Acessibilidade / Reportar erro

Lateralidade da atividade do sistema olivococlear medial eferente: estudo preliminar

RESUMO:

Objetivo:

avaliar a diferença na supressão das emissões otoacústicas entre as orelhas direita e esquerda.

Métodos:

participaram da pesquisa 36 indivíduos, sendo 18 destros e 18 canhotos, todos sem queixa auditiva e com audição dentro dos padrões de normalidade. A coleta de dados foi realizada por meio das emissões otoacústicas transientes e pela supressão das emissões otoacústicas. A análise da presença/ausência do efeito de supressão foi realizada baseada no valor obtido em response.

Resultados:

não houve diferença entre a orelha direita e esquerda para os valores de response das emissões otoacústicas com ruído contralateral para os indivíduos destros e canhotos. No gênero masculino houve diferença entre a orelha direita e esquerda para os valores de response das emissões otoacústicas com ruído contralateral.

Conclusão:

a avaliação realizada por meio da supressão das emissões otoacústicas não evidenciou diferenças entre as orelhas direita e esquerda nos grupos estudados.

DESCRITORES:
Percepção Auditiva; Supressão; Vias Eferentes; Emissões Otoacústicas Espontâneas; Lateralidade Funcional

ABSTRACT:

Purpose:

to evaluate the difference in the suppression of otoacoustic emissions between the right and left ears

Methods:

participated in this study 36 individuals, being 18 right-handed and left-handed 18, all without hearing complaints and hearing within normal limits. Data collection was performed by: transient otoacoustic emissions and suppression of the otoacoustic emissions. The analysis of the presence / absence of the suppression effect was made based on the value obtained in response.

Results:

there was no difference between the right and left ears for the response values of otoacoustic emissions with contralateral noise for right and left handed individuals. In the male, there was a difference between the right and left ears for the response values of otoacoustic emissions with contralateral noise.

Conclusion:

the evaluation through the suppression of otoacoustic emissions showed no differences between the right and left ears in the groups studied.

KEYWORDS:
Auditory Perception; Suppression; Efferent Pathways; Otoacoustic Emissions, Spontaneous; Functional Laterality

Introdução

As emissões otoacústicas são sons produzidos na cóclea e detectados no meato acústico externo, sendo especificamente o registro da mobilidade e da habilidade mecânica das células ciliadas externas11. Kemp DT. Otoacoustic emissions: basic facts and applications. Audiol Practice. 1989;3(1):1-4.. O ruído contralateral exerce efeito inibitório sobre o funcionamento das células ciliadas externas, cujo resultado é a redução da amplitude das emissões otoacústicas. Este fenômeno, conhecido como efeito de supressão das emissões otoacústicas, evidencia a integridade do sistema olivococlear medial, já que esse inerva as células ciliadas externas22. Hill JC, Prasher DK, Luxon LM. Evidence efferent effects on auditory afferent activity and their functional relevance. Clin Otolaryngol. 1997;22:394-402.)-(44. Leme VN, Carvallo RMM. Efeito da estimulação acústica contralateral nas medidas temporais das emissões otoacústicas. Rev CEFAC. 2009;11(Suppl 1):24-30..

O mecanismo pelo qual o efeito de supressão das emissões otoacústicas ocorre não está totalmente esclarecido. Acredita-se que o trato olivococlear medial eferente funciona como um modulador. O sistema olivococlear medial eferente ajusta o processo ativo coclear por meio das contrações lentas das células ciliadas externas, atenuando as contrações rápidas e proporcionando, especificamente, um mecanismo de proteção das estruturas da orelha interna, mediante estimulação acústica33. Burguetti FAC, Carvalho RMM. Sistema auditivo eferente: efeito no processamento auditivo. Rev Bras Otorrinolaringol. 2008;74(5):737-45.)-(55. Perez AP, Kós MI, Frota S. A supressão das emissões otoacústicas transitórias em mulheres com audição normal. Rev CEFAC. 2006;8(3):368-74..

