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EDITORIAL

Este número de EDUCAÇÃO E PESQUISA apresenta inicialmente quatro artigos que abordam diferentes aspectos da realidade escolar brasileira, cobrindo um vasto espectro que inclui o autogerenciamento de docentes em sua formação e em seu trabalho; as condições do trabalho docente e seus efeitos sobre a saúde dos professores; a formação de professoras nas Escolas Normais, a partir de um estudo histórico da disciplina Biologia Educacional; e uma análise sobre a construção do fracasso escolar relacionando-o com as atividades dos Conselhos de Classe.

O primeiro artigo, intitulado "O autogerenciamento de docentes em sua formação e em seu trabalho" é uma instigante análise fundamentada em conceitos elaborados por Michel Foucault acerca das estratégias e técnicas utilizadas nos discursos da mídia educativa brasileira voltada para a educação escolar. A autora, Marlucy Alves Paraíso, argumenta que a mídia educativa, através de meios tecnológicos diferenciados, do uso de especialistas e da produção de novas autoridades em educação, apresenta a si mesma como uma autoridade, colocando em funcionamento uma série de mecanismos que visam a ensinar aos professores como efetuar o controle sobre suas próprias condutas e sobre a conduta de seus pares. Trata-se de uma análise dos mecanismos de poder postos em prática por agentes que se autodefinem como autoridade no campo da educação e, nesta condição, visam a promover modelos de ação e de comportamento a serem seguidos pelos profissionais da educação escolar. Mostra ainda como novas autoridades vêm sendo incorporadas e criadas pelo discurso da mídia educativa hoje, no Brasil, consoante o modelo que pretendem institucionalizar.

As autoras Sandra Maria Gasparini, Sandhi Maria Barreto e Ada Ávila Assunção, da Universidade Federal de Minas Gerais, apresentam no artigo "O professor, as condições de trabalho e os efeitos sobre sua saúde", um estudo a partir de dados da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte acerca dos afastamentos de professores decorrentes de transtornos psíquicos, aspecto poucas vezes explorado pela pesquisa educacional. Mostram-nos que os transtornos psíquicos ocupam o primeiro lugar entre os diagnósticos que provocaram os afastamentos da função nos anos de 2001 e 2002, e sugerem que novos estudos sejam feitos para ampliar nossa compreensão da inadequação entre as mudanças educacionais propostas e implementadas e as condições reais de trabalho nas escolas, pois a hipótese que apresentam é que as contradições aí existentes podem estar na base desses afastamentos.

O artigo de Luciana Maria Viviani, intitulado "Formação de professoras e Escolas Normais paulistas: um estudo da disciplina Biologia Educacional", aborda, numa perspectiva histórica, o desenvolvimento dessa disciplina no âmbito das Escolas Normais, apoiando-se nos escritos teóricos de André Chervel e Ivor Goodson. Parte do pressuposto da criatividade das produções do sistema escolar, considerando suas possibilidades de reelaborar conhecimentos acadêmicos, formar indivíduos e produzir uma cultura escolar, resultando daí padrões que se estendem a outras esferas da realidade social. O estudo baseou-se em análises de programas de ensino, manuais didáticos, documentação arquivística e depoimentos de professoras. A autora identifica várias formas de organização dos conteúdos, mas ressalta em sua análise o que denomina padrão de maior sucesso, calcado no binômio hereditariedade e meio, binômio este considerado como elemento facilitador do conhecimento das individualidades humanas e do trabalho do educador, no sentido de disciplinar física e mentalmente seus alunos. Ao mesmo tempo, nos fala da construção de perfis de atuação social relativos às crianças, mães e donas de casa, a partir de um ideal de desempenho considerado moderno.

Em "O conselho de classe e a construção do fracasso escolar", Carmen Lúcia Guimarães de Mattos discute uma das formas de construção do fracasso escolar de alunos e alunas do ensino fundamental, no Estado do Rio de Janeiro, a partir dos resultados obtidos em uma pesquisa etnográfica por ela realizada em duas escolas da rede pública. A autora mostra a existência de uma orquestração de falas de professores que ratificam mutuamente suas impressões dos resultados escolares de seus alunos, baseando-se não em critérios acadêmicos de avaliação, mas em apreciações subjetivas, a partir das quais alunos e alunas são julgados. O artigo aponta para a vulnerabilidade daqueles que apresentam dificuldades educacionais frente às decisões do Conselho, o que favorece seu fracasso e sua exclusão do ensino fundamental e do sistema educacional.

A seção EM FOCO, sob o título "Educação Ambiental", apresenta cinco artigos que abordam diversos aspectos relativos à temática. A seção TRADUÇÃO complementa esse debate, apresentando "Educação ambiental: possibilidades e limitações", de autoria de Lucie Sauvé, da Universidade de Quebec.

Em nosso número anterior demos início à apresentação online da versão em inglês dos artigos da seção EM FOCO. Neste número, infelizmente, não pudemos dar continuidade a essa proposta devido à não liberação pelo CNPq de recursos já comprometidos. Assim que essa verba for liberada retomaremos esse projeto, que nos parece de fundamental importância, na medida em que significa nossa contribuição para a divulgação internacional da pesquisa em Educação produzida no Brasil.

Registramos aqui nossos agradecimentos aos autores que participam deste volume, especialmente a Pedro Jacobi, organizador da seção EM FOCO. Também não podemos deixar de mencionar a imprescindível colaboração da colega Isabel Gretel Ères Fernandéz pela revisão do texto em espanhol.

Lúcia Emilia Nuevo Barreto Bruno

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Fev 2006
  • Data do Fascículo
    Ago 2005
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