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Estudo experimental do movimento de partículas carregadas em campos elétricos e magnéticos: seletor de velocidades

Experimental study of charged particles movement in electric and magnetic fields: velocity selector

Resumos

Neste trabalho é apresentado um experimento incluído no contexto de experimentos longos adotado nas disciplinas experimentais de eletricidade, magnetismo e óptica, e consiste na caracterização de um seletor de velocidades que funciona com campos elétricos e magnéticos cruzados. Utiliza-se um tubo de raios catódicos para gerar um feixe de elétrons. As placas de deflexão vertical do tubo geram o campo elétrico e um par de bobinas, com os eixos perpendiculares ao eixo do tubo, gera o campo magnético. São realizados estudos de trajetória dos elétrons com auxílio de um programa de simulação de elétrons.

campos elétrico e magnético; seletor de velocidades; trajetória de elétrons


In this work we present an experiment included in the context of long-duration experiments adopted in the electricity, magnetism and optics experimental disciplines, which consists in characterizing a velocity selector working with crossed electric and magnetic fields. We make use of a cathode ray tube to generate an electron beam. The tube's vertical deflection plates generate the electric field and a pair of coils with their axis perpendicular to the tube, generate the magnetic field. We perform investigations of the electron trajectory with the support of a simulation code.

electric and magnetic fields; velocity selector; electron trajectory


ARTIGOS GERAIS

Estudo experimental do movimento de partículas carregadas em campos elétricos e magnéticos: seletor de velocidades

Experimental study of charged particles movement in electric and magnetic fields: velocity selector

N. Carlin1 1 E-mail: carlin@dfn.if.usp.br ; E.M. Szanto; F.O. Jorge; W.A. Seale; F.A. Souza

Instituto de Física, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

RESUMO

Neste trabalho é apresentado um experimento incluído no contexto de experimentos longos adotado nas disciplinas experimentais de eletricidade, magnetismo e óptica, e consiste na caracterização de um seletor de velocidades que funciona com campos elétricos e magnéticos cruzados. Utiliza-se um tubo de raios catódicos para gerar um feixe de elétrons. As placas de deflexão vertical do tubo geram o campo elétrico e um par de bobinas, com os eixos perpendiculares ao eixo do tubo, gera o campo magnético. São realizados estudos de trajetória dos elétrons com auxílio de um programa de simulação de elétrons.

Palavras-chave: campos elétrico e magnético, seletor de velocidades, trajetória de elétrons.

ABSTRACT

In this work we present an experiment included in the context of long-duration experiments adopted in the electricity, magnetism and optics experimental disciplines, which consists in characterizing a velocity selector working with crossed electric and magnetic fields. We make use of a cathode ray tube to generate an electron beam. The tube's vertical deflection plates generate the electric field and a pair of coils with their axis perpendicular to the tube, generate the magnetic field. We perform investigations of the electron trajectory with the support of a simulation code.

Keywords: electric and magnetic fields, velocity selector, electron trajectory.

1. Introdução

O experimento a ser descrito faz parte de uma filosofia adotada nas disciplinas experimentais de eletricidade, magnetismo e óptica, a qual consiste em ministrar experimentos longos com a finalidade de explorar de forma mais profunda os conceitos físicos e procedimentos experimentais. O experimento em questão é realizado pelos alunos durante 6 aulas, cada uma com aproximadamente 4 horas de duração, ou seja, o experimento é realizado em 6 semanas.

Os conceitos experimentais de campos elétricos e magnéticos são explorados por meio de experimento que utiliza um feixe de elétrons para compor um equipamento denominado seletor de velocidades. Procedimentos experimentais são delineados com o objetivo de caracterizar o equipamento. Em um seletor de velocidades, partículas carregadas sofrem diferentes deflexões de acordo com suas velocidades [1, 2]. Esse dispositivo é também chamado de filtro de velocidades ou filtro de Wien, por fazer uma seleção dos objetos que o atravessam.

O princípio de funcionamento do seletor está baseado no fato de que partículas carregadas em movimento sofrem a ação de forças quando cruzam uma região onde existe um campo elétrico ou um campo magnético, ou ambos.

