplicável aos micopesticidas; contudo, como muitos fungos entomopatogênicos infectam seus hospedeiros penetrando diretamente a cutícula, a ingestão pode ser desnecessária e iscas podem ser constituídas por componentes atrativos de diversas naturezas.

Pó polvilhável (DP): pó para polvilhamento

Pó para contato (CP): formulação em pó para aplicação direta; inclui todos os micopesticidas em pó que não se enquadram nos tipos de formulação previamente mencionados.

Dispersão oleosa (OD): suspensão estável constituída pelo(s) ingrediente(s) ativo(s) em fluído originalmente não miscível em água e com emulsificante(s); para uso após diluição em água. A palavra “estável” nesta e em outras formulações acima mencionadas indica que o produto pode apresentar sedimentação do ingrediente ativo durante o armazenamento, porém facilmente ressuspensa por agitação manual pelo usuário. Dispersões oleosas de fungos entomopatogênicos têm sido referidas mais comumente na literatura como suspensões emulsionáveis, suspoemulsões ou suspensões em óleo emulsionável e identificadas pela abreviação ES (MOORE; CAUDWELL, 1997MOORE D.; CAUDWELL R.W. Formulation of entomopathogens for the control of grasshoppers and locust. Memoirs of the Entomological Society of Canada, v.171, p.49-67, 1997.; JONES; BURGES, 1998). Todavia, a abreviação ES pelo sistema de códigos da CropLife International refere-se a emulsões para tratamentos de sementes. Nesta categoria também se enquadraria a form\sulação denominada concentrado emulsionável (EC), a qual é utilizada por alguns autores para denominar micopesticidas atualmente classificados como “suspensão emulsionável”. Entretanto, conforme a definição da FAO/WHO (2002)FAO/WHO. Manual on development of FAO and WHO specifications for pesticides. Rome: FAO/WHO, 2002. 275p. (FAO Plant Production and Protection Papers, n.173)., o concentrado emulsionável deve ser uma formulação líquida concentrada e homogênea, para ser aplicada como emulsão após diluição em água. O termo “homogênea” aplica-se a soluções e, portanto, o emprego da denominação EC para suspensões à base de microorganismos não é indicado (T.S. WOODS, comunicação pessoal), sendo OD a denominação correta para estes casos.

Suspensão concentrada (SC): suspensão estável de ingrediente(s) ativo(s) em água, para aplicação após diluição em água.

Suspensão concentrada miscível em óleo (suspensão miscível em óleo) (OF): suspensão estável de ingrediente(s) ativo(s) em um fluído, para aplicação após diluição em um líquido orgânico.

Suspensão para aplicação a ultra baixo volume (SU): suspensão pronta para uso através de equipamento UBV, sem necessidade de diluição.

CENÁRIO MUNDIAL

Cerca de 12 espécies ou subespécies (variedades) de fungos têm sido empregadas como ingredientes ativos em micopesticidas visando o controle de insetos e ácaros (FARIA; WRAIGHT, 2007FARIA, M.R. de; WRAIGHT, S.P. Mycoinsecticides and mycoacaricides: a comprehensive list with worldwide coverage and international classification of formulation types. Biological Control, v.43, p.237-256, 2007.). Micopesticidas baseados em B. bassiana (33, 9%), M. anisopliae (33, 9%), Lecanicillium spp. (9, 4%), Isaria fumosorosea Wize (5, 8%) e B. brongniartii (Sacc.) Petch (4, 1%) são os mais comuns dentre os produtos já desenvolvidos em escala mundial. Alguns desses fungos necessitam de avanços em sua precisa identificação. Por exemplo, o fungo ainda identificado como Sporothrix insectorum de Hoog & H.C. Evans, e atualmente usado no Brasil para controle do percevejo-de-renda Leptopharsa heveae Drake & Poor em plantações de seringueira, a rigor não é uma espécie verdadeira de Sporothrix (K.T. HODGE, Cornell University, comunicação pessoal).