Pesquisadores descreveram diferenças nos padrões de supressão das emissões otoacústicas evocadas entre a orelha direita e orelha esquerda. Encontraram assimetria interaural, em relação ao tamanho da amplitude das emissões otoacústicas evocadas, sendo maior à direita, e também quanto à ação do sistema auditivo eferente, também com maior efetividade à direita66. Urnau D, Tochetto TM. Ocorrência e efeito de supressão das emissões otoacústicas em adultos normo-ouvintes com zumbido e hiperacusia. Braz J Otorhinolaryngol. 2012;78(1):87-94.)-(99. Khalfa S, Collet L. Functional asymmetry of medial olivocochlear system in humans. Towards a peripheral auditory lateralization. Neuroreport. 1996;7:993-6.. A atividade do trato olivococlear medial eferente, em ambas as orelhas de 44 indivíduos entre 19 e 29 anos, com audição normal, foi investigada para comparar a inibição do trato bilateralmente. As emissões otoacústicas evocadas por estímulo transiente foram pesquisadas com o estímulo clique na intensidade variando de 59 a 71 dB NPS, com estimulação acústica contralateral de ruído branco a 30 dB nível de sensação de intensidade. Observou-se maior atividade do sistema eferente do lado direito, sem diferença significante quanto ao gênero99. Khalfa S, Collet L. Functional asymmetry of medial olivocochlear system in humans. Towards a peripheral auditory lateralization. Neuroreport. 1996;7:993-6..

Em estudo que comparou a presença do efeito de supressão das emissões otoacústicas e sua amplitude em indivíduos adultos audiologicamente normais os autores não observaram dominância lateral. Não houve diferença entre os resultados da orelha direita e da orelha esquerda quanto à assimetria do tamanho da amplitude e quanto à presença do efeito de supressão1010. Oliveira JRM, Fernandes CF, Filho OAC. Estudo da supressão da amplitude das emissões otoacústicas: dominância lateral. Braz J Otorhinolaryngol. 2011;77(5):547-54..

Alguns autores verificaram a ocorrência e a magnitude do efeito de supressão das emissões otoacústicas evocadas por estímulo transiente, em lactentes nascidos pré-termo, com indicadores de risco para perda auditiva e observaram respostas maiores na orelha direita1111. Amorim AM, Lewis DR, Rodrigues GRI, Fiorini AC, Azevedo MF. Efeito de supressão das emissões otoacústicas evocadas por estímulo transiente em lactentes de risco para perda auditiva nascidos pré-termo. Rev CEFAC. 2010;12(5):749-55.. Valores maiores de supressão da amplitude das emissões otoacústicas transientes na orelha direita com o uso de um ruído na orelha contralateral e mudanças nas amplitudes destas emissões durante tarefas de atenção auditiva e visual indicam que o trato olivococlear medial pode estar envolvido na manutenção deste padrão assimétrico periférico e por meio dele, o córtex pode modular o funcionamento coclear88. Khalfa S, Morlet T, Micheyl C, Morgon A. Evidence of peripheral hearing asymmetry in humans: clinical implications. Acta otolaryngol. 1997;117:192-6.),(99. Khalfa S, Collet L. Functional asymmetry of medial olivocochlear system in humans. Towards a peripheral auditory lateralization. Neuroreport. 1996;7:993-6.),(1212. Fávero ML, Sanchez TG, Bento RF, Nascimento AF. Atividade coclear assimétrica: influência do SNC? Arquivos Int Otorrinolaringol. 2005;9(4):300-4..

A lateralidade do sistema nervoso central ou a predominância de um hemisfério cerebral sobre o outro é um tema muito estudado desde que áreas dominantes para a linguagem no hemisfério esquerdo foram descritas. Entretanto, somente com o surgimento dos exames de imagem funcional foi possível entender melhor este funcionamento assimétrico e analisar se a ausência desta predominância pode colaborar com o aparecimento de quadros como dislexia, afasia, esquizofrenia e autismo1313. Foundas AL. Is language laterality established by 5 years os age? Neurology. 2003;60:1573-4.)-(1515. Veuillet E, Georgieff N, Philibert B, Dalery J, Marie-Cardine M, Collet L. Abnormal peripheral auditory asymmetry in schizophrenia. J neurol neurosurg psychiatry. 2001;70:88-94.. Por outro lado, determinar esta assimetria pode não ser tarefa fácil. Além dos vários níveis de predominância hemisférica, a assimetria pode ser diferente em um mesmo indivíduo, para os diversos membros e órgãos sensoriais. Assim, pode haver lateralidade cruzada para diferentes órgãos e funções1212. Fávero ML, Sanchez TG, Bento RF, Nascimento AF. Atividade coclear assimétrica: influência do SNC? Arquivos Int Otorrinolaringol. 2005;9(4):300-4..

