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Inclusão de fontes de óleo na dieta de cabras em lactação: digestibilidade dos nutrientes e parâmetros ruminais e sangüíneos

Feeding vegetable oil to lactating goats: nutrient digestibility and ruminal and blood metabolism

Resumos

Os objetivos neste trabalho foram avaliar o efeito da inclusão de fontes de óleo na dieta de cabras em lactação sobre o consumo, a digestibilidade total dos nutrientes, a concentração de NDT e os parâmetros da fermentação ruminal. Foram utilizadas quatro cabras (54±1,02 kg PV) Saanen canuladas no rúmen aos 80 dias em lactação. Os tratamentos consistiram de dietas suplementadas com diferentes fontes de óleo (canola, arroz e soja) e de uma dieta controle. Os dados foram analisados em um delineamento quadrado latino 4 x 4 utilizando-se o procedimento MIXED do SAS (2001), de modo que as diferenças entre as médias dos tratamentos foram determinadas por contrastes ortogonais, a 5% de significância. A inclusão de óleos vegetais na dieta reduziu a digestibilidade da FDN e a digestão total dos CNF, mas não influenciou o conteúdo de NDT. A utilização de óleos vegetais também não provocou mudanças na concentração de N-NH3 ruminal (valor médio de 23,00 mg/dL), porém elevou o pH ruminal. Do mesmo modo, as fontes de óleo adicionadas às dietas não provocaram alterações na concentração de N-uréico no plasma (NUP), mas promoveram redução na concentração de N uréico no leite (NUL). A inclusão de 5,1% de óleos vegetais e de níveis de extrato etéreo superiores a 7% na MS da dieta não altera a digestibilidade dos nutrientes e os parâmetros de fermentação ruminal de cabras em lactação.

óleo de arroz; óleo de canola; óleo de soja; pH ruminal


The objectives of this trial were to evaluate the effect of dietary oil supplementation on intake, apparent total tract digestibility of nutrients, and ruminal metabolism in lactating Saanen goats. Four ruminally cannulated multiparous goats averaging 54±1.02 kg BW and 80 days in milk were used. Goats were fed a control diet (no oil supplementation) or diets supplemented with one of the following oil sources: canola, rice or soybean. A 4 x 4 Latin square design was used and data were analyzed using the MIXED procedure of SAS (2001) with means compared through orthogonal contrasts at 5% of significance. Dietary oil supplementation reduced apparent total tract digestibility of both neutral detergent fiber and nonstructural carbohydrates but contents of TDN did not differ among diets. Oil supplementation did not change the concentration of ruminal ammonia N and plasma urea N but increased ruminal pH and decreased milk urea nitrogen concentration (MUN). The inclusion of 5.1% of vegetable oils in the diet of lactating goat did not significantly affect nutrient digestibility and ruminal fermentation parameters.

rice oil; rapeseed oil; soybean oil; ruminal pH


RUMINANTES

Inclusão de fontes de óleo na dieta de cabras em lactação: digestibilidade dos nutrientes e parâmetros ruminais e sangüíneos1 1 Parte da dissertação de Mestrado do primeiro autor.

Feeding vegetable oil to lactating goats: nutrient digestibility and ruminal and blood metabolism

Fábio José MaiaI; Antonio Ferriani BrancoII; Gisele Fernanda MouroIII; Sabrina Marcantonio ConeglianIV; Geraldo Tadeu dos SantosII; Tathiane Fernanda MinellaV; Francisco de Assis Fonseca de MacedoII

IMestre em Zootecnia pela UEM. Bolsista CAPES

IIDepartamento de Zootecnia da UEM – Av. Colombo, 5790 CEP: 87020-900, Maringá – PR. Pesquisador Bolsista do CNPq

