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OCORRÊNCIA DE AGENTES PARASITÁRIOS COM POTENCIAL ZOONÓTICO DE TRANSMISSÃO EM FEZES DE CÃES DOMICILIADOS DO MUNICÍPIO DE GUARULHOS, SP

OCCURRENCE OF ZOONOTIC PARASITIC AGENTS IN FAECAL SAMPLES OF DOMICILIATED DOGS OF GUARULHOS CITY, SP, BRAZIL

RESUMO

Foram analisadas amostras fecais de cães domiciliados provenientes de Guarulhos, SP, para se determinar a ocorrência de agentes parasitários de zoonoses. Das 166 amostras examinadas, 54 (32,53%) apresentaram-se positivas, com uma maior freqüência de Giardia duodenalis (13,25%), seguido de Ancylostoma spp. (10,84%), Dipylidium caninum (2,41%) e Toxocara canis (1,81%).

ABSTRACT

Samples of faeces from domiciliated dogs of Guarulhos, SP, were analyzed to determine the occurrence of zoonotic parasitic agents. From 166 samples examined, 54 (32.53%) were positive, with a frequency of Giardia duodenalis (13.25%), followed by Ancylostoma spp. (10.84%), Dipylidium caninum (2.41%) and Toxocara canis (1.81%).

KEY WORDS
Zoonoses; helminthes; protozoa; faecal samples; dogs

O conhecimento mais acurado sobre a epidemiologia e a profilaxia dos parasitas mais importantes de cães e gatos, particularmente sobre as suas incidências e prevalências, são fundamentais para a adoção de medidas profiláticas adequadas para a proteção humana (OGASSAWARA et al., 19866 OGASSAWARA S.; BENASSI S.; LARSSON C.E.; LEME P.T.Z.; HAGIWARA M.K. Prevalência de infecções helmínticas em gatos na cidade de São Paulo. Revista da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo. v.23, p.139-144, 1986.).

O crescente número de animais de companhia, principalmente, nos grandes centros, tem estreitado o contato entre estes e o homem, aumentando a exposição do ser humano aos agentes de zoonoses. Dentre essas zoonoses, a Larva Migrans Visceral (LMV), devido à infecção pelas larvas do nematódeo de cães e gatos, Toxocara spp. é, provavelmente, a mais emergente. Outra zoonose parasitária de grande importância no mundo todo é a Larva Migrans Cutânea (LMC), causada principalmente por larvas de Ancylostoma braziliense, um ancilostomídeo de cães e de gatos (SCHANTZ, 19917 SCHANTZ, P.M. Parasitic zoonosis in perspective. International Journal for Parasitology. v.21, p.161-70, 1991.).

Dipylidium caninum, um cestoda parasito intestinal muito comum em cães e gatos, em nosso país tem sido raramente encontrado parasitando o homem. Com cerca de 150 casos relatados no mundo todo, inclusive com alguns casos de infecção em crianças do Brasil (NEVES, 20005 NEVES D.P. Outros cestoda. In: NEVES, D.P.; MELO, A.L.; GENARO, O.; LINARDI, P.M. (org). Parasitologia humana. 10.ed. São Paulo: Atheneu, 2000.).

Além dos helmintos citados, alguns protozoários também apresentam caráter zoonótico de transmissão. Trabalhos recentes vêm indicando a similaridade entre a Giardia presente no homem e em muitas espécies animais, levando a crer que há grande possibilidade de transmissão desse protozoário entre as diferentes espécies (THOMPSON et al., 19938 THOMPSON R.C.A.; REYNOLDSON J.A.; MENDISA H.W. Giardia and Giardiasis. Advances in Parasitology, v.32, p.72-133, 1993.).

A ocorrência de Cryptosporidium parvum em fezes de cães também tem sido freqüentemente demonstrada em todo o mundo, indicando a importância desses animais como fontes de infecção deste protozoário para o homem (LALLO & BONDAN, 20064 LALLO, M.A. & BONDAN , E.F. Prevalência deCryptosporidium sp. em cães de instituições da cidade de São Paulo. Revista de Saúde Pública, v.40, n.1, p.120-125, 2006.).

Este trabalho teve por objetivo estudar a freqüência de agentes parasitários com potencial zoonótico de transmissão em fezes de cães atendidos no Hospital Veterinário da Universidade Guarulhos, Município de Guarulhos, Estado de São Paulo, Brasil.

No período de setembro de 2002 a outubro de 2004, realizou-se um inquérito coproparasitológico em cães que utilizaram os serviços do Hospital Veterinário da Universidade Guarulhos para determinar a ocorrência de agentes parasitários com especial atenção para aqueles que apresentam potencial de transmissão ao homem. Todas as amostras foram armazenadas sob refrigeração (4º C) no Laboratório de Biociências da Universidade Guarulhos até o momento da análise que ocorreu dentro de um período de 48h após o recebimento. As amostras foram processadas através das técnicas de centrífugo - flutuação em solução de sacarose (Método de Sheater Modificado - d= 1,205) e sedimentação em água – éter (Método de Ritchie), segundo HOFFMANN (1987)3 HOFFMANN R.P. Diagnóstico de parasitismo veterinário. Porto Alegre: Sulina, 1987.. A leitura das lâminas foi realizada em microscopia de luz com aumentos de 100X e 400X.

