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Bloqueio neurolítico subaracnoideo em paciente com dor oncológica refratária: relato de caso

Resumos

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: O uso de bloqueio neurolítico subaracnoideo no controle de dor tem diminuído nos últimos anos devido à introdução de novas técnicas, mas ainda tem importância no controle de dor oncológica refratária. O objetivo deste estudo foi apresentar um caso de dor oncológica, em que esta técnica foi utilizada para controle da dor. RELATO DO CASO: Paciente do sexo masculino, 45 anos, diagnosticado com carcinoma espinocelular de canal anal localmente avançado e lesão ulcerada em região perineal com presença de fístula retovesical e infecção local. O paciente apresentava dor intensa com escala verbal numérica (EVN) =10 e recebia tratamento farmacológico com doses altas de opioide e adjuvantes sem boa resposta. Foi realizado bloqueio neurolítico subaracnoideo com fenol a 5% e após realização do bloqueio houve melhora significativa do quadro doloroso, tendo paciente referindo alívio de 80% após 20 minutos do procedimento. A melhora permaneceu até o 21º dia após bloqueio quando o paciente foi a óbito devido complicações infecciosas. CONCLUSÃO: O caso ilustrou o uso do bloqueio subaracnoideo com fenol a 5% para controle de dor oncológica. Conclui-se que para casos selecionados, onde a expectativa de vida é limitada, esta técnica pode ser empregada com sucesso.

Analgesia; Bloqueio neurolítico; Dor oncológica


BACKGROUND AND OBJECTIVES: The use of subarachnoid neurolytic blockade to control pain has decreased in recent years due to the introduction of new techniques, but it is still important to control refractory cancer pain. This study aimed at presenting a case of cancer pain where this technique was used to control pain. CASE REPORT: Male patient, 45 years old, with locally advanced anal canal scamous cell carcinoma and ulcerated lesion in perineal region with enterovesical fistula and local infection. Patient had severe pain with numerical verbal scale (NVS) = 10 and was being pharmacologically treated with high opioid doses and adjuvants without good response. Subarachnoid neurolytic blockade was induced with 5% phenol with significant pain relief; 20 minutes after the procedure patient has referred 80% relief. Improvement has remained for 21 days when patient died due to infectious complications. CONCLUSION: This case has illustrated the use of subarachnoid blockade with 5% phenol to control cancer pain. The conclusion is that for selected cases, where life expectation is limited, this technique may be successfully used.

Analgesia; Cancer pain; Neurolytic blockade


RELATO DE CASO

Bloqueio neurolítico subaracnoideo em paciente com dor oncológica refratária. Relato de caso* * Recebido do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo. Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP.

José Osvaldo Barbosa NetoI; Ângela Maria SousaII; Silvia Maria Machado TahamtaniII; Hazem Adel AshmawiIII

IMédico Anestesiologista do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). São Paulo, SP, Brasil

IIMédica Anestesiologista, Doutora pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP); Supervisora da Equipe de Controle da Dor do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). São Paulo, SP, Brasil

IIIMédico. Professor Livre-Docente pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP); Supervisor da Equipe de controle da dor da Divisão de Anestesiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). São Paulo, SP, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dr. José Osvaldo Barbosa Neto Serviço de Anestesia - Prédio dos Ambulatórios Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 255 - 8º A 05403-000 São Paulo, SP E-mail: osvbarbosa@yahoo.com.br

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: O uso de bloqueio neurolítico subaracnoideo no controle de dor tem diminuído nos últimos anos devido à introdução de novas técnicas, mas ainda tem importância no controle de dor oncológica refratária. O objetivo deste estudo foi apresentar um caso de dor oncológica, em que esta técnica foi utilizada para controle da dor.

RELATO DO CASO: Paciente do sexo masculino, 45 anos, diagnosticado com carcinoma espinocelular de canal anal localmente avançado e lesão ulcerada em região perineal com presença de fístula retovesical e infecção local. O paciente apresentava dor intensa com escala verbal numérica (EVN) =10 e recebia tratamento farmacológico com doses altas de opioide e adjuvantes sem boa resposta. Foi realizado bloqueio neurolítico subaracnoideo com fenol a 5% e após realização do bloqueio houve melhora significativa do quadro doloroso, tendo paciente referindo alívio de 80% após 20 minutos do procedimento. A melhora permaneceu até o 21º dia após bloqueio quando o paciente foi a óbito devido complicações infecciosas.

