Acessibilidade / Reportar erro

Obtenção de ferritas de cálcio dopadas com cromo visando aplicação em esmaltes transparentes brilhante e mate

Obtaining calcium ferrites doped with chromium aims application in transparent and matte glazes

RESUMO

Este trabalho tem como objetivo obter óxidos com estrutura tipo espinélio de composição CaFe1,8Cr0,2O4 pelo método gelatina, visando aplicação em esmaltes transparentes brilhantes e mate. Os pós precursores, resultantes do processo de síntese, foram calcinados a 600 °C e a 800 °C para a obtenção da fase espinélio. Os pós foram caracterizados por espectroscopia na região do infravermelho, difração de raios-x, seguido por refinamento Rietveld, espectroscopia de reflectância difusa UV-visível e colorimetria CIE-L*a*b*. Em seguida, os pós foram misturados aos esmaltes transparentes brilhante e mate na proporção de 2% em peso, revestido substratos cerâmicos e, posteriormente, sinterizados a 1100 °C. De acordo com os difratogramas de raios-x, os pós possuíram estrutura espinélio ortorrômbica. As ferritas de cálcio dopadas com cromo apresentaram coloração alaranjada, sendo mais escura nos pós calcinados a temperaturas mais altas. Os resultados da esmaltação revelaram que houve compatibilidade entre o pigmento e o esmalte brilhante. Já nos esmaltes mate, houve variação abrupta da cor. O ataque por ácido clorídrico mostrou que os esmaltes preparados são altamente resistentes ao ataque químico. Por fim, este trabalho conclui que a rota gelatina foi eficiente em sintetizar óxidos com estrutura espinélio monofásicos em baixas temperaturas de síntese e que os pigmentos obtidos são viáveis para aplicação industrial.

Palavras-chave
Gelatina; Espinélios; Propriedades ópticas; Ferritas; Dopagem

ABSTRACT

This work aims to obtain oxides with a spinel type structure of composition CaFe1,8Cr0,2O4 by the gelatin method, aiming application in transparent and matte glazes glazes. The precursor powders, resulting from the synthesis process, were calcined at 600 ° C and 800 ° C to obtain the spinel phase. The powders were characterized by infrared spectroscopy, X-ray diffraction, followed by Rietveld refinement, diffuse UV-visible reflectance spectroscopy and CIE-L*a*b* colorimetry. The powders were then incorporated into the bright and matte transparent glazes in the proportion of 2% by weight, coated ceramic substrates and then sintered at 1100 °C. According to the X-ray diffractograms, the powders had an orthorhombic spinel structure. The calcium ferrites doped with chromium presented orange coloration, being darker in the calcined powders at higher temperatures. The glaze coating results showed that there was compatibility between pigment and glaze brigth. We already mate glaze, there was abrupt variation of color. The hydrochloric acid attack showed that the prepared glazes are highly resistant to chemical attack. Finally, this work concludes that the gelatin route was efficient in synthesizing oxides with a single-phase spinel structure at low synthesis temperatures and that the obtained pigments are viable for industrial application.

Keywords
Gelatin; Spinel; Optical Properties; Ferrites; Doping

1. INTRODUÇÃO

A estrutura espinélio possui formulação geral AB2O4. O sítio A é composto por elementos do grupo dos metais com estado de oxidação II, enquanto o sítio B representa um íon metálico trivalente. A estrutura ideal do espinélio possui simetria cúbica de face centrada e 96 interstícios catiônicos, sendo 64 interstícios tetraédricos e 32 octaédricos. Entretanto, somente 24 interstícios são ocupados, sendo 8 tetraédricos e 16 octaédricos [11 SILVA, M.A.F.M., SOSMAN, L.P., YOKAICHIYA, F., et al., “Neutron Powder Diffraction Measurements of the Spinel MgGa2O4:Cr3+- A Comparative Study between the High Flux Diffractometer D2B at the ILL and the High Resolution Powder Diffractometer Aurora at IPEN”, Journal of Physics Conference Series, v. 340, pp. 12-41, 2012-22 SOSMAN, L. P., FONSECA, R.J.M., TAVARES JR, A D et al., “Photoluminescence and optical absorption of Cs2NaScF6:Cr3+”, Journal of Fluorescence, v. 16, n.2, pp. 317-323, 2006.]. Há também a estrutura espinélio invertida, de modo que a quantidade de sítios tetraédricos e octaédricos se invertem [11 SILVA, M.A.F.M., SOSMAN, L.P., YOKAICHIYA, F., et al., “Neutron Powder Diffraction Measurements of the Spinel MgGa2O4:Cr3+- A Comparative Study between the High Flux Diffractometer D2B at the ILL and the High Resolution Powder Diffractometer Aurora at IPEN”, Journal of Physics Conference Series, v. 340, pp. 12-41, 2012]. Nesse sentido, a estrutura espinélio tem atraído cada vez mais atenção dos pesquisadores devido sua versatilidade de arranjo dos cátions nos sítios (normal ou invertida) bem como, devido a possibilidade de incorporação de dopagens substitucionais [33 COSTA, A.F., PIMENTEL, P.M., MELO, D.M.A., et al., “Preparação de pigmentos de aluminatos de cobalto para aplicação em vidrados cerâmicos”, Cerâmica, v. 62, pp. 179-185, 2016.].