Das 166 amostras de cães analisadas, 54 apresentaram-se positivas (32,53%), seja em infecções únicas ou múltiplas, independente do potencial zoonótico de transmissão dos agentes, e 112 apresentaram-se negativas (67,47%).

O helminto encontrado com maior freqüência foi Ancylostoma spp., presente em 10,84% (18/166) das amostras analisadas, seguido de D. caninum presente em 2,41% (04/166) e de Toxocara canis com 1,81% (03/166). O protozoário de maior ocorrência foi a Giardia duodenalis, encontrado em 13,25% (22/166) das amostras.

Os resultados aqui obtidos podem estar subestimados, pois foi recebida apenas uma amostra de cada animal, sendo que o ideal seria fazer repetições dos exames negativos. Apesar do objetivo central deste trabalho ser determinar a freqüência de agentes parasitários com potencial zoonótico de transmissão, procurou-se também registrar a freqüência de outros parasitos que não possuem essa característica, como o nematódeo Trichuris vulpis, e o protozoário Apicomplexa Cystoisospora, devido à expressiva freqüência de sua ocorrência, e o cestódeo D. caninum, que apesar de apresentar pequeno risco de transmissão ao homem, mostrou também uma freqüência significativa (Tabela 1).

Tabela 1
Número e porcentagem de amostras de fezes de cães domiciliados do Município de Guarulhos, positivas para as diferentes espécies de parasitos gastrintestinais, dentre o total de amostras positivas (n=54). Laboratório de Biociências da Universidade Guarulhos, no período de setembro de 2002 a março de 2004.

A porcentagem de amostras positivas obtidas neste trabalho (32,53%) assemelha-se com os resultados obtidos por GENNARI et al. (1999)2 GENNARI, M.S.; KASAI, N.; PENA, H.F.J.; CORTEZ, A. Ocorrência de protozoários e helmintos em amostras de fezes de cães e gatos da cidade de São Paulo. Brazilian Journal of Veterinary Research and Animal Science, v.36, n.2, 1999. que apresentaram 45,32% ao examinarem cães domiciliados da Cidade de São Paulo. O mesmo não ocorre com CASTRO et al. (2001)1 CASTRO, E.S.; MATTOS, M.J.T.; BASTOS, C.D. Gastrenteritesparasitárias em cães atendidos na clínica hospitalar da UFRGS. Revista Brasileira de Medicina Veterinária, v.23, n.2, p.76-77, 2001. que encontraram 62% de amostras positivas em relação ao total de amostras em cães atendidos no hospital de clínicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Essas diferenças podem estar relacionadas ao ambiente e ao manejo a que estes animais eram submetidos.

Ancylostoma spp. foi o helminto que apresentou maior ocorrência, representando 33,33% (18/54) das amostras com resultados positivos (Tabela 1). Relatos de pesquisas de outros autores enfatizam que o gênero mais prevalente é o Ancylostoma spp. GENNARI et al. (1999)2 GENNARI, M.S.; KASAI, N.; PENA, H.F.J.; CORTEZ, A. Ocorrência de protozoários e helmintos em amostras de fezes de cães e gatos da cidade de São Paulo. Brazilian Journal of Veterinary Research and Animal Science, v.36, n.2, 1999. observaram uma freqüência de 20,40% do total de amostras analisadas e CASTRO et al. (2001)1 CASTRO, E.S.; MATTOS, M.J.T.; BASTOS, C.D. Gastrenteritesparasitárias em cães atendidos na clínica hospitalar da UFRGS. Revista Brasileira de Medicina Veterinária, v.23, n.2, p.76-77, 2001. observaram uma freqüência de 42% dentre as amostras positivas.

A ocorrência de ovos de T. canis (1,81%), D. caninum (2,41%) e T. vulpis (1,20%), foi relativamente baixa entre o total de amostras de fezes analisadas no presente trabalho. Para GENNARI et al. (1999)2 GENNARI, M.S.; KASAI, N.; PENA, H.F.J.; CORTEZ, A. Ocorrência de protozoários e helmintos em amostras de fezes de cães e gatos da cidade de São Paulo. Brazilian Journal of Veterinary Research and Animal Science, v.36, n.2, 1999. o segundo helminto mais freqüente foi Toxocara canis com 8,49%, seguido de D. caninum e T. vulpis ambos com 0,28%. CASTRO et al. (2001)1 CASTRO, E.S.; MATTOS, M.J.T.; BASTOS, C.D. Gastrenteritesparasitárias em cães atendidos na clínica hospitalar da UFRGS. Revista Brasileira de Medicina Veterinária, v.23, n.2, p.76-77, 2001. observaram que o segundo helminto mais freqüente foi Trichuris com 28%, seguido de Toxocara com 21% e Dipylidium com 9%.

