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O DISCURSO DA (IN)FLEXIBILIDADE CURRICULAR EM ANÁLISE DIALÓGICA

THE DISCOURSE OF CURRICULAR (IN)FLEXIBILITY IN DIALOGICAL ANALYSIS

EL DISCURSO DE LA (IN) FLEXIBILIDAD CURRICULAR EN ANÁLISIS DIALÓGICO

Resumo

Este artigo objetiva analisar a reação-resposta de professores do Núcleo Docente Estruturante (NDE) de cursos de Letras de uma universidade pública ao discurso da flexibilidade curricular consignado nos documentos oficiais, com poderes de normatizar e regular os cursos de formação de professores. Sob a perspectiva da Teoria/Análise Dialógica do Discurso advinda dos estudos de Bakhtin e o Círculo, examina os Pareceres do Conselho Nacional de Educação que apresentam e fundamentam as Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Letras e para Formação Docente. Ainda analisa enunciados de professores do NDE, produzidos durante o processo de reestruturação dos cursos de Letras, discutindo as perspectivas que se apresentam para a formação docente a partir do conceito de flexibilidade. A análise dialógica evidencia que o ideário da flexibilidade curricular não se consolidou de forma efetiva nos enunciados dos sujeitos da pesquisa.

Palavras-chave:
Diretrizes curriculares; Projeto pedagógico; Flexibilidade curricular; Responsividade

Abstract

This article aims to analyze the reactions-responses of professors who belong to a Structuring Professoriate Group (Núcleo Docente Estruturante - NDE in its Portuguese acronym) from the Language Teacher Education Undergraduate Programs in a public university to the curricular flexibility discourse in official documents with powers to regulate teacher training courses. From the perspective of Bakhtin and the Circle’s Dialogical Discourse Analysis/Theory studies, it examines the National Education Board reports which present and underpin the National Curricular Guidelines for the Language Teacher Education Undergraduate programs and Teacher Training. It also has analyzed the NDE’s professors’ utterances, produced during the Language Teacher Education Undergraduate Programs, discussing the perspectives that are presented for teacher training from the flexibility concept. The dialogical analysis shows that the curricular flexibility ideology has not effectively consolidated in an effective way in the research subjects’ utterances.

Keywords:
Curricular Guidelines; Pedagogical Project; Curricular flexibility; Responsivity

Resumen

Este artículo tiene el objetivo de analizar la reacción-respuesta de los profesores del Núcleo Docente Estructurante (NDE) de los Cursos de Letras en una universidad pública al discurso de la flexibilidad curricular consignado en los documentos oficiales con poderes de reglamentar y regular los cursos de formación de profesores. Por la perspectiva de la Teoría/Análisis Dialógica(o) del Discurso, advenido de los estudios de Bakhtin y el Círculo, examina los Pareceres del Consejo Nacional de Educación que presentan y fundamentan las Directrices Curriculares Nacionales para los Cursos de Letras y para la Formación Docente. También analiza los enunciados de los profesores del NDE, producidos durante el proceso de reestructuración de los cursos de Letras, discutiendo las perspectivas que se presentan para la formación docente, desde el concepto de flexibilidad. El análisis dialógico muestra que el ideario de la flexibilidad curricular no se ha consolidado de manera objetiva en los enunciados de los sujetos de la investigación.

Palabras-llave:
Directrices Curriculares; Proyecto pedagógico; Flexibilidad curricular; Responsividad

1 INTRODUÇÃO

Este artigo apresenta um recorte de nossa tese de doutorado que objetivou compreender a complexidade do processo de reforma de Cursos de Letras na esfera acadêmica, a partir da análise dialógica de discursos oficiais da educação e de discursos de professores que integram o Núcleo Docente Estruturante (NDE) de cursos de Letras de uma universidade pública, responsáveis pela reformulação dos Projetos Pedagógicos dos Cursos1 1 Doutorado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem, realizado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação da Profa. Dra. Beth Brait. . Neste trabalho, analisamos a reação-resposta desses professores ao discurso da flexibilidade curricular consignado nos Pareceres do Conselho Nacional de Educação (CNE) que fundamentam as Diretrizes Curriculares para os Cursos de Letras e Diretrizes Curriculares para a Formação Inicial e Continuada dos Profissionais do Magistério da Educação Básica. Para tanto, além dos Pareceres, examinamos o Projeto Pedagógico do Curso de Letras Português e Literatura reformulado pelos professores do NDE e os discursos-respostas desses professores às questões de uma entrevista coletiva realizada. A partir de uma perspectiva bakhtiniana acerca dos fenômenos da linguagem, examinamos esses enunciados, entendidos como um conjunto de signos verbais produzidos por sujeitos sociais historicamente situados, apoiando-nos nos conceitos de discurso/relações dialógicas, compreensão/resposta (responsividade), assim como no conceito dialógico geral de linguagem.

Com vista à consecução dos objetivos, iniciamos apresentando o aporte teórico que guiou a análise dialógica dos discursos, bem como a metodologia adotada no trabalho. A seção analítica se desdobra em resultados da análise dos discursos oficiais acerca da flexibilidade, enquanto princípio de organização curricular, e análise dos discursos dos sujeitos da pesquisa, enfocando sua reação-resposta àqueles discursos. Após, apresentamos as considerações finais.

2 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO

A fundamentação teórico-metodológica deste artigo insere-se na Teoria/Análise Dialógica do Discurso - ADD (BRAIT, 2008BRAIT, B. Análise e teoria do discurso. In: BRAIT, B. Bakhtin: Outros conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2008.), advinda dos estudos de Bakhtin e do Círculo, que considera como essência da linguagem o fenômeno da interação discursiva, de qualquer tipo, não sendo somente a “presencial, face a face, mas as variadas e diferenciadas formas e graus de interação eu/outro, de interação polêmica de consciências, de cruzamento de ideias, valores, discursos e/ou ideologias em tensão” (BRAIT, 2017, p. 8). Isso significa dizer que, na amplitude postulada pela teoria, a linguagem em uso é vista como um diálogo infindável, uma vez que parte de diversos enunciados já ditos no meio social, encontrando o interlocutor que lhe dará sempre um novo sentido.

Sob essa perspectiva, a unidade real da comunicação discursiva é o enunciado, proferido “num contexto cultural e semântico-axiológico (científico, artístico, político, etc.) ou no contexto de uma situação isolada da vida privada” (BAKHTIN, 2014BAKHTIN, M. O discurso no romance. In Questões de literatura e de estética: a teoria do romance. 3. ed. Trad. Aurora Fornoni Bernardini et al. São Paulo: Unesp, 2014 [1934-1935]. , p. 46). Nesse sentido, a linguagem só pode ser analisada na sua complexidade quando for entendida como fenômeno sócio-histórico-ideológico realizado por meio do enunciado que aflora da comunicação verbal concreta e não no “sistema linguístico abstrato das formas da língua nem no psiquismo individual dos falantes” (VOLÓCHINOV, 2017, p. 220). Esse aspecto nos leva a considerar que os enunciados dos professores do NDE e os Pareceres que estabelecem as Diretrizes não podem ser desvinculados de seu contexto de produção ou tomados como um fenômeno puramente linguístico, sob pena de perderem sua valoração e deixarem de significar, passando a ser apenas uma forma linguística abstrata.