Um dos compostos com estrutura espinélio que tem sido frequentemente estudado é o grupo das ferritas. Em geral, estes compostos resultam em pigmentos de cor avermelhada, bastante empregada na indústria cerâmica. Contudo, com a crescente demanda por pigmentos e as novas exigências tecnológicas, estudos de abrangência internacional tem sido realizado no intuito de sintetizar pigmentos com cores diversas e, principalmente, com boa qualidade [33 COSTA, A.F., PIMENTEL, P.M., MELO, D.M.A., et al., “Preparação de pigmentos de aluminatos de cobalto para aplicação em vidrados cerâmicos”, Cerâmica, v. 62, pp. 179-185, 2016.-44 DUTRA, J. L. S., DANTAS, G. C. B., PIMENTEL, P. M., et al., “Caracterização óptica e estrutural de ortoferritas de lantânio dopadas com cromo e alumínio”, Cerâmica, v.64, pp.413-417, 2018.]. Um pigmento de boa qualidade deve apresentar estabilidade química e térmica, não geração gases e flocos na superfície do esmalte [55 FURUKAWA, S., MASUI, T., IMANAKA, N. “Synthesis of new environment-friendly yellow pigments”, J. Alloys Compd., v.418, pp. 255, 2006.]. Frequentemente, essas propriedades são atribuídas à estrutura e elementos químicos que compõem os pigmentos. Entretanto, sabe-se que a rota de síntese exerce influência substancial nas propriedades finais, bem como na homogeneidade destas propriedades [66 PIMENTEL, P.M., LIMA, S.V.M., COSTA, A.F., et al., “Gelatin synthesis and color properties of (La, Pr, Nd) lanthanide aluminates”, Ceramics International, v.43, pp.6592–6596, 2017.].

A principal rota de síntese empregada na indústria é a rota cerâmica [77 ALBUQUERQE, G.B., BALLMANN, T.J.C., FOLGUERAS, M.V., et al., “Síntese de pigmento cerâmico verde com base na estrutura cristalina da wollastonita”, Matéria, v.21, n.2, pp. 355-365, 2016.]. Este método tem produzido pigmentos com propriedades heterogêneas, depreciando o valor agregado e a vida útil da esmaltação. Rotas alternativas vêm sendo utilizadas para sintetizar as ferritas, tais como, Pechine, combustão, coprecipitação e reação no estado sólido. No entanto, estas rotas estão associadas à elevada perda de material ou ainda, utilização de temperaturas de calcinação muito elevadas, inviabilizando sua reprodução em escala industrial.

Nos últimos anos, um método que vem chamando atenção é o método gelatina. Nesse método de síntese, a gelatina comestível é utilizada como agente polimerizante para a obtenção de óxidos com alta pureza e baixo custo. A gelatina é uma proteína composta por aminoácidos essenciais, substituindo os produtos tóxicos usando em outras rotas [88 COSTA, A. F., PIMENTEL, P. M., MELO, D. M. A., et al., “Síntese e caracterização de espinélios a base de ferritas utilizando gelatina como agente direcionador”, Cerâmica, v. 57, pp. 352-355, 2011.-99 PIMENTEL, P.M., BARBOSA, K.M.B., GOMES, D.K.S., et al., “Optical and structural properties of lanthanum chromite synthesized by microwave assisted selfcombustion method”, Materials Science Forum, v.881, pp.7-11, 2016.].

