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Estratégia nos fundos de pensão do Brasil: contribuições para a construção de um modelo de análise

Strategy in Brazilian pension funds: contributions for the construction of an analysis model

Resumos

Em relação aos fundos de pensão, existem poucos estudos relativos à estratégia. Este trabalho contribui para a construção da estratégia nos fundos de pensão no Brasil. Utilizando uma pesquisa exploratória baseada em estudo de caso múltiplo, o objetivo do artigo é propor um modelo orientador para a análise das estratégias dos fundos. Com base em conceitos de competitividade, concorrência e vantagem competitiva, desenvolveu-se um modelo teórico. Em virtude das características específicas desse setor, foram adicionados os conceitos de governança e responsabilidade social. Com base no modelo proposto, elencaram-se os fatores relevantes à formulação de estratégias e as vantagens competitivas para cada um dos casos estudados, tendo sido sugerido um padrão de concorrência de caráter dinâmico para o setor. Propôs-se também uma classificação dos fundos estudados, de acordo com o padrão concebido, e foi possível verificar que os fundos de pensão possuem diferentes percepções sobre o tema concorrência, conforme distintas orientações estratégicas gerais.

Fundos de pensão; Estratégia empresarial; Modelo de análise; Tipos de estratégia; Estudo de caso múltiplo


As for Pension Funds, there is a limited amount of studies related to the strategy theme. This work contributes to the construction of the Brazilian Pension Fund's strategy. Using an exploratory research based in a Multiple Case Study, this article aims to propose a model capable of guiding the Funds strategies' analysis. Based in concepts such as competitiveness, competition and competitive advantage, a theoretical model was built. Because of the specific characteristics of that industry, Governance and Social Responsibility concepts were added. Based in this proposed model, relevant factors to the strategies' formulation and competitive advantages to each one of the studied cases were established, enabling the authors to suggest a dynamic competition' behavior pattern for that industry. According to the conceived pattern, a classification of the studied Funds was also proposed, allowing one to verify that Pension Funds present different perceptions about competition, following different general strategic orientations.

Pension funds; Business strategy; Analysis model; Strategy types; Multiple case study


Estratégia nos fundos de pensão do Brasil: contribuições para a construção de um modelo de análise

Strategy in Brazilian pension funds: contributions for the construction of an analysis model

Silvio Omar Leal Dos SantosI; José Antônio Valle Antunes JúniorII; Rodrigo Pinto LeisIII

IMestre em Administração, Organizações e Competitividade pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), Gerente executivo do Fundo de Pensão de Funcionários do Banco do Brasil (PREVI-BB), Praia do Botafogo, 501, 3º andar, Botafogo – Rio de Janeiro – RJ – CEP 22250-040, E-mail: silvioleal@previ.com.br

IIDoutor em Administração pelo Programa de Pós-graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGA-UFRGS), Professor titular da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), Rua Engenheiro Afonso Cavalcante, 54, Bela Vista – Porto Alegre – RS – CEP 90200-410, E-mail: junico@produttare.com.br

IIIDoutorando pelo Programa de Pós-graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGA-UFRGS-NITEC) e Doctorant à Euromed Marseille École de Management – França, Professor titular das Faculdades Rio-grandenses (FARGS) e professor convidado da Euromed Marseille École de Management – França, Avenida Farrapos, 3.682, ap. 303, São Geraldo – Porto Alegre – RS – CEP 90220-003, E-mail: rodrigo@produttare.com.br

RESUMO

Em relação aos fundos de pensão, existem poucos estudos relativos à estratégia. Este trabalho contribui para a construção da estratégia nos fundos de pensão no Brasil. Utilizando uma pesquisa exploratória baseada em estudo de caso múltiplo, o objetivo do artigo é propor um modelo orientador para a análise das estratégias dos fundos. Com base em conceitos de competitividade, concorrência e vantagem competitiva, desenvolveu-se um modelo teórico. Em virtude das características específicas desse setor, foram adicionados os conceitos de governança e responsabilidade social. Com base no modelo proposto, elencaram-se os fatores relevantes à formulação de estratégias e as vantagens competitivas para cada um dos casos estudados, tendo sido sugerido um padrão de concorrência de caráter dinâmico para o setor. Propôs-se também uma classificação dos fundos estudados, de acordo com o padrão concebido, e foi possível verificar que os fundos de pensão possuem diferentes percepções sobre o tema concorrência, conforme distintas orientações estratégicas gerais.

Palavras-chave: Fundos de pensão; Estratégia empresarial; Modelo de análise; Tipos de estratégia; Estudo de caso múltiplo.

ABSTRACT

As for Pension Funds, there is a limited amount of studies related to the strategy theme. This work contributes to the construction of the Brazilian Pension Fund's strategy. Using an exploratory research based in a Multiple Case Study, this article aims to propose a model capable of guiding the Funds strategies' analysis. Based in concepts such as competitiveness, competition and competitive advantage, a theoretical model was built. Because of the specific characteristics of that industry, Governance and Social Responsibility concepts were added. Based in this proposed model, relevant factors to the strategies' formulation and competitive advantages to each one of the studied cases were established, enabling the authors to suggest a dynamic competition' behavior pattern for that industry. According to the conceived pattern, a classification of the studied Funds was also proposed, allowing one to verify that Pension Funds present different perceptions about competition, following different general strategic orientations.

Keywords: Pension funds; Business strategy; Analysis model; Strategy types; Multiple case study.