Outro aspecto relevante nos estudos de análise dialógica do discurso é o entendimento de que os enunciados são plenos de atitudes responsivas a outros enunciados de dada esfera social. Tal pensamento remete aos conceitos de compreensão e resposta (responsividade), que muito interessa ao percurso analítico deste trabalho. Para Bakhtin (2014BAKHTIN, M. O discurso no romance. In Questões de literatura e de estética: a teoria do romance. 3. ed. Trad. Aurora Fornoni Bernardini et al. São Paulo: Unesp, 2014 [1934-1935]. , p. 90), “a compreensão e a resposta estão fundidas dialeticamente e reciprocamente condicionadas, sendo impossível uma sem a outra”. O teórico sublinha que a palavra do outro coloca diante do indivíduo a tarefa especial de compreendê-la. Nesse ponto de vista, o ouvinte, ao perceber e compreender o significado do discurso, passa a ocupar, em relação a ele, uma ativa posição responsiva que ocorre sempre concomitantemente ao ato discursivo do locutor, formando-se “ao longo de todo o processo de audição e compreensão desde o seu início, às vezes literalmente a partir da primeira palavra do falante” (BAKHTIN, 2011bBAKHTIN, M. O autor e a personagem na atividade estética. In: BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. Tradução de P. Bezerra. 6.ed. São Paulo: Martins Fontes , 2011b. p. 3-192 [1920/1922]., p. 271). Em outros termos, o ouvinte expressa sua posição de concordância ou discordância (total ou parcialmente) frente ao conteúdo do enunciado. Assim, “toda compreensão da fala viva, do enunciado vivo é de natureza ativamente responsiva [...] toda compreensão é prenhe de resposta, e nessa ou naquela forma a gera obrigatoriamente: o ouvinte se torna falante” (BAKHTIN, 2011b, p. 271). Aproximando-nos das considerações de Volóchinov (2017), podemos afirmar que compreender o discurso do outro é ter uma orientação em relação ao que foi dito, é encontrar o seu lugar apropriado no contexto correspondente. Assim, não há compreensão sem uma antipalavra, no dizer de Volóchinov (2017, p. 232), isto é, sem resposta.

Essa visão está associada a outro prisma da análise dialógica do discurso que é considerar o enunciado como instância da expressão do posicionamento valorativo do locutor frente ao objeto de seu discurso. Tal posição axiológica é um pensar que entona, que expressa o tom emocional-volitivo do autor, o qual pode refletir e refratar em seu discurso os tons e ecos de palavras alheias, cujo tom valorativo assimila, reelabora e reacentua (BAKHTIN, 2011, 295). Esse pressuposto orienta a análise dos Pareceres que fundamentam as Diretrizes, buscando apreender os sentidos de flexibilidade curricular. Entendemos que os sentidos não nascem ao acaso, mas de relações estabelecidas ideologicamente entre sujeitos numa dada situação de interação verbal. Sob essa óptica, e considerando que os sentidos, a partir da perspectiva dialógica, não se reduzem a uma só possibilidade, apesar de em certos contextos enunciativos haver sentidos dominantes, a nossa compreensão ativa da dimensão flexibilidade curricular no âmbito dos Pareceres que estabelecem as Diretrizes Curriculares para os cursos de Letras e para os cursos de Formação Docente, por se tratar de construção de sentidos, certamente provocará novas compreensões.

Uma vez que a natureza do enunciado é dialógica, a responsividade dos professores do NDE ao discurso da flexibilização curricular consignado nos Pareceres será analisada a partir do estabelecimento de relações dialógicas, que são relações discursivas, que fazem parte da natureza da vida concreta da linguagem, cuja dinâmica pode resultar em convergências ou divergências. Faz-se mister ressaltar que as relações dialógicas não estão nos textos em si, mas são delimitadas, apreendidas a partir do ponto de vista do observador, do pesquisador. É ele quem vai captar, desvelar as relações dialógicas existentes entre os textos, discursos, que podem ser harmônicas ou polêmicas, abertamente polêmicas ou veladamente polêmicas. Assim sendo, analisaremos a reação-resposta dos professores do NDE ao discurso da flexibilidade curricular a partir do estabelecimento de relações dialógicas entre os enunciados produzidos por esses professores (Projeto Pedagógico de Curso e respostas às questões da entrevista realizada) e os Pareceres do CNE que fundamentam as Diretrizes Curriculares para os cursos de Letras e Formação docente, verificando se há uma confrontação ou convergência de sentidos entre os seus mais diversos posicionamentos.

Sob esses pressupostos, formulamos nosso percurso de pesquisa a partir das orientações de Volóchinov (2017, p. 220), assim como dos pressupostos da Teoria/Análise Dialógica do Discurso (BRAIT, 2008BRAIT, B. Análise e teoria do discurso. In: BRAIT, B. Bakhtin: Outros conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2008.), buscando compreender as formas e tipos de interação discursiva com relação a suas condições concretas, bem como as formas dos enunciados em relação estreita com a interação da qual são parte para, por fim, realizar a revisão das formas da língua em sua concepção linguística habitual.

Para a análise do caráter de responsividade dos enunciados dos integrantes do NDE dos cursos de Letras estudados aos discursos da flexibilidade curricular que atravessam os documentos oficiais, é indispensável, antes, estudarmos tais discursos. Assim, analisaremos, num primeiro momento, os Pareceres CNE/CES n. 492/2001 e CNE/CP n. 2/2015, que fundamentam, respectivamente, as Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Letras (DCL) e as novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial e Continuada dos Profissionais do Magistério da Educação Básica (NDCF), focalizando o posicionamento valorativo dos enunciadores com relação à flexibilidade como princípio organizador do currículo. Posteriormente, analisaremos os enunciados dos professores do NDE: Projeto Pedagógico do Curso de Letras Português e Literatura e as antipalavras da entrevista coletiva. Os sujeitos participantes da pesquisa foram cinco professores que integram o Núcleo Docente Estruturante de quatro cursos de Letras de uma universidade pública, que tinham a função de reestruturar os Projetos Pedagógicos dos cursos. Partindo, então, desse percurso traçado, passemos à análise dos Pareceres.

3 SENTIDOS DE FLEXIBILIDADE CURRICULAR NOS DOCUMENTOS OFICIAIS

Nesta seção, investigamos o Parecer CNE/CES n. 492/2001, que fundamenta as Diretrizes Curriculares para os Cursos de Letras (DCL), e o Parecer CP n. 2/2015, que estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial e Continuada dos Profissionais do Magistério da Educação Básica (NDCF), com o objetivo de compreender os sentidos de flexibilidade curricular que emergem dos seus discursos. Faz-se mister destacar que tal procedimento analítico, sendo de natureza eminentemente discursiva, se dá a apreender, habitualmente, na relação do enunciado com o contexto discursivo e suas ideias-força e não de forma restrita por delineamento patente na superfície linguística.

O Parecer CNE/CES 492/2001, que apresenta as Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Letras (DCL), destaca como um dos princípios norteadores da proposta de Diretrizes Curriculares para os cursos de Letras a flexibilidade na organização do curso. No bojo desse documento, esse conceito é entendido como adaptação dos currículos às necessidades profissionais e às demandas do mercado de trabalho, como podemos constatar a seguir.