Dentre as principais vantagens deste método está a alta homogeneidade do material preparado, a obtenção de partículas nanométricas, além da simplicidade, do baixo custo envolvido e não geração de resíduos tóxicos [44 DUTRA, J. L. S., DANTAS, G. C. B., PIMENTEL, P. M., et al., “Caracterização óptica e estrutural de ortoferritas de lantânio dopadas com cromo e alumínio”, Cerâmica, v.64, pp.413-417, 2018.,66 PIMENTEL, P.M., LIMA, S.V.M., COSTA, A.F., et al., “Gelatin synthesis and color properties of (La, Pr, Nd) lanthanide aluminates”, Ceramics International, v.43, pp.6592–6596, 2017.]. Somando-se a isso, outra vantagem do método é a facilidade na obtenção da gelatina, visto que esta é um polímero natural, obtido pela hidrólise das fibras de colágeno, normalmente utilizando como matérias-primas as peles de origem animal e tecnologia simples e dominada pela indústria e, por essa razão, é capaz de ser produzida em larga escala [1010 VIJAYARAGHAVAN, R., THOMPSON, B.C., MACFARLANE, D.R., et al., “Biocompatibility of choline salts as crosslinking agents for collagen based biomaterials”, Chemical Communications, v.46, pp.294–296, 2010.-1111 DUCONSEILLE, A., GAILLARD, C., SANTÉ-LHOUTELLIER, V., et al., “Molecular and structural changes in gelatin evidenced by Raman microspectroscopy”, Food Hydrocolloids, v. 77, pp. 777-786, 2018.]. Não obstante, a produção mundial de gelatina alcançou a marca recorde de 412.700 toneladas em 2015, com perspectiva de crescimento cada vez mais acentuada [1212 GRAND VIEW RESEARCH. I Gelatin Market Analysis by Raw Material, Function, Application and Segment Forecasts to 2024, (June 2016 ed.)Grand View Research, Inc. 2016. Disponível em <https://www.grandviewresearch.com/industry-analysis/gelatin-market-analysis>. Acesso em: 17 de março de 2018.
https://www.grandviewresearch.com/indust...
].

Nesse contexto, diante da escassez de pesquisas de conteúdo nacional no desenvolvimento de pigmentos e rotas de síntese, este trabalho tem como objetivo obter óxidos com estrutura tipo espinélio de composição CaFe1,8Cr0,2O4 pelo método gelatina, avaliando as propriedades microestruturais e ópticas dos pós produzidos, visando aplicação em esmaltes transparentes brilhantes e mate.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

2.1 Materiais

Os materiais usados na síntese dos pós foram: nitrato de ferro (III) nonahidratado Fe(NO3)3.9H2O (Sigma-Aldrich, 98,9%), nitrato de cálcio tetrahidratado Ca(NO3)3.4H2O (Vetec, 99,8%) e nitrato de cromo hexahidratado Cr(NO3)3.6H2O (Sigma-Aldrich, 99,8%). A gelatina foi cedida pela empresa GELITA. Os esmaltes transparentes brilhantes e mate foram cedidos pela empresa Vittra. As placas cerâmicas foram fornecidas pela empresa BQMIL.

2.2 Método

Os pós foram preparados utilizando a rota gelatina, conforme descrito por outros autores [44 DUTRA, J. L. S., DANTAS, G. C. B., PIMENTEL, P. M., et al., “Caracterização óptica e estrutural de ortoferritas de lantânio dopadas com cromo e alumínio”, Cerâmica, v.64, pp.413-417, 2018.,66 PIMENTEL, P.M., LIMA, S.V.M., COSTA, A.F., et al., “Gelatin synthesis and color properties of (La, Pr, Nd) lanthanide aluminates”, Ceramics International, v.43, pp.6592–6596, 2017.,1313 OLIVEIRA, F.S., PIMENTEL, P.M., OLIVEIRA, R.M.P.B., et al., “Effect of lanthanum replacement by strontium in lanthanum nickelate crystals synthetized using gelatin as organic precursor”, Materials Letter, v.64, pp.2700-2703, 2010.