Entretanto, há evidências que o sistema auditivo central e periférico também funcionam de forma lateralizada. Maiores amplitudes da onda III na audiometria de tronco cerebral e das emissões otoacústicas transientes na orelha direita em contrapartida com a maior presença de zumbido e de perda auditiva temporária após exposição a ruído na orelha esquerda sugerem, além de uma assimetria entre as orelhas, que a orelha esquerda seja mais vulnerável a alterações auditivas88. Khalfa S, Morlet T, Micheyl C, Morgon A. Evidence of peripheral hearing asymmetry in humans: clinical implications. Acta otolaryngol. 1997;117:192-6..

Portanto, essa pesquisa justificou-se pela possibilidade de compreender a atuação do sistema olivococlear medial eferente no que se refere à dominância auditiva. Sendo assim, o objetivo do estudo foi avaliar a diferença na supressão das emissões otoacústicas entre as orelhas direita e esquerda.

Métodos

Os procedimentos desta pesquisa foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, sob protocolo nº CAAE 0342.0.213.000-10 (conforme Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde - CONEP).

Esta pesquisa caracterizou-se por um estudo piloto, de tipologia descritiva, de análise qualitativa e quantitativa. Foram convidados a participar do estudo 60 indivíduos. Destes, um total de 10 recusaram-se a participar da pesquisa, 6 não compareceram para a avaliação e os outros 8 foram excluídos do estudo por apresentarem perda auditiva, queixas auditivas e/ou doença otológica pregressa. A amostra, então, foi composta por 36 indivíduos (18 destros e 18 canhotos), de ambos os gêneros, na faixa etária de 18 a 25 anos.

Os participantes da pesquisa foram selecionados nos cursos de graduação ofertados no prédio do Instituto de Educação Continuada - IEC da PUC Minas e no meio social da pesquisadora. Os sujeitos dessa pesquisa foram selecionados por meio da técnica de amostragem não aleatória, do tipo amostragem por conveniência.

Os participantes da pesquisa foram comunicados pessoalmente quanto aos objetivos da pesquisa, quanto à ausência de danos à sua saúde, quanto à garantia de sigilo de suas identidades ou quaisquer outras características que pudessem identificá-los e quanto ao roteiro da pesquisa. Estando devidamente esclarecidos todos os sujeitos da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

A coleta de dados foi realizada no Centro Clínico de Fonoaudiologia da PUC Minas. Todos os indivíduos foram submetidos à avaliação audiológica básica. Essa avaliação foi constituída por: anamnese, meatoscopia, audiometria tonal limiar, logoaudiometria, timpanometria e pesquisa dos reflexos acústicos.

Na anamnese o indivíduo forneceu informações como dados pessoais, história audiológica, aspectos relacionados à saúde e domínio da habilidade motora manual (destro ou canhoto). A anamnese foi realizada com o mesmo protocolo utilizado no Centro Clínico de Fonoaudiologia da PUC Minas.

Para realizar a inspeção visual do meato acústico externo (meatoscopia) utilizou-se otoscópio, da marca TK, modelo 22. A audiometria tonal limiar e logoaudiometria foram realizadas em cabina acústica e com audiômetro de dois canais, modelo Midimate 602, da marca Madsen Electronics, utilizando fone TDH-39 e vibrador ósseo B-71. A timpanometria e a pesquisa dos reflexos acústicos foram realizadas por meio do analisador de orelha média, modelo AZ7, da marca Interacoustics.