Se o objetivo e selecionar partículas por sua velocidade, fica evidente que as forças que vão atuar sobre as mesmas devem ser perpendiculares à sua trajetória, para separá-las. Há portanto uma aceleração perpendicular ao movimento, que muda a direção da trajetória.

Um seletor de velocidades é composto por um campo elétrico e um campo magnético uniformes, superpostos e perpendiculares entre si. Esses campos são previstos para funcionarem de tal forma que desviem as partículas carregadas que passam através deles, de acordo com sua velocidade. As aplicações praticas desse tipo de instrumento são várias, em particular, ele é muito utilizado em física nuclear experimental, tanto para a separação de partículas provenientes de reações nucleares, quanto para a produção de feixes secundários. Na prática, ao se projetar um seletor de velocidades, deve-se considerar que os campos elétricos e magnéticos não são idealmente uniformes, havendo a necessidade de se levar em conta diversos parâmetros, tais como efeitos de borda.

Neste trabalho, apresentamos um experimento de laboratório didático que trata da caracterização de um seletor de velocidades. O feixe de partículas é representado pelos elétrons de um tubo de raios catódicos. As placas de deflexão vertical do tubo produzem o campo elétrico e o campo magnético é produzido por um par de bobinas ligadas em série, colocadas na região das placas defletoras de forma que seus eixos sejam perpendiculares ao eixo do tubo. Em ambos os casos, os campos não são uniformes, propiciando uma situação experimental muito próxima da encontrada nos equipamentos utilizados em pesquisa. Para um melhor entendimento por parte dos alunos, do efeito desses campos no movimento dos elétrons, são realizadas simulações, assim como estudos de trajetórias dos mesmos sob o efeito separado de cada campo e sob o efeito dos dois campos cruzados.

2. Fundamentos teóricos

Na Fig. 1 observa-se uma trajetória possível para uma partícula carregada no interior de um seletor de velocidades.


As forças que atuam em cada partícula carregada, no interior do seletor de velocidades, são

sendo que, de acordo com a Fig. 1,

onde i, j, k são os versores nas direções x, y e z, respectivamente e q é a carga da partícula.

No caso mais geral, num instante qualquer, a velocidade de uma partícula carregada do feixe será

e a força eletromagnética que atua sobre ela é

Portanto a força resultante tem componentes nas direções x e z. Com as equações acima pode-se chegar às equações do movimento, que são

Aqui, d2x/dt2 e d2z/dt2 são as acelerações nas direções x e z, respectivamente. As equações acima são equações diferenciais que, com as condições de contorno experimentais, podem ser resolvidas e resultam nas equações que regem o movimento das partículas do feixe no interior do seletor de velocidades

Em que

É importante notar que o movimento não sofre alteração na direção y, resumindo-se a um plano, o plano xz.

Analisando as equações do movimento do elétron, vemos que ele não sofre desvio se

Essa condição é satisfeita para qualquer t, quando

A Eq. (12), acima, permite afirmar que, se ajustarmos as intensidades dos campos de maneira que (Ez/By) = υ0x, a partícula com essa velocidade não sofre alteração no seu movimento

Todas as outras partículas cujas velocidades forem diferentes de υ0x, serão desviadas de sua trajetória inicial. Se vão ser desviadas para uma direção ou para a oposta vai depender do valor de sua velocidade. Se

υ0x > teremos C > 0 e, portanto, z(t) > 0.

Se

υ0x < teremos C < 0 e, portanto, z(t) < 0.

3. O seletor de velocidades

No experimento a ser realizado, utiliza-se um arranjo similar ao que pode ser utilizado para a determinação da razão carga/massa do elétron [3] e estudo do movimento de elétrons sob ação de um campo elétrico e um campo magnético [4]. O feixe de elétrons e gerado e acelerado no interior de um tubo de raios catódicos. Esse tubo consiste de um filamento que, ao ser aquecido, libera elétrons que são, em seguida, acelerados. O processo que ocorre no filamento é a emissão termiônica. Na verdade, existem dois dispositivos aceleradores, o anodo 1 e o anodo 2, que aceleram os elétrons em direção a uma tela fosforescente, gerando aí um ponto luminoso. O sistema de geração e aceleração do feixe de elétrons recebe o nome de canhão de elétrons. Todo esse sistema encontra-se dentro de um tubo de vidro selado, em baixa pressão. A Fig. 2 apresenta um esquema do tubo de raios catódicos a ser utilizado.