14 PIMENTEL, P.M., DUTRA, J. L. S., LIMA, A. C., et al., “Structural and magnetic characterization of LaFe1-xAlxO3 (x= 0 and 0.2) orthoferrites synthesized by gelatin method”, Materials Science Forum, v. 899, pp. 227-231, 2017.
-1515 COSTA, A.F., PIMENTEL, P.M., AQUINO, F.M., et al., “Microstructural and colour analysis of CuCrO2delafossite obtained by gelatin method”, Materials Science Forum, v.798-799, pp.160-164, 2014.]. Inicialmente, a gelatina foi misturada à água deionizada, sob agitação, até sua dissolução completa. Em seguida, foram adicionados os nitratos metálicos obedecendo a relação estequiométrica 1:1 entre gelatina/íons metálicos. Então, a mistura permaneceu sob agitação e temperatura de 70 °C até a formação de um gel, levado a mufla por 2h para eliminação da matéria orgânica inserida no processo de síntese. Em seguida, os pós precursores foram calcinados nas temperaturas previamente estabelecidas (600°C e 800°C) por 4h para obtenção da fase espinélio.

2.3 Preparações das placas cerâmicas

O esmalte foi preparado a partir de uma mistura de 2% em peso de pigmentos e 98% de esmaltes transparente brilhante (TB) e transparente mate (TM). Em seguida, os esmaltes foram utilizados para revestir o substrato cerâmico. As placas cerâmicas foram levadas a mufla por 15min a 1100 °C para sinterização.

2.4 Ataque químico

Inicialmente, as cerâmicas preparadas com os esmaltes TB e TM foram imersas em uma solução aquosa contendo 15% (V/V) de HCl e mantidas imersa por 1h. Em seguida, foram lavadas com água deionizada até pH neutro, secos e novamente submetidos a análise da cor.

2.5 Caracterização

Após a obtenção dos pós, o material foi caracterizado por meio das técnicas: difração de raios-x com refinamento Rietveld por meio do equipamento modelo XRD-6000 do difratômetro Shimadzu, operando com radiação CuKα, ângulo de 2θ variando de 10° a 80°; espectrometria na região do infravermelho utilizando o espectrofotômetro da marca Shimadzu; colorimetria por intermédio do colorímetro Gretag Macbeth color-eye 2180 e espectrometria na região do UV-Visível usando o espectrofotômetro UV-Visible Shimadzu, com reflectância acessória UV-2550 com um comprimento de onda na região de 200-900 nanômetros. A composição química dos esmaltes foi obtida por meio da espectroscopia de fluorescência de raios X utilizando o espectrômetro de fluorescência de raios-x por energia dispersiva (EDX), da marca Shimadzu, modelo EDX-720. As cerâmicas foram caracterizadas por colorimetria CIE-L*a*b*. As cerâmicas submetidas ao ataque químico foram submetidas a CIE-L*a*b*.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Figura 1 evidencia os espectros vibracionais de transmissão na região do infravermelho (2000 cm-1 a 400cm-1) para os pós de CaFe1,8Cr0,2O4. De acordo com os estudos de Reddy e Frost (2005), os óxidos com estrutura espinélio apresentam quatro bandas características: 700–650 (ƞ1); 600–500 (ƞ2); 400–300 (ƞ3); 200–150cm-1 (ƞ4). Essas bandas são características dos metais de transição com estado de oxidação II e III que, especificamente neste estudo são os íons Fe3+ e o Cr3+. Nesse sentido, observa-se na Figura 1, as bandas ƞ1 e ƞ2, correspondendo as vibrações intrínsecas dos complexos tetraédricos e octaédricos, referentes ao movimento de estiramento característico da estrutura espinélio [1616 PATIL, R. S., KAKATKAR, S. V., SANKPAL, A. M., et al., "Infrared absorption spectra of Ti4+ and Zr4+ substituted Ni–Zn ferrites" Indian. J. Pure Appl. Phys., v.32, n. 193, 1994.-1717 REDDY, B. J., FROST, R. L. “Spectroscopic characterization of chromite from the moa-baracoa ophiolitic massif, Cuba”, Spectrochimica Acta a, v.61, pp.1721, 2005.].