1 INTRODUÇÃO

Os fundos de pensão (FP) têm sido alvo de especulações a respeito de sua contribuição como formador de poupança interna e gerador de recursos de longo prazo que possam financiar o desenvolvimento do país. No Brasil, esses recursos somam aproximadamente 16,5% do Produto Interno Bruto (PIB) distribuído entre 364 entidades, com 2.208 patrocinadores, num total de 2,44 milhões de pessoas entre participantes, assistidos e pensionistas (MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL, 2006). No mundo, os valores dos ativos atingem um montante aproximado de dez trilhões de dólares, dos quais 55% encontram-se nos Estados Unidos (BOULIER; DUPRÉ, 2003). Os FP são enquadrados como entidades fechadas de previdência privada (EFPP), que servem de complemento à previdência oficial, com participação restrita aos empregados da empresa e dos FP de entidades associativas. Assim, não perdem seu traço distintivo e constitucional de elemento de proteção social (WEINTRAUB, 2004).

Certos campos de pesquisa nos estudos organizacionais continuam pouco explorados. É o caso do objeto FP no que tange à área de estratégia. Tal situação pode ser visualizada como uma oportunidade, ensejando a necessidade do desenvolvimento de modelos de análise mais apropriados e focalizados nessa temática. De acordo com Fontes Filho (2005), os modelos de análise de indústria já existentes não devem ser simplesmente replicados, em virtude das particularidades que permeiam tal setor. Assim, o momento é oportuno para uma reflexão sobre os caminhos a serem adotados pelas entidades fechadas de previdência complementar (EFPC), como também são denominados os FP, principalmente no país. As particularidades desse mercado, a inexistência de modelos de análise específicos para estratégias e a falta de estudos na área fazem surgir a seguinte questão de pesquisa: Como orientar estratégias em EFPC? Assim, o objetivo principal do artigo consiste em desenvolver e propor um modelo orientador que permita auxiliar a análise de estratégias dos FP no Brasil.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

Este artigo propõe uma abordagem da estratégia com base na corrente teórica da escolha estratégica (FONSECA; MACHADO-DA-SILVA, 2001), a fim de compreender as relações entre o ambiente, a empresa e o mercado. A idéia é discutir o setor de FP com base no entendimento dos conceitos de competitividade, concorrência e vantagens competitivas englobados pela teoria da organização industrial.

2.1 Organização industrial: competitividade, concorrência e vantagem competitiva

O desempenho das empresas é determinado pelo comportamento (ou conduta estratégica de compradores e vendedores), e este é determinado pela estrutura da indústria na qual as empresas atuam (VASCONCELOS; CYRINO, 2000). Segundo Bain (1959), a análise de uma indústria é importante para descrever e classificar os tipos de conduta e estrutura de um mercado e explicitar as associações desses tipos com o caráter de atuação do mercado. A razão principal desta análise é verificar a atuação satisfatória do mercado e orientar políticas públicas. Os modelos de análise de indústria aplicam-se em mercados nos quais compradores, vendedores e produtos encontram-se bem definidos, como é o caso dos estudos desenvolvidos por Porter (1989), Hamel e Prahalad (1997), Kupfer (1992) e Besanko (2006).

Num enfoque macroeconômico, a competitividade significa o grau que uma nação, em condições de mercado livre e justo, possui para produzir bens e serviços que passem no teste dos mercados internacionais, expandindo simultaneamente a renda real de seus cidadãos (POSSAS, 1999). Assim, ser competitivo consiste em ter condições de alcançar bons desempenhos no processo de concorrência, o que, dentro de um setor, se traduz por ações ou movimentos competitivos, caracterizados por determinadas condutas, pela intensidade que ocorrem (quantidade de ações), pela simplicidade (variedade de ações) e pela heterogeneidade – diferença em relação aos concorrentes (SÁNCHES; FERNÁNDES, 2004).

Já num enfoque microeconômico, a empresa passa a ser a parte central das definições. Assim, o grau de eficiência de uma empresa em certo momento é determinado pelas estratégias competitivas adotadas anteriormente (KUPFER, 1992), podendo ainda ser uma adequação das estratégias adotadas em relação ao padrão de concorrência. Logo, a competitividade é uma adequação das estratégias adotadas em relação ao padrão de concorrência, devendo ser entendida como um fenômeno direto e indissoluvelmente ligado ao processo de concorrência.

Concorrência pode ser definida como o processo de enfrentamento das empresas em um espaço econômico (a indústria ou o mercado), mediado pelas estruturas de mercado (onde se configuram as especificidades dos ramos de atividade capitalista), que se distinguem entre si no processo competitivo (POSSAS, 1999). Ferraz et al. (1997) definem competitividade como a capacidade de a empresa formular e implementar estratégias concorrenciais que lhe permitam ampliar ou conservar, de forma duradoura, uma posição sustentável no mercado. Desempenho e eficiência são considerados resultados de capacitação acumulada pela empresa e reflexo de suas estratégias. Dinamicamente, as estratégias visam modificar as capacitações ajustando-as às metas de desempenho, mas acabam também sendo limitadas por essas capacitações.

Ainda, a empresa é considerada competitiva conforme sua capacidade de adequação aos padrões de concorrência, que são exclusivos de cada mercado e influenciados por sua estrutura e seu comportamento, abrangendo um número expressivo de variáveis atreladas às formas de concorrência. Assim, para avaliar competitividade, é preciso estudar os fatores que dão origem às vantagens competitivas: gestão, tamanho do mercado, condicionantes de política econômica etc. (FERRAZ et al., 1997). Logo, a vantagem competitiva pode ser vista como a ocorrência de níveis de performance econômica acima da média do mercado, em razão das estratégias adotadas pelas empresas (VASCONCELOS; CYRINO, 2000). Com base nesse conceito, pode-se afirmar que a competitividade está relacionada à existência de vantagens competitivas que possam ser sustentadas em médio e longo prazos. As teorias de vantagem competitiva numa primeira análise podem ser abrigadas por três abordagens: posicionamento estratégico (PORTER, 1989), visão baseada em recursos (PENROSE, 1962; WERNERFELT, 1984; BARNEY, 2001) e das capacidades dinâmicas (HAMEL; PRAHALAD, 1997).