IIIDoutora em Zootecnia pela UEM

IVDoutoranda em Zootecnia da UEM

VGraduação em Zootecnia da UEM – Bolsista de Iniciação Científica - CNPq

RESUMO

Os objetivos neste trabalho foram avaliar o efeito da inclusão de fontes de óleo na dieta de cabras em lactação sobre o consumo, a digestibilidade total dos nutrientes, a concentração de NDT e os parâmetros da fermentação ruminal. Foram utilizadas quatro cabras (54±1,02 kg PV) Saanen canuladas no rúmen aos 80 dias em lactação. Os tratamentos consistiram de dietas suplementadas com diferentes fontes de óleo (canola, arroz e soja) e de uma dieta controle. Os dados foram analisados em um delineamento quadrado latino 4 x 4 utilizando-se o procedimento MIXED do SAS (2001), de modo que as diferenças entre as médias dos tratamentos foram determinadas por contrastes ortogonais, a 5% de significância. A inclusão de óleos vegetais na dieta reduziu a digestibilidade da FDN e a digestão total dos CNF, mas não influenciou o conteúdo de NDT. A utilização de óleos vegetais também não provocou mudanças na concentração de N-NH3 ruminal (valor médio de 23,00 mg/dL), porém elevou o pH ruminal. Do mesmo modo, as fontes de óleo adicionadas às dietas não provocaram alterações na concentração de N-uréico no plasma (NUP), mas promoveram redução na concentração de N uréico no leite (NUL). A inclusão de 5,1% de óleos vegetais e de níveis de extrato etéreo superiores a 7% na MS da dieta não altera a digestibilidade dos nutrientes e os parâmetros de fermentação ruminal de cabras em lactação.

Palavras-chave: óleo de arroz, óleo de canola, óleo de soja, pH ruminal

ABSTRACT

The objectives of this trial were to evaluate the effect of dietary oil supplementation on intake, apparent total tract digestibility of nutrients, and ruminal metabolism in lactating Saanen goats. Four ruminally cannulated multiparous goats averaging 54±1.02 kg BW and 80 days in milk were used. Goats were fed a control diet (no oil supplementation) or diets supplemented with one of the following oil sources: canola, rice or soybean. A 4 x 4 Latin square design was used and data were analyzed using the MIXED procedure of SAS (2001) with means compared through orthogonal contrasts at 5% of significance. Dietary oil supplementation reduced apparent total tract digestibility of both neutral detergent fiber and nonstructural carbohydrates but contents of TDN did not differ among diets. Oil supplementation did not change the concentration of ruminal ammonia N and plasma urea N but increased ruminal pH and decreased milk urea nitrogen concentration (MUN). The inclusion of 5.1% of vegetable oils in the diet of lactating goat did not significantly affect nutrient digestibility and ruminal fermentation parameters.

Key Words: rice oil, rapeseed oil, soybean oil, ruminal pH

Introdução

Modificações nas características da dieta podem ser responsáveis por várias alterações no metabolismo ruminal, nos processos digestivos e, conseqüentemente, dos nutrientes que chegam ao duodeno. Apesar dessas alterações, a inclusão de fontes de óleo na dieta de ruminantes é uma alternativa para o atendimento às exigências de energia de animais de alta produção leiteira.

O uso de fontes de lipídios, tanto de origem animal quanto vegetal, em dietas para ruminantes ainda é motivo de muitas contradições, haja vista o conhecimento ainda restrito dos níveis e das formas de inclusão (protegidas ou não) e de seus efeitos no consumo. Fatores com ação potencial incluem a aceitabilidade das dietas, o efeito sobre as motilidades ruminal e intestinal, a liberação de hormônios intestinais e a oxidação das gorduras pelo fígado (NRC, 2001).

Estudos com inclusão de lipídios na dieta para avaliação do consumo e da digestibilidade dos nutrientes demonstram variações nos resultados, atribuídas à fonte lipídica utilizada, ao nível de inclusão ou à espécie animal. Romo et al. (2000) verificaram menor consumo de MS em vacas submetidas à infusão abomasal de misturas de isômeros cis-C18:1 e trans-C18:1. Segundo Benson et al. (2001), os ácidos graxos poliinsaturados e não-esterificados parecem ser inibidores do consumo mais potentes que, respectivamente, os monoinsaturados e os esterificados. Estes dados indicam que a utilização de fontes lipídicas conhecidamente ricas em ácidos graxos poliinsaturados e não-esterificados podem influenciar o consumo de matéria seca.