Os anodos também desempenham a função de lente eletrostática. O princípio de funcionamento da lente eletrostática não vai ser discutido aqui. Dentro do tubo existe, também, um par (na verdade são dois pares, mas so vamos utilizar um) de placas que permite a instalação de um campo elétrico perpendicular à trajetória do feixe. Essas placas, que são chamadas de placas defletoras, não tem a geometria ideal porque esse tubo foi projetado para ser um osciloscópio e não um seletor de velocidades. Entretanto, mesmo com essa geometria (vista nas Figs. 2 e 3), pode-se estudar o funcionamento de um seletor de velocidades.


O campo magnético cruzado e aplicado externamente ao tubo, na região das placas defletoras. Para tal, são utilizadas duas bobinas de 250 espiras ligadas em série, colocadas como se observa na Fig. 3.

A tensão de aceleração dos elétrons e fornecida por uma fonte de ate 1200 V, e tanto a tensão nas placas defletoras, quanto a corrente nas bobinas, são fornecidas por fontes comerciais de 30 V-3 A. Para esse tubo, a distância do final das placas de deflexão vertical até a tela é Dps = 22,5 cm.

E importante que, durante a tomada dos dados, o arranjo seja alinhado com o campo magnético terrestre local para minimizar a deflexão devido a esse campo. Esse procedimento e necessário por não haver blindagem magnética ao redor dos tubos.

4. Procedimento experimental

Para o estudo do movimento dos elétrons e caracterização do seletor de velocidades, estabeleceu-se um procedimento experimental que prevê o estudo do movimento devido somente ao campo elétrico, depois somente devido ao campo magnético e finalmente, com a presença dos dois campos cruzados. Para cada caso, é realizada uma simulação com o programa FEMM [5], com a vantagem de que se trata de um software livre. No caso do campo elétrico é realizado um mapeamento por meio de uma cuba eletrolítica e para o campo magnético é realizado um mapeamento com uso de um sensor Hall da PASCO. Com a presença dos campos cruzados, é feito um estudo de trajetórias e também da resolução em velocidade do seletor.

4.1. Movimento dos elétrons sob ação do campo elétrico

Nessa parte do experimento a proposta é estudar a deflexão do feixe de elétrons. As variáveis em questão são a tensão nas placas de deflexão vertical e a tensão de aceleração dos elétrons. As placas de deflexão não são paralelas em toda sua extensão o que apresenta um desafio interessante para os estudantes.

Inicialmente, é realizada uma simulação com o programa FEMM para as equipotenciais e campo elétrico. O resultado é mostrado na Fig. 4.


O resultado da simulação pode ser comparado a um resultado obtido experimentalmente por meio do mapeamento de linhas equipotenciais com a utilização de uma cuba eletrolítica e placas de cobre com a mesma geometria das placas do tubo, numa escala 5:1. A componente z do campo elétrico no eixo de simetria é obtida a partir da medida de equipotenciais 2,0 mm acima e abaixo do eixo, a cada 5 mm, na direção x e utilizando a relação E ≈ ΔV/Δz. A Fig. 5 mostra uma foto do arranjo experimental utilizado para mapeamento das equipotenciais e também a comparação entre o resultado experimental para a componente z do campo elétrico e o valor obtido na simulação ao longo da linha horizontal mostrada na Fig. 4. Levando-se em conta as escalas, a tensão aplicada nas placas foi de 2,5 V. Pode-se notar na Fig. 5, que o campo elétrico é constante somente em uma pequena região e que os efeitos de borda são relativamente significativos, principalmente à esquerda da borda correspondente à parte em que as placas são paralelas.