Foram utilizados como critérios de inclusão, para construir o grupo de estudo, indivíduos sem queixas auditivas e/ou doença otológica pregressa e com avaliação audiológica dentro dos padrões de normalidade. Considerou-se indivíduos com avaliação audiológica dentro dos padrões de normalidade aqueles que apresentaram limiares tonais por via aérea até 25 dBNA nas frequências de 250 a 8000 Hz e limiares tonais por via óssea até 15 dBNA nas frequências de 500 a 4000 Hz com diferença entre os limiares de via aérea e via óssea menor ou igual a 10 dB, curva timpanométrica do tipo A e presença de reflexos acústicos nas frequências de 500, 1000, 2000 e 4000 Hz.

Foram excluídos do estudo indivíduos portadores de doenças neurológicas, neoplasias, otites, perfuração da membrana timpânica, os com antecedentes de trauma crânio-encefálico e cirurgia otológica, os com zumbido, com histórico de exposição a ruído, em uso de medicamentos ototóxicos, com queixas auditivas e com perdas auditivas.

Em seguida, os indivíduos foram submetidos à pesquisa das emissões otoacústicas evocadas transientes e supressão das emissões otoacústicas transientes. Cada participante submeteu-se apenas a uma avaliação das emissões otoacústicas transientes e supressão das emissões otoacústicas transientes. Primeiramente, realizou-se um registro de emissões otoacústicas transientes em uma das orelhas e, em seguida, um registro na outra orelha. Posteriormente, realizou-se um registro de supressão das emissões otoacústicas transientes em uma das orelhas e, em seguida, um registro na outra orelha. Portanto, a coleta foi realizada de maneira alternada entre as orelhas.

As emissões otoacústicas transientes foram realizadas em ambiente confortável e silencioso com estímulo linear do tipo clique com intensidade entre 80 e 85dB NPS. O número de estímulos utilizados durante o registro das emissões otoacústicas transientes não sofreu variação (260 séries), sendo que o procedimento apresentou tempo de duração de no máximo 75 segundos em cada orelha. Considerou-se nível de ruído abaixo de 16dB NPS. As emissões otoacústicas transientes foram captadas inicialmente sem ruído contralateral, e em seguida, com ruído contralateral com o objetivo de não alterar a colocação da sonda durante as duas situações de teste.

Para realizar as emissões otoacústicas transientes utilizou-se equipamento modelo ILO versão 6, da marca Otodynamics. Para a pesquisa do efeito de supressão das emissões otoacústicas transientes utilizou-se ruído de banda larga transmitido pelo audiômetro de dois canais, modelo Midimate 622, da marca Madsen Electronics, por meio do fone TDH-39, na intensidade de 60dB NPS.

As emissões otoacústicas evocadas transientes foram consideradas presentes quando a amplitude das frequências de 1 e 1,4, 2, 2,8 e 4 kHz foram maiores ou iguais a 3dB em pelo menos três frequências consecutivas tendo valores de reprodutibilidade maiores que 50% e valores de estabilidade do ajuste da sonda maior que 70%. Apenas os indivíduos que apresentaram emissões otoacústicas evocadas transientes presentes foram incluídos no estudo.

Para o efeito de supressão observou-se a variação da amplitude de resposta na presença de ruído em relação à amplitude de resposta na ausência de ruído. O valor da supressão referente à ação do sistema olivococlear é dado pela diferença dos valores obtidos nas condições sem e com estimulação contralateral, em cada orelha, sendo que esse valor determina se existe ou não supressão. O valor dessa diferença representa de forma quantitativa a magnitude da redução/supressão. Assim, se o valor é positivo, há supressão e se é negativo ou igual a zero, não há supressão na amplitude das emissões1010. Oliveira JRM, Fernandes CF, Filho OAC. Estudo da supressão da amplitude das emissões otoacústicas: dominância lateral. Braz J Otorhinolaryngol. 2011;77(5):547-54.. Neste estudo optou-se por considerar como variação mínima 0,5dB NPS e a análise da presença/ausência do efeito de redução/supressão foi realizada baseada no valor obtido em response, excluindo a interferência do ruído de fundo.

