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Distribuição espacial de plantas infestadas por Spodoptera frugiperda (J.E. Smith) (Lepidoptera: Noctuidae) na cultura do milho

Spatial distribution of plants infested with Spodoptera frugiperda (J.E. Smith) (Lepidoptera: Noctuidae) on corn crop

Resumos

A importância da lagarta-do-cartucho, Spodoptera frugiperda (J.E. Smith), deve-se não somente aos danos causados, mas especialmente à dificuldade de seu controle. É imprescindível o conhecimento dos parâmetros populacionais da praga, como seu padrão de dispersão na cultura, pois, dependendo do arranjo espacial do inseto na área são necessários diferentes métodos de amostragem, variando o número e o tamanho da amostra. Para o presente trabalho foram instalados três campos experimentais em três diferentes áreas. No Campo I foram alocadas 66 parcelas, compostas por sete plantas cada; no Campo II foram demarcadas 55 parcelas, compostas por quatro plantas, e por fim, o Campo III também foi formado por 55 parcelas compostas por seis plantas cada uma. Nas amostragens realizadas avaliou-se a presença ou ausência da praga na planta. De acordo com os dados observados tanto para os índices de dispersão como para os modelos teóricas de distribuições de freqüência, S. frugiperda possui padrão de dispersão espacial definido mais adequadamente pela aleatoriedade, sendo esse modelo de distribuição muito influenciado pelo nível da infestação.

Índice de dispersão; amostragem; população


The importance of the fall armyworm, Spodoptera frugiperda (J.E. Smith), is not only due to the damage it can cause, but also to its difficult control. It is essential to know the pest population parameters, such as its standard scattering in the crop, because depending on the space arrangement of the insects in the area, different sampling methods are required. For the present work, three experimental fields were installed in different areas: the first one had 66 plots with seven plants each; the second one had 55 plots with four plants each; and the third field had 55 plots with six plants each. The presence or absence of the pest in the plant was evaluated in the samples. According to the data observed, either to the scattering index or to the theoretical scattering models, S. frugiperda dispersion is scattered at random and strongly depends on the infestation level.

Dispersion index; sample; population


CROP PROTECTION

Distribuição espacial de plantas infestadas por Spodoptera frugiperda (J.E. Smith) (Lepidoptera: Noctuidae) na cultura do milho

Spatial distribution of plants infested with Spodoptera frugiperda (J.E. Smith) (Lepidoptera: Noctuidae) on corn crop

Elmo P. de Melo; Marcos G. Fernandes; Paulo E. Degrande; Raphael M.A. Cessa; Jorge L. Salomão; Rodrigo F. Nogueira

Depto. Ciências Agrárias - UFGD, Campus de Dourados, Rod. Dourados-Itahum, km 12, C. postal 583, 79.804-970 Dourados, MS

RESUMO

A importância da lagarta-do-cartucho, Spodoptera frugiperda (J.E. Smith), deve-se não somente aos danos causados, mas especialmente à dificuldade de seu controle. É imprescindível o conhecimento dos parâmetros populacionais da praga, como seu padrão de dispersão na cultura, pois, dependendo do arranjo espacial do inseto na área são necessários diferentes métodos de amostragem, variando o número e o tamanho da amostra. Para o presente trabalho foram instalados três campos experimentais em três diferentes áreas. No Campo I foram alocadas 66 parcelas, compostas por sete plantas cada; no Campo II foram demarcadas 55 parcelas, compostas por quatro plantas, e por fim, o Campo III também foi formado por 55 parcelas compostas por seis plantas cada uma. Nas amostragens realizadas avaliou-se a presença ou ausência da praga na planta. De acordo com os dados observados tanto para os índices de dispersão como para os modelos teóricas de distribuições de freqüência, S. frugiperda possui padrão de dispersão espacial definido mais adequadamente pela aleatoriedade, sendo esse modelo de distribuição muito influenciado pelo nível da infestação.