Segundo FARIA; WRAIGHT (2007)FARIA, M.R. de; WRAIGHT, S.P. Mycoinsecticides and mycoacaricides: a comprehensive list with worldwide coverage and international classification of formulation types. Biological Control, v.43, p.237-256, 2007., nas últimas quatro décadas, mais de 80 companhias no mundo desenvolveram 171 micoinseticidas e micoacaricidas. Neste levantamento foram identificadas 11 categorias de produtos técnicos e formulações, com concentrados técnicos (substratos colonizados por fungos) (26, 3%), pós molháveis (20, 5%) e dispersões oleosas (15, 2%) entre as mais comuns.

COMO ESTAMOS?

No Brasil, M. anisopliae é usado em grande escala para controlar um complexo de cigarrinhas, incluindo Mahanarva fimbriolata (Stål) e M. posticata em cultivos de cana-de-açúcar, e M. fimbriolata, Deois flavopicta (Stål) e Notozulia entreriana (Berg) em pastagens (ALVES, 1998ALVES, S.B. Fungos entomopatogênicos. In: . Controle microbiano de insetos. 2.ed. Piracicaba: FEALQ, 1998. p.289-381.; FARIA; MAGALHÃES, 2001FARIA, M.R.; MAGALHÃES, B.P. O uso de fungos entomopatogênicos no Brasil. Biotecnologia, Ciência & Desenvolvimento, v.4, p.18-21, 2001.; ALVES; LOPES, 2008ALVES, S.B.; LOPES, R.B. (Ed.). Controle microbiano de pragas na América Latina: avanços e desafios. Piracicaba: FEALQ, 2008. p.69-110.). Produtos à base desse fungo representam 55% dos produtos comercialmente disponíveis ou em processo de registro, seguido por B. bassiana (30, 0%), Lecanicillium spp. (7, 5%) e “S. insectorum” (7, 5%) (Tabela 1).

Tabela 1
Micopesticidas desenvolvidos para controle de insetos e acarinos no Brasil.

Além das cigarrinhas, atualmente as principais pragas-alvo de micopesticidas são o percevejo-derenda da seringueira, L. hevea; a broca da bananeira, Cosmopolites sordidus (Germar); a broca-do-café, Hypothenemus hampei (Ferrari), ácaros Tetranychidae e Eriophyidae em plantas ornamentais e citros e a cochonilha Orthezia praelonga Douglas em citros (ALMEIDA; BATISTA FILHO, 2007aALMEIDA, J.E.M.; BATISTA FILHO, A. Uso de micopesticidas no Brasil: programas e números recentes. In: SIMPÓSIO DE CONTROLE BIOLÓGICO, 10., 2007, Brasília, DF. Resumos. Brasília, 2007a. 1 CDROM.; ALVES; LOPES, 2008ALVES, S.B.; LOPES, R.B. (Ed.). Controle microbiano de pragas na América Latina: avanços e desafios. Piracicaba: FEALQ, 2008. p.69-110.). No ano agrícola 2006/2007, a produção por fermentação sólida de concentrado técnico constituído por fungo + substrato sólido atingiu 1750 t de M. anisopliae, 35 t de B. bassiana e 2 t de Lecanicillium spp., enquanto por fermentação líquida foram produzidos 3.000 L de “S. insectorum” (ALMEIDA; BATISTA FILHO, 2007aALMEIDA, J.E.M.; BATISTA FILHO, A. Uso de micopesticidas no Brasil: programas e números recentes. In: SIMPÓSIO DE CONTROLE BIOLÓGICO, 10., 2007, Brasília, DF. Resumos. Brasília, 2007a. 1 CDROM.).

Em alguns casos, impactos econômicos altamente positivos gerados pelo uso de micopesticidas no controle de pragas têm impulsionado o surgimento de biofábricas (ALVES; LOPES, 2008aALVES, S.B.; LOPES, R.B. (Ed.). Controle microbiano de pragas na América Latina: avanços e desafios. Piracicaba: FEALQ, 2008. p.69-110.), levando à geração de muitos empregos.