Figura 1
Espectros de transmissão de infravermelho das amostras de CaFe1,8Cr0,2O4

A Figura 2 apresenta os difratogramas de raios-x dos pós de ferritas de cálcio dopadas com cromo nas duas temperaturas de calcinação. A identificação das fases deu-se por meio do Refinamento Rietveld [1818 RIETVELD, H.M. “A profile refinement method for nuclear and magnetic structures”, Journal of Applied Crystallography, v.2, pp.65-71, 1969.], utilizando o software MAUD [1919 LUTTEROTTI, L. (2006). MAUD, Version 2.046, http://www.ing.unitn.it/wmaud/.
http://www.ing.unitn.it/wmaud/...
]. Os difratogramas revelaram que os pós sintetizados apresentaram estrutura cristalina tipo espinélio, com simetria ortorrômbica, conforme constatada pela carta ICSD 16695, correspondente a ferrita de cálcio sem dopagem. A quantidade de reflexões, combinada com a reflexão principal em 30° < x < 35° são característicos da estrutura espinélio, corroborando os resultados do infravermelho. O estreitamento da base da reflexão principal evidencia o aumento da cristalinidade dos pós calcinados nas mais altas temperaturas. Observa-se também que o cromo incorporou completamente na rede cristalina, uma vez que a carta utilizada é correspondente a ferrita de cálcio sem dopagem (CaFe2O4). Os pós sintetizados pela rota da gelatina foram monofásicos em ambas as temperaturas de calcinação, mostrando-se vantajoso para obtenção de ferritas de cálcio. O interesse por pós monofásicos ocorre pela necessidade dos pigmentos apresentarem propriedades homogêneas, agregando valor tecnológico e econômico, de modo a garantir qualidade, melhor desempenho e maior durabilidade do revestimento cerâmico aplicado, quando submetido aos esforços de abrasão, aos agentes químicos e solicitações físico-mecânicos.

Os parâmetros de refinamento estão ilustrados na Tabela 1. Com base nos resultados, o tamanho do cristalito aumento com a elevação da temperatura calcinação, o que é um resultado esperado, visto que a temperatura é a força impulsionadora de expansão do cristalito. O valor do refinamento foi aceitável, visto que foi inferior a 2 para ambos pós [99 PIMENTEL, P.M., BARBOSA, K.M.B., GOMES, D.K.S., et al., “Optical and structural properties of lanthanum chromite synthesized by microwave assisted selfcombustion method”, Materials Science Forum, v.881, pp.7-11, 2016.].

Figura 2
Difratogramas de raios-x dos das amostras de CaFe1,8Cr0,2O4.
Tabela 1
Parâmetros microestruturais das amostras de CaFe1,8Cr0,2O4.

A Figura 3 e a Tabela 2 apresentam os espectros de reflectância difusa e os parâmetros colorimétricos das amostras de CaFe1,8Cr0,2O4, respectivamente. A partir do estudo da formação da cor, sabe-se que é um fenômeno que ocorre devido às transições d-d, proporcionado pelo não preenchimento total dos elétrons nos orbitais d. Como o Ca2+ não possui elétrons nos orbitais d (d0), não contribui para a cor do pigmento. Nesse sentido, os íons Cr3+ e Fe3+ são os cromóforos do espinélio sintetizado, sendo o íon Fe3+ o principal contribuinte para a cor final, conforme evidenciado pela banda larga entre 450 e 700 nm no espectro de reflectância das amostras, sendo atribuída à transição 6A1g-4T2g, que é característica do íon Fe3+ em sítio octaédrico [2020 PAILHE, N., WATTIAUX, A., GAUDON, M., et al., “Correlation between structural features and vis–NIR spectra of α -Fe2O3 hematite and AFe2O4 spinel oxides (A=Mg, Zn)”, J. Solid State Chem., v.181, pp.1040–1047, 2008.