Entretanto, Kelly et al. (1998) avaliaram fontes de óleos vegetais ricas em ácidos graxos poliinsaturados (oléico, linoléico e linolênico) na dieta de vacas leiteiras e verificaram que a ingestão de matéria seca não foi alterada pela fonte de lipídio adicionada à dieta.

Segundo Loor et al. (2002), a suplementação da dieta de vacas leiteiras com lipídios protegidos e óleo de canola não afetou a digestibilidade aparente da MS, PB e FDA no trato digestório total. Esses autores verificaram também pH ruminal mais elevado nas dietas com fontes de lipídio protegidas que com óleo de canola. Além disso, a concentração de nitrogênio amoniacal do rúmen diminuiu em resposta à suplementação lipídica, sendo menor para as fontes protegidas.

Estudos similares também indicaram diminuição da concentração de nitrogênio amoniacal quando uma dieta controle foi suplementada com óleo de linhaça (Igwuegbu & Sutton, 1982) e óleo de canola (Ferlay et al., 1993).

Portanto, os parâmetros fermentativos do rúmen podem ser afetados pela adição de fontes de óleo à dieta. Porém, a extensão dessa interferência depende tanto da fonte de óleo como do nível em que é adicionada à ração. A maioria dos trabalhos confirma que o uso de lipídios exerce pouco ou nenhum efeito sobre as atividades da flora microbiana e as demais características do ambiente ruminal, desde que não ultrapasse o valor de 7% da MS total da dieta.

Considerando os dados atuais sobre os efeitos da inclusão de fontes ricas de lipídeos em dietas para cabras em lactação, avaliaram-se os efeitos da inclusão de fontes de óleo, no nível de 5,1% (com base na MS), na dieta total de cabras Saanen em lactação sobre o consumo, a digestibilidade total dos nutrientes, o pH, as concentrações de amônia ruminal e de N-uréico no plasma e no leite.

Material e Métodos

O experimento foi realizado no período de outubro de 2002 a janeiro de 2003 na Fazenda Experimental de Iguatemi, distrito de Iguatemi, e as análises foram realizadas no Laboratório de Análises de Alimentos e Nutrição Animal do Departamento de Zootecnia da Universidade Estadual de Maringá.

Foram utilizadas quatro cabras lactantes Saanen com 80 dias em lactação, canuladas no rúmen, pesando 54±1,02 kg e com produção diária de 2,5±0,43 kg de leite. Os animais foram alojados individualmente em gaiolas de metal com piso de madeira ripada, providas de bebedouro e comedouro individuais.

A alimentação foi fornecida em duas porções iguais, às 8 e 16h, e a água foi disponibilizada ad libitum em bebedouros individuais. As gaiolas e as cânulas foram lavadas duas vezes ao dia para manutenção do controle higiênico/sanitário e as cabras foram ordenhadas duas vezes ao dia, às 8h30 e 16h30.

Os animais receberam dieta balanceada para atender às exigências de mantença e lactação, segundo o AFRC (1993), com relação volumoso:concentrado de 50:50. O volumoso foi composto de silagem de milho e o concentrado, de aveia, milho, farelo de soja, farelo de algodão, uréia, calcário e suplemento mineral. Os tratamentos avaliados consistiram da utilização de três fontes de óleo (canola, arroz e soja) na dieta, em nível de 5,1%, e de um tratamento controle sem a inclusão de óleo, como descrito a seguir:

TT = sem adição de fonte de óleo na dieta;

TOA = adição de 5,1% de óleo de arroz na dieta total;

TOC = adição de 5,1% de óleo de canola na dieta total;

TOS = adição de 5,1% de óleo de soja na dieta total.

A composição dos alimentos empregados na formulação das dietas experimentais encontra-se na Tabela 1 e a das rações experimentais, na Tabela 2.

Foram estabelecidos períodos experimentais com 14 dias de duração. As amostras de alimentos e rações foram coletadas no momento da mistura e a cada 14 dias, de modo que as análises fossem realizadas para cada período. As sobras foram pesadas e amostradas diariamente e, posteriormente, foram misturadas para obtenção de uma amostra composta/animal/período.