Palavras-chave: Índice de dispersão, amostragem, população

ABSTRACT

The importance of the fall armyworm, Spodoptera frugiperda (J.E. Smith), is not only due to the damage it can cause, but also to its difficult control. It is essential to know the pest population parameters, such as its standard scattering in the crop, because depending on the space arrangement of the insects in the area, different sampling methods are required. For the present work, three experimental fields were installed in different areas: the first one had 66 plots with seven plants each; the second one had 55 plots with four plants each; and the third field had 55 plots with six plants each. The presence or absence of the pest in the plant was evaluated in the samples. According to the data observed, either to the scattering index or to the theoretical scattering models, S. frugiperda dispersion is scattered at random and strongly depends on the infestation level.

Key words: Dispersion index, sample, population

A cultura do milho (Zea mays) é uma das mais importantes no contexto econômico e social no mundo, ocupando a segunda posição em termos de produção mundial (Fnp 2004). No Brasil, durante a safra 2002/2003, o milho foi cultivado em uma área de 13,4 milhões de hectares com produção de aproximadamente 47,4 milhões de toneladas (Conab 2004). O Brasil é o terceiro produtor mundial dessa cultura, estando a sua frente apenas os Estados Unidos e a China; no entanto, a produtividade nacional é baixa. A média de rendimento (3,2 t/ha nas últimas três safras) é de menos de um terço da norte-americana e cerca de metade da argentina (Fnp 2004).

São diversos os fatores responsáveis pela baixa produtividade, sendo que as pragas têm elevada participação, principalmente nos últimos anos com o cultivo de milho "safrinha", que oferece condições para a continuidade de desenvolvimento das pragas devido à permanência da planta de milho na área, praticamente durante todo ano (Farias et al. 2001a). Dentre as pragas mais importantes do milho destaca-se a lagarta-do-cartucho Spodoptera frugiperda (J.E.Smith), considerada a principal praga da cultura no Brasil, que em condições favoráveis aumenta sua população, destruindo as folhas e o cartucho do milho, chegando mesmo a impedir a produção de espigas comerciais (Fernandes et. al. 2003a), assumindo também grande importância no México, América Central e América do Sul, causando perdas de 15% a 37% (Cruz 1993).

No Brasil, estima-se que a lagarta-do-cartucho seja responsável por mais de 25% dos prejuízos causados por pragas ao milho e pela maior parte dos 38,3 milhões de dólares gastos com pulverizações de inseticidas, resultando no prejuízo anual de aproximadamente 250 milhões de dólares (Waquil & Vilella 2003).

Sua importância deve-se não somente aos danos provocados, mas especialmente à dificuldade de seu controle. É imprescindível o conhecimento dos parâmetros populacionais da praga, como seu padrão de dispersão na cultura, para buscar maneiras mais econômicas e sustentáveis de controle (Santos et al. 2004).

Para o controle de pragas, atualmente, tem-se buscado alterar o mínimo possível o meio ambiente, através do Manejo Integrado de Pragas (MIP), adotando técnicas que privilegiam o manejo da população dos artrópodes que se inter-relacionam dentro do agroecossistema. Assim, o conhecimento de uma forma rápida e eficiente de amostragem das pragas, principalmente em extensas áreas de cultivo, é fundamental para que o MIP seja aplicado satisfatoriamente (Fernandes et al. 2003b).

Para implementar um manejo racional de S. frugiperda, é necessário construir um plano confiável de amostragem que permita estimar a densidade populacional da praga e classificar seus danos, e com base nisso, então, tomar a decisão apropriada (Farias et al. 2001b). A determinação do tipo de distribuição espacial da praga é o primeiro passo para o estabelecimento do plano de amostragem (Fernandes et al. 2003b), pois, conforme o tipo de arranjo espacial do inseto na área a ser avaliada, são necessários diferentes métodos de amostragem, variando o número e o tamanho da amostra na área.

A dispersão espacial de uma população em um dado ecossistema pode ser do tipo agregado (ou contagioso), aleatório (ou ao acaso) ou uniforme (ou regular) (Barbosa 1992). Para determinar o padrão de arranjo espacial de uma determinada espécie é necessário ter dados de contagem de indivíduos no ecossistema a ser considerado. Fundamental para isso é que o ecossistema em questão permita a realização de amostragens. Essas amostragens, de acordo com Young & Young (1998), podem ser utilizadas para inferir sobre a forma de distribuição da população amostrada ou sobre as características da distribuição. Para a descrição das formas de distribuição de uma população utilizam-se os índices de agregação e as distribuições de freqüências.