Na introdução do Parecer CNE/CES 492/2001, há as seguintes prescrições:

Os cursos de graduação em Letras deverão ter estruturas flexíveis que:

facultem ao profissional a ser formado opções de conhecimento e de atuação no mercado de trabalho;

criem oportunidade para o desenvolvimento de habilidades necessárias para se atingir a competência desejada no desempenho profissional;

deem prioridade à abordagem pedagógica centrada no desenvolvimento da autonomia do aluno;

promovam articulação constante entre ensino, pesquisa e extensão, além de articulação direta com a pós-graduação;

propiciem o exercício da autonomia universitária, ficando a cargo da Instituição de Ensino Superior definições como perfil profissional, carga horária, atividades curriculares básicas, complementares e de estágio (BRASIL, 2001, p. 29).

As orientações de como devem ser as estruturas curriculares, tendo como eixo a flexibilidade, apontam, no fragmento, para duas direções: uma voltada para o mercado de trabalho, de modo que os cursos possibilitem ao profissional “opções de conhecimento e de atuação no mercado de trabalho”, bem como o “desenvolvimento de habilidades necessárias para se atingir a competência desejada no desempenho profissional”, e outra relacionada com questões de ordem acadêmico-pedagógica, como “prioridade à abordagem pedagógica”, promoção de “articulação constante entre ensino, pesquisa e extensão, além de articulação direta com a pós-graduação” e, por fim, o exercício da autonomia universitária.

Mais adiante, no mesmo parecer, lemos:

A flexibilização curricular, para responder às novas demandas sociais e aos princípios expostos, é entendida como a possibilidade de:

eliminar a rigidez estrutural do curso;

imprimir ritmo e duração ao curso, nos limites adiante estabelecidos;

utilizar, de modo mais eficiente, os recursos de formação já existentes nas instituições de ensino superior (BRASIL, 2001, p. 29).

O primeiro aspecto que chama a atenção no fragmento é a concepção de flexibilidade manifestada, que é vista como meio para a eliminação da “rigidez estrutural do curso” e responsável por lhe imprimir ritmo. Essa perspectiva adotada pelo enunciado evidencia uma preocupação com a rápida formação do licenciando em Letras e sua consequente inserção no mercado de trabalho. Isso leva a entender que os sujeitos envolvidos na reformulação de cursos devem pensar em desenhos curriculares que provoquem percursos formativos diferenciados dos tradicionais, com relações mais sutis entre os seus componentes, além de proporcionar tempos e espaços diversos para a concretização do processo educativo. Nesse sentido, a reforma curricular deve buscar a eficiência, o bom desempenho, e a noção de flexibilidade passa a ser adotada como sinônimo de inovação e, principalmente, de possibilidade.

A percepção imediatista do currículo ganhou força quando a Resolução CNE/CP 2/2002 possibilitou às instituições a integralização do curso em apenas 3 (três) anos letivos2 2 A Resolução CNE/CP 2/2002 foi revogada pela Resolução CNE/CP N. 2/2015, que estabelece a integralização dos cursos de Formação de Professores em no mínimo 4 (quatro) anos (BRASIL, 2002). . Esse indicativo, aliado à orientação presente nas DCL, ao tomar o conceito de flexibilidade como nuclear para a formação de professores, endossa um processo formativo que se caracteriza pela banalização e pelo aligeiramento do ensino (KUENZER, 2015KUENZER, A. Z. O que muda no cotidiano da sala de aula universitária com as mudanças no mundo do trabalho? In: CASTANHO, S.; CASTANHO, M. E. (Org.). Temas e textos em metodologia do ensino superior. Campinas, SP: Papirus, 2015 [2002].). É preciso, com isso, destacar que os (re)estruturadores dos cursos, bem como os demais sujeitos da esfera acadêmica, devem atentar para o fato de que uma formação rápida não significa uma formação de qualidade.

A estreita relação entre flexibilização curricular e demandas do mercado é contrária à ideia defendida historicamente pelos educadores, segundo a qual a flexibilidade pressupõe uma opção que não apenas valoriza os sujeitos da esfera educacional, a autonomia da instituição, do professor e do aluno, como também assegura o papel da IES na produção e socialização do conhecimento, abrindo a possibilidade, entre outros aspectos, de (re)formulação e implementação de projetos pedagógicos orientados por concepções inovadoras e diferenciadas de formação do licenciando (VEIGA, 2012VEIGA, I. P. A. Educação Básica e Educação Superior: Projeto Político-Pedagógico. São Paulo: Papirus Editora, 2012.). Por conseguinte, observa-se que o sentido do termo “flexibilidade” perde sua essência quando consideramos o posicionamento manifestado nos excertos acima.

Em sintonia com a perspectiva bakhtiniana, entendemos que as DCL, como todo enunciado, pressupõem a situacionalidade. Isso quer dizer que elas foram determinadas pelas condições reais de sua produção, isto é, pela situação social mais próxima (VOLÓCHINOV, 2017). Assim sendo, do ponto de vista bakhtiniano, a nova situação social em que o termo flexibilidade foi empregado tem influência sobre seu sentido apreendido nas Diretrizes. Dito de outro modo, esses signos (palavras) indicam uma concepção pedagógica ressignificada em função do contexto político-econômico, em que a intervenção do governo brasileiro nas Diretrizes para formação docente é conduzida com base em medidas de reordenamento das Instituições de Educação Superior e em conformidade com a política internacional que orienta diversos ajustes nos setores sociais do país (SHIROMA; GARCIA; CAMPOS, 2011SHIROMA, E. O.; GARCIA, R. M. C.; CAMPOS, R. F. Conversão das “almas” pela liturgia da palavra: uma análise do discurso do Movimento Todos pela Educação. In: BALL, S.; MAINARDES, J. (Org.). Políticas educacionais: questões e dilemas. São Paulo: Cortez, 2011.; MOTA JÚNIOR; MAUÉS, 2014MOTA JÚNIOR, W. P. da M.; MAUÉS, O. C. O Banco Mundial e as políticas educacionais brasileiras. Educação & Realidade, Porto Alegre, v. 39, n. 4, p. 1137-1152, out./dez. 2014. Disponível em: Disponível em: http://www.ufrgs.br/edu_realidade . Acesso em: 20 maio 2015.
http://www.ufrgs.br/edu_realidade...
). Ademais, além de a ressignificação do termo operar no curso da projeção sócio-histórico-cultural, opera também na interação contínua com os enunciados do outro. Nesse horizonte, configura-se o caráter ideológico voltado ao contexto extraverbal como parte constitutiva dos enunciados (VOLÓCHINOV, 2017).

No âmbito das DCL, flexibilizar o currículo significa criar estratégias para tornar os currículos viáveis e mais adequados à dinâmica do mercado de trabalho. É associada, portanto, a uma percepção de empregabilidade, em que se priorizam formações mais pragmáticas com vistas a produzir subjetividades coerentes com a produção e com a competitividade, características próprias do paradigma da flexibilização de feitio neoliberal. Faz-se mister destacar que, na esfera educacional, há uma recorrente crítica a esse ideário de flexibilização curricular.