As coletas de fezes foram realizadas do 9º ao 13º dias do período experimental. Foram amostrados aproximadamente 25 g de fezes a cada coleta, duas vezes ao dia, com início no 9º dia às 8 e 13h, com incremento de uma hora a cada dia de coleta. Desse modo, foram realizadas dez amostragens/animal/período, incluindo amostras de fezes coletadas das 8 às 16h, ao longo do período de coleta. As amostras foram misturadas àquelas coletadas nos horários anteriores, constituindo amostras compostas por tratamento/animal/período, que, posteriormente, foram secas em estufa de circulação forçada, a 55ºC por 72 horas.

Os alimentos, as rações, as sobras e as fezes foram analisados quanto aos teores de MS, MO, PB e EE, de acordo com as metodologias descritas por Silva (1990). As determinações de FDN foram realizadas segundo Van Soest et al. (1991).

A fibra em detergente neutro indigestível (FDNi) foi utilizada como indicador interno para cálculo dos coeficientes de digestibilidade dos nutrientes analisados, sendo determinada a partir da metodologia descrita por Cochran et al. (1986). A partir da utilização do indicador, foram determinados os coeficientes de digestibilidade total de MS, MO, PB, EE e FDN.

A porcentagem de NDT foi determinada pela equação descrita por Sniffen et al. (1992):

NDT = PBD + FDNND + CNFD + (EED x 2,25)

em que: NDT = nutrientes digestíveis totais; PBD = proteína bruta digestível; FDNND = fibra em detergente neutro digestível corrigida para nitrogênio; CNFD = carboidratos não-fibrosos digestíveis; EED = extrato etéreo digestível.

sendo: CNF = 100 – (%PB + %FDNND + %EE + %MM)

em que: CNF = carboidratos não-fibrosos; CIN = cinzas.

As amostras de líquido ruminal para a determinação do nitrogênio amoniacal (N-NH3) e pH foram coletadas no 14º dia do período experimental, das 8 às 20h, a cada 2 horas, procedendo-se imediatamente à determinação do pH. Uma alíquota de 50 mL de líquido ruminal foi acidificada com 1 mL de ácido sulfúrico 20%, dividida em dois recipientes de aproximadamente 25 mL cada e armazenada a -20ºC, para posterior determinação dos teores de amônia, de acordo com técnica descrita por Vieira (1980).

As amostras de leite foram coletadas duas vezes ao dia (11º, 12º e 13º dias, às 8h30 e 15h), sendo preservadas com 2-bromo-2-nitropropano-1,3diol (BRONOPOL) e refrigeradas a 4ºC. As amostras da manhã e tarde foram compostas para o 11º, 12º e 13º dias. Posteriormente, foram centrifugadas (3500 x g por 15 minutos a 22ºC) e mantidas no refrigerador por 24 horas, para retirada da camada sobrenadante, formada pela gordura. O leite desengordurado foi analisado quanto à concentração de uréia pelo método enzimático (urease/glutamato desidrogenase), segundo Talke & Schubert (1965), utilizando-se o analisador automático Merch Vitalab Selectra®2.

As amostras de sangue foram coletadas diretamente da veia jugular de cada animal, duas vezes ao dia, às 10 e 18h, no 11º, 12º e 13º dias de cada período experimental, e acondicionadas em tubos contendo heparina. Logo após as coletas, as amostras foram centrifugadas a 3500 x g por 15 minutos. O plasma foi removido, congelado e posteriormente analisado para estimativa da concentração de uréia pela mesma metodologia aplicada ao leite desengordurado.

Os dados foram analisados em um quadrado latino 4 x 4 utilizando-se o procedimento MIXED do SAS (2001). As fontes de variação consideradas no modelo foram animal, período e tratamento. As diferenças entre as médias dos tratamentos foram determinadas por contrastes ortogonais, a 5% de significância. Os contrastes ortogonais avaliados foram controle x tratamentos (cont x trat), óleo de arroz x óleo de sementes de oleaginosas (arr x ole) e óleo de canola x óleo de soja (can x soj).

O modelo matemático utilizado na análise dos dados foi o seguinte:

Yijk = µ + Ti + Aj + Pk + eijk

em que Yijk = resposta observada; µ = constante geral; Ti = efeito do tratamento i, variando de 1 a 4; Aj = efeito do animal j, variando de 1 a 4; Pk = efeito do período k, variando de 1 a 4; e eijk = erro aleatório associado a cada observação ijk.