21 KUMARI, L.S., RAO, P.P., REDDY, M.L. “Environment-friendly red pigments from CeO2 – Fe2O3 – Pr6O11 solid solutions”, J. Alloy Compd., v.461, pp.509–515, 2008.
-2222 MARANHA, F.G., FIUZA, T.E.R., SOUZA, E.C.F., et al., “Synthesis and characterization of pigments of the LaAl1-xFexO3 system e Application in ceramic and polymer”, Dyes and Pigments, v.133, pp.304-310, 2016.]. Devido ao pequeno percentual de dopagem (10% de cromo) e a sobreposição das bandas do íon Fe3+, as transições do íon Cr3+ em sítio octaédrico não são observadas e, portanto, não exercem contribuição significativa na cor alaranjada do pigmento. Esses resultados são corroborados pelos parâmetros colorimétricos CIE-L*a*b* da Tabela 2. Além disso, de acordo com estes parâmetros, os pós calcinados nas temperaturas em 1000 °C são mais escuros. Esse comportamento é justificado pelo aumento do tamanho do cristalito (Tabela 1) que reduz a superfície de reflexão da luz do iluminante, resultando em um deslocamento da luminosidade L para o preto [66 PIMENTEL, P.M., LIMA, S.V.M., COSTA, A.F., et al., “Gelatin synthesis and color properties of (La, Pr, Nd) lanthanide aluminates”, Ceramics International, v.43, pp.6592–6596, 2017.]. Observa-se também que os pós apresentaram ΔE0 inferior a 10, revelando a estabilidade térmica dos pós sintetizados pelo método gelatina.

Figura 3
Espectros de reflectância difusa das amostras de CaFe1,8Cr0,2O4.
Tabela 2
Colorimetria CIE-L*a*b das amostras de CaFe1,8Cr0,2O4.

A Tabela 3 evidencia as coordenadas colorimétricas dos esmaltes preparados a partir da incorporação dos pigmentos na matriz vítrea brilhante e mate. Observa-se que após a incorporação no esmalte TB, os parâmetros colorimétricos não sofreram deslocamento significativo, revelando que houve compatibilidade química entre os componentes do esmalte e do pigmento. A satisfatória estabilidade de cor do esmalte está apresentada na Tabela 3, que evidenciou ΔE1 inferior a 20. O bom desempenho da incorporação é explicado pela composição química do esmalte brilhante apresentado na Tabela 4. O elevado teor de sílica e alumina, combinado com o baixo teor de impurezas e de opacificante (ZnO) resultaram na baixa reatividade do esmalte, preservando a cor dos pigmentos, conforme mostrado na Figura 4 [2323 AHMADI, S., AGHAEI, A., YEKTA, B.E, “Synthesis of Y(Al,Cr)O3 red pigments by co-precipitation method and their interactions with glazes”, Ceramics International, v.35, pp.3485-3488, 2009.-2424 PEREIRA, O.C., BERNARDIN, A.M. “Ceramic colorant from untreated iron ore residue”, Journal of Hazardous Materials, v.233–234, pp.103–111, 2012.].

Tabela 3
Colorimetria CIE-L*a*b* das cerâmicas no esmalte brilhante e mate.
Figura 4
Imagens das cerâmicas obtidas a) CaFe1,8Cr0,2O4_600°_TBc e b) CaFe1,8Cr0,2O4_800°C_TB, c) CaFe1,8Cr0,2O4_600 °C_TM e d) CaFe1,8Cr0,2O4_800 °C_TM.

A colorimetria dos esmaltes preparados com o esmalte TM pode ser visto na Tabela 3. Observa-se que apresentaram deslocamento significativo da cor na direção do preto, sinalizando que houve interação entre componentes químicos dos pigmentos e do esmalte mate. Provavelmente, o elevado teor de óxido de zinco (ZnO > 10), combinando com elevado teor de óxido de cálcio resultou em um esmalte mais opaco e com menor capacidade de reflexão do esmalte, resultando em um ΔE1 superior a 20 e, consequentemente, a coloração mais escura [2323 AHMADI, S., AGHAEI, A., YEKTA, B.E, “Synthesis of Y(Al,Cr)O3 red pigments by co-precipitation method and their interactions with glazes”, Ceramics International, v.35, pp.3485-3488, 2009.-2424 PEREIRA, O.C., BERNARDIN, A.M. “Ceramic colorant from untreated iron ore residue”, Journal of Hazardous Materials, v.233–234, pp.103–111, 2012.].

Tabela 4
Composição química do esmalte transparente brilhante e mate

Os resultados do teste de resistência ao ataque químico estão exibidos na Tabela 5. De acordo com os resultados, não houve alteração significativa da cor em todas as amostras, uma vez que a variação de cor foi inferior a 5, mostrando que os esmaltes preparados são capazes de resistir ao ataque químico de ácido clorídrico na concentração de 15% (v/v).