CONCLUSÃO: O caso ilustrou o uso do bloqueio subaracnoideo com fenol a 5% para controle de dor oncológica. Conclui-se que para casos selecionados, onde a expectativa de vida é limitada, esta técnica pode ser empregada com sucesso.

Descritores: Analgesia, Bloqueio neurolítico, Dor oncológica.

INTRODUÇÃO

A dor é um sintoma prevalente entre pacientes portadores de câncer e continua sendo um fator que gera grande morbidade para o paciente e seus familiares. Em uma ampla revisão dos últimos 40 anos a prevalência geral de dor neste perfil de paciente foi de 53%, e de 58% a 69% nos paciente com doença avançada1.

O tratamento da dor oncológica é atualmente orientado pela escada analgésica da Organização Mundial da Saúde e consegue tratar efetivamente 80% a 90% dos pacientes com terapia farmacológica. No entanto, 10% a 20% dos pacientes com câncer não respondem adequadamente aos fármacos e se beneficiam da terapia intervencionista de dor2,3.

O bloqueio neurolítico subaracnoideo é uma técnica intervencionista efetiva e é utilizada para controle de dor em paciente com câncer. A despeito de seu uso ter diminuído nos últimos anos, especialmente devido à introdução de outras modalidades de terapia intervencionista, esta técnica ainda tem importância no controle de dor oncológica refratária4.

Este estudo teve como objetivo relatar um caso de dor oncológica refratária à terapia farmacológica, em que esta técnica foi utilizada para obtenção do controle da dor.

RELATO DO CASO

Paciente do sexo masculino, 45 anos, diagnosticado com carcinoma espinocelular de canal anal localmente avançado foi encaminhado para o Centro de Tratamento de Dor da instituição para avaliação de dor de difícil controle.

Apresentava lesão ulcerada em região perineal com presença de fístula retovesical e infecção local, alem de sinais de infecção cutânea em região de coxa direita.

As imagens tomográficas ilustram a extensão da lesão (Figura 1).


A equipe cirúrgica considerou o tumor inoperável, alem disso os diversos ciclos de quimioterapia e radioterapia não haviam obtido sucesso no controle da lesão. Por fim, optou-se por confecção de colostomia protetora e encaminhado para cuidado paliativo exclusivo.

O paciente relatava queixa de dor intensa em região perineal, com escore pela escala verbal numérica (EVN) igual a 10, contínua, em pontada e queimação. Referia ainda dor incidental espontânea e incapacitante. Tinha dificuldade para deambular e para ficar sentado, de tal forma que passava a maior parte do tempo em pé. Chegava a ingerir até 300 mg de morfina para conseguir alívio da dor.

Sua prescrição habitual era composta de fentanil transdérmico (250 µg/h), resgate de morfina (120 mg) até de 4/4h, dipirona (2 g) a cada 6h, amitriptilina (75 mg) à noite, diclofenaco (50 mg) a cada 8h, gabapentina (900 mg/d). Contudo, apesar destas altas doses de fármacos analgésicos prescritos, permanecia com dor intensa.

Devido o quadro refratário à terapia farmacológica, após assinatura de termo de consentimento livre e esclarecido, foi realizado bloqueio neurolítico subaracnoideo com fenol a 5%, no total de 2 mL, no espaço intervertebral L5-S1 em posição sentada.

Após a realização do bloqueio houve melhora significativa do quadro doloroso, com alívio de 80% após 20 minutos do procedimento. No acompanhamento subsequente, o paciente continuou a referir melhor controle da dor, com EVN = 1-2 na maior parte do tempo, o que o levou a descontinuar o uso de resgates e tendo crises menos intensas de dor incidental (EVN = 6).

A melhora permaneceu até o 21º dia após bloqueio quando o paciente foi a óbito devido complicações infecciosas decorrente de celulite na perna direita.