Assim, os conceitos de competitividade ganham relevância neste estudo em virtude da estreita ligação entre os FP e os reflexos econômico-financeiros que seus comportamentos acarretam no país. Uma nação competitiva depende de instituições que contribuam para a competitividade das empresas, inserindo-se nesse contexto as EFPC como protagonistas da construção processual da competitividade nacional.

2.2 Estratégia

Fonseca e Machado-da-Silva (2001) afirmam que, por força do excesso, usa-se cotidianamente o termo estratégia sem a adequada discriminação ou reflexão, o que só contribui para torná-lo cada vez mais difuso e impreciso (ANSOF, 1990; MINTZBERG et al., 2000). Estratégia é um conceito multidimensional e situacional, o que dificulta uma definição de consenso (NICOLAU, 2001).

As abordagens sobre estratégias podem ser divididas, inicialmente, numa perspectiva clássica de estratégia empresarial, em que a atenção do estudo encontra-se fora da empresa (inside-out), na sua relação com o mercado (PORTER, 1989; BAIN, 1959), e inside-in (PENROSE, 1962; BARNEY, 2001; WERNERFELT, 1984), em que o enfoque está dentro da empresa no que se refere a seus recursos ou suas competências. Recentemente, alguns autores têm buscado integrar essas duas visões por meio de abordagens sistêmicas, dinâmicas, cognitivas, evolucionárias e processuais (BERTERO et al., 2003).

Vasconcelos e Cyrino (2000) propõem o estudo de estratégias relacionado às vantagens competitivas. O Quadro 1 resume a explicação da classificação das vantagens: uma dimensão classifica as teorias segundo a origem da vantagem competitiva e a outra de acordo com premissas de concorrência.


Finalmente, um debate relevante refere-se à criação de estratégias que podem ser classificadas como pretendidas (são previamente planejadas) e realizadas (ocorridas efetivamente). Quando uma estratégia pretendida é posta em prática, é considerada deliberada, ou seja, as intenções que existiam foram operacionalizadas. Mas, quando uma estratégia é realizada sem ter sido previamente pretendida, denomina-se emergente. Destaca-se que, se as estratégias pretendidas podem significar aprendizado zero e as estratégias emergentes podem indicar controle zero, todas as estratégias da vida real precisam misturar ambas: de alguma forma, exercer controle que fomente o aprendizado (BORGES JÚNIOR; LUCE, 2000; PRADO JÚNIOR, 2003; MARIOTTO, 2003).

2.3 Governança corporativa e responsabilidade socioambiental

Segundo Monforte (2005), governança é um sistema que envolve acionista/cotistas, conselho de administração e seus comitês, diretorias, auditora independente e conselho fiscal. O objetivo da empresa é aumentar o valor para a sociedade, facilitar o acesso ao capital e contribuir para sua perenidade. No conceito da governança corporativa, os conselheiros são colocados no centro de decisão (JESUS, 2004).

Para Cerda (2000), o sistema de governança tem dois objetivos: prover uma estrutura eficiente de incentivos para a administração da empresa, visando à maximização de valor; e estabelecer responsabilidades e outros tipos de salvaguardas para evitar que os gerentes promovam algum tipo de expropriação de valor em detrimento a qualquer um dos interessados. Há duas classificações para os modelos de governança: shareholders (relação com os acionistas) e stakeholders (esse modelo inclui os demais interessados numa visão ampliada de respostas à sociedade). O modelo ideal de governança deve garantir que as estratégias resguardem os interesses dos proprietários, sendo pouco provável que as estratégias corporativas que não correspondam à governança corporativa sejam sustentáveis, porque irá lhes faltar o suporte daqueles que tomam decisões finais (WHITTINGTON, 2002).

Uma visão mais ampliada de governança pode-se dar pela incorporação efetiva dos conceitos de sustentabilidade e responsabilidade socioambiental (RSA). Enquanto a teoria da agência procura resolver os problemas dos interesses, a governança possui uma visão além do simples controle, internalizando princípios de RSA. De acordo com o Instituto Ethos (2006), a RSA é uma forma de gestão definida pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais se relaciona, estabelecendo metas compatíveis com o desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para as gerações futuras, respeitando a diversidade cultural e promovendo a redução das desigualdades sociais.

Quanto à replicação das práticas de governança e RSA, a principal função dos FP seria ativista e de indução. Farah (2005) destaca que, se as fundações indicassem ao mercado que estariam preferindo investir em ações com melhores indicadores sociais, utilizando carteiras com ranking de responsabilidade social, as empresas estariam cada vez mais procurando dar ênfase aos aspectos sociais, trazendo um efeito multiplicador positivo para toda a sociedade e para a rentabilidade dos investimentos das fundações em renda variável.

2.4 Modelo proposto para pesquisa e análise de estratégia em fundos de pensão

Para o desenvolvimento do modelo, escolheu-se a estratégia de Tregoe e Zimmerman (1984), que é definida como a estrutura que guia as escolhas que determinam a natureza e a direção de uma organização. Com base nisso, foi realizada uma síntese que leva à construção de um modelo específico que privilegiou três aspectos (ver Figura 1):


  • Discussão da estrutura do mercado: esse aspecto é analisado com base nas teorias de organização industrial. Nesse processo, correlacionam-se os temas competitividade, concorrência e estratégia.

  • Levantamento e análise dos aspectos da concorrência: esses aspectos são fundamentais nos estudos de estratégias, pelo seu vínculo intrínseco com competitividade e vantagens competitivas. Como é essencial perceber e identificar a concorrência (quanto ao nível, à abrangência e às dimensões), essas três dimensões são analisadas no modelo por meio da concorrência de captação, aplicação e entre as participadas.