Tabela 5
Coordenadas CIE-L*a*b* das cerâmicas após ataque químico.

4. CONCLUSÕES

A rota de síntese gelatina revelou-se simples, de baixo custo e rápido no passo a formar óxidos de estrutura do tipo espinélio a baixas temperaturas, podendo ser usada para substituir outros métodos usais de síntese. Os difratogramas de raio-x mostraram que as ferritas de cálcio sintetizadas pelo método da gelatina exibiram estrutura do tipo espinélio com distorção ortorrômbica. A cor alaranjada deve-se predominantemente às bandas características do íon cromóforo Fe3+ em sítio octaédrico. Quanto ao estudo da interação entre os pigmentos e o esmalte transparente brilhante, a cor original do pigmento foi praticamente preservada, sinalizando que os componentes químicos do esmalte não reagiram com os pigmentos evidenciando, assim, estabilidade química do esmalte. Já com os esmaltes mate, a cor foi modificada para tons mais escuros, evidenciando uma possível interação entre compostos do esmalte mate e do pigmento. O ataque químico mostrou que os esmaltes preparados apresentam elevada resistência química. Por fim, conclui-se que os pigmentos preparados podem ser utilizados na indústria cerâmica.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao CNPQ pelo suporte financeiro à pesquisa, a empresa VITTRA pelo fornecimentodos esmaltes e a BQMIL pelo fornecimento dos substratos cerâmicos utilizados nesse trabalho.