Após a simulação e mapeamento, é solicitado aos estudantes um estudo da deflexão do feixe em função de cada uma dessas variáveis. Com o objetivo de entender os conceitos envolvidos, é elaborado um modelo simplificado do movimento dos elétrons através das placas, utilizando placas paralelas ideais, ou seja, sem os efeitos de borda. Nesse caso, essas placas corresponderiam a placas equivalentes, conforme a Fig. 6, e considera-se o movimento no interior das placas como uniformemente variado sujeito à ação da força elétrica, e uniforme após a saída dos elétrons da região das placas.


Portanto, para essa situação o campo elétrico fica dado conforme se segue

em que L = 25,5 cm é dado por L = Lp + Dps, correspondendo à verdadeira distância entre o início das placas e a tela do tubo; m e q são a massa e carga do elétron, υ0x é a velocidade dos elétrons, e H é a deflexão vertical medida na tela do tubo. As variáveis referentes à geometria do modelo podem ser entendidas como equivalentes, com respeito à geometria original do problema. Adicionalmente, o campo elétrico pode ser escrito como E = Vp/d e é válida também a relação de conservação de energia 1/2mυ20c = qVac. Aqui, Vp e Vac são a tensão nas placas de deflexão e a tensão de aceleração dos elétrons respectivamente. Logo, pelo modelo, a tensão nas placas é proporcional à deflexão H e à tensão Vac de aceleração dos elétrons.

Para verificar se o modelo se aplica, são realizados estudos experimentais de Vp em função de H com Vac = 800 V e de Vp em função de Vac com H = 2 cm. Os resultados são mostrados nas Figs. 7 e 8. Nota-se em ambos os casos que, levando-se em consideração as incertezas envolvidas, o comportamento segue bem o determinado no modelo.



A partir do coeficiente angular dos gráficos das Figs. 7 ou 8, considerando-se o modelo proposto, pode ser obtida a razão rE entre a distância entre as placas e o comprimento das mesmas. Os resultados obtidos pelos dois gráficos são consistentes e para o gráfico da Fig. 7 foi obtido o valor rE = d/Lp = (6,885 ± 0,003) × 10-2. Esse resultado será utilizado mais adiante para a obtenção dos valores de d e Lp.

4.2. Movimento dos elétrons sob ação do campo magnético

De forma análoga ao estudo anterior, realiza-se um estudo do movimento dos elétrons sob ação do campo magnético das bobinas. Como no caso do campo elétrico, o campo magnético não é uniforme, o que propicia também um desafio para os estudantes. As variáveis em estudo são nesse caso a corrente nas bobinas e a tensão de aceleração dos elétrons. Como anteriormente, realiza-se uma simulação com o programa FEMM. Os resultados são mostrados na Fig. 9. As bobinas utilizadas no experimento possuem 250 espiras e seção reta interna com forma retangular. Na simulação o interior foi assumido como sendo circular, devido às características do programa FEMM, que nesse caso realiza uma rotação em torno do eixo vertical.


O resultado da simulação pode ser comparado ao de um mapeamento que pode ser efetuado com sensores Hall, disponíveis no laboratório. As bobinas são dispostas da mesma maneira que quando da presença do tubo, tomando-se o cuidado para manter a mesma distância. O mapeamento é realizado com i = 1,0 A seguindo, por exemplo, o que seria a linha horizontal mostrada na Fig. 9 (direção do feixe de elétrons incidente). Na Fig. 10 e mostrada uma foto do arranjo experimental e o resultado do mapeamento, o qual, dentro das incertezas, se encontra em bom acordo com o resultado da simulação.


Um modelo, supondo uma região com campo magnético uniforme equivalente, sem efeitos de borda, e também elaborado e demonstra a dependência da deflexão com a corrente e tensão de aceleração dos elétrons.

Utilizando os parâmetros da Fig. 11 obtém-se a seguinte relação para o campo magnético equivalente


em que L = 25,5 cm é o mesmo utilizado no modelo para o campo elétrico.

O campo magnético pode ser expresso como B = (βi, com β dependendo somente da geometria do sistema. O valor de β na região das placas de deflexão pode ser determinado experimentalmente por meio de medidas em uma mesma posição do campo magnético em função da corrente. Para a geometria em questão, o valor obtido foi β = (1,37 ± 0,07) × 10-3 T/A.