Em seguida os dados coletados foram tabulados e submetidos à análise estatística. A análise estatística foi realizada por meio do software Statistical Package for Social Sciences (SPSS) versão 20.0. Inicialmente foi realizada a análise descritiva, que compreendeu medidas de tendência central (média e mediana), de dispersão (desvio padrão) e de posição (máximo e mínimo).

Além da estatística descritiva foi realizada a estatística inferencial por meio do teste t de Student pareado. Foi adotado o nível de significância de 5% (p ≤ 0,05). Considerou-se como tendência a significância estatística os resultados significantes ao nível de 10% (p ≤ 0,10).

Resultados

A média de idade da população estudada foi de 22,0 anos (desvio padrão de 2,46). Sendo que 18 indivíduos foram do gênero feminino, média de idade de 22,8 anos (desvio padrão de 1,84) e 18 indivíduos foram do gênero masculino, média de idade de 21,2 anos (desvio padrão de 2,75). No grupo dos indivíduos destros, a média de idade foi de 22,3 anos (desvio padrão de 2,08) e no grupo dos indivíduos canhotos, a média de idade foi de 21,7 anos (desvio padrão de 2,81).

A análise descritiva, considerando toda a amostra, pode ser visualizada na Tabela 1. Pode-se observar que, a média dos valores de response das emissões otoacústicas sem e com ruído contralateral foram maiores para a orelha direita.

Tabela 1:
Medidas de tendência central, dispersão e posição para os resultados das emissões otoacústicas e supressão das emissões otoacústicas (n=36)

Na Tabela 2 é apresentada a comparação entre os indivíduos destros e canhotos para as medidas de tendência central. Na Tabela 3 é apresentada a comparação entre os gêneros feminino e masculino para as medidas de tendência central.

Tabela 2:
Medidas de tendência central, dispersão e posição para os resultados das emissões otoacústicas e supressão das emissões otoacústicas para os indivíduos destros e canhotos
Tabela 3:
Medidas de tendência central, dispersão e posição para os resultados das emissões otoacústicas e supressão das emissões otoacústicas para os gêneros feminino e masculino

Na análise estatística inferencial, considerando toda a amostra, verificou-se que não houve diferença entre os valores de response das emissões otoacústicas sem ruído contralateral entre a orelha direita e esquerda (p=0,155) e que também não houve diferença entre os valores de response das emissões otoacústicas com ruído contralateral entre a orelha direita e esquerda (p=0,104). Em relação à magnitude da redução, observou-se que não houve diferença entre a orelha direita e esquerda (p=0,420).

No grupo dos indivíduos destros verificou-se que não houve diferença entre os valores de response das emissões otoacústicas sem ruído contralateral entre a orelha direita e esquerda (p=0,523) e que também não houve diferença entre os valores de response das emissões otoacústicas com ruído contralateral entre a orelha direita e esquerda (p=0,360). Em relação à magnitude da redução, observou-se que não houve diferença entre a orelha direita e esquerda (p=0,380).

No grupo dos indivíduos canhotos, verificou-se que não houve diferença entre os valores de response das emissões otoacústicas sem ruído contralateral entre a orelha direita e esquerda (p=0,151) e que também não houve diferença entre os valores de response das emissões otoacústicas com ruído contralateral entre a orelha direita e esquerda (p=0,166). Em relação à magnitude da redução, observou-se que não houve diferença entre a orelha direita e esquerda (p=0,891).

No gênero feminino, verificou-se que não houve diferença entre os valores de response das emissões otoacústicas sem ruído contralateral entre a orelha direita e esquerda (p=0,808) e que também não houve diferença entre os valores de response das emissões otoacústicas com ruído contralateral entre a orelha direita e esquerda (p=0,637). Em relação à magnitude da redução, observou-se que não houve diferença entre a orelha direita e esquerda (p=0,457).

A Tabela 4 permite observar que, no gênero masculino, houve tendência à diferença entre a orelha direita e esquerda para os valores de response das emissões otoacústicas sem ruído contralateral e que houve diferença entre a orelha direita e esquerda para os valores de response das emissões otoacústicas com ruído contralateral.