Resultados e Discussão

A inclusão de óleo na dieta não influenciou (P>0,05) as ingestões de MS, MO, PB, FDN, CNF e NDT (Tabela 3). Não houve diferença (P>0,05) entre as fontes de óleo utilizadas na suplementação. As fontes de óleos vegetais incluídas na dieta também não influenciaram (P>0,05) a excreção fecal (EF), em g/dia, a digestão total (DT), em g/dia, e a digestibilidade total (DIG), em %, da MS, MO e PB.

A ingestão de MS foi de 2,02±0,06 kg MS/animal/dia, o que representa consumo de 3,73% do PV, pois o fornecimento de MS foi limitado a 5% do PV.

O consumo de dietas com altos níveis de EE pode comprometer a ingestão de alimentos por reduzir a digestão da fibra e a taxa de passagem da digesta pelo trato gastrintestinal, como resultado do efeito negativo da presença de gordura no ambiente ruminal sobre o crescimento microbiano, sobretudo dos microrganismos celulolíticos (NRC, 2001).

A redução das perdas gasosas também têm sido utilizada para explicar o efeito negativo sobre o consumo de MS pelos inibidores microbianos, como os lipídios e ionóforos (Goodrich et al., 1984). Segundo Chalupa et al. (1984), lipídios insaturados inibem as bactérias ruminais gram-positivas e estimulam aquelas produtoras de propionato, normalmente atribuído à ação de ionóforos.

Outros estudos mostram ainda que a redução no consumo de MS, comumente verificada em trabalhos com fontes suplementares de lipídios na dieta, pode estar relacionada à concentração plasmática de determinados ácidos graxos resultantes do metabolismo dessas fontes lipídicas. Os principais ácidos graxos que parecem estar envolvidos neste mecanismo são o 18:2n-6 e o 18:1n-9.

Jenkins et al. (1996) não observaram redução na ingestão de MS em vacas alimentadas com 3,5% de fontes de óleo protegidas, mesmo quando os animais apresentaram altas concentrações plasmáticas de 18:2n-6. Jenkins & Thies (1997), em estudo realizado com ovinos alimentados com dietas ricas em ácidos graxos insaturados, verificaram redução no consumo de MS, como conseqüência da maior concentração plasmática de 18:2n-6. Vargas et al. (2002) encontraram efeito negativo dos lipídios sobre o consumo de MS, sem afetar os parâmetros ruminais, à exceção do pH, que foi aumentado com a inclusão de grãos de soja na dieta.

A absorção de ácidos graxos insaturados reduziu a ingestão de alimentos quando foram infundidos 450 g/dia no abomaso de vacas leiteiras (Drackley et al., 1992). Segundo Loor et al. (2002), a suplementação com ácido oléico (18:1n-9) diminui a ingestão e os fluxos duodenais de MS, PB e FDA. Ressalta-se que, neste estudo, estas fontes de óleos vegetais ricos em 18:2n-6 e 18:1n-9 foram adicionadas em níveis elevados na dieta das cabras e não ocasio-naram efeito redutor sobre a ingestão de MS e outros nutrientes.

Como não houve diferença no consumo de MS entre os tratamentos, o mesmo ocorreu com a ingestão de nutrientes, à exceção do EE, pois as dietas foram formuladas para fornecer aos animais os mesmos níveis dos nutrientes avaliados (Tabela 2). Ao analisar os dados do EE, deve-se considerar que este nutriente representava 2,97% da MS no tratamento controle e 7,83% da MS nas dietas suplementadas com óleos vegetais.

Verificou-se efeito negativo da adição de fontes de lipídios à dieta não apenas sobre o coeficiente de digestibilidade da parede celular (FDN), mas também sobre a digestão total dos CNF. A digestibilidade da FDN foi maior (P<0,05) no tratamento controle, que apresentou média de 36%, enquanto naqueles com suplementação lipídica, o coeficiente de digestibilidade foi, em média, 24% inferior (27,62; 26,35 e 27,83% para os óleos de arroz, de canola e de soja, respectivamente). A inclusão de óleos reduziu (P<0,05) aproximadamente 18% a digestão dos CNF da dieta de cabras Saanen. A digestibilidade da FDN e dos CNF não diferiu entre as dietas suplementadas com óleos de oleaginosas (canola e soja) e de arroz nem entre as fontes oleaginosas (P>0,05).