  • O relacionamento entre concorrência, vantagens competitivas, estratégias e teorias organizacionais se faz necessário a fim de entender o que orienta a composição da estratégia. Posteriormente, pode-se focalizar a análise de estratégia do padrão de concorrência específico de cada setor. Esses aspectos proporcionam um entendimento de como as estratégias orientam os FP.

A estrutura da estratégia, no modelo proposto, é formada pela composição de duas definições: conduta de adequação aos padrões de concorrência (KUPFER, 1992) e geradoras de vantagem competitivas (VASCONCELOS; CYRINO, 2000). Isso implica a necessidade de conhecer os padrões de concorrência e o que é considerado vantagem competitiva no setor. Depois da identificação das fontes de vantagem, procede-se ao enquadramento na matriz de Vasconcelos e Cyrino (2000), para verificar qual teoria e orientação estratégica são utilizadas pelos FP. Após estruturar o padrão, devem-se identificar as orientações estratégicas que levam à melhor adequação ao padrão. No item 4 deste artigo, são apresentados múltiplos estudos de caso a fim de verificar a aplicabilidade desse modelo no contexto dos FP no Brasil.

3 MÉTODO DE PESQUISA

Dadas as características do objeto de pesquisa, definiu-se a necessidade de uma pesquisa exploratória (COLLIS; HUSSEY, 2005), e o estudo de casos múltiplos (YIN, 2001) foi o método escolhido. Os dados foram obtidos de múltiplas fontes: 1. seis entrevistas – apoiadas em um roteiro semi-estruturado – com pessoas que ocupam postos-chave na gestão e responsáveis pela formulação de estratégias nos FP (Previ, Fundação dos Economiários Fedrerais (Funcef), Petros (FP da Petrobras), Companhia Energética de São Paulo (Cesp), HSBC (banco) e BBPrevidência (do Banco do Brasil)); 2. três entrevistas com gestores de instituições reconhecidas do setor – Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão (Anapar), Associação Brasileira de Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp) e Secretaria de Previdência Complementar (SPC) –, pois são influenciadoras nesse mercado; 3. participou-se de um congresso específico da área – o 26º Congresso de FP realizado em 2005 –, o que contribuiu para o entendimento das dinâmicas dos FP, para a “visualização” de seus mercados e para a identificação de seus principais componentes de funcionamento; 4. a análise de documentos também foi utilizada, principalmente os relativos ao planejamento estratégico dos FP pesquisados.

O roteiro semi-estruturado foi dividido em duas seções: a primeira contém vinte questões abertas abordando a caracterização, as tendências e as dimensões de concorrência; a segunda agrupou 37 questões fechadas (em que cada pergunta representa uma variável), formuladas com base nas relações entre vantagem competitiva e estratégia definidas por Vasconcelos e Cyrino (2000). As questões foram classificadas por meio da escala Likert de 5 pontos, que buscam medir o grau de relevância de acordo com o seguinte critério: 0 (nenhuma), 1 (pouca), 2 (razoável), 3 (muita) e 4 (extrema). As variáveis consideradas relevantes foram classificadas segundo a média ponderada entre o nível de relevância (peso) e o número de respostas atribuídas. Destacaram-se as variáveis que obtiveram média maior que 3,25 (por poderem ser enquadradas como muito relevantes) e que apresentaram desvio padrão abaixo de 1 (HAIR, 2005), utilizado para excluir as questões com respostas que pudessem apresentar incoerências. Decidiu-se pela inclusão de mais quatro variáveis com média abaixo de 3,25, consideradas relevantes segundo a análise dos dados primários e secundários.

No intuito de validar e readequar as perguntas que seriam utilizadas, foram realizados pré-testes, aplicados aos ocupantes de cargos de gerência em três FP previamente escolhidos: Previ, BBPrevidência e Indusprev. Os pré-testes foram realizados pelos pesquisadores nas sedes das EFPC em Brasília, Rio de Janeiro e Porto Alegre (com exceção da Indusprev). A partir desse momento, escolheram-se os casos para a pesquisa: três entidades representativas do setor e seis EFPC, de acordo com os critérios de abrangência e “segmentação” dos FP, o que permitiu analisar o espectro de quatro diferentes grupos: um de instituições (Anapar, Abrapp e SPC) e três de EFPC. Em conjunto, os seis FP representam aproximadamente 50% dos ativos totais das entidades cadastradas na Abrapp e representam mais de 20% da população total do setor.

Os FP foram classificados de acordo com as orientações de Souza e Nazaré (2005), ou seja, conforme a prospecção de novos patrocinadores e instituidores. Os multipatrocinados passivos (MPP) são compostos por entidades que não prospectam novos patrocinadores ou instituidores (por exemplo, Previ e Funcef), tendo como patrocinadores a empresa e os próprios FP. Já os multipatrocinados ativos restritos (MPAR) são aqueles que prospectam dentro do segmento associativo ou das empresas do conglomerado do qual faz parte o principal patrocinador (por exemplo, Petros e Cesp). Os multipatrocinados ativos (MPA) são compostos pelas empresas constituídas para administrar FP e que prospectam patrocinadores e instituidores no mercado, e, geralmente, estão ligados a bancos, sendo chamados de fundos de mercado (por exemplo, HSBC e BBPrevidência). Essa segmentação não teve caráter institucional e foi adotada na pesquisa para efeitos didáticos.

4 ANÁLISE, DISCUSSÃO E SÍNTESE DOS RESULTADOS

Para padronizar as referências feitas pelos entrevistados aos FP, em relação ao seu tamanho, optou-se pela seguinte classificação: 1. grandes FP são aqueles com investimentos acima de R$ 1 bilhão; 2. médios FP possuem investimentos acima de R$ 100 milhões e abaixo de R$ 1 bilhão; e 3. pequenos FP são aqueles com investimentos abaixo de R$ 100 milhões. Ainda, dividiu-se a descrição deste item em: análise da indústria, concorrência dentro do modelo de análise proposto e fatores relevantes na formulação de estratégias.