Tabela 4:
Comparação entre a orelha direita e esquerda para os resultados das emissões otoacústicas e supressão das emissões otoacústicas para o gênero masculino

Discussão

Em estudos semelhantes não foram encontradas diferenças para a presença do efeito de supressão das emissões otoacústicas evocadas no que se refere à dominância direita e esquerda em indivíduos adultos com audição dentro dos padrões de normalidade66. Urnau D, Tochetto TM. Ocorrência e efeito de supressão das emissões otoacústicas em adultos normo-ouvintes com zumbido e hiperacusia. Braz J Otorhinolaryngol. 2012;78(1):87-94.),(1010. Oliveira JRM, Fernandes CF, Filho OAC. Estudo da supressão da amplitude das emissões otoacústicas: dominância lateral. Braz J Otorhinolaryngol. 2011;77(5):547-54..

Entretanto, em outro estudo, os pesquisadores documentaram diferenças nos padrões de supressão das emissões otoacústicas evocadas quanto às orelhas direita e esquerda. Os pesquisadores apontaram assimetria interaural, em relação às emissões otoacústicas evocadas, sendo maior à direita, e, quanto à ação do sistema auditivo eferente, também com maior efetividade à direita. Contudo, esses pesquisadores não explicaram os motivos de seus achados, destacando a necessidade de novas investigações para explicar a assimetria encontrada99. Khalfa S, Collet L. Functional asymmetry of medial olivocochlear system in humans. Towards a peripheral auditory lateralization. Neuroreport. 1996;7:993-6..

No presente estudo a média dos valores de response das emissões otoacústicas sem ruído contralateral e com ruído contralateral foi maior à direita. Porém, este resultado não foi observado para a magnitude da redução das emissões otoacústicas. A média dos valores de magnitude da redução das emissões otoacústicas foi maior à esquerda.

Em pesquisa realizada com destros com audição dentro dos padrões de normalidade, a supressão foi significantemente maior na orelha direita. Como a maioria dos participantes do estudo era destra, a provável explicação para esse achado é a lateralização do sistema olivococlear medial77. Breuel MLF, Sanchez TG, Bento RF. Vias auditivas eferentes e seu papel no sistema auditivo. Arquivos Int. Otorrinolaringol. 2001;5(2):62-7.),(44. Leme VN, Carvallo RMM. Efeito da estimulação acústica contralateral nas medidas temporais das emissões otoacústicas. Rev CEFAC. 2009;11(Suppl 1):24-30.),(1212. Fávero ML, Sanchez TG, Bento RF, Nascimento AF. Atividade coclear assimétrica: influência do SNC? Arquivos Int Otorrinolaringol. 2005;9(4):300-4..

No presente estudo, os participantes foram divididos em 2 grupos, um grupo de indivíduos destros e um grupo de indivíduos canhotos. Porém, a média dos valores de magnitude da redução das emissões otoacústicas foi maior à esquerda tanto para os indivíduos destros quanto para os indivíduos canhotos.

Em outros estudos diferenças estatisticamente significantes entre o lado da orelha em lactentes foram observadas, sendo que o lado direito apresentou maiores respostas22. Hill JC, Prasher DK, Luxon LM. Evidence efferent effects on auditory afferent activity and their functional relevance. Clin Otolaryngol. 1997;22:394-402.. Os autores sugeriram que há uma atividade assimétrica entre as orelhas e, consequentemente, uma magnitude de supressão maior na orelha direita33. Burguetti FAC, Carvalho RMM. Sistema auditivo eferente: efeito no processamento auditivo. Rev Bras Otorrinolaringol. 2008;74(5):737-45.),(1111. Amorim AM, Lewis DR, Rodrigues GRI, Fiorini AC, Azevedo MF. Efeito de supressão das emissões otoacústicas evocadas por estímulo transiente em lactentes de risco para perda auditiva nascidos pré-termo. Rev CEFAC. 2010;12(5):749-55.. Tais achados fornecem novos argumentos a favor da lateralização auditiva periférica, especialmente no que diz respeito ao sistema eferente medial. Alguns autores argumentam que há um predomínio da orelha direita sobre a orelha esquerda o que indica uma provável influência do trato olivococlear. Deste modo, acreditam que uma melhor função do sistema eferente medial à direita levaria a uma maior proteção das células ciliadas externas que, consequentemente, geraria maior efeito de supressão. Além disso, desencadearia reflexos eferentes mais efetivos deste lado, refletindo um equilíbrio entre a função das células ciliadas externas e do sistema eferente medial1212. Fávero ML, Sanchez TG, Bento RF, Nascimento AF. Atividade coclear assimétrica: influência do SNC? Arquivos Int Otorrinolaringol. 2005;9(4):300-4..