Com relação ao sentido do exercício da autonomia universitária, cabe ressaltar que o termo flexibilidade está comprometido no Parecer que apresenta as DCL, revelando certas contradições, à medida que constatamos que já estão definidos, no todo do enunciado, as habilidades, as competências, o perfil do egresso, pressupondo um modelo de curso e de currículo que possa dar conta da formação considerada ideal pelos enunciadores. Em virtude disso, ao mesmo tempo que o documento defende a flexibilidade, entendida como autonomia/liberdade na elaboração do currículo, estabelece qual deve ser o resultado final do processo, deixando implícita a ideia de que se trata de um mecanismo guiado por uma lógica bastante inflexível.

Ao verificarmos como as DCL dialogam com as novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial e Continuada dos Profissionais do Magistério da Educação Básica (NDCF), aprovadas em 2015, no que tange ao paradigma da flexibilidade curricular, constatamos que não há qualquer referência a esse conceito no Parecer CNE/CP n. 2/2015 que as fundamenta e as apresenta. Contudo, é preciso frisar que, apesar de o discurso da flexibilização curricular não se apresentar explicitamente no texto, ele o influencia ativamente. Ou, nas palavras de Bakhtin (2013BAKHTIN, M. Problemas da poética de Dostoiévski. Trad. Paulo Bezerra. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2013 [1963]., p. 225), “a sensação da presença desse discurso lhe determina a estrutura”.

No Parecer, fica marcada a necessidade de flexibilização curricular, quando os enunciadores estabelecem “200 (duzentas) horas de atividades teórico-práticas de aprofundamento em áreas específicas de interesse dos estudantes” (BRASIL, 2015a). Tal componente imprime flexibilidade aos currículos dos cursos por dinamizar o processo ensino-aprendizagem e possibilitar diferentes oportunidades educativas para os licenciandos. Nessa óptica, as propostas dos cursos podem incorporar a possibilidade de o estudante escolher, dentre um conjunto de atividades, algumas previstas pelo Projeto Pedagógico de Curso como relevantes para a formação, computando créditos para a integralização do curso. Desse modo, tais propostas pedagógicas vão além da concepção de currículo como o conjunto de disciplinas centralizadas na área básica e específica do curso, organizadas rigidamente, e passam a valorizar a autonomia de o universitário escolher, dentre uma série de experiências, aquelas que passarão a fazer parte de seu percurso acadêmico.

O não pronunciamento do termo flexibilidade na materialidade discursiva do Parecer CNE/CP n. 2/2015 é uma resposta às vozes que combateram fortemente tal princípio de organização curricular, visto como eixo do movimento das políticas neoliberais, voltadas às demandas do setor produtivo. Apesar de seu conceito ficar patente no documento no estabelecimento de 200 horas para atividades de perfis flexíveis, cabe ressaltar que o modelo pedagógico proposto nas DCL, centrado na estreita relação entre currículo flexível e empregabilidade, é negado no Parecer de 2015.

A crítica ao discurso da flexibilidade ocorre mais fortemente por esse conceito reforçar o aligeiramento do ensino, colocando em risco a sólida formação teórica na esfera do conhecimento específico, imprescindível à formação científica e crítica dos futuros professores. Um dos maiores críticos de tal conceito é o relator do Parecer em análise (Parecer CNE/CP n. 2/2015), Luiz Fernandes Dourado, que destaca o papel central do ideário da flexibilização curricular nas reformas educacionais consubstanciadas na LDB e em outros documentos oficiais, afirmando que esse conceito encontra fundamentação “sobretudo, na ótica da esfera privada, tendo a ver com a lógica empresarial e mercadológica na constituição da nova ordem econômica mundial” (DOURADO; OLIVEIRA, 1999DOURADO, L. F.; OLIVEIRA, J. F. Políticas educacionais e reconfiguração da educação superior no Brasil. In: DOURADO, L. F.; CATANI, A. M. (Org.). Universidade pública: políticas e identidade institucional. Campinas: Autores Associados; Goiânia: Editora da UFG, 1999., p. 10). Assim, tendo em vista o próprio posicionamento do autor e a atitude responsiva de seus interlocutores, o discurso da flexibilidade tal como presente nas DCL não encontrou eco no Parecer de 2015.

Na próxima seção, verificaremos como os discursos materializados nesses pareceres, no que diz respeito à flexibilidade curricular, são compreendidos e implementados pelos integrantes do NDE no contexto de reestruturação dos cursos de Letras.

4 RESPOSTAS AO DISCURSO DA FLEXIBILIDADE CURRICULAR

Esta seção é dirigida às análises dos enunciados dos professores do Núcleo Docente Estruturante (NDE), produzidos durante o processo de reestruturação dos cursos de Letras da Instituição pesquisada. Nossa inserção reflexiva no contexto do NDE desses cursos visa analisar como os enunciados dos professores que o integram respondem aos discursos da flexibilidade curricular consignados nos documentos oficiais analisados na seção anterior. Para tanto, examinamos o Projeto Pedagógico do curso de Letras Português e Literatura reformulado pelos sujeitos da pesquisa e suas antipalavras na entrevista coletiva realizada. Concentrar-nos-emos nos conceitos bakhtinianos de discurso/relações dialógicas - relações de convergência ou divergência -, em sua vinculação com o conceito de responsividade.

4.1 TENSÕES DISCURSIVAS NO PROJETO PEDAGÓGICO O CURSO DE LETRAS PORTUGUÊS E LITERATURA

Por retratar os parâmetros norteadores da prática pedagógica, o Projeto Pedagógico de Curso (PPC) é um dos documentos analisados pelo Ministério da Educação (MEC) tanto para fins de autorização quanto de reconhecimento de curso. Em 2010, a Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (CONAES) aprovou a Resolução n. 1/2010, que delega ao Núcleo Docente Estruturante a função de reestruturar, implementar e avaliar esse instrumento. A ideia é a de que o acompanhamento do Projeto Pedagógico de Curso (PPC) deve se dar de forma participativa por um grupo de professores “que, poder-se-ia dizer, é a alma do curso” (BRASIL, 2010).

Neste trabalho, consideramos o Projeto Pedagógico do Curso de Letras Português e Literatura (PPCP), reestruturado no período de 2013 a 2015, resultante de um tipo de interação, realizado por sujeitos sócio-historicamente situados, os professores do NDE, cujo discurso é atravessado pelas escolhas educacionais, teórico-metodológicas e ideológicas, refletindo e refratando o momento que vivem.

Constatamos, em nossas análises, que o discurso da flexibilização, constante nas Diretrizes, mais especificamente nas DCL, ecoa nesse documento, expressando-se claramente na seleção abaixo, extraída da Introdução:

Com o Programa de Licenciaturas Internacionais (PLI), estudantes de diversas áreas, incluindo os de Letras, podem se capacitar no exterior recebendo bolsas de estudos. Por meio desse programa, a partir de 2013, alunos do Curso de Língua Portuguesa/Literatura já vivenciam a vida acadêmica em universidade francesa e mexicana.

O Programa Ciências sem Fronteiras, por sua vez, promove a consolidação, expansão e internacionalização da ciência e da tecnologia por meio de intercâmbio e da mobilidade internacional.