4.1 Indústria das EFPC

A estrutura de mercado das EFPC é peculiar e exige conhecimento específico em diversas áreas (por exemplo, financeira, atuarial, legislação etc.). A regulação e a crescente sofisticação desse mercado tornam complexa a tarefa de classificá-lo ou explorá-lo, o que pode criar significativas barreiras de entrada (PORTER, 1989). A legislação vigente atua, por vezes, como limitadora ao definir um portfólio que pode impedir a aplicação de recursos no exterior ou a administração de FP por empresas estrangeiras. Independentemente de seu desempenho, essas empresas não podem trocar de produto, serviços ou atividade. Ainda, a estrutura do mercado brasileiro de FP tem influência de vários intervenientes nas decisões dos FP: Secretaria de Previdência Complementar (SPC), Conselho de Gestão da Previdência Complementar, Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp) e Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão (Anapar).

Quanto à análise dos FP (a empresa propriamente dita), existem apenas duas opções para sua criação: pela vontade dos empregados e sua articulação por meio de seus representantes na empresa ou associação; e pela vontade da empresa, geralmente associada a políticas de recursos humanos. A organização interna dos FP é estruturada sobre os ativos e passivos, e necessita basicamente da formação de um corpo técnico-administrativo. O custo de produção está ligado à gestão própria (custo diluído entre os colaboradores) ou gestão terceirizada (preço por contrato, dependendo das especificações do serviço que será prestado). Assim, o aumento no número de participantes e do valor total dos ativos de uma EFPC tende a reduzir os principais índices de custeio dessas entidades.

No que tange aos produtos, as EPFC pagam uma taxa em prol de um benefício a ser adquirido num futuro distante pelos seus clientes. São três as modalidades de planos: 1. benefício definido (BD), em que há solidariedade entre os participantes; 2. contribuição definida (CD), na qual não há solidariedade no plano e suas vantagens estão restritas ao agrupamento; 3. e os chamados planos mistos. Segundo os entrevistados dos MPA, também podem ser classificados como produtos a serem oferecidos nesse mercado: a administração do fundo, a gestão dos recursos por terceiros, os planos de aposentadoria e os ativos como investimento. Uma característica relevante é o elevado grau de padronização dos produtos, em que a diferença básica é a competência para gerenciar os diversos recursos. Outros benefícios que podem ser considerados serviços para as empresas que desejam constituir FP são: assessoria atuarial, apoio administrativo-legal e gerenciamento da folha de pagamento dos aposentados.

Foram várias as definições de clientes apontadas pelos executivos pesquisados. O conceito de clientes nos FP parece estar ligado a diversas variáveis e se trata de uma noção complexa. Para os MPA, os clientes são basicamente as empresas que podem comprar seus produtos como pessoa jurídica. Para as associações e os FP que apresentam um maior nível de governança, os clientes são todos aqueles com os quais os FP se relacionam (incluindo seus fornecedores de insumos físicos). Para os demais FP, os clientes são os seus próprios proprietários, ou seja, os participantes e patrocinadores. O que dificulta uma maior clareza no conceito de clientes é que estes podem ocupar papéis distintos nos FP. Inicialmente, podem ser considerados clientes potenciais. Posteriormente, quando “captados” e aderem aos planos dos FP, podem ser considerados clientes efetivos. Finalmente, podem ser considerados proprietários, por causa de sua participação na gestão dos FP. Atualmente, uma visão do potencial de clientes pessoa jurídica no Brasil aponta para a existência de aproximadamente 5.560 prefeituras, 18 mil associações e sindicatos capazes de constituir FP como instituidores em atividade no País, 9.400 pessoas jurídicas com mais de cinqüenta empregados e os mais de 4,7 milhões de funcionários públicos das diversas instâncias governamentais (IBGE, 2006).

A análise do comportamento de mercado aponta um crescimento lento do número de novas EFPC no País, nos últimos anos (SOUZA; NAZARÉ, 2005). Porém, as EFPC já existentes têm apresentado crescimento no que se refere a resultados. Observa-se que a decisão pela “compra” de um plano nas empresas não está relacionada somente à área de recursos humanos, mas também a colaboradores que teriam preferência por empresas que oferecem bons planos de aposentadoria. Em consonância com o referencial teórico, os depoimentos indicaram uma relação do crescimento do setor com a modernização da legislação, implicando novas oportunidades e crescimento para essa indústria. Segundo o representante da Anapar, o baixo nível de emprego e renda da população é apontado como o maior impeditivo de crescimento desse mercado. Já o executivo da Previ julga ser essencial a profissionalização das EFPC e destaca que isso é vital para o acompanhamento de tendências de aumento de pressão da sociedade e dos participantes que exigem transparência e qualidade na gestão. Observou-se que não existe um consenso entre os envolvidos no que tange à abertura/flexibilização da legislação para investimentos no exterior. Mas é unânime a opinião dos entrevistados quanto à importância da criação de uma agência reguladora.

4.2 Competitividade e concorrência nas EFPC

Conforme sugerido no referencial teórico, parece necessário alargar o conceito estático de competitividade com base numa visão dinâmica do processo de concorrência. Isso inclui a necessidade de que os FP identifiquem sistematicamente a ação estratégica de seus concorrentes. Porém, os dados apontam para a não-existência de consenso entre os entrevistados quanto ao conceito de concorrência nesse mercado. Alguns entrevistados entendem que não existe concorrência com os MPP porque estes detêm um mercado cativo (funcionários da patrocinadora). Já entre os MPA e MPAR, há uma percepção de que existe uma competição a ser enfrentada. O Quadro 2 sintetiza a opinião dos diversos entrevistados em torno da concorrência nas EFPC.