Os índices de agregação ou dispersão, apesar de não descreverem matematicamente a distribuição da população estudada (Elliot et al. 1990), fornecem uma idéia bastante aproximada dessa realidade quando diferentes índices fornecem resultados similares (Myers 1978). A confirmação do tipo de distribuição ocorre apenas com o conhecimento das distribuições de freqüência dos números de indivíduos da praga estudada em cada cultura (Barbosa 1992). O conhecimento das distribuições de probabilidade que descrevem as disposições espaciais de insetos pragas, que são obtidas a partir dos dados de contagens, é importante para o estabelecimento de critérios adequados de amostragem, análises estatísticas e decisão sobre o controle de pragas agrícolas (Ruesink 1980, Taylor 1984).

O presente trabalho objetivou estudar a distribuição espacial de S. frugiperda em milho, através da determinação dos índices de agregação e dos testes de qui-quadrado de aderência para os principais tipos de distribuições teóricas de freqüência.

Material e Métodos

Este trabalho foi realizado em lavouras comerciais de milho, localizadas no município de Dourados, MS, de latitude de 22º14ºS, longitude de 54º49ºW, e altitude 458m e clima Cfa (clima mesotérmico úmido sem estiagem). A precipitação pluviométrica total anual da região é 1200 mm a 1400 mm, a evapotranspiração real anual é de 1100 mm a 1200 mm e a temperatura média anual é de 22ºC. A variação mesoclimática é de Úmido a Sub-úmido, com excedente hídrico anual de 800 mm a 1200 mm durante quatro meses (Mato Grosso do Sul 2000).

Foram instalados três campos experimentais em diferentes áreas: o Campo I, localizado em uma área de 11 ha, foi composto por 66 parcelas, as quais foram compostas por sete plantas cada uma; o Campo II, localizado em uma área de 25 ha, tinha 55 parcelas, compostas por quatro plantas e o Campo III, localizado em uma área de 50 ha foi formado por 55 parcelas compostas por seis plantas cada. Como o trabalho foi realizado em lavouras comerciais em diferentes localidades, foi necessário adequar-se à disponibilidade de área de cada produtor, e também a necessidade de alocar as parcelas de tal modo a não inviabilizar o manejo da área, uma vez que foram realizadas pulverizações nas áreas deixando apenas as parcelas (com bordadura) sem pulverização. Como a freqüência e a intensidade da praga são altas na região em estudo, optou-se pela realização do trabalho mesmo com a variação do número e tamanho das parcelas.

No Campo I utilizou-se o milho híbrido Pioneer 3210 e nos Campos II e III o híbrido BRS 304. O espaçamento entre linhas foi de 90 cm, com cinco plantas por metro linear nos três campos. Não houve tratamento de sementes com inseticida. A primeira amostragem foi realizada nos Campo I e II, no sexto dia após a emergência e, no Campo III, no primeiro dia da emergência.

As amostragens no Campo I foram realizadas nos dias 24/03/2004, 27/03/2004, 30/03/2004, 06/04/2004, 10/04/2004, 13/04/2004 e 16/04/2004; no Campo II, em 19/03/2004, 22/03/2004, 25/03/2004, 28/03/2004, 31/03/2004, 07/04/2004, 10/04/2004 e 13/04/2004, e no Campo III, em 22/03/2004, 25/03/2004, 28/03/2004, 01/04/2004, 07/04/2004, 10/04/2004, 13/04/2004 e 16/04/2004.

As amostragens para as lagartas foram realizadas observando-se a presença ou ausência da praga na planta. Segundo Waquil & Vilella (2003), a partir do 3º ínstar, estágio em que S. frugiperda começa a causar perdas significativas, geralmente encontra-se uma ou, raramente, duas lagartas por planta. Outro ponto a ser ressaltado é que quando se avalia somente o número de plantas atacadas, por exemplo plantas com folhas "raspadas", que é um sintoma característico da praga, pode-se estar subestimando a infestação, porque as lagartas de primeiros ínstares ao se dispersarem, podem ir diretamente para o "cartucho" da planta, não apresentando folhas raspadas, porém as plantas encontram-se infestadas. O contrário também é válido, quando se quantificam as plantas atacadas, pois pode ser que a infestação seja superestimada devido a algum fator, como a presença de inimigos naturais, podendo a planta já não estar mais infestada.