[...] o corpo docente dos cursos de Letras, levando em consideração esse movimento, ao longo do ano de 2013 e de 2014, se reuniu em colegiados ampliados e em suas áreas para discussão de alterações à matriz curricular dos cursos a fim de poder atender a essa mobilidade acadêmica internacional, visando à flexibilização de modalidade de oferta que permitisse o melhor aproveitamento de disciplinas no retorno e sua reintegração ao curso de origem sem prejuízos para sua conclusão.

Assim, este documento aponta novas mudanças para os próximos anos (2016 a 2020), propostas pelo corpo docente dos cursos de Letras, sob a coordenação do Núcleo Docente Estruturante (NDE), ao longo do ano de 2013 e 2014 (PPCP, 2015, p. 10-12, grifo nosso).

Nos excertos, os enunciadores destacam que a causa da alteração da matriz curricular do Curso de Letras Português e Literatura está relacionada ao atual cenário mundial de internacionalização da ciência, mais culturalmente diversificado, mais exigente de estruturas curriculares que facilitem a mobilidade dos estudantes. O documento aponta, assim, “mudanças para os próximos anos (2016 a 2020)”, com “flexibilização de modalidade de oferta”, a fim de permitir ao aluno que sai em mobilidade acadêmica “o melhor aproveitamento de disciplinas no retorno e sua reintegração ao curso de origem sem prejuízos para sua conclusão”.

Indubitavelmente, essa nova realidade de ensino e aprendizagem exige a mudança do currículo tradicional e disciplinarmente rígido para formas mais flexíveis de organização curricular. Dada essa circunstância, a reformulação dos Projetos Pedagógicos dos Cursos fazia-se necessária. Nessa mesma direção, no item “Justificativa da Reestruturação do Projeto Pedagógico de Curso (PPC)”, há o seguinte posicionamento:

Atento à dinâmica das demandas de formação que atendam aos tempos em que vivemos, o corpo docente, orientado pelo NDE, vem propor novo curso, cujas disciplinas serão oferecidas semestralmente, sob o regime de créditos, a partir de 2016, com 3360 horas, distribuídas em 2752 teórico-práticas, 400h de PCC, e 200h de Atividades Complementares (PPCP, 2015, p. 14, grifo nosso).

Conforme o fragmento, no novo curso proposto pelos professores/NDE, as “disciplinas serão oferecidas semestralmente, sob o regime de créditos”. Ocorre que na estrutura curricular que estava em vigência, do Projeto Pedagógico de 2009, o regime do curso é o seriado com periodicidade anual. O regime seriado, de acordo com a Resolução CONSEPE N.º 14/99 da instituição pesquisada, consiste na organização das disciplinas em séries de tal forma que sejam, naturalmente, preparatórias para as séries subsequentes. A nova proposta retoma o regime de crédito, com periodicidade semestral, que já havia sido adotado no curso. Nesse regime, o curso oferece um elenco de disciplinas a partir das quais o aluno pode fazer sua matrícula. É um sistema mais flexível, na percepção de seus defensores, visto que permite ao aluno organizar seu curso conforme suas necessidades, sua disponibilidade.

Sem entrar na questão das vantagens, desvantagens e incongruências dos dois regimes, o que percebemos, nessa mudança, é a atitude responsiva dos sujeitos da pesquisa e do corpo docente do curso de concordância com o discurso da flexibilização curricular presente nas DCL, como analisamos na seção anterior, assim como com os discursos institucionais de incentivo à adoção do regime de crédito, manifestados na Resolução CONSEPE n. 118/2014, da universidade pesquisada, que dispõe sobre a elaboração e reelaboração de Projeto Pedagógico de Curso de Graduação. Assim, o posicionamento dos sujeitos da pesquisa se estabelece na inter-relação com as vozes do MEC e da administração superior da instituição com as quais dialogam.

A resposta de aceitação do discurso da flexibilização curricular se manifesta também no excerto em análise, quando constatamos o estabelecimento de 200 horas para atividades complementares, em conformidade com o Parecer CNE/CP n. 2/2015, que fundamentam as NDCF.

O regulamento das atividades complementares que se encontra anexo ao PPCP define tais atividades como componentes curriculares obrigatórios, caracterizando-se pelo “conjunto das atividades de formação que proporcionam o enriquecimento acadêmico, científico e cultural necessário à constituição das competências e habilidades requeridas dos profissionais de ensino” (PPCP, p. 178). Almeja-se que esse componente curricular possibilite a autonomia do licenciando, dando-lhe mais liberdade para escolher a organização de sua vida acadêmica e, conforme seus interesses, desenvolver atividades oferecidas por outros cursos da instituição, assim como de outras instituições para integralizar seu currículo.

Nessa óptica, o novo currículo do Curso de Letras Língua Portuguesa e Literatura passaria a valorizar e contabilizar créditos a um conjunto de vivências que vão além dos limites da matriz de disciplinas do curso, asseverando, entre outros aspectos, um dos princípios presentes nas Diretrizes, que diz respeito à realização de estudos e de atividades complementares com características interdisciplinares, a fim de enriquecer e implementar o perfil profissional do professor em formação.

De acordo com o PPCP, a operacionalização dos objetivos do curso se concretiza com o cumprimento da carga horária destinada às disciplinas oferecidas ao longo de oito semestres, “contemplando conteúdos de natureza científico-cultural; conteúdos de formação didático-pedagógica e de legislação específica e conteúdos de formação integradora, os quais estão intrinsecamente relacionados à formação da identidade profissional do professor” (p. 38-39).

No que tange aos conteúdos de formação integradora, há o seguinte posicionamento:

O núcleo de conteúdos integradores é constituído por componentes curriculares obrigatórios para integralização da carga horária do curso, porém passíveis de escolha pelo acadêmico, isto é, são as disciplinas optativas de ordem linguística, literária, filosófica, sociológica, antropológica, metodológica entre outras, oferecidas em diferentes Departamentos [...]. As optativas objetivam a horizontalização do conhecimento e desenvolvem competências holísticas, permitindo um posicionamento sócio-filosófico e político frente ao estado de coisas no mundo. No curso de Letras Língua Portuguesa/Literatura, as disciplinas optativas que se referem às áreas de Língua Portuguesa e Literatura serão ofertadas alternadamente em semestres letivos, ou seja, a cada semestre uma disciplina diferente será ofertada de maneira a contemplar conteúdos diversificados, assegurando a igualdade de oportunidades e a flexibilidade de escolha de conhecimentos outros pelo acadêmico (grifo nosso).

O Quadro 1 descreve as disciplinas de conteúdos integradores que compõem esse núcleo.

Quadro 1
Disciplinas e componentes de conteúdos integradores

Os enunciadores destacam o componente optativo, como possibilidade de assegurar “a igualdade de oportunidades e a flexibilidade de escolha de conhecimentos outros pelo acadêmico”. Nessa lógica, dentre os conteúdos integradores, o aluno poderia escolher aqueles que mais se aproximem da área de seus interesses, podendo, inclusive, cursar disciplinas em outros departamentos da instituição, dando complementaridade à formação. Para tanto, o curso oferece um rol de disciplinas, concedendo ao licenciando o direito de escolher aquela(s) de seu interesse.