Ressalta-se que os estudos sobre supressão das emissões otoacústicas que tem o objetivo de investigar diferenças entre os padrões de lateralidade são escassos. Os estudos existentes apresentam grande variabilidade metodológica, o que compromete as comparações. Além disso, o mesmo nível de estímulo apresentado nas emissões otoacústicas pode produzir diferentes respostas em diferentes indivíduos, e esta variabilidade intersujeitos será refletida, consequentemente, no nível de supressão22. Hill JC, Prasher DK, Luxon LM. Evidence efferent effects on auditory afferent activity and their functional relevance. Clin Otolaryngol. 1997;22:394-402..

Portanto, é necessário que outros estudos sejam desenvolvidos para propiciar novas comparações e descobertas. Os estudos já realizados definiram vários parâmetros para obter os melhores registros de captação das emissões otoacústicas e do efeito de supressão das emissões otoacústicas, como por exemplo, o intervalo de análise da resposta da amplitude, a intensidade do ruído contralateral versus amplitude da supressão, o modo bilateral de captação em comparação ao ipsilateral ou contralateral e intervalos de tempo11. Kemp DT. Otoacoustic emissions: basic facts and applications. Audiol Practice. 1989;3(1):1-4.),(88. Khalfa S, Morlet T, Micheyl C, Morgon A. Evidence of peripheral hearing asymmetry in humans: clinical implications. Acta otolaryngol. 1997;117:192-6.. Todavia, ainda há uma lacuna quanto ao fator gênero e ao fator lateralização para orelha direita e esquerda.

No presente estudo, os participantes também foram divididos quanto ao gênero, porém não foram encontradas diferenças entre as orelhas direita e esquerda para a supressão das emissões otoacústicas no gênero feminino. Este fato, provavelmente, poderia ser justificado, também, pela ausência de diferença entre as orelhas direita e esquerda para os valores de response das emissões otoacústicas transientes sem ruído contralateral. Entretanto, no gênero masculino foram encontradas diferenças entre as orelhas direita e esquerda para a supressão das emissões otoacústicas e para os valores de response das emissões otoacústicas transientes sem ruído contralateral.

A fisiologia e a anatomia da via eferente, particularmente do trato olivococlear medial eferente, ainda são desconhecidas. Salienta-se, então, a necessidade de conhecimento mais detalhado das implicações da ocorrência de uma dominância lateral para o mecanismo de supressão das emissões otoacústicas.

Ressalta-se ainda que uma seleção rigorosa da amostra seja necessária nos estudos de lateralidade e predominância funcional. É possível ocorrer lateralidade cruzada para diferentes órgãos e funções, portanto a seleção de indivíduos destros não prova que estes também possuam sistemas auditivos predominantes à direita. Para esta comprovação, testes eletrofisiológicos com estímulo verbal, tonal e de escuta dicótica deveriam ser realizados no momento da inclusão dos participantes para a determinação da real predominância auditiva99. Khalfa S, Collet L. Functional asymmetry of medial olivocochlear system in humans. Towards a peripheral auditory lateralization. Neuroreport. 1996;7:993-6.)-(1212. Fávero ML, Sanchez TG, Bento RF, Nascimento AF. Atividade coclear assimétrica: influência do SNC? Arquivos Int Otorrinolaringol. 2005;9(4):300-4..