Como exemplo, para o controle de M. fimbriolata no Estado de São Paulo, a produção do fungo M. anisopliae no ano agrícola 2006/2007 por empresas e usinas de cana-de-açúcar foi de 360 t (ALMEIDA; BATISTA FILHO, 2007bALMEIDA, J.E.M.; BATISTA FILHO, A. A indústria do fungo entomopatogênico Metarhizium anisopliae. In: SIMPÓSIO DE CONTROLE BIOLÓGICO, 10., 2007, Brasília, DF. Resumos. Brasília, 2007b. 1 CD-ROM.). Conforme estes autores, o valor médio de comercialização foi de R$ 9, 00/kg de grãos de arroz colonizados e a receita bruta gerada no período chegou a R$ 3.240.000, 00. A atividade de produção do micopesticida gerou 180 empregos diretos e a área de cana tratada atingiu 250.000 ha. O valor médio do tratamento/ha foi de R$ 40, 00 enquanto o tratamento químico (inseticidas tiametoxam e carbofurano) teve um custo de R$ 160, 00/ha. A economia média gerada foi, portanto, de R$ 120, 00/ha, totalizando uma economia global de R$ 40 milhões e, conforme salientado pelos autores, cinco toneladas de inseticidas químicos deixaram de ser aplicadas no ambiente.

Cerca de 48 micopesticidas já foram disponibilizados no Brasil, sendo que 40 produtos encontram-se atualmente disponíveis no mercado e aproximadamente 19 biofábricas (empresas com fins lucrativos) estão em funcionamento (Tabela 1). Além dessas, universidades, organizações sem fins lucrativos, usinas de cana-de-açúcar, fazendas produtoras de látex e fazendas voltadas para bovinocultura – nestes três últimos, salvo algumas exceções, para consumo próprio – também estão igualmente envolvidos na produção de fungos entomopatogênicos (FARIA; MAGALHÃES, 2001FARIA, M.R.; MAGALHÃES, B.P. O uso de fungos entomopatogênicos no Brasil. Biotecnologia, Ciência & Desenvolvimento, v.4, p.18-21, 2001.; ALVES; LOPES, 2008ALVES, S.B.; LOPES, R.B. (Ed.). Controle microbiano de pragas na América Latina: avanços e desafios. Piracicaba: FEALQ, 2008. p.69-110.).

Pelo menos cinco tipos de produtos à base de fungos entomopatogênicos têm sido utilizados no Brasil: 1) Concentrado técnico (TK) constituído de grãos de cereais (geralmente arroz cozido) colonizados por fungo, cabendo ao usuário final as etapas de lavagem do produto em água e de peneiração para obtenção da calda com conídios e hifas; 2) Concentrado técnico (TK) à base de grãos triturados semelhante ao anterior, porém, os grãos colonizados são triturados antes de sua comercialização na forma de pó; 3) Concentrado técnico (TK) líquido – suspensão líquida constituída predominantemente por blastosporos, porém com presença de hifas e conídios submersos, para mistura direta à água sem necessidade de espalhantes adesivos; 4) Material técnico (TC) (conídios puros) os conídios são separados do substrato pelo fabricante, gerando um produto final com elevada concentração de conídios, o qual pode ser utilizado para posterior formulação ou diluição em água e aplicação no campo, mas, a exemplo das categorias anteriores, neste último caso exigindo a adição de espalhante adesivo à calda, dependendo da hidrofobicidade dos conídios; 5) Dispersão oleosa (OD) produto pronto para uso, no qual os conídios puros (categoria anterior) são misturados pelo fabricante a um óleo emulsionável para que o micopesticida seja diretamente misturado à água no momento da aplicação sem o emprego adicional de espalhantes adesivos.

Portanto, conforme a classificação de micopesticidas apresentada por FARIA; WRAIGHT (2007)FARIA, M.R. de; WRAIGHT, S.P. Mycoinsecticides and mycoacaricides: a comprehensive list with worldwide coverage and international classification of formulation types. Biological Control, v.43, p.237-256, 2007., apenas duas categorias de produtos técnicos (72, 5% dos micoinseticidas correspondendo a TK e 2, 5% como TC) e um único tipo de formulação (tipo OD, equivalente a 25% dos produtos) encontram-se disponíveis no mercado brasileiro (Tabela 1).