Por outro lado, por conservação de energia, 1/2mv20x = qVac. Portanto, a corrente mostra-se proporcional à deflexão H e à raiz quadrada de Vac. São realizados estudos experimentais de i em função de H com Vac = 800 V e de i em função da raiz quadrada de Vac com H = 2 cm, conforme mostrado nas Figs. 12 e 13. O resultado também mostra que o modelo é bem fundamentado.



A partir do coeficiente angular dos gráficos das Figs. 12 ou 13, considerando-se o modelo proposto, pode ser obtido o produto pM entre a constante geométrica e o comprimento equivalente de ação do campo magnético. Os resultados obtidos pelos dois gráficos são consistentes e obteve-se pM = (βLB = (1,59 + 0,02) × 10-4 Tm/A. Mais adiante retomaremos o uso desse valor.

4.3. Movimento dos elétrons sob ação dos campos cruzados

Nesta parte do experimento, e realizado um estudo com os campos elétrico e magnético cruzados. Conforme dado pela Eq. (12), ao se escolher uma velocidade para ser selecionada, estabelece-se a razão entre os valores do campo elétrico e magnético de forma que elétrons com essa velocidade não sejam defletidos, ou seja, elétrons com velocidades diferentes da selecionada terão suas trajetórias defletidas para cima ou para baixo.

A Fig. 14 mostra trajetórias dos elétrons, calculadas a partir das Eqs. (8) e (9), para diferentes valores de Vac, com o valor v0x = 1,552 × 107 m/s (Vac = 700 V) escolhido para não apresentar deflexão. Os cálculos foram efetuados com ω = 3,36 × 107 rad/s, o que corresponde a B = 1,96 × 10-4 T e E = 3034 V/m. Nessa situacão temos i = 0,14 A e Vp = 12,7 V.


4.3.1. Calibração do equipamento

Na pratica, e interessante que se realize uma calibração do equipamento. Como experimentalmente se lida com a tensão Vp nas placas defletoras e corrente i nas bobinas ao invés de valores diretos dos campos elétrico e magnético, são realizadas medidas para determinar uma constante que relaciona a velocidade a ser selecionada e os valores de Vp e i. Assim, sabendo-se que ao selecionar uma dada velocidade υ0x dos elétrons vale υ0x = E/B, podemos escrever

Na Fig. 15 é mostrado um gráfico de υ0x em função da razão Vp/i para cada valor de υ0x. O valor da constante de calibração á α = (174,9 ± 0,1) × 103 mA/(Vs).


4.3.2. Determinação das grandezas equivalentes a partir dos modelos

Sabendo-se que o campo elétrico pode ser escrito como E = Vp/d e que o campo magnético pode também ser dado por B = βi, temos que

em que d e a distância efetiva entre as placas no modelo apresentado anteriormente no estudo do campo elétrico e β é a constante geométrica que relaciona o campo magnético e a corrente para a configuração de par de bobinas, na região das placas defletoras. Portanto, tem-se que α = 1/βd e, dessa forma, pode-se determinar o valor da distância d, já que β foi determinado experimentalmente como sendo β = (1,37 ± 0,07) × 10-3 T/A. Nesse caso, o valor determinado foi d = (4,2 ± 0,2) mm.

Conforme já visto, a partir das medidas realizadas no estudo do campo elétrico, pode se extrair, por exemplo, do coeficiente angular do gráfico Vp em função de H, a razão rE = d/Lp entre a distância e o comprimento efetivos das placas no modelo utilizado. Aqui, o valor obtido foi rE = (6,885 ± 0,003) × 10-2. Portanto, obtém-se que Lp = (61 ± 3) mm.

Analogamente, no caso do estudo do campo magnético, a partir do coeficiente angular, por exemplo, do gráfico de i em função de H, obtém-se o produto pM = βLB entre a constante geométrica e o comprimento efetivo LB de ação do campo magnético. O valor obtido foi pM = (1,59 ± 0,02) × 10-4 Tm/A. Logo, tem-se que LB = (116 ± 6) mm.

Pode-se verificar a consistência dos valores obtidos se considerarmos a divisão da Eq. (14) pela Eq. (15). Tem-se então

Logo, deve-se ter que LB = 2LP, o que, dentro das incertezas, está de acordo com os valores determinados acima.