Percebe-se que alguns executivos não consideram a Previ, o maior FP brasileiro, um concorrente. Essa percepção por parte dos entrevistados pode significar um equívoco de avaliação, pois, na hipótese de essa entidade realizar um movimento estratégico para investir no multipatrocínio, isso poderia provocar mudanças significativas na estrutura do mercado, uma vez que ela possui vantagens competitivas identificadas pelos próprios “concorrentes”. Ainda, como declarado por alguns entrevistados, considerando que as patrocinadoras podem influenciar nas estratégias dos FP, seria temerário perceber o Banco do Brasil como concorrente e não estabelecer relação, no mínimo como possibilidade, com a Previ.

As análises supracitadas ajudam a comprovar a inexistência de uma visão clara no mercado de FP sobre a competitividade no setor e sobre quem são os principais concorrentes reais e potenciais. Para alguns entrevistados, o principal concorrente apontado, as entidades fechadas de previdência abertas (EFPA), está fora do sistema. Uma análise mais apurada mostra não haver por parte dos FP a percepção que as EFPA são vinculadas, em geral, aos mesmos bancos que participam do mercado de FP, o que implica uma concorrência bem mais próxima do que a imaginada. Para entender mais profundamente a concorrência existente no País, ela foi dividida no que se refere à captação, aplicação e participada.

Vários entrevistados postularam que as EFPC têm “sofrido” concorrência direta das entidades abertas de previdência complementar (EAPC) quanto à captação de novos associados e recursos. Os aspectos relevantes no que tange ao acirramento desse tipo de concorrência nos FP são: a) a instituição da portabilidade que deu liberdade aos participantes dos FP de direcionar seus recursos, inclusive para instituições de EFPA; e b) optar pelo benefício diferido, ou seja, mesmo cessando o vínculo empregatício permanecer no plano. Com a intenção de reduzir custos administrativos e promover ganhos em escala, os FP pequenos poderão fundir-se, aumentando ainda mais a concorrência na captação (REIS, 2005). Tudo indica que haverá uma estagnação no número de entidades e um aumento no número de planos novos administrados pelas mesmas entidades, o que poderá tornar-se uma barreira de entrada no setor, que buscará ampliar a concorrência de captação daqueles que já participam do sistema.

Quanto à concorrência de aplicação dos recursos, pode-se verificar nos dados levantados que todas as EFPC buscam o melhor retorno para seus ativos, independentemente de a administração ser própria ou terceirizada. Há uma concentração por aplicações em renda fixa, em razão de estas estarem atreladas à busca por maior segurança, rentabilidade com menor risco e comodidade para cumprir a meta atuarial, em que os papéis do governo trazem esse benefício. Porém, ao mesmo tempo, tiram das EFPC o poder de agir diretamente quanto à escolha do melhor mercado para atuar. O Quadro 3 sintetiza a opinião dos diversos entrevistados em torno da concorrência de aplicação nas EFPC.


Em relação à dimensão concorrência de aplicação, o mercado ainda é tomador dos recursos dos FP. Há uma concorrência de bancos e assets com o propósito de captar esses recursos, enquanto a postura dos FP passa a ser, na maioria das vezes, passiva. Para as médias e pequenas EFPC, as decisões estão mais ligadas à escolha de um bom gestor financeiro que ofereça garantia na obtenção da meta atuarial. Percebe-se que pode haver terceirização da aplicação dos recursos, o que não significa terceirização da gestão.

Quanto à concorrência na participada, verifica-se que a grande maioria das EFPC concentra seus esforços em deter uma boa aplicação financeira que garanta rentabilidade e que cumpra o compromisso atuarial. No entanto, se houver uma queda acentuada da taxa de juros nos próximos anos, é provável que os pequenos e médios FP venham a concentrar sua ação na melhoria do portfólio de aplicação. De acordo com o entrevistado da Cesp, a entrada em um novo mercado por meio de uma participada pode tornar-se uma vantagem competitiva se a EFPC se utilizar de instrumentos efetivos de gestão e controle. Já os entrevistados da Previ, Cesp e Petros afirmam não ter dúvida da necessidade de participação da governança da participada, onde o que deve ser discutido são a forma e o nível de participação, se direta, pela ocupação de cargos de diretoria, ou indireta, por intermédio de conselheiros. Ambas têm a finalidade de garantir o alinhamento estratégico com os FP. Assim, parece não estar claro para a empresa participada o diferencial competitivo que pode significar a atuação dos FP no seu negócio (por meio da participação no capital). Os mercados das participadas parecem ser visualizados pelos FP como: uma oportunidade de um melhor retorno financeiro e para a composição de um portfólio mais diversificado.

Os entrevistados apontam os FP como estratégicos para o País, vinculando-os à competitividade nacional. Destacam que os investimentos tendem a migrar para a renda variável e que as alterações no mercado implicarão uma maior especialização na formação do portfólio de aplicações, exigindo uma mudança na estratégia de participação no mercado. Nesse contexto, as entidades percebem que possuem algum tipo de vantagem competitiva em relação aos seus concorrentes. As opiniões específicas dos entrevistados dos casos pesquisados quanto à vantagem competitiva das EFPC podem ser analisadas no Quadro 4.


As entidades ligadas a bancos têm a vantagem de atuar e lucrar em mais de um ponto da cadeia dos FP (por exemplo, no oferecimento de outros produtos quando da aquisição do plano). Uma instituição bancária pode “vender' os produtos e serviços diretos de previdência e aumentar sua base de clientes de pessoa jurídica. Pode captar e gerenciar os recursos advindos do plano, ampliar sua base de clientes entre contribuintes e aposentados, e oferecer um diferencial de fidelização tanto para as empresas quanto para as pessoas físicas.