Um dos micoinseticidas atualmente indisponível poderia ser tecnicamente enquadrado como pó molhável, pois os conídios eram separados dos grãos de arroz colonizados e, em seguida, misturados com farelo de arroz, buscando garantir uma padronização em termos de concentração de conídios viáveis por quilo do produto comercial e, supostamente, dispensaria a lavagem do produto para remoção do material inerte. Uma suspensão experimental à base de conídios aéreos de M. anisopliae em óleo de soja para aplicação a ultra baixo volume após diluição em querosene foi avaliada com sucesso no controle de gafanhotos (MAGALHÃES et al., 2000MAGALHÃES, B.P.; LECOQ, M.; FARIA, M.R. de; SCHMIDT, F.G.V.; GUERRA, W.D. Field trial with the entomopathogenic fungus Metarhizium anisopliae var. acridum against bands of the grasshopper Rhammatocerus schistocercoides in Brazil. Biocontrol Science and Technology, v.10, p.427-441, 2000.; FARIA et al., 2002FARIA, M.R. de; MAGALHÃES, B.P.; ALVES, R.T.; SCHMIDT, F.; SILVA, J.B.T. da; FRAZÃO, H.P.S. Effect of two dosages of Metarhizium anisopliae var. acridum against Rhammatocerus schistocercoides Rehn. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.37, p.1531-1539, 2002.; ALVES; LOPES, 2008ALVES, S.B.; LOPES, R.B. (Ed.). Controle microbiano de pragas na América Latina: avanços e desafios. Piracicaba: FEALQ, 2008. p.69-110.), mas não chegou ao mercado em razão do declínio natural das populações da praga-alvo. Com relação aos tipos de propágulos utilizados, 28 produtos comerciais disponíveis contêm conídios aéreos e hifas, 12 contêm exclusivamente conídios aéreos e apenas um produto possui mistura de conídios submersos, blastosporos e hifas.

Apesar da demanda de biopesticidas por parte dos agricultores e do retorno econômico potencial advindo do seu emprego em alguns agroecossistemas, a maioria dos micopesticidas não está oficialmente registrada no Brasil (BRASIL, 2009BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. AGROFIT – Sistema de Agrotóxicos Fitossanitários. Brasília: MAPA, 2007. Disponível em <http://extranet.agricultura.gov.br/agrofit_cons/principal_agrofit_cons>. Acesso em: 14 mai. 2009.
http://extranet.agricultura.gov.br/agrof...
; AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2009AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (Brasil). SIA – Sistema de Informação sobre Agrotóxicos. Brasília: ANVISA/MAPA, 2004. Disponível em <http://www.anvisa.gov.br/toxicologia/sai.htm>. Acesso em: 14 mai. 2009.
http://www.anvisa.gov.br/toxicologia/sai...
) e, conforme discutido neste trabalho, muitos deles ainda são vendidos tais como foram produzidos, na forma de concentrados técnicos, sem nenhum tratamento posterior ou adição de substâncias que lhes assegurem melhorias durante as etapas de transporte e armazenamento, praticidade de manuseio, persistência no agroecossistema ou eficiência de controle (FARIA; MAGALHÃES, 2001FARIA, M.R.; MAGALHÃES, B.P. O uso de fungos entomopatogênicos no Brasil. Biotecnologia, Ciência & Desenvolvimento, v.4, p.18-21, 2001.). Situação oposta ocorre nos países industrializados, onde se sobressaem os produtos formulados (aprox. 75%) e registrados (M.R. FARIA, dados não publicados). Nos EUA, por exemplo, todos os produtos desta natureza são registrados e mais de 90% de todos os micoinseticidas/micoacaricidas já lançados no mercado são formulados. Nesses países, os poucos produtos não formulados são empregados principalmente visando ao controle de pragas subterrâneas (PAAU, 1998PAAU, A.S. Formulation of beneficial organisms applied to soil. In: BURGES, H.D. (Ed.). Formulation of Microbial Pesticides – Beneficial Microorganisms, Nematodes and Seed Treatments. Dordrecht: Kluwer Academic, 1998, p.236-254.), através da incorporação do micoinseticida ao solo.