BIBLIOGRAFIA

  • 1
    SILVA, M.A.F.M., SOSMAN, L.P., YOKAICHIYA, F., et al, “Neutron Powder Diffraction Measurements of the Spinel MgGa2O4:Cr3+- A Comparative Study between the High Flux Diffractometer D2B at the ILL and the High Resolution Powder Diffractometer Aurora at IPEN”, Journal of Physics Conference Series, v. 340, pp. 12-41, 2012
  • 2
    SOSMAN, L. P., FONSECA, R.J.M., TAVARES JR, A D et al, “Photoluminescence and optical absorption of Cs2NaScF6:Cr3+”, Journal of Fluorescence, v. 16, n.2, pp. 317-323, 2006.
  • 3
    COSTA, A.F., PIMENTEL, P.M., MELO, D.M.A., et al, “Preparação de pigmentos de aluminatos de cobalto para aplicação em vidrados cerâmicos”, Cerâmica, v. 62, pp. 179-185, 2016.
  • 4
    DUTRA, J. L. S., DANTAS, G. C. B., PIMENTEL, P. M., et al, “Caracterização óptica e estrutural de ortoferritas de lantânio dopadas com cromo e alumínio”, Cerâmica, v.64, pp.413-417, 2018.
  • 5
    FURUKAWA, S., MASUI, T., IMANAKA, N. “Synthesis of new environment-friendly yellow pigments”, J. Alloys Compd., v.418, pp. 255, 2006.
  • 6
    PIMENTEL, P.M., LIMA, S.V.M., COSTA, A.F., et al, “Gelatin synthesis and color properties of (La, Pr, Nd) lanthanide aluminates”, Ceramics International, v.43, pp.6592–6596, 2017.
  • 7
    ALBUQUERQE, G.B., BALLMANN, T.J.C., FOLGUERAS, M.V., et al, “Síntese de pigmento cerâmico verde com base na estrutura cristalina da wollastonita”, Matéria, v.21, n.2, pp. 355-365, 2016.
  • 8
    COSTA, A. F., PIMENTEL, P. M., MELO, D. M. A., et al, “Síntese e caracterização de espinélios a base de ferritas utilizando gelatina como agente direcionador”, Cerâmica, v. 57, pp. 352-355, 2011.
  • 9
    PIMENTEL, P.M., BARBOSA, K.M.B., GOMES, D.K.S., et al, “Optical and structural properties of lanthanum chromite synthesized by microwave assisted selfcombustion method”, Materials Science Forum, v.881, pp.7-11, 2016.
  • 10
    VIJAYARAGHAVAN, R., THOMPSON, B.C., MACFARLANE, D.R., et al, “Biocompatibility of choline salts as crosslinking agents for collagen based biomaterials”, Chemical Communications, v.46, pp.294–296, 2010.
  • 11
    DUCONSEILLE, A., GAILLARD, C., SANTÉ-LHOUTELLIER, V., et al, “Molecular and structural changes in gelatin evidenced by Raman microspectroscopy”, Food Hydrocolloids, v. 77, pp. 777-786, 2018.
  • 12
    GRAND VIEW RESEARCH. I Gelatin Market Analysis by Raw Material, Function, Application and Segment Forecasts to 2024, (June 2016 ed.)Grand View Research, Inc. 2016. Disponível em <https://www.grandviewresearch.com/industry-analysis/gelatin-market-analysis>. Acesso em: 17 de março de 2018.
    » https://www.grandviewresearch.com/industry-analysis/gelatin-market-analysis
  • 13
    OLIVEIRA, F.S., PIMENTEL, P.M., OLIVEIRA, R.M.P.B., et al, “Effect of lanthanum replacement by strontium in lanthanum nickelate crystals synthetized using gelatin as organic precursor”, Materials Letter, v.64, pp.2700-2703, 2010.
  • 14
    PIMENTEL, P.M., DUTRA, J. L. S., LIMA, A. C., et al, “Structural and magnetic characterization of LaFe1-xAlxO3 (x= 0 and 0.2) orthoferrites synthesized by gelatin method”, Materials Science Forum, v. 899, pp. 227-231, 2017.
  • 15
    COSTA, A.F., PIMENTEL, P.M., AQUINO, F.M., et al, “Microstructural and colour analysis of CuCrO2delafossite obtained by gelatin method”, Materials Science Forum, v.798-799, pp.160-164, 2014.
  • 16
    PATIL, R. S., KAKATKAR, S. V., SANKPAL, A. M., et al, "Infrared absorption spectra of Ti4+ and Zr4+ substituted Ni–Zn ferrites" Indian. J. Pure Appl. Phys, v.32, n. 193, 1994.
  • 17
    REDDY, B. J., FROST, R. L. “Spectroscopic characterization of chromite from the moa-baracoa ophiolitic massif, Cuba”, Spectrochimica Acta a, v.61, pp.1721, 2005.
  • 18
    RIETVELD, H.M. “A profile refinement method for nuclear and magnetic structures”, Journal of Applied Crystallography, v.2, pp.65-71, 1969.
  • 19
    LUTTEROTTI, L. (2006). MAUD, Version 2.046, http://www.ing.unitn.it/wmaud/
    » http://www.ing.unitn.it/wmaud/
  • 20
    PAILHE, N., WATTIAUX, A., GAUDON, M., et al, “Correlation between structural features and vis–NIR spectra of α -Fe2O3 hematite and AFe2O4 spinel oxides (A=Mg, Zn)”, J. Solid State Chem, v.181, pp.1040–1047, 2008.
  • 21
    KUMARI, L.S., RAO, P.P., REDDY, M.L. “Environment-friendly red pigments from CeO2 – Fe2O3 – Pr6O11 solid solutions”, J. Alloy Compd, v.461, pp.509–515, 2008.
  • 22
    MARANHA, F.G., FIUZA, T.E.R., SOUZA, E.C.F., et al, “Synthesis and characterization of pigments of the LaAl1-xFexO3 system e Application in ceramic and polymer”, Dyes and Pigments, v.133, pp.304-310, 2016.
  • 23
    AHMADI, S., AGHAEI, A., YEKTA, B.E, “Synthesis of Y(Al,Cr)O3 red pigments by co-precipitation method and their interactions with glazes”, Ceramics International, v.35, pp.3485-3488, 2009.
  • 24
    PEREIRA, O.C., BERNARDIN, A.M. “Ceramic colorant from untreated iron ore residue”, Journal of Hazardous Materials, v.233–234, pp.103–111, 2012.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Nov 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    03 Ago 2018
  • Aceito
    27 Fev 2019
Laboratório de Hidrogênio, Coppe - Universidade Federal do Rio de Janeiro, em cooperação com a Associação Brasileira do Hidrogênio, ABH2 Av. Moniz Aragão, 207, 21941-594, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, Tel: +55 (21) 3938-8791 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revmateria@gmail.com