Na sequência, enunciam:

A seguir, há um quadro comparativo da proposta de distribuição das disciplinas, especificando a natureza e carga horária para o curso de Letras Língua Portuguesa/Literatura, e a determinação prevista pela legislação vigente para formação no curso (PPCP, 2015, p. 43-44).

Quadro 2
Proposta curricular 2016-2020 e Legislação vigente

Ao analisarmos o Quadro 2 (quadro 8 do documento), em termos de flexibilidade, constatamos que o discurso da flexibilização por meio das optativas não se materializa de forma significativa na proposta curricular do curso. As 64 horas de disciplinas optativas são poucas, se considerarmos as 3152 horas destinadas às aulas teóricas e práticas (disciplinas obrigatórias e optativas), representando apenas 2,03% da carga horária das aulas.

De acordo com Bakhtin (2011aBAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In: BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. Trad. Paulo Bezerra. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2011a, p. 261-306 [1952-1953].), ao menos duas vozes se enunciam num enunciado, mesmo que algumas vezes elas não se revelem no fio do discurso. No quadro em análise, além das vozes do Conselho Nacional de Educação/MEC (Resolução CNE/CP n. 2/2002 e Resolução N. 2/2007) manifestadas explicitamente, percebemos também a atuação de outra voz, que podemos denominar voz da tradição, empenhada em manter a cultura organizacional da matriz com apenas uma disciplina optativa. Na matriz curricular do Projeto Pedagógico de Curso de 2009, que estava em vigência, por exemplo, o aluno deveria ocupar-se, obrigatoriamente, somente de 1 disciplina optativa. Podemos inferir que uma das causas da resistência em mudar essa realidade, certamente, é o reduzido quadro de professores do curso, o que dificulta a oferta de disciplinas não obrigatórias.

Se considerarmos a carga horária total do curso (3360 horas), incluindo as atividades complementares (208 horas), que é um componente de flexibilidade, como vimos, e adicionarmos as horas desse componente às horas das optativas, o percentual de flexibilidade no curso sobe para 8,09%. Ainda assim, esse percentual sugere que o curso precisa reduzir o número de horas de disciplinas obrigatórias e investir um pouco mais nas optativas com vistas a dar abertura para a atualização de paradigmas científicos e a variedade de formas de produção de conhecimento e desenvolvimento da autonomia intelectual e profissional do futuro professor de línguas (VEIGA, 2012VEIGA, I. P. A. Educação Básica e Educação Superior: Projeto Político-Pedagógico. São Paulo: Papirus Editora, 2012.). Para tanto, seria necessário o investimento também no quadro de professores do curso, o que esbarraria numa complexa questão política.

É preciso ficar claro, todavia, como destaca Veiga (2012VEIGA, I. P. A. Educação Básica e Educação Superior: Projeto Político-Pedagógico. São Paulo: Papirus Editora, 2012., p. 71), que a

tão alardeada flexibilidade das diretrizes curriculares não pode provocar o efeito contrário, ou seja, não se deve incorrer no risco de continuar com a rigidez imposta aos cursos acadêmicos por meio de um extenso e variado elenco de conhecimentos justapostos e superpostos.

Cabe destacar que a Resolução CNE/CP n. 2/2002 não estabelece o número de horas de disciplinas optativas, como pode parecer, se considerarmos os dados do quadro em análise.

Conforme discutimos na seção anterior, a flexibilização curricular, como princípio orientador e eixo articulador do currículo, significa, no discurso das DCL, criar estratégias para tornar os cursos de Letras mais adequados às estruturas sociais emergentes que se configuram no processo de globalização, a fim de formar profissionais dinâmicos e adaptáveis às demandas do mercado de trabalho. No Projeto Pedagógico do Curso de Letras em análise, por sua vez, o princípio da flexibilidade não está associado à adaptação dos currículos às necessidades profissionais e às demandas do mercado de trabalho, mas, sim, à possibilidade de atender a mobilidade acadêmica internacional, permitindo ao licenciando “melhor aproveitamento de disciplinas no retorno e sua reintegração ao curso de origem sem prejuízos para sua conclusão”. Percebemos aí uma relação dialógica de complementação ao discurso das DCL na medida em que os enunciadores não descartam o discurso da flexibilização curricular, reconhecendo sua importância, mas o modificam, apresentando uma justificativa diferenciada que leva em conta o contexto atual de produção do enunciado.

Por fim, a síntese a que convergem os dados levantados do PPCP aponta que o princípio da flexibilidade curricular aparece na materialidade discursiva do documento, mas não orienta efetivamente a organização curricular. Tal princípio se estabelece apenas quando possibilita ao futuro professor de línguas o aproveitamento de atividades complementares para fins de integralização curricular. Desse modo, cabe ainda ao curso ampliar a carga horária de componentes curriculares que possibilitem ao licenciando escolher livremente aqueles que atendam a seus interesses intelectuais e sociais (VEIGA, 2012VEIGA, I. P. A. Educação Básica e Educação Superior: Projeto Político-Pedagógico. São Paulo: Papirus Editora, 2012., p. 70).

4.2 ENTREVISTA COLETIVA: EMBATE ENTRE VOZES

A entrevista coletiva3 3 Para a transcrição da entrevista, seguimos algumas das codificações apresentadas por Marcuschi (2000). Os códigos usados são: [ ] fala intercalada dos professores; (+) pausa breve nos fluxos de fala; (++) pausa longa nos fluxos de fala; (( )) comentários da pesquisadora; MAIÚSCULAS, ênfase ou acento forte. Além desses códigos, utilizamos: E para entrevistadora; P01 ... P02 para os professores. realizada com os professores que integram o NDE compõe a outra parte do estudo do discurso dos sujeitos da pesquisa, representando o corpus, do qual extraímos recortes para a análise, no que diz respeito à flexibilidade enquanto princípio de organização curricular.

Ao serem questionados sobre como atribuem sentidos aos princípios que norteiam as Diretrizes Curriculares para os Cursos de Letras com relação à flexibilidade curricular, os professores assim se posicionaram:

FRAGMENTO 1

P01 - [...] é preciso dizer que não porque um documento oficial defenda e proponha uma coisa, que vai ser fácil e vai ser diretamente aplicado.

P02 - [...] Eu acho que o currículo pra mim ainda continua duro, não está flexível para que o aluno possa escolher o que ele quer fazer [...] Os alunos seguem o curso pelas disciplinas que têm. Então está tudo lá. Ele não escolhe “eu quero fazer essa disciplina com esse professor”, “eu quero ir lá na Antropologia e fazer isso”. As optativas que existem, no fundo, é uma optativa. Nós não temos professores pra ter um curso que estão pedindo aqui. São (incompreensível), pra mim não dá de fazer um curso flexível, no sentido do aluno ser mais autônomo.

[...]

P02 - [...] a gente concorda com essa teoria até de ser mais flexível o curso, mas que ainda depende de chão pra fazer isso. Uma flexibilidade curricular depende de ter mais professores. Eu não tenho a menor dúvida sobre isso. Se não houver mais professores, se não houver duas turmas, você não faz um curso ser flexível. O aluno aqui é do colégio. Entra, faz o primeiro, ano, faz o segundo, faz o terceiro como num colégio [...]