Embora sejam muito utilizados como produtos finais no Brasil, os concentrados técnicos (TK) à base de grãos colonizados apresentam algumas desvantagens que têm limitado a expansão do mercado de micopesticidas em razão da baixa satisfação dos usuários. Esses produtos são de difícil manuseio durante o preparo e aplicação da calda, uma vez que são pouco práticos em alguns casos (ex. exigência de lavagem e peneiração prévias) e em outros podem causar o entupimento de bicos dos pulverizadores devido à elevada proporção de inertes, principalmente quando são empregados baixos volumes de aplicação. Produtos que dificultam a aplicação levam a um maior custo de aplicação (FARIA; MAGALHÃES, 2001FARIA, M.R.; MAGALHÃES, B.P. O uso de fungos entomopatogênicos no Brasil. Biotecnologia, Ciência & Desenvolvimento, v.4, p.18-21, 2001.).

Inúmeros trabalhos ressaltam a importância de conídios com baixo teor de umidade para aumento da vida de prateleira (HEDGECOCK et al., 1995HEDGECOCK, S.; MOORE, D.; HIGGINS, P.M.; PRIOR, C. Influence of moisture content on temperature tolerance and storage of Metarhizium flavoviride conidia in an oil formulation. Biocontrol Science and Technology, v.5, p.371-377, 1995.; HONG et al., 1997HONG, T.D.; ELLIS, R.H.; MOORE, D. Development of a model to predict the effect of temperature and moisture on fungal spore longevity. Annals of Botany, v.79, p.121-128, 1997.; MAGALHÃES; BOUCIAS, 2004MAGALHÃES, B.P.; BOUCIAS, D.G. Effects of drying on the survival of conidiospores of Metarhizium anisopliae var. acridum Driver & Milner. Journal of Orthoptera Research, v.13, p.155-159, 2004.). Em função do teor de água relativamente elevado do ingrediente ativo, sobretudo devido à dificuldade envolvida na secagem de grandes volumes de cereais colonizados por fungos, a maioria dos concentrados técnicos possui sobrevida mais curta à temperatura ambiente.

A reduzida termo-tolerância de concentrados técnicos torna-se mais crítica sob condições tropicais, já que na ausência de refrigeração as temperaturas em certos meios de transporte podem superar os 50-60º C, podendo ainda exceder os 40º C em armazéns rurais destinados ao armazenamento de agrotóxicos, dependendo da localização geográfica no Brasil e época do ano. A consequência óbvia é que, não raramente, a baixa ou total ausência de viabilidade conidial por ocasião de sua aplicação leva a resultados desastrosos. Mesmo que cuidados sejam tomados durante o transporte, a baixa termo-tolerância de produtos com elevado teor de água faz com que as vendas ocorram quase que, exclusivamente, sob encomenda, restringindo de forma considerável seu potencial mercadológico.

Além da necessidade de remoção do material inerte desses produtos antes da sua aplicação, a ação dos concentrados técnicos torna-se extremamente dependente das condições climáticas, não funcionando adequadamente, por exemplo, em períodos de baixa umidade relativa. Este quadro torna-se ainda mais preocupante quando tem-se a comercialização de produtos com baixa concentração de estruturas infectivas viáveis, elevada contaminação por outros micro-organismos, recomendação de doses inadequadas pelos fabricantes, recomendação equivocada sobre condições climáticas adequadas para uso de micoinseticidas e, adoção incorreta de tecnologias de aplicação. Como consequência de informações conflitantes e resultados inconsistentes, o que se observa é uma atmosfera de insegurança dentre potenciais usuários de micopesticidas.