Os dados obtidos em cada uma das amostragens foram utilizados para a descrição matemática da dispersão espacial da população do inseto. Foram determinados a média, variância e os índices de agregação. As seguintes distribuições teóricas de freqüências foram utilizadas como modelo para amostras das populações: distribuição de Poisson, distribuição binomial negativa e distribuição binomial positiva. Em seguida, foram realizados os testes de ajustes da estatística de qui-quadrado dos dados obtidos no campo às distribuições teóricas de freqüência.

Os índices de agregação utilizados para se verificar o grau de agregação das lagartas foram:

Razão Variância/Média. Este índice foi primeiramente utilizado por Clapham (1936), citado por Perry & Mead (1979). É também chamado de índice de dispersão e, segundo Rabinovich (1980), serve para medir o desvio de um arranjo das condições de aleatoriedade. Valores iguais à unidade indicam arranjo espacial ao acaso, menores que a unidade indicam disposição espacial regular ou uniforme, e valores significativamente maiores que a unidade indicam arranjo agregado. As limitações desse índice, segundo Southwood (1971), residem na influência do tamanho da unidade de amostra sobre a quantidade de indivíduos observados, sendo extremamente afetado nas disposições de contágio. Esse índice foi estimado neste trabalho através de:

onde: s2 = variância amostral e = média amostal.

A significância da diferença da unidade (teste de afastamento da aleatoriedade) foi testada através da determinação do valor da estatística do qui-quadrado pela expressão:

onde: I = valor da razão variância-média e N = tamanho da amostra.

Com N-1 graus de liberdade, comparou-se o valor do qui-quadrado calculado (X2) com o qui-quadrado tabelado (c2), obtido através da tabela de c2 e não rejeitou-se a aleatoriedade (I = 1) quando:

Assim, quando for rejeitada a aleatoriedade, ou seja, o valor de X2 não se situa entre os valores de c2 determinados acima, podem ocorrer duas situações distintas:

a) o valor do X2 é maior que o c2(N - 1 gl; a = 0,025). Nesse caso, o índice I é significativamente maior que a unidade, e uma distribuição contagiosa é um modelo que pode se ajustar aos dados.

b) o valor do X2 é menor que o c2(N - 1 gl; a = 0,975), e nesse caso, uma distribuição regular é mais adequada.

Índice de Morisita. Foi desenvolvido por Morisita (1959, 1962), com o objetivo de apresentar um índice independente da média amostral e do número total de indivíduos. Valores próximos à unidade indicam arranjo ao acaso, valores superiores à unidade indicam disposição agregada, e valores inferiores à unidade indicam arranjo regular ou uniforme (Nascimento 1995). A limitação do índice de Morisita reside no fato de que este é demasiadamente influenciado pela quantidade de amostras (N) (Bianco 1984), tornando-se necessário, para sua utilização segura, que o número de unidades de amostras seja o mesmo em todos os campos que estejam sendo comparados (Mesina 1986). Foi dado por:

onde: N = tamanho da amostra e xi = número de insetos na i-ésima unidade amostral.

O afastamento da aleatoriedade foi testado por:

onde: Id = valor do índice de Morisita; xi = número de insetos na i-ésima unidade amostral e N = tamanho da amostra.

A aleatoriedade da distribuição foi rejeitada quando:

Índice K. O expoente k é um bom índice de dispersão quando o tamanho e os números de unidades amostrais por amostra são os mesmos, pois esse índice é freqüentemente influenciado pelo tamanho das unidades amostrais. Esse parâmetro é uma medida inversa do grau de agregação, e valores negativos indicam distribuição regular ou uniforme. Valores positivos próximos de 0 indicam disposição agregada e valores superiores a 8 indicam disposição ao acaso (Pielou 1977, Southwood 1978, Elliot 1979).