DISCUSSÃO

A dor é um sintoma temido pelos pacientes portadores de câncer e até 20% destes pacientes não são adequadamente tratados. O uso de terapia intervencionista em momento apropriado pode permitir uma drástica redução do consumo de opioides e reduzir a morbidade causada pela dor para este grupo de pacientes5. O presente caso ilustrou o uso do bloqueio subaracnoideo com fenol a 5% para controle de dor perineal que foi refratário à terapia farmacológica com altas doses de opioides associado a adjuvantes.

Dentre as vantagens deste tipo de técnica está o bom custo-benefício para o paciente com menor número de visitas de seguimento comparado com outras técnicas6. Os principais riscos associados são a curta duração da analgesia e a possibilidade de desenvolvimento de fraqueza de membros inferiores e disfunção esfincteriana6.

Neste caso, o paciente já havia sido submetido à confecção de colostomia, o que torna o risco de disfunção esfincteriana irrelevante. Como o paciente já apresentava grande limitação para deambulação, o benefício do alívio da dor superava o risco de bloqueio motor permanente.

Como o efeito deste bloqueio tem duração que não supera 6 meses, os pacientes indicados para esta terapia devem ter expectativa de vida reduzida e com doença intratável e bem localizada7.

Os agentes químicos mais utilizados são álcool a 50%-100% e fenol a 7%-12%. Para o presente caso optou-se por fenol, que é uma solução hiperbárica em relação ao líquido cefalorraquidiano. Utilizando esta propriedade do agente é possível limitar o surgimento de efeitos colaterais concentrando este agente sobre as fibras sacrais deixando o paciente na posição sentada por um período prolongado (bloqueio em sela). Além disso, o fenol produz um bloqueio de maior intensidade com menor risco de neurite química5.

Concluiu-se que para casos selecionados, onde a expectativa de vida é limitada, esta técnica pode ser empregada com sucesso no controle rápido da dor oncológica.

Apresentado em 02 de outubro de 2012.

Aceito para publicação em 27 de fevereiro de 2013.

Errata

Subarachnoid neurolytic blockade in patient with refractory cancer pain. Case report

Bloqueio neurolítico subaracnoideo em paciente com dor oncológica refratária. Relato de caso

José Osvaldo Barbosa Neto, Ângela Maria Sousa, Silvia Maria Machado Tahantami, Hazem Adel Ashmawi

Rev Dor. 2013;14(1):76-7

A grafia correta da Dra. Silvia é Silvia Maria Machado Tahamtani.

  • 1. van den Beuken-van Everdingen MH, de Rijke JM, Kessels AG, et al. Prevalence of pain in patients with cancer: a systematic review of the past 40 years. Ann Oncol. 2007;18(9):1437-49.
  • 2. Burton AW, Hamid B. Current challenges in cancer pain management: does the WHO ladder approach still have relevance? Expert Rev Anticancer Ther. 2007;7(11):1501-2.
  • 3. Miguel R. Interventional treatment of cancer pain: the fourth step in the World Health Organization analgesic ladder? Cancer Control. 2000;7(2):149-56.
  • 4. Sloan PA. The evolving role of interventional pain management in oncology. J Support Oncol. 2004;2(6):491-503.
  • 5. Watanabe A, Yamakage M. Intrathecal neurolytic block in a patient with refractory cancer pain. J Anesth. 2011;25(4):603-5.
  • 6. Chambers WA. Nerve blocks in palliative care. Br J Anaesth. 2008;101(1):95-100.
  • 7. Gerbershagen HU. Neurolysis. Subarachnoid neurolytic blockade. Acta Anaesthesiol Belg. 1981;32(1):45-57.
  • Endereço para correspondência:
    Dr. José Osvaldo Barbosa Neto
    Serviço de Anestesia - Prédio dos Ambulatórios
    Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 255 - 8º A
    05403-000 São Paulo, SP
    E-mail:
  • *
    Recebido do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo. Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Abr 2013
    • Data do Fascículo
      Mar 2013

    Histórico

    • Recebido
      02 Out 2012
    • Aceito
      27 Fev 2013
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