Portanto, a disponibilização de produtos de melhor qualidade, preferencialmente formulados, com elevada concentração e viabilidade de estruturas infectivas, de fácil manuseio e aplicação, com preço competitivo (inferior aos produtos químicos) e maior previsibilidade na eficiência de controle, são fundamentais para incremento do cenário atual referente ao emprego de fungos entomopatogênicos no Brasil.

Em muitos casos, os micopesticidas à base de fungos entomopatogênicos podem ser tão eficientes no controle de pragas quanto inseticidas químicos convencionais quando observados os pontos anteriormente mencionados e com custo equivalente ou até mesmo inferior. Todavia, esses produtos não devem ser empregados isoladamente e nem como simples substitutos dos inseticidas e acaricidas químicos. Preconiza-se o uso de fungos entomopatogênicos como mais uma ferramenta a ser implementada no manejo integrado de populações da espécie-alvo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A classificação das formulações e o levantamento de produtos apresentados neste trabalho representam um marco referencial que poderá ser atualizado periodicamente, propiciando à comunidade científica brasileira valiosa fonte de informação do “estado da arte” de inseticidas e acaricidas à base de fungos entomopatogênicos no País.

Embora o avanço tecnológico e a utilização de micopesticidas nacionais nos últimos 40 anos tenham sido menores do que o desejado (MICHEREFF FILHO; FARIA, 2007MICHEREFF FILHO, M.; FARIA, M.R. de Fungos entomopatogênicos: o que mudou nos últimos 30 anos? In: SIMPÓSIO DE CONTROLE BIOLÓGICO, 10., 2007, Brasília, DF. Resumos. Brasília, 2007. 1 CD-ROM.), há expectativa de crescente adoção desses agentes de controle biológico em razão de nichos de mercado emergentes, como a produção integrada de frutas, agropecuária orgânica, cultivos protegidos e a expansão do agronegócio da cana-de-açúcar e bovinocultura, dentre outros. Sem dúvida que crescentes barreiras internacionais aos produtos de origem agropecuária e a exigência por rastreamento/ certificação tenderão a favorecer o emprego de produtos devidamente registrados e ambientalmente seguros. A qualidade dos micoinseticidas disponíveis no mercado brasileiro poderá ser incrementada de forma considerável, restando às biofábricas investir em parcerias para constante melhoria de seus produtos, e aos órgãos governamentais o estabelecimento de critérios mínimos de qualidade em patamar mais elevado que o atual.

NOTA

  • A EMBRAPA e o USDA-ARS não garantem a qualidade e a eficácia dos produtos comerciais mencionados neste trabalho e o uso de nomes comerciais não implica em aprovação dos referidos produtos.