Schauff (1992), em experimento com grão de soja integral e sebo bovino (2,5 e 4% da MS), constataram que as digestibilidades da FDA, FDN e HEM não foram afetadas. Esses dados estão de acordo com os encontrados por Villaça et al. (1999), que avaliaram dietas suplementadas com 5% de lipídios e não notaram alteração na digestibilidade da FDN quando a gordura foi introduzida na forma de óleo degomado; porém, houve decréscimo na digestibilidade com a utilização de sementes oleaginosas inteiras.

Neste estudo, as quantidades ingeridas, as digeridas e a digestibilidade total de EE foram maiores (P<0,05) para os tratamentos com fontes suplementares de lipídios na dieta. Considerando as mesmas variáveis, não houve diferenças entre óleos de oleaginosas (canola e soja) e de arroz nem entre as duas oleaginosas (P>0,05). Os animais alimentados com as dietas suplementadas com lipídios apresentaram médias de ingestão, de digestão total e do coeficiente de DIG do EE 244,89; 286,79 e 9,7% superiores em relação ao tratamento controle, respectivamente.

O NDT apresentou valor médio de 65,02% da MS e não diferiu (P>0,05) entre as dietas. Este valor foi 11,9% inferior ao estimado utilizando-se os dados do NRC (1996), que foi de 73,84% da MS (Tabela 2).

Os dados referentes à concentração de N-NH3 ruminal, N-uréico no plasma (NUP), N-uréico no leite (NUL) e pH encontram-se na Tabela 4. A inclusão de fontes de óleos vegetais na dieta não influenciou (P>0,05) a concentração de N-NH3 ruminal, cujo valor médio foi 23,00 mg/dL. Estes dados corroboram aqueles descritos por Vargas et al. (2002), em estudo com óleo e grão de soja moído, no qual também não verificaram efeito da utilização de fontes suplementares de lipídios em nível de 7% da MS da dieta sobre a concentração de N-NH3.

Contudo, diferem dos obtidos por Villaça et al. (1999), que, utilizando dietas suplementadas com 5% de EE na MS, por meio da inclusão de sementes de oleaginosas (soja e algodão) e de óleo de soja na dieta de bezerros holandeses fistulados, verificaram que a concentração média de N-NH3 ruminal foi maior com a introdução de óleo de soja em relação às dietas controle e grão de soja, mas não em relação àquela com caroço de algodão. Nestas condições, a concentração média de N-NH3 ruminal encontrada pelos autores foi 7,54 mg/100 mL.

Igwuegbu & Sutton (1982) e Tesfa et al. (1992) demonstraram que óleos insaturados diminuem a concentração de nitrogênio amoniacal, principalmente em razão da diminuição da população de protozoários no ambiente ruminal, entretanto, este efeito não foi avaliado neste estudo. Balieiro Neto & Melloti (1998) avaliaram dietas com 6% de sebo bovino e não encontraram efeito negativo sobre a ingestão de MS e a concentração de N-NH3 ruminal, mesmo quando houve redução na população de protozoários.

Similarmente, Igwuegbu & Sutton (1982), trabalhando com dieta suplementada com óleo de linhaça e Ferlay et al. (1993), com óleo de canola, verificaram redução na concentração de nitrogênio amoniacal. O mesmo efeito foi relatado por Loor et al. (2002) em resposta à suplementação lipídica a 4,8% da MS em vacas em lactação. No entanto, a concentração média verificada pelos autores foi 9,77 mg/dL, bastante inferior à média encontrada neste trabalho. Contudo, Van Nevel & Demeyer (1988) observaram aumento da eficiência da síntese microbiana e redução da concentração de NH3 ruminal em animais consumindo óleo na dieta. Segundo os autores, provavelmente isto ocorreu em virtude do efeito sobre a defaunação e/ou a redução na população de bactérias desaminadoras.

A variação na concentração de N-NH3 ruminal ao longo do dia está representada na Figura 1. Como evidenciado, as concentrações mais elevadas ocorreram aproximadamente duas horas após o fornecimento das dietas.