A estimativa de k pelo método dos momentos é dada por:

onde: = média amostral e s2 = variância amostral.

As distribuições teóricas de freqüências utilizadas para avaliar a distribuição espacial de S. frugiperda são apresentadas em seguida:

Distribuição de Poisson. Também conhecida como distribuição aleatória, caracteriza-se por apresentar variância igual à média (s2 = µ). As fórmulas recorrentes para cálculo da série de probabilidades foram dadas por:

onde: x = classes = 1,2,3...; e = base do logaritmo neperiano (e = 2,718282...); P(x) = probabilidade de encontrar x indivíduos na amostra e = média amostral.

Distribuição Binomial Positiva. Descreve a distribuição uniforme e caracteriza-se por apresentar variância menor que a média (s2 < µ). Sua função probabilística é:

para x = 1,2,3,...,k; onde:

Distribuição Binomial Negativa. Caracteriza-se por apresentar variância maior que a média indicando, assim, distribuição agregada. Possui dois parâmetros: a média (µ) e o expoente k (k > 0), e as probabilidades foram calculadas pelas fórmulas recorrentes dadas por:

para x = 1,2,3,...

O valor de k foi estimado por:

O teste de ajuste dos dados observados às distribuições teóricas de freqüência foi verificado através do teste qui-quadrado de aderência, e consistiu em comparar as freqüências observadas na área amostral com as freqüências esperadas que são definidas, de acordo com Young & Young (1998), pelo produto das probabilidades de cada classe pelo número total de unidades amostrais utilizadas. Os valores das estatísticas do qui-quadrado calculados foram determinados por:

onde: nc = número de classes da distribuição de freqüências; FOi = freqüência observada na i-ésima classe e FEi = freqüência esperada na i-ésima classe.

Para a realização deste teste, fixou-se a freqüência esperada mínima igual a 1. O número de graus de liberdade associado à estatística X2 foi determinado por:

onde: GL = número de graus de liberdade; nc = número de classes da distribuição de freqüências; np = número de parâmetros estimados na amostra.

O critério do teste foi o de rejeitar o ajuste da distribuição estudada a 5% de probabilidade se:

onde: c2 = qui-quadrado tabelado.

Resultados e Discussão

Dinâmica populacional da praga. A população de lagartas de S. frugiperda atingiu elevados índices na área amostral durante o período de avaliação (Fig. 1). Os altos níveis de infestação chegaram a 70% de plantas infestadas com pelo menos uma lagarta e podem estar relacionados ao fato de que as áreas vizinhas aos campos de avaliação desses experimentos haviam sido cultivadas com milho no verão e, também, por não ter sido utilizada nenhuma medida de controle na área amostral durante o período de realização das amostragens. Outro fator que pode ter contribuído para o significativo aumento populacional refere-se à questão da instalação da cultura na área em estudo, a qual se deu após um longo período de estiagem (Fig. 2), o que, segundo Bianco (1991), favorece o desenvolvimento da praga, uma vez que em condição de seca os danos causados pela lagarta-do-cartucho são maiores.



Foram observadas, ainda, acentuadas variações no número total de plantas atacadas nas áreas amostradas (Fig. 1), o que reflete as oscilações populacionais comumente esperadas para a espécie na cultura do milho. Segundo Carvalho (1970), citado por Siloto (2002), após a chegada dos primeiros indivíduos adultos na área, a população permanece pequena por um curto período, aumentando rapidamente em seguida até atingir o tamanho máximo, e permanecendo assim até próximo do final do ciclo da cultura.

Esse padrão típico de crescimento populacional da espécie foi observado em todos os campos estudados. No Campo I, por exemplo, a percentagem de infestação foi crescente desde a primeira amostragem, quando apresentou 3,3% de plantas infestadas, até a sexta que apresentou o maior índice de infestação observado em todo o período de amostragem, 48,7% (Tabela 1). Na sétima amostragem a infestação diminuiu bastante, provavelmente por questões intrínsecas à biologia da praga como o seu ciclo de vida (Silva 1999). No Campo II, a variação no tamanho populacional da praga foi mais abrupta, haja vista que a percentagem de infestação foi bastante baixa até a terceira amostragem quando se detectou 4,1% de infestação, passando para mais de 50% de plantas infestadas na semana seguinte, permanecendo alta a infestação até o final do período de monitoramento. O mesmo padrão de variação no tamanho populacional de S. frugiperda foi observado no Campo III, onde nas primeiras avaliações a infestação foi baixa e, a partir da terceira data de amostragem, a percentagem de plantas atacadas variou de 21,5% até 50,3%.