REFERÊNCIAS

  • ALMEIDA, J.E.M.; BATISTA FILHO, A. Uso de micopesticidas no Brasil: programas e números recentes. In: SIMPÓSIO DE CONTROLE BIOLÓGICO, 10., 2007, Brasília, DF. Resumos Brasília, 2007a. 1 CDROM.
  • ALMEIDA, J.E.M.; BATISTA FILHO, A. A indústria do fungo entomopatogênico Metarhizium anisopliae In: SIMPÓSIO DE CONTROLE BIOLÓGICO, 10., 2007, Brasília, DF. Resumos Brasília, 2007b. 1 CD-ROM.
  • ALVES, S.B. Fungos entomopatogênicos. In: . Controle microbiano de insetos 2.ed. Piracicaba: FEALQ, 1998. p.289-381.
  • ALVES, S.B.; LOPES, R.B. (Ed.). Controle microbiano de pragas na América Latina: avanços e desafios Piracicaba: FEALQ, 2008. p.69-110.
  • ALVES, S.B.; PEREIRA, R.M.; LOPES, R.B.; TAMAI, M.A. Use of entomopathogenic fungi in Latin America. In: UPADHYAY, R.K. (Ed.). Advances in microbial control of insect pests New York: Kluwer Academic, 2003. p.193-211.
  • AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (Brasil). SIA – Sistema de Informação sobre Agrotóxicos. Brasília: ANVISA/MAPA, 2004. Disponível em <http://www.anvisa.gov.br/toxicologia/sai.htm>. Acesso em: 14 mai. 2009.
    » http://www.anvisa.gov.br/toxicologia/sai.htm
  • BATEMAN, R.P.; MATHEWS, G.A.; HALL, F.R. Ground-based application equipment. In: LACEY, L.A.; KAYA, H.K. (Ed.). Field manual of techniques in invertebrate pathology Dordrecht: Kluwer Academic Publishers, 2000. p.77-112.
  • BATISTA FILHO, A.; ALVES, S.B.; ALVES, L.F.A.; PEREIRA, R.M.; AUGUSTO, N.T. Formulação de entomopatógenos. In: ALVES, S.B. (Ed.). Controle microbiano de insetos 2.ed. Piracicaba: FEALQ, 1998. p.917-965.
  • BATISTA FILHO, A.; BARROS, B.C.; COSTA, V.A.; PATRÍCIO, F.R.A.; OLIVEIRA, S.H.F. de; OLIVEIRA, C.M.G. de; RAGA, A.; RAMIRO, Z.A. Conceitos e técnicas do manejo integrado de pragas e doenças das culturas São Paulo: Secretaria de Agricultura e Abastecimento, 1999. v.1, 40p. (Manual Técnico, Série Especial).
  • COPPING, L.G. The Manual of Biocontrol Agents 3rd ed. Aston: British Crop Protection Council, 2004. 758p.
  • CROPLIFE INTENATIONAL. Catalogue of pesticide formulation types and international coding system 5th.ed.2002. (Technical Monograph, n.2). Disponível em <http://www.croplife.org/monographs.aspx>. Acesso em: 9 set. 2006.
    » http://www.croplife.org/monographs.aspx
  • FARIA, M.R.; MAGALHÃES, B.P. O uso de fungos entomopatogênicos no Brasil. Biotecnologia, Ciência & Desenvolvimento, v.4, p.18-21, 2001.
  • FARIA, M.R. de; MAGALHÃES, B.P.; ALVES, R.T.; SCHMIDT, F.; SILVA, J.B.T. da; FRAZÃO, H.P.S. Effect of two dosages of Metarhizium anisopliae var. acridum against Rhammatocerus schistocercoides Rehn. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.37, p.1531-1539, 2002.
  • FARIA, M.R. de; WRAIGHT, S.P. Mycoinsecticides and mycoacaricides: a comprehensive list with worldwide coverage and international classification of formulation types. Biological Control, v.43, p.237-256, 2007.
  • FAO/WHO. Manual on development of FAO and WHO specifications for pesticides Rome: FAO/WHO, 2002. 275p. (FAO Plant Production and Protection Papers, n.173).
  • HAJEK, A.E.; WRAIGHT, S.P.; VANDENBERG, J.D. Control of arthropods using pathogenic fungi. In: POINTING, S.B.; HYDE, K.D. (Ed.). Bio-Exploitation of Filamentous Fungi Hong Kong: Fungal Diversity Press, 2001. p.309-347. (Fungal Diversity Research Series, 6).
  • HEDGECOCK, S.; MOORE, D.; HIGGINS, P.M.; PRIOR, C. Influence of moisture content on temperature tolerance and storage of Metarhizium flavoviride conidia in an oil formulation. Biocontrol Science and Technology, v.5, p.371-377, 1995.
  • HONG, T.D.; ELLIS, R.H.; MOORE, D. Development of a model to predict the effect of temperature and moisture on fungal spore longevity. Annals of Botany, v.79, p.121-128, 1997.