A amônia ruminal, originada da degradação de aminoácidos e do nitrogênio não-protéico da dieta, quando não utilizada para a síntese de proteína microbiana, é absorvida pela parede do rúmen, atinge a corrente sanguínea e passa pelo fígado, onde é metabolizada para dar origem à uréia. Uma vez na corrente sangüínea, a uréia pode difundir-se livremente para o leite, justificando a alta correlação entre a concentração de nitrogênio uréico no plasma (NUP) e no leite (NUL) (Mouro et al., 2002).

A suplementação lipídica da dieta não influenciou (P>0,05) o nível de NUP, que apresentou valor médio de 18,14 (mg/dL), comprovando que, nas condições em que foi realizado este experimento, a utilização das fontes adicionais de óleos na dieta não interferiu neste indicador do metabolismo do nitrogênio. Do mesmo modo, a fonte de óleo empregada na suplementação, sementes de oleaginosas (canola ou soja) ou de cereal, também não interferiu (P>0,05) neste parâmetro, como verificado pela análise dos contrastes avaliados. Estes dados confirmam os encontrados por Schimidely et al. (1996) e Mouro et al. (2002), que obtiveram para a concentração de uréia no plasma, 36 e 38,30 mg/dL, que correspondem, respectivamente, a 16,78 e 17,85 mg N-uréico/dL. Além disso, foram próximos aos verificados por Loor et al. (2002), que encontraram valor de 13,98 mg de N uréico/dL.

A concentração de uréia no leite foi superior (P<0,05) para o tratamento controle e, a exemplo do que ocorreu com a concentração de uréia plasmática, a análise dos contrastes não mostrou diferença (P>0,05) entre as fontes de óleo utilizadas na suplementação. A concentração média deste elemento entre as dietas estudadas foi de 38,88 mg/dL, muito próxima à descrita por Mouro et al. (2002), de 36,87 mg/dL. No entanto, Loor et al. (2002), trabalhando com lipídios adicionados em nível de 5% da MS da dieta de vacas em lactação, encontraram média de 12,43 mg de N-uréico/dL, que corresponde a aproximadamente 27,62 mg de uréia/dL para este parâmetro. Isso comprova que os dados obtidos neste estudo estão dentro da faixa de variação proposta na literatura.

A inclusão de óleo na dieta promoveu aumento do pH ruminal (P<0,05). Além disso, o aumento provocado pelas oleaginosas para este parâmetro foi superior (P<0,05) ao do óleo de arroz, porém não diferiu (P>0,05) entre as duas fontes de oleaginosas avaliadas (Tabela 4).

O comportamento do pH ao longo do dia (Figura 2) foi contrário ao apresentado pela concentração de N-NH3, em que os menores valores foram observados 4 horas após o fornecimento das rações.


Christensen et al. (1994) não observaram efeito de dietas suplementadas com óleo de milho e sebo bovino sobre o pH ruminal. No entanto, Vargas et al. (2002) observaram aumento do pH para as dietas suplementadas com grão e óleo de soja e atribuíram este efeito à queda do consumo de MS e à menor fermentação ruminal, que proporciona menor acúmulo de ácidos graxos voláteis, principal fator de redução do pH. Contudo, esses autores não verificaram redução no consumo de MS, o que indica que a redução na degradação da fibra dietética reduziu a produção de ácidos graxos voláteis e, conseqüentemente, impediu a queda do pH ruminal.

Conclusões

A inclusão de óleos vegetais no nível de 5,1% para atingir níveis de EE superiores a 7% na MS da dieta não alterou a digestibilidade dos nutrientes e os parâmetros de fermentação ruminal de cabras em lactação.

Literatura Citada

Recebido: 30/11/04

Aprovado: 30/01/06

Financiamento CNPq.

Correspondências devem ser enviadas para: afbranco@uem.br, maiafj@hotmail.com

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  • 1
    Parte da dissertação de Mestrado do primeiro autor.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Out 2006
    • Data do Fascículo
      Ago 2006

    Histórico

    • Recebido
      30 Nov 2004
    • Aceito
      30 Jan 2006
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