Deslocamento da força normal à superfície de apoio a um corpo em equilíbrio na presença da força de atrito

The displacement of normal force to the support surface of a body in equilibrium in the absence of friction forces

ARTIGOS GERAIS

Deslocamento da força normal à superfície de apoio a um corpo em equilíbrio na presença da força de atrito

The displacement of normal force to the support surface of a body in equilibrium in the absence of friction forces

Eden V. Costa¹; C.A. Faria Leite

Instituto de Física, Universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ, Brasil

RESUMO

A representação do equilíbrio de um corpo por meio da figura de um bloco apoiado sobre uma superfície plana nos é muito familiar, pois é recorrente nos livros didáticos de física básica. No entanto, na maioria dos casos onde a força de atrito está presente, esta representação, em geral, necessita de maior rigor. Pois, sob esta condição, a força normal à superfície desloca-se lateralmente, e, então, deixa de ter o mesmo suporte do peso, fato este, quase sempre, negligenciado nos livros didático de física básica. Neste artigo, faremos a análise das condições de equilíbrio de um corpo na presença do atrito e discutiremos o deslocamento lateral da força normal à superfície de apoio ao corpo.

Palavras-chave: equilíbrio, atrito, deslocamento.

ABSTRACT

The equilibrium representation of a body by means of a figure of a block resting on a plane surface is very familiar to us since it is recurrent in the textbooks of fundamental physics. Nevertheless, in most of the cases where the frictional force is present, this representation, in general, requires greater strictness. Under this consideration, the normal force to the surface is displaced sideways, leaving the same line action of the weight force, and this fact is almost always neglect in the textbooks of fundamental physics. In this paper we will analyze the equilibrium conditions of a body in the presence of frictional forces and we will discuss the lateral displacement of the normal force to the support surface of a body.

Keywords: equilibrium, frictional, displacement.

1. As condições de equilíbrio

O equilíbrio de um corpo é definido a partir dos conceitos de força e de torque. O conceito de força nos acompanha desde criança, quando, adquirimos a idéia de que força e esforço muscular são sinônimos. O torque está ligado à idéia de rotação. E, é comum apresentá-lo utilizando como exemplo o ato de abrir ou de fechar portas. Sendo assim, são conceitos presentes em nosso dia-a-dia, vivência de um longo cotidiano, e, apreendidos intuitivamente. Finalmente, aprendemos que as condições para o equilíbrio de um corpo são: (1) a resultante do sistema de forças que agem sobre o corpo deve ser nula; (2) o torque resultante do sistema de forças que age sobre o corpo, deve ser nulo.

Uma ilustração comum nos livros de física básica é um bloco em repouso, apoiado sobre uma superfície plana horizontal na presença da força de atrito (Fig. 1). A análise da figura mostra que a representação das forças está compatível com a condição da força resultante nula, entretanto, incompatível com a condição do torque resultante nulo. Pois, o binário formado pelo peso P e pela força normal N não equilibra o binário formado pela força F e pela força de atrito Fat. Logo, esta representação está em desacordo com as condições estabelecidas para o equilíbrio de um corpo. Na Fig. 2 vê-se a representação compatível. Nela, o deslocamento da normal N torna o binário (P, N) capaz de equilibrar o binário (F, Fat), e, assim, representar um torque resultante nulo, compatível com o equilíbrio de um corpo [1].

2. O deslocamento da força normal à superfície de apoio ao corpo

Vamos aplicar as condições de equilíbrio ao cubo em repouso representado na Fig 3. A resultante nula nos dá

O torque resultante nulo, em relação ao ponto O, nos dá

Sabendo que Fat = μ_e N e P = mg, podemos escrever

onde a = (1/μ_e) e b = (1/μ_e). A Eq. (6) é a equação de uma reta. Logicamente, a dependência entre y e x é linear.