  • JONES, K.A.; BURGES, H.D. Technology of formulation and application. In: BURGES, H.D. (Ed.). Formulation of microbial pesticides – beneficial microorganisms, nematodes and seed treatments Dordrecht: Kluwer Academic, 1998. p.7-30.
  • LEITE, L.G.; ALVES, S.B.; PEREIRA, R.M. Insecticidas Microbianos. In: AGUAYO, G.S.; GALLO, R.H. (Ed.). Bases para el manejo racional de insecticidas Chillán: Universidad de Conception/Fundación para la Innovación Agraria (FIA), 2003a. p.115-155.
  • LEITE, L.G.; BATISTA FILHO, A.; ALMEIDA, J.E.M. de; ALVES, S.B. Produção de fungos entomopatogênicos Ribeirão Preto: A.S. Pinto, 2003b. 92p.
  • LEITE, M.S.P.; PENTEADO, S.R.C.; ZALESKI, S.R.M.; CAMARGO, J.M.M.; RIBEIRO, R.D. Seleção de isolados de Verticillium lecanii para o controle de Cinara atlantica Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.40, p.1141-1144, 2005.
  • LORD, J.C. From Metchnikoff to Monsanto and beyond: the path of microbial control. Journal of Invertebrate Pathology, v.89, p.19-29, 2005.
  • MAGALHÃES, B.P.; LECOQ, M.; FARIA, M.R. de; SCHMIDT, F.G.V.; GUERRA, W.D. Field trial with the entomopathogenic fungus Metarhizium anisopliae var. acridum against bands of the grasshopper Rhammatocerus schistocercoides in Brazil. Biocontrol Science and Technology, v.10, p.427-441, 2000.
  • MAGALHÃES, B.P.; BOUCIAS, D.G. Effects of drying on the survival of conidiospores of Metarhizium anisopliae var. acridum Driver & Milner. Journal of Orthoptera Research, v.13, p.155-159, 2004.
  • BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. AGROFIT – Sistema de Agrotóxicos Fitossanitários. Brasília: MAPA, 2007. Disponível em <http://extranet.agricultura.gov.br/agrofit_cons/principal_agrofit_cons>. Acesso em: 14 mai. 2009.
    » http://extranet.agricultura.gov.br/agrofit_cons/principal_agrofit_cons
  • McCOY, C.W. Factors governing the efficacy of Hirsutella thompsonii in the field. In: SAMSON, R.A.; VLAK, J.M.; PETERS, D. (Ed.). Fundamental and applied aspects of invertebrate pathology Foundation of the International Colloquium of Invertebrate Pathology. Wageningen: Society of Invertebrate Pathology, 1986. p.171-174.
  • MICHEREFF FILHO, M.; FARIA, M.R. de Fungos entomopatogênicos: o que mudou nos últimos 30 anos? In: SIMPÓSIO DE CONTROLE BIOLÓGICO, 10., 2007, Brasília, DF. Resumos Brasília, 2007. 1 CD-ROM.
  • MOORE D.; CAUDWELL R.W. Formulation of entomopathogens for the control of grasshoppers and locust. Memoirs of the Entomological Society of Canada, v.171, p.49-67, 1997.
  • NARDO, E.A.B. de; CAPALBO, D.M.F. Utilização de agentes microbianos de controle de pragas: mercado, riscos e regulamentações. In: MELO, I.S. de; AZEVEDO, J.L. de (Ed.). Controle biológico Jaguariúna: Embrapa, 1998. v1, p.231-262.
  • PAAU, A.S. Formulation of beneficial organisms applied to soil. In: BURGES, H.D. (Ed.). Formulation of Microbial Pesticides – Beneficial Microorganisms, Nematodes and Seed Treatments Dordrecht: Kluwer Academic, 1998, p.236-254.
  • WRAIGHT, S.P.; JACKSON, M.A.; KOCK, S.L. Production, stabilization and formulation of fungal biocontrol agents. In: BUTT, T.M.; JACKSON, C.; MAGAN, N. (Ed.). Fungi as biocontrol Agents: progress, problems and potential. Wallingford: CAB International, 2001. p.253-287.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Jun 2021
  • Data do Fascículo
    Oct-Nov 2009

Histórico

  • Recebido
    16 Jul 2008
  • Aceito
    14 Maio 2009
Instituto Biológico Av. Conselheiro Rodrigues Alves, 1252 - Vila Mariana - São Paulo - SP, 04014-002 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: arquivos@biologico.sp.gov.br