Índices de dispersão. Com base nas amostragens realizadas nos três campos utilizados nesse trabalho, calcularam-se os valores dos índices razão variância/média (I), índice Morisita (Id ) e o índice K (Tabela 1). No Campo I, os valores obtidos para o índice I em quatro das sete amostragens não apresentaram diferenças da unidade, indicando um arranjo aleatório; outras duas datas de amostragem indicaram uniformidade e apenas uma indicou distribuição agregada dos indivíduos da população de S. frugiperda. No caso do índice Id , seis datas não diferiram da unidade mostrando um arranjo aleatório. No entanto, o índice I na quarta amostragem e o índice Id na quarta, quinta e sexta amostragens, apresentaram tendência à uniformidade, uma vez que os valores de ambos os índices são menores que a unidade. Os valores encontrados para o índice K demonstram distribuição uniforme nas três amostragens com as maiores médias de infestação (4ª, 5ª e 6ª amostragens) e agregação nas duas amostragens com o menor tamanho populacional (1ª e 2ª amostragens).

Os índices de agregação calculados no Campo I indicam que na maioria das amostragens os indivíduos da população da praga estudada apresentaram arranjo aleatório na área em estudo. Resultado semelhante foi descrito por Farias et al. (2001), os quais afirmam que com o desenvolvimento biológico dos indivíduos imaturos dessa espécie, há uma tendência de se arranjarem de forma aleatória na área devido à alta capacidade de dispersão, ao comportamento de canibalismo existente na espécie, a fatores de mortalidade natural, densidade populacional, atividade migratória, busca por alimento e presença de inimigos naturais.

No Campo II (Tabela 1), em quatro amostragens o índice I mostrou arranjo aleatório, pois seus valores não foram significativamente diferentes de um (01), e em outras quatro detectou-se arranjo uniforme. Ao analisar o índice Id , infere-se que em todas as amostragens em que o número de indivíduos foi suficiente para permitir a determinação do índice, os valores calculados não diferiram da unidade enquadrando a população estudada em um arranjo aleatório. Assim, os valores de ambos os índices indicam um arranjo aleatório, porém com tendência para a uniformidade, pois seus valores são menores que um. O índice K,em todas as datas de amostragem, mostrou disposição uniforme. De acordo com Barbosa (1982), em situações de alta infestação, há tendência para a distribuição uniforme. Esse comportamento deve estar relacionado com o aumento da competição intra-específica que faz com que os indivíduos de mesma população se afastem o máximo possível uns dos outros.

Na primeira amostragem realizada no Campo III, não foram encontradas lagartas uma vez que as plantas haviam recém-emergido, não sendo possível, portanto, calcular os índices de dispersão. A maioria das amostragens seguintes, no entanto, permitiu concluir para o arranjo aleatório da população, assim como nos campos anteriores.

Os resultados observados anteriormente estão em concordância com os descritos por Bianco (1995), o qual observou que a disposição espacial das plantas danificadas por S. frugiperda segue o padrão do tipo ao acaso, para baixo, moderado e alto nível de dano, enquanto que para o nível de dano muito alto, a tendência é de disposição regular.

Distribuições de freqüências. No Campo I os valores dos qui-quadrados obtidos para a população de lagartas enquadraram-se nos três modelos de distribuições teóricas de freqüência, praticamente em todas as datas de amostragem (Tabela 2). São observados valores significativos, ou seja, valores que indicam que os dados de contagem obtidos no campo não se ajustam aos modelos teóricos de distribuição considerados, em apenas duas amostragens para distribuição de Poisson (2ª e 5ª) e binomial positiva (2ª e 7ª) e em uma para binomial negativa (2ª). No âmbito da estatística ecológica o melhor ajuste é representado pela distribuição de freqüência que apresenta o menor valor do X2 calculado. Nesse caso, em apenas uma data de amostragem (4ª) houve melhor ajuste à binomial positiva, mostrando uniformidade na dispersão populacional. Nas demais amostragens, o melhor ajuste ocorreu na distribuição binomial negativa, ou seja, nessas datas a população apresentou arranjo agregado de seus indivíduos (Tabela 2).