4.3.3. Resolução do seletor de velocidades

Com o objetivo de verificar o movimento dos elétrons de diferentes velocidades sob ação dos campos cruzados, é realizado um estudo da deflexão em função da velocidade dos elétrons. Nesse ponto, é interessante notar que para diferentes valores do campo elétrico e magnético que perfazem a mesma razão, o comportamento das curvas e diferente, embora todas se cruzem no valor pré-determinado de υ0x .

Aqui, a velocidade escolhida foi = 1,552 × 107 m/s, correspondente a Vac = 700 V. E determinada a razão entre Vp e i (proporcionais aos campos elétrico e magnético) para que não se observe deflexão do feixe nessa situação. Em seguida, mantendo-se esses valores fixos, são tomados os dados para montar a curva da deflexão z em função de υ0x. O procedimento e repetido para dois valores distintos de Vp e i, mas mantendo a mesma razão, ou seja, para Vac = 700 V continua não havendo deflexão do feixe de elétrons. Na Fig. 16 são apresentados os resultados para duas tomadas de dados. Esse comportamento tem importante efeito sobre o que se chama resolução do equipamento, que está relacionada ao fato de as trajetórias, ou deflexões na região da tela para diferentes velocidades serem mais próximas ou mais afastadas. A resolução é definida como R = Δυ0x0x.


Como teste de consistência dos modelos utilizados e dos resultados obtidos nas tomadas de dados anteriores, podemos a partir das Eqs. (14) e (15), referentes aos modelos adotados, definir a deflexão zmod como a diferença entre os deslocamentos devidos ao campo magnético e ao campo elétrico. Temos, portanto

em que é a velocidade selecionada, no caso υ0x = 1,552 × 107 m/s, e LP tem o valor determinado experimentalmente. A Eq. (19) foi escrita em função somente de B, assumindo que B = βi e que E/B = υ0x. A linha tracejada e a sólida na Fig. 16 correspondem aos valores calculados com a Eq. (19) para as correntes especificadas. O bom acordo com os resultados experimentais demonstra a consistência dos resultados e procedimentos.

Utilizando-se as curvas referentes aos modelos e tomando-se o coeficiente angular da reta tangente a cada curva na regiãao de cruzamento, obtemos o valor de dz/dυ0x. Supondo uma fenda de colimação para passagem dos elétrons selecionados, com 2 mm de diâmetro, determinamos o valor de dυ0x e com isso podemos estimar o valor de R. Nesse experimento, notamos que R é melhor para o caso em que tanto Vp quanto i são mais elevados. Em particular, na Fig. 16 temos que para Vp = 5 V e i = 0,06, a resolução é R = 20,7%. Já para Vp = 25 V e i = 0,30 A, temos que R = 2,9%.

5. Considerações finais

Neste trabalho mostramos um experimento de laboratório didático que faz parte de uma filosofia adotada, com experimentos longos, visando explorar com mais profundidade os conceitos físicos e procedimentos experimentais. Trata-se de um seletor de velocidades didático que consiste de um tubo de raios catódicos que gera um feixe de elétrons. O campo elétrico e gerado pelas placas de deflexão vertical e o campo magnético e gerado por um par de bobinas. O experimento requer a caracterização do equipamento e para tal, são realizados vários estudos de trajetórias dos elétrons sob ação do campo elétrico e do magnético. Os estudos contam com apoio de um programa de simulação para os campos. O objetivo de caracterização do seletor de velocidades leva os estudantes a planejarem os passos a serem seguidos para o entendimento dos conceitos físicos envolvidos, por meio dos modelos elaborados, e também a planejarem os procedimentos experimentais. Com isso, acreditamos que os objetivos do experimento são atingidos.

Recebido em 4/12/2008

Aceito em 21/3/2009

Publicado em 30/6/2009

  • [1] M. Kato and K. Tsuno, Nucl. Instr. and Meth. in Phys. Res. A 298, 296 (1990).
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Out 2009
    • Data do Fascículo
      Jun 2009

    Histórico

    • Aceito
      21 Mar 2009
    • Recebido
      04 Dez 2008
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