Conclusão

Os resultados do presente estudo não foram conclusivos. A avaliação realizada por meio da supressão das emissões otoacústicas não evidenciou diferenças entre as orelhas direita e esquerda para todos os grupos estudados. Embora sem diferença estatisticamente significante, foi observada vantagem da orelha direita para os valores de response das emissões otoacústicas sem e com ruído contralateral para todos os grupos estudados. A diferença entre as orelhas no gênero masculino deve ser considerada com cautela, uma vez que há dados não coerentes com a literatura consultada. Portanto, para afirmar que há atuação do sistema olivococlear medial eferente no que se refere à dominância auditiva, outros estudos devem ser realizados com maior casuística e tendo critérios de inclusão diferentes, como, por exemplo, a determinação da predominância auditiva.

Referências

  • 1
    Kemp DT. Otoacoustic emissions: basic facts and applications. Audiol Practice. 1989;3(1):1-4.
  • 2
    Hill JC, Prasher DK, Luxon LM. Evidence efferent effects on auditory afferent activity and their functional relevance. Clin Otolaryngol. 1997;22:394-402.
  • 3
    Burguetti FAC, Carvalho RMM. Sistema auditivo eferente: efeito no processamento auditivo. Rev Bras Otorrinolaringol. 2008;74(5):737-45.
  • 4
    Leme VN, Carvallo RMM. Efeito da estimulação acústica contralateral nas medidas temporais das emissões otoacústicas. Rev CEFAC. 2009;11(Suppl 1):24-30.
  • 5
    Perez AP, Kós MI, Frota S. A supressão das emissões otoacústicas transitórias em mulheres com audição normal. Rev CEFAC. 2006;8(3):368-74.
  • 6
    Urnau D, Tochetto TM. Ocorrência e efeito de supressão das emissões otoacústicas em adultos normo-ouvintes com zumbido e hiperacusia. Braz J Otorhinolaryngol. 2012;78(1):87-94.
  • 7
    Breuel MLF, Sanchez TG, Bento RF. Vias auditivas eferentes e seu papel no sistema auditivo. Arquivos Int. Otorrinolaringol. 2001;5(2):62-7.
  • 8
    Khalfa S, Morlet T, Micheyl C, Morgon A. Evidence of peripheral hearing asymmetry in humans: clinical implications. Acta otolaryngol. 1997;117:192-6.
  • 9
    Khalfa S, Collet L. Functional asymmetry of medial olivocochlear system in humans. Towards a peripheral auditory lateralization. Neuroreport. 1996;7:993-6.
  • 10
    Oliveira JRM, Fernandes CF, Filho OAC. Estudo da supressão da amplitude das emissões otoacústicas: dominância lateral. Braz J Otorhinolaryngol. 2011;77(5):547-54.
  • 11
    Amorim AM, Lewis DR, Rodrigues GRI, Fiorini AC, Azevedo MF. Efeito de supressão das emissões otoacústicas evocadas por estímulo transiente em lactentes de risco para perda auditiva nascidos pré-termo. Rev CEFAC. 2010;12(5):749-55.
  • 12
    Fávero ML, Sanchez TG, Bento RF, Nascimento AF. Atividade coclear assimétrica: influência do SNC? Arquivos Int Otorrinolaringol. 2005;9(4):300-4.
  • 13
    Foundas AL. Is language laterality established by 5 years os age? Neurology. 2003;60:1573-4.
  • 14
    Binder JR, Frost JA, Hammeke TA, Rao SM, Cox RW. Function of the left planum temporale in auditory and linguistic processing. Brain. 1996;119:1239-47.
  • 15
    Veuillet E, Georgieff N, Philibert B, Dalery J, Marie-Cardine M, Collet L. Abnormal peripheral auditory asymmetry in schizophrenia. J neurol neurosurg psychiatry. 2001;70:88-94.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    18 Jun 2015
  • Aceito
    12 Ago 2015
ABRAMO Associação Brasileira de Motricidade Orofacial Rua Uruguaiana, 516, Cep 13026-001 Campinas SP Brasil, Tel.: +55 19 3254-0342 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revistacefac@cefac.br