4.3 Governança e responsabilidade socioambiental (RSA) nas EFPC

Quanto às influências e posições alternadas de agente e principal nas relações dos FP com patrocinador e empresas participadas, foi possível perceber que estes ainda vivem uma fase de influência das patrocinadoras na formatação de suas estratégias. No entanto, não é possível afirmar que a ação direta de um FP em um mercado seja fruto de uma estratégia de sua patrocinadora. A busca dos maiores FP pela sua identidade e formulação de estratégias próprias tende a ocorrer à medida que o mercado amadurece e são implantados mecanismos modernos de gestão. Os entrevistados da Anapar, Abrapp e SPC entendem ser vital o desenvolvimento de práticas de governança semelhantes às adotadas pelas empresas. Sugerem a necessidade de elaborar uma análise diferenciada para esse setor. Isso porque, no geral, as empresas têm um proprietário. Já nos FP isso não acontece, já que, nesse caso, o controle é pulverizado.

Já a RSA tem sido tema corrente nas esferas empresariais, estando presente nas discussões promovidas pelas associações de FP. Verifica-se a preocupação, por parte dos FP, em incluir o tema RSA no escopo da formulação estratégia. O que parece ainda não estar claro são os conceitos do que venha a ser RSA, sua vinculação com o mercado e, principalmente, como transformá-la em ações objetivas “dentro” da entidade. O executivo da Previ afirmou que faltam instrumentos que ajudem a parametrizar e a mensurar a RSA.

A Previ e Petros têm ações efetivas na área do RSA. Percebe-se que apenas a Petros adota uma atitude clara de RSA interna em relação aos seus públicos de relacionamento (por exemplo, por meio da inclusão de condicionantes de verificação de ações de RSA para avaliação de seus fornecedores). Já para os executivos das MPA, a consciência de RSA está presente nas empresas, mas nos FP é embrionária. Um dos representantes afirmou que “as EFPC's têm uma meta, então a RSA pode ficar em segundo plano quando se fala em aplicar, ou não recursos em Fundos de Investimento chamados sociais”. Essas análises também são corroboradas por Penteado (2005), que afirma ser o crescimento das empresas ou da economia a principal variável considerada relevante pelos mercados financeiros. Apesar do componente socioambiental, que parece estar na essência da constituição dos FP, é possível inferir que nem seus participantes ainda percebem a relação clara de vinculação das estratégias dos FP com a RSA.

4.4 Análise das estratégias das EFPC

Em relação às estratégias das EFPC, os entrevistados das MPA (HSBC e BBPrevidência) afirmaram que têm seus planejamentos estratégicos estruturados, com focos de atuação definidos e mercados-alvo escolhidos. As estratégias adotadas podem ser resumidas em: alocação de ativos, cuidados com o passivo e, mais recentemente, adoção de princípios de governança. A maioria dos entrevistados diz que um elemento merecedor de atenção pelas EFPC é que o planejamento estratégico das patrocinadoras tem sido considerado pouco relevante na formulação das suas estratégias.

Quanto à difusão da cultura de previdência, ainda não foi possível identificar nenhuma ação estratégica específica para o público externo às EFPC. As entidades Previ, Petros e Funcef tiveram de desenvolver, reativamente, estratégias para a captação do público interno para ampliar a sua participação como associado dos FP. No Quadro 5, são apresentados os fatores mais relevantes para a formulação de estratégias nas EFPC e suas principais fontes de vantagem competitiva.


Com base na classificação proposta por Vasconcelos e Cyrino (2000), categorizaram-se as vantagens competitivas (ver Quadro 6), em que a alocação das vantagens foi feita dentro de cada quadrante, levando em consideração as dimensões de classificação (origem e concorrência); as fontes de vantagem competitiva são identificadas pela sigla atribuída.


A análise crítica desse quadro aponta para os seguintes pontos:

a) A atual visão dos profissionais de mercado que atuam nos FP parte de uma postura estática da formulação da estratégica quanto à dimensão de concorrência, exceção à importância sugerida para os aspectos ligados ao aprendizado na organização (ERH).

b) Quanto à dimensão da origem, percebe-se um maior número de vantagens ligadas a recursos e capacidades.

c) Os FP apresentam vantagens que podem ser classificadas em mais de uma corrente explicativa.

d) Não foi possível identificar nenhuma vantagem que possa ser vinculada à corrente explicativa de processo de mercado (PM) – cujo caráter é a busca contínua por inovação, o que pode ser explicado pela padronização do produto, pelas melhorias em produtos complementares que não possuem características de continuidade e pela eventual falta de percepção da importância de inovação no contexto da competição.

e) Os principais recursos apontados como fonte de vantagem apresentam características de intangibilidade e podem estar associados às peculiaridades desse mercado no que se refere ao produto oferecido (planos de aposentadoria).

f) O processo de aprendizagem embasado pela constante especialização dos recursos humanos aparece como vantagem, vinculada às capacidades dinâmicas, por satisfazer a condição de incorporação de novas técnicas e de recombinação de recursos existentes como processo de adaptação às exigências do mercado.

g) A vantagem relativa à experiência no setor é posicionada na fronteira entre recursos e capacidades dinâmicas e está associada ao aprendizado organizacional.

h) A especialização em mercados é propositalmente localizada próxima às orientações com visão dinâmica de concorrência, o que implica a vinculação com as alterações do mercado.