Se a força F for nula, a força de atrito Fat também será nula. Neste caso, a linha de ação do peso P coincidirá com a linha de ação da força normal N, e, assim, x = L. Logo, este é o menor valor de x. Fica evidente, que o maior valor de x é igual a L. Portanto, a força normal N pode deslocar-se no intervalo L < x < 2L (veja a Fig. 4).

Em nossa análise, consideramos o cubo em repouso, isto é, em equilíbrio estático. É óbvio que, se o cubo estiver em movimento uniforme, ou seja, em equilíbrio dinâmico, a discussão também é válida.

3. Uma aplicação

Considere o cubo da Fig. 3. Suponha a aresta 2L= 48 cm, a força horizontal F = 300 N e o peso P = 500 N. A Eq. (3) nos dá

Quando o cubo estiver na iminência de tombar em torno do ponto O, a linha de ação da força normal N estará na posição limite x = 48 cm, condição sob a qual y = 40 cm. Se aumentarmos o valor de y, o binário formado pelas forças P e N não poderá equilibrar o binário formado pelas forças F e Fat, e, então o cubo tombará em torno do ponto O. Da mesma forma haverá tombamento se mantivermos y = 40 cm e aumentarmos o valor da força F, pois, a situação apresentada é limite, o equilíbrio é instável.

Uma outra ilustração comum nos livros de física básica é um bloco homogêneo em equilíbrio, apoiado sobre um plano inclinado. Com base na análise feita para o plano horizontal, fica evidente que numa representação adequada, a linha de ação da força normal ao plano não deverá passar pelo centro de massa de um bloco (Fig. 5).

4. Um comentário

A ciência que estuda a interação entre superfícies, submetidas a cargas e a movimentos relativos chama-se tribologia. Palavra derivada das palavras grega, tribo que significa atrito e logos que significa estudo. De forma que, em uma tradução literal pode ser entendida como o estudo do atrito. A tribologia é uma vasto campo de pesquisa. Um estudo detalhado poderá ser feito no livro The Friction and Lubrication of Solids [2].

5 Conclusões

Como vimos, na representação das forças aplicadas a um corpo em equilíbrio, estático ou dinâmico, apoiado sobre uma superfície plana na presença da força de atrito, deve-se levar em conta o deslocamento lateral da força normal à superfície de apoio ao corpo. A falta de rigor nesta representação fere frontalmente uma das condições para o equilíbrio de um corpo: o torque resultante nulo. A análise e a discussão em classe deste tema foi importante, pois, nos surpreendeu constatar que muitos estudantes jamais haviam atentado para este detalhe. Certamente, pelo fato de quase sempre estar negligenciado nas representações que aparecem nos livros didáticos de física básica. Isto nos motivou destacar a importância do rigor na representação de um modelo físico. No entanto, devemos ter em mente que, os textos de física dirigidos ao ensino médio, logicamente, dão ênfase ao equilíbrio de uma partícula. E, neste caso, apenas a condição da força resultante nula é suficiente. Porém, por outro lado, isto nos fez pressupor que, muitos estudantes confundem corpo com partícula.

Assim, este texto dá oportunidade para uma importante discussão sobre as condições de equilíbrio de um corpo e, também, sobre o rigor na sua representação. Portanto, é capaz de preencher a lacuna existente nos livros didáticos de física básica, que, em geral, negligenciam o deslocamento da força normal à superfície de apoio ao corpo.

Recebido em 23/9/2009; Aceito em 15/11/2009; Publicado em 25/2/2011

• [1] Alaor Chaves e J.F. Sampaio, Física Básica: Mecânica (LTC Editora, Rio de Janeiro, 2007).
• [2] F.P. Bowden and D. Tabor, The Friction and Lubrication of Solids - Oxford Classic Texts in the Physical Sciences (Clarendon Press, Oxford, 2001).

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  04 Abr 2011
• Data do Fascículo
  Dez 2010

Histórico

• Aceito
  15 Nov 2009
• Recebido
  23 Set 2009