P01 se posiciona explicitamente em relação à avaliação que faz entre o que está prescrito nos documentos oficiais e o que realmente acontece na prática: “é preciso dizer que não porque um documento oficial defenda e proponha uma coisa, que vai ser fácil e vai ser diretamente aplicado”. A fala do professor vai em direção ao nosso entendimento de que a esfera universitária, assim como a escolar, possui uma força centralizadora, manifestada a partir das orientações e determinações normativas e preestabelecidas pelos órgãos oficiais, mas também preserva um outro tipo de força que interage com a primeira por meio da significação dada pela cultura acadêmica e pelas experiências dos seus sujeitos às prescrições legais. As duas forças interagem entre si e influenciam o modo de ser e de agir da comunidade acadêmica, algumas vezes alterando o movimento da força centralizadora e, outras vezes, contribuindo para sua perpetuação.

P02, por sua vez, assume uma atitude responsiva em relação à pergunta, destacando: “Eu acho que o currículo pra mim ainda continua duro, não está flexível para que o aluno possa escolher o que ele quer fazer [...] Os alunos seguem o curso pelas disciplinas que têm”. Constatamos que o sentido atribuído pelo professor ao conceito de flexibilidade está voltado para uma forma de organização do conhecimento, cuja matriz curricular não é rígida. Nesse entendimento, a flexibilidade curricular busca a efetivação de maior liberdade, tanto para licenciandos quanto para professores, para estabelecimento e desenvolvimento das ações formativas, de modo mais adaptado a diversos sujeitos inseridos em contextos instáveis. Tal compreensão é a mesma que atravessa a discursividade do Projeto Pedagógico do Curso de Letras Português e Literatura, como analisamos neste trabalho.

Assim como constatamos no PPC analisado, o princípio da flexibilidade para o professor não está associado à adaptação dos currículos às necessidades profissionais e às demandas do mercado de trabalho, conforme um dos vieses defendidos nas Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Letras. Tal flexibilidade está relacionada ao sentido de apresentar uma matriz curricular flexível “para que o aluno possa escolher o que ele quer fazer”. Nessa óptica, a flexibilidade curricular não associa a formação desenvolvida na universidade à empregabilidade.

A noção de flexibilidade manifestada pelo professor envolve uma opção filosófica que valoriza os sujeitos acadêmicos, a “autonomia do aluno”, do professor, da instituição. É a condição da efetivação de um PPC não duro, que pressupõe liberdade e mobilidade estudantil em termos de espaço, tempo e organização curricular. Não está no sentido das Diretrizes de redefinir o currículo numa perspectiva pragmática, de formar profissionais “dinâmicos”, “diante das intensas transformações que têm ocorrido na sociedade contemporânea, no mercado de trabalho e nas condições de exercício profissional” (BRASIL, 2001, p. 29). Todavia, esse princípio de flexibilidade é um imenso desafio para os Cursos de Letras: “a gente concorda com essa teoria até de ser mais flexível o curso, mas que ainda depende de chão pra fazer isso”. Constata-se na fala do professor e na materialidade linguística da matriz curricular do Curso de Letras Português e Literatura, conforme analisamos, que esse princípio não se efetivou plenamente.

O principal empecilho para a plena efetivação da flexibilidade curricular, citado pelo professor, refere-se ao reduzido quadro de professores: “uma flexibilidade curricular depende de ter mais professores. Eu não tenho a menor dúvida sobre isso”. Certamente, este é o grande dilema das universidades. Sabe-se que a escassez de recursos destinados à área social não é nenhuma novidade, tendo se agravado muito nos últimos anos. Nesse contexto, a política educacional, no conjunto das políticas sociais, vem sendo fortemente penalizada em virtude da redução de recursos necessários para seu pleno desenvolvimento. Nessa perspectiva, um quadro reduzido de professores dificulta a oferta de disciplinas não obrigatórias, destacando-se o componente optativo, que possibilita o exercício da escolha por parte do aluno. No PPC que estava em vigência, assim como nos reestruturados só existe uma optativa, o que é ratificado por P02: “as optativas que existem, no fundo, é uma optativa”.

P02 destaca que o aluno não escolhe “eu quero fazer essa disciplina com esse professor”, “eu quero ir lá na antropologia e fazer isso”. A atenção com esse olhar exotópico (BAKHTIN, 2011bBAKHTIN, M. O autor e a personagem na atividade estética. In: BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. Tradução de P. Bezerra. 6.ed. São Paulo: Martins Fontes , 2011b. p. 3-192 [1920/1922].; AMORIM, 2004AMORIM, M. O pesquisador e seu outro: Bakhtin nas ciências humanas. São Paulo: Musa, 2004.) do aluno, por meio do uso de um tipo de discurso reportado, que podemos chamar de hipotético, leva o professor a ter convicção de que a estrutura curricular do curso, tanto a que está em vigência quanto a que foi apresentada nos projetos pedagógicos reestruturados, não permite que se estude na perspectiva da flexibilidade como indutora da autonomia do aluno.

A temática da flexibilidade voltou à tona em outro momento da entrevista, quando os professores apresentavam suas posições axiológicas acerca dos desafios que se colocam aos egressos dos Cursos de Letras com as novas propostas curriculares. Observemos o fragmento 2, que trata da questão.

FRAGMENTO 2

P04 - [...] eu acho que hoje a universidade oferece MUITA oportunidade para os alunos terem uma formação mais efetiva, vamos pensar assim, (incompreensível); de dar sentido àquilo que ele faz, porque a coisa estava muito desprovida de sentido, né? Então essa atividade contínua que o PIBID ((Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência)) desenvolve, de estar na escola… Tenho visto lá, a gente vai lá pro estágio, os alunos do PIBID estão lá frequentemente. Eles interagem. Eu acho que isso é MUITO importante. A universidade está criando mecanismo, também, pra essa qualificação; e nós estamos nos apropriando. Isso está sendo bem aproveitado.

E - O curso está aproveitando. A universidade poderia oferecer, mas o curso também não aproveitar e não envolver os alunos. [P04 - Isso.] [P03 - Exatamente] Então isso está sendo feito e é um grande ganho.

P03 - Isso tem um reflexo. Todo envolvimento do aluno em projetos, quaisquer que sejam: PIBIC ((Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica)), PIBID, Tutoria, Monitora... Todo esse envolvimento [P04 - Projeto de extensão.] [P05 - A extensão. Perfeito] Todos esses projetos eles são [P02 - Estão sendo ocupados e vivenciados pelos alunos.] Isso. E eles criam um diferencial. O aluno que participa é um aluno diferente.

P04 - É um aluno diferente.

P02 - Então. É aí que o curso está sendo flexível. [E - Há, então, essa flexibilidade!?] Não é pelo curso em si de Letras só… Aí ele se sente mais autônomo, mais independente, ele vai aprendendo, né? [P03, P04, P05 - Isso]. Aprendendo a adquirir confiança.

E - Exatamente. Então é isso que se coloca enquanto flexibilidade, né? É essa integração com a extensão, com a pesquisa. Não é só ali na sala de aula. Então há uma flexibilidade curricular?

P01 - Só que nós não estamos falando do aluno que vai ingressar em 2015. Estamos falando do aluno atual.