Com relação aos protozoários, G. duodenalis apresentou maior ocorrência (13,25%), semelhante ao resultado obtido por GENNARI et al. (1999)2 GENNARI, M.S.; KASAI, N.; PENA, H.F.J.; CORTEZ, A. Ocorrência de protozoários e helmintos em amostras de fezes de cães e gatos da cidade de São Paulo. Brazilian Journal of Veterinary Research and Animal Science, v.36, n.2, 1999. que apresentou uma freqüência de 7,65%.

Dentre os agentes mais freqüentemente encontrados nas amostras aqui analisadas, estão aqueles pertencentes aos gênerosAncylostoma eGiardia, que apresentaram uma freqüência de ocorrência bastante alta (33,33% e 40,74% das amostras positivas, respectivamente), indicando o potencial risco de transmissão às pessoas que convivem com esses animais. Por outro lado, a freqüência de Toxocara canis nas amostras analisadas foi relativamente baixa quando comparada com a dos outros agentes de zoonose evidenciados neste trabalho.

Não se observou a presença do protozoário C. parvum nestas amostras, devido, provavelmente, a não adequação dos métodos de diagnósticos utilizados neste trabalho. A visualização dos oocistos deste parasita sem o emprego de métodos de coloração adequados podem não ser plenamente confiáveis. LALLO & BONDAN (2006)4 LALLO, M.A. & BONDAN , E.F. Prevalência deCryptosporidium sp. em cães de instituições da cidade de São Paulo. Revista de Saúde Pública, v.40, n.1, p.120-125, 2006., ao estudarem a prevalência de C. parvum em 450 amostras de fezes de cães provenientes de instituições da Cidade de São Paulo entre 2003 e 2004, observaram 8,8% de positividade quando estas amostras foram analisadas pela técnica de Ziehl – Neelsen e 9,5% quando analisadas com técnica de PCR (reação de polimerização em cadeia) e GENNARI et al. (1999)2 GENNARI, M.S.; KASAI, N.; PENA, H.F.J.; CORTEZ, A. Ocorrência de protozoários e helmintos em amostras de fezes de cães e gatos da cidade de São Paulo. Brazilian Journal of Veterinary Research and Animal Science, v.36, n.2, 1999., ao examinarem 353 amostras de cães da mesma cidade, verificaram uma ocorrência de 2,83% ao empregarem os métodos de centrífugo – flutuação em solução de sacarose e centrífugo-sedimentação em água-éter. Não se deve excluir a possibilidade de portadores deste parasito dentre os animais aqui estudados.

A falta de exames específicos e uso indiscriminado de medicamentos anti-helmínticos podem contribuir para o aumento de casos dessas parasitoses, especialmente das infecções por Giardia nesses animais. Faz-se necessário intensificar as medidas de controle das parasitoses gastrintestinais de cães, especialmente no que diz respeito à educação de seus proprietários quanto à importância da freqüente consulta ao médico veterinário e a coleta de fezes do ambiente, para que se possa minimizar a freqüência de ocorrência desses parasitos e a possível transmissão ao homem.

REFERÊNCIAS

  • 1
    CASTRO, E.S.; MATTOS, M.J.T.; BASTOS, C.D. Gastrenteritesparasitárias em cães atendidos na clínica hospitalar da UFRGS. Revista Brasileira de Medicina Veterinária, v.23, n.2, p.76-77, 2001.
  • 2
    GENNARI, M.S.; KASAI, N.; PENA, H.F.J.; CORTEZ, A. Ocorrência de protozoários e helmintos em amostras de fezes de cães e gatos da cidade de São Paulo. Brazilian Journal of Veterinary Research and Animal Science, v.36, n.2, 1999.
  • 3
    HOFFMANN R.P. Diagnóstico de parasitismo veterinário Porto Alegre: Sulina, 1987.
  • 4
    LALLO, M.A. & BONDAN , E.F. Prevalência deCryptosporidium sp. em cães de instituições da cidade de São Paulo. Revista de Saúde Pública, v.40, n.1, p.120-125, 2006.
  • 5
    NEVES D.P. Outros cestoda. In: NEVES, D.P.; MELO, A.L.; GENARO, O.; LINARDI, P.M. (org). Parasitologia humana 10.ed. São Paulo: Atheneu, 2000.
  • 6
    OGASSAWARA S.; BENASSI S.; LARSSON C.E.; LEME P.T.Z.; HAGIWARA M.K. Prevalência de infecções helmínticas em gatos na cidade de São Paulo. Revista da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo v.23, p.139-144, 1986.
  • 7
    SCHANTZ, P.M. Parasitic zoonosis in perspective. International Journal for Parasitology v.21, p.161-70, 1991.
  • 8
    THOMPSON R.C.A.; REYNOLDSON J.A.; MENDISA H.W. Giardia and Giardiasis. Advances in Parasitology, v.32, p.72-133, 1993.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2006

Histórico

  • Recebido
    03 Abr 2006
  • Aceito
    20 Jun 2006
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