As três primeiras amostragens realizadas no Campo II resultaram em números de classes insuficientes para realização dos testes de ajuste às distribuições teóricas de freqüências (Tabela 2). As demais amostragens nesse campo resultaram em ajuste dos qui-quadrados calculados às distribuições binomial negativa e positiva, ao passo que apenas duas datas ajustaram-se à distribuição de Poisson. Os valores dos qui-quadrados obtidos nesse campo apontam para distribuição agregada dos indivíduos da população considerada, porém com considerável tendência para a uniformidade.

No Campo III, a distribuição de Poisson foi a que apresentou o maior número de amostragens com suficiência de classes para o cálculo do qui-quadrado, ou seja, oito amostragens de um total de nove realizadas. As demais distribuições de freqüências apresentaram insuficiência de classes nas duas primeiras datas de amostragens. A distribuição de Poisson foi a que melhor representou a distribuição espacial populacional em seis amostragens realizadas (2ª, 3ª, 6ª, 7ª, 8ª, 9ª), assim como a distribuição binomial positiva (3ª, 4ª, 6ª, 7ª, 8ª, 9ª). Já a binomial negativa se ajustou aos dados obtidos nesse campo em cinco amostragens (3ª, 6ª, 7ª, 8ª, 9ª).

Barbosa (1982), Bianco (1995), Álvares & Martinez (1990) e Farias et al. (2001) trabalhando com S. frugiperda, observaram arranjo espacial agregado para lagartas pequenas, e atribuíram o resultado ao fato de a oviposição dessa praga ser realizada em massas de ovos, o que proporcionaria esse tipo de arranjo para lagartas pequenas.

O ajuste dos dados à distribuição aleatória representou mais adequadamente o arranjo espacial das populações de S. frugiperda na cultura do milho cultivado na região de Dourados, MS, quando se considera o total de lagartas encontradas na área, independente de seu estádio de desenvolvimento. Esse ajuste não se deve apenas ao fato de a distribuição de freqüências ter apresentado os menores valores de qui-quadrado, mas também ao ajuste das três distribuições teóricas de freqüência aos dados de contagem obtidos nas áreas amostrais, não se podendo, portanto, com base apenas nos testes de qui-quadrado, descartar nenhum padrão teórico de dispersão. Sendo assim, como a distribuição de Poisson apresentou menor número de amostragens com insuficiência de classes e com base nos índices de dispersão calculados (com exceção do parâmetro K), pode-se sugerir que a distribuição aleatória representa melhor o arranjo espacial das populações estudadas.

De acordo como dados observados tanto para os índices de dispersão como para os modelos teóricos de distribuições de freqüência, S. frugiperda possui um padrão de dispersão espacial definido mais adequadamente pela aleatoriedade, sendo esse modelo de distribuição muito influenciado pelo nível da infestação. As populações amostradas estão dispostas, em um primeiro momento, em um arranjo agregado quando a densidade populacional ainda é baixa, depois passa por uma aleatoriedade quando o tamanho da população começa a aumentar, até atingir distribuição uniforme quando a população atinge seu máximo tamanho. O resultado do presente estudo difere do de Farias et al. (2001), que observaram uma disposição mais uniforme para o número de plantas com pelo menos uma lagarta por parcela.

A definição do arranjo espacial de S. frugiperda na cultura do milho é fundamental para a construção do plano de amostragem em lavouras de milho, pois os planos de amostragens são fundamentados e elaborados conforme o arranjo, aleatório, agregado ou uniforme, variando, principalmente, no que se refere ao número de pontos a serem amostrados na área.

Received 28/XII/04.

Accepted 9/II/06.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Dez 2006
  • Data do Fascículo
    Out 2006

Histórico

  • Aceito
    09 Fev 2006
  • Recebido
    28 Dez 2004
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