E - Sim. Mas vai continuar nesse novo?

P04 - Na verdade, o novo PPC 2015, na verdade [P03 - Vai formalizar] Vai formalizar isso que está sendo [P02 - Já vivendo, né. Já estamos vivendo.] É.

Na fala dos professores, constatamos que os Cursos de Letras valorizam um conjunto de vivências que vão além dos limites das matrizes curriculares dos cursos e que atendem, entre outros aspectos, um dos princípios das Diretrizes que diz respeito à prática de estudos e atividades complementares com características interdisciplinaridades e opcionais, com a finalidade de enriquecer e efetivar o perfil profissional do licenciando. São exemplos apresentados por P03: a participação no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica - PIBIC; Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência - PIBID, Tutoria e Monitora.

Outras atividades, como participação em atividades de apoio acadêmico e eventos relacionados às diferentes áreas do conhecimento, aprovação em exames internacionais de proficiência em língua estrangeira, frequência e aprovação em cursos de extensão, minicursos e oficinas relacionados à área de Ciências Humanas, constituem atividades complementares, conforme detalhado no “Regulamento das Atividades Complementares”, apêndice B do Projeto Pedagógico do Curso de Letras Português e Literatura. Tais atividades são caracterizadas pelas práticas vivenciadas pelos licenciandos na universidade, nas quais existe maior autonomia do aluno na seleção das atividades que desenvolverá. P03 defende que tais atividades “criam um diferencial e que o aluno que participa é um aluno diferente”, posição essa confirmada por P04. Constatamos, assim, uma relação dialógica de ratificação entre o discurso dos professores e o discurso da legalidade, materializado nas Diretrizes analisadas.

Essa possibilidade de vivência universitária foi considerada por P02 como componente de flexibilidade do curso: “É aí que o curso está sendo flexível”. Ao ser questionado pela entrevistadora que, então, havia flexibilidade na proposta dos cursos, P02 ressalta que: “não é pelo curso em si de Letras só”. Essa ressalva está relacionada ao fato de as atividades desenvolvidas pelos alunos no PIBIC e PIBID, por exemplo, não serem uma iniciativa dos Cursos de Letras, já que estes são programas institucionais. P04, por sua vez, no início da discussão, ao valorar esse tipo de atividade (“Eu acho que isso é MUITO importante”) destaca que a “universidade está criando mecanismo, também, pra essa qualificação; e nós estamos nos apropriando”. Esse envolvimento do curso foi considerado por P04 como motivo de uma apreciação positiva: “isso está sendo bem aproveitado”.

P01 se opõe à posição da entrevistadora quando ela conclui que, considerando essas atividades vivenciadas pelos alunos fora da sala de aula, o conceito de flexibilidade permeia os cursos: “Não estamos falando do aluno que vai ingressar em 2015. Estamos falando do aluno atual”. P04, assimilando as vozes de P03 e P02, intercaladas ao seu discurso, esclarece: “Na verdade, o novo PPC 2015, na verdade [P03 - Vai formalizar] Vai formalizar isso que está sendo [P02 - Já vivendo, né. Já estamos vivendo.] É”.

Considerando os enunciados dos sujeitos da pesquisa extraídos da entrevista e do Projeto Pedagógico do Curso de Letras Português e Literatura, podemos afirmar que os aspectos flexíveis identificados estão representados por atividades complementares, na sua maioria em conformidade com a prescrição da Resolução CNE/CP n. 2/2015, que determina, dentre as dimensões dos componentes comuns, carga horária de 200 (duzentas) horas de atividades teórico-práticas de aprofundamento em áreas específicas de interesse dos estudantes, por meio da iniciação científica, da iniciação à docência, da extensão e da monitoria, entre outras.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste trabalho, analisamos a responsividade dos professores do Núcleo Docente Estruturante de uma Universidade Pública, responsáveis pela reformulação dos Projetos Pedagógicos dos Cursos de Letras da instituição, aos discursos da flexibilidade curricular, consignados nos Pareceres que fundamentam as Diretrizes Curriculares para os Cursos de Letras e para Formação de professores, sob a óptica dos pressupostos teóricos de Bakhtin e o Círculo, perscrutando, primeiramente, tais Pareceres. Dos enunciados dos sujeitos da pesquisa, examinamos o Projeto Pedagógico do Curso de Letras Português e Literatura e as antipalavras às questões de uma entrevista coletiva realizada.

A análise dialógica dos enunciados dos professores do NDE evidenciou que as oposições e relutâncias estiveram inseridos num complexo quadro discursivo de embate entre forças sociais opostas, configurando a constituição de propostas curriculares, ancoradas por horizontes valorativos adversos. Observamos que, de um lado, na discursividade do projeto pedagógico e da entrevista, há uma responsividade positiva dos enunciadores ao discurso da flexibilidade curricular defendido nas Diretrizes; de outro, na proposta curricular decorrente do documento, houve uma aceitação parcial de tal discurso (com a instituição de atividades complementares), prevalecendo os valores da voz da tradição, na construção de uma matriz curricular rígida.

Entendemos que tornar um currículo flexível pode representar, certamente, a promoção de trajetórias formativas diferenciadas e promover uma adequada relação entre o conteúdo e o método, de modo a contribuir para uma melhor formação do profissional da educação, preparado para atuar na condição de formador de cidadãos. Todavia, esse mesmo processo, dependendo da forma como é concebido e praticado, pode passar a significar uma precarização da formação do licenciando, sobretudo se for direcionado para atender, antes de tudo, às necessidades do mercado de trabalho, como constatamos no discurso que atravessa o Parecer que fundamenta as Diretrizes Curriculares para os Cursos de Letras. Cabe aos responsáveis pela elaboração, implementação e avaliação dos Projetos Pedagógicos dos cursos, numa perspectiva de gestão democrática, discutir uma possibilidade de trabalho que vise a introdução de debates que abordem a problemática do processo de reestruturação curricular, tomando as Diretrizes como uma oportunidade para discussões sobre o que nelas está posto e buscando possíveis cenários para melhorar a formação em Letras. Os princípios organizadores do currículo constantes nesses documentos devem ser um dos pontos principais da discussão, com vista a buscar caminho para a construção de projetos pedagógicos inovadores, articulados à produção crítica do conhecimento.

REFERÊNCIAS

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1

  • 1
    Doutorado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem, realizado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação da Profa. Dra. Beth Brait.

2

  • 2
    A Resolução CNE/CP 2/2002 foi revogada pela Resolução CNE/CP N. 2/2015, que estabelece a integralização dos cursos de Formação de Professores em no mínimo 4 (quatro) anos (BRASIL, 2002).

3

  • 3
    Para a transcrição da entrevista, seguimos algumas das codificações apresentadas por Marcuschi (2000). Os códigos usados são: [ ] fala intercalada dos professores; (+) pausa breve nos fluxos de fala; (++) pausa longa nos fluxos de fala; (( )) comentários da pesquisadora; MAIÚSCULAS, ênfase ou acento forte. Além desses códigos, utilizamos: E para entrevistadora; P01 ... P02 para os professores.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Maio 2019
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2019

Histórico

  • Recebido
    29 Jun 2018
  • Aceito
    29 Dez 2018
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