Com base no cruzamento dos direcionamentos estratégicos e das vantagens competitivas, é possível identificar as orientações estratégicas de cada uma das EFPC pesquisadas neste artigo (ver Quadro 7). A categorização anterior das vantagens (ver Quadro 6) procurou verificar a concentração ou dispersão de vantagens em relação às orientações estratégicas com as quais estão relacionadas. A finalidade foi identificar orientações para um padrão de concorrência. Já a classificação proposta no Quadro 7 visa avaliar a hipótese de que as estratégias em um mesmo FP não seguiam uma corrente explicativa única. É possível observar que, embora pertençam ao mesmo mercado, as EFPC têm seguido distintas orientações estratégicas.


Essa falta de uniformidade quanto à orientação estratégica tende a refletir a ausência de um padrão competitivo claro no mercado. Mostra também a dificuldade em determinar um modelo de análise para essa indústria. A maioria dos FP, quando analisados isoladamente, concentra orientações estratégicas baseadas em recursos, o que complementa a visão de uma percepção predominantemente estática do mercado.

Para formular um padrão de concorrência nas EFPC, foram consideradas as formas ou premissas relevantes de concorrência, associadas às fontes de vantagens competitivas e aos principais fatores classificados anteriormente. O padrão de concorrência sugerido neste artigo para essa indústria é: práticas de gestão de RSA e governança, escala/custo, especialização em mercados e recursos humanos, e valorização da marca da instituição à que está vinculado o fundo. Sugere-se ainda que, quando da formulação de estratégias, sejam levados em conta os seguintes fatores relevantes: a) analisar cenários, tendências futuras e concorrência; b) disseminar a cultura de previdência no mercado; c) estruturar o planejamento estratégico; d) analisar a concorrência; e) ter conhecimento do planejamento estratégico do patrocinador; e f) ter ações vinculadas ao desenvolvimento do país.

Partindo da definição dos padrões de concorrência, é possível propor uma classificação para as EFPC. Neste sentido, sugere-se que sejam levados em consideração quais seriam os elementos prováveis que tendem a compor o padrão futuro, para que seja possível formular, de forma mais eficaz, as estratégias. Sendo assim, foi incluída no padrão de concorrência a preocupação com as práticas de RSA.

Utilizando-se os conceitos de Kupfer (1992) e Vasconcelos e Cyrino (2000), a Figura 2 apresenta uma proposta de enquadramento das EFPC. Essa classificação é um esforço de utilização da metodologia, tendo como intenção verificar como estariam posicionadas atualmente essas instituições com relação ao padrão definido. É possível identificar as EFPC mais orientadas para as estratégias outside-in (orientado de fora para dentro) ou inside-out (orientado de dentro para fora). As relações mostradas no Quadro 7 e na Figura 2 permitem perceber que, apesar de pertencerem ao mesmo mercado, as “empresas” seguem orientações distintas para a formulação das estratégias. Em relação às vantagens competitivas, estas podem ser classificadas, com base em distintas teorias, quanto à origem e dimensão de concorrência.


Esta análise não tem intuito de criar juízo de valor nem pretende propor nenhum tipo de ranqueamento entre entidades, mas possibilitar um exercício para a compreensão dos direcionamentos estratégicos utilizados nos FP. A classificação permite visualizar de forma simples o enquadramento para futura análise e tomadas de decisão da empresa quanto a ações de melhor adequação ao padrão. No entanto, ela não deve ser feita de forma estanque, pois pode-se perder a visão sistêmica e da inter-relação das teorias, já que nenhuma das EFPC poderia ser enquadrada rigidamente em uma das orientações estratégicas por apresentar uma ou outra característica prevista em outra dimensão de classificação.

Assim, certos fatores que determinam a competitividade do mercado ocupam posição de destaque. Entre os fatores empresariais, devem-se destacar a gestão e os recursos humanos. Quanto aos fatores estruturais, são mais relevantes: a configuração da indústria, o regime de incentivos e a regulação da concorrência. Nos fatores sistêmicos figuram os componentes macroeconômicos (por exemplo, taxa de juro e política salarial), político-institucionais (por exemplo, a política tributária), legal-regulatórios (por exemplo, a defesa do consumidor e da concorrência) e sociais (por exemplo, padrão de vida dos consumidores, políticas trabalhistas e de seguridade).

5 CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo indica a possibilidade da integração das teorias de Kupfer (1992), em que a estratégia deve buscar adequação ao padrão, com as teorias de Vasconcelos e Cyrino (2000), que mostram a orientação estratégica relacionando-se com as vantagens identificadas. A idéia consistiu em integrar a sugestão de padrão com uma visão dinâmica sugerida por Kupfer (1992): a possibilidade de as estratégias incluírem orientações ligadas a recursos e capacidades.

As conclusões do trabalho sugerem que as EFPC devem adotar estratégias que contemplem o padrão sugerido e que estejam num caminho entre a orientação pelo mercado e aquela orientada pelos recursos, incorporando de forma dinâmica as inovações e enquadrando-se ao seu atual momento no país. Tal proposta resulta em escolhas mais próximas daquelas sugeridas pela teoria das capacidades dinâmicas, uma vez que esta pressupõe a formação de competências organizacionais em ambientes de alta complexidade e mudança (VASCONCELOS; CYRINO, 2000).

Os dados empíricos da presente pesquisa sugerem que as EFPC necessitam incorporar elementos dinâmicos na formulação de suas estratégias, o que implica a necessidade de construir um conjunto de cenários possíveis, no que tange às mudanças que poderão ocorrer futuramente no mercado. Atualmente, as EFPC que adotarem posturas passivas, acreditando em uma visão estática do mercado e que a regulação será suficiente para conter pressões para alterações no modelo de previdência, podem correr o risco de ver seu mercado cativo definitivamente ameaçado.

TRAMITAÇÃO

Recebido em 27/4/2007

Aprovado em 17/7/2007

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jun 2012
  • Data do Fascículo
    Fev 2008

Histórico

  • Aceito
    17 Jul 2007
  • Recebido
    27 Abr 2007
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