Acessibilidade / Reportar erro

Amamentação ao seio, amamentação com leite de vaca e o diabetes mellitus tipo 1: examinando as evidências

Breast- feeding, bottle- feeding and the type 1 diabetes mellitus: examining the evidences

Resumos

A etiologia do diabetes mellitus tipo 1 (DM1) envolve tanto herança genética como a exposição a fatores ambientais. Evidências de estudos epidemiológicos e experimentais sugerem que a dieta pode ser importante na etiopatogenia dessa doença. Em 1984, Borch-Johnsen e col. sugeriram, com base nos resultados de um estudo caso-controle, que o leite materno seria um fator de proteção para o DM1; esse efeito se daria devido às propriedades anti-infecciosas desse tipo de leite, ou pelo fato de que a amamentação ao seio evitaria que as crianças pudessem ser precocemente expostas a outros agentes etiológicos contidos nos substitutos do leite materno. Esses mesmos achados foram poste-riormente encontrados em diversos estudos, mas o papel do leite materno no aparecimento do DM1 ainda permanece controverso. Em 1992, Karjalainen e col., ao compararem os soros de indivíduos com e sem DM1, observaram, entre os diabéticos, altas concentrações de anticorpos anti-albumina bovina. Os autores postularam a hipótese de que a albumina bovina poderia atuar como desencadeadora do processo destrutivo das células ß do pâncreas e, conseqüentemente, do diabetes. Resultados conflitantes foram observados nas publicações que se sucederam a essa. Neste artigo, resumem-se e discutem-se os achados de diferentes pesquisadores que investigaram a importância desses fatores dietéticos para o aparecimento do DM1.

Diabetes mellitus insulino-dependente; Leite; Aleitamento materno; Diabetes mellitus, epidemiologia


The aetiology of type 1 diabetes mellitus (DM1) includes genetic heritage and environmental exposure. Evidence from animal and epidemiological studies suggests that some diet components may play a role in the aetiology of DM1. In 1984, Borch-Johnsen et al. suggested, based on a case-control study, that breast-feeding was a protective factor for DM1, probably due its anti-infectious properties or because breast-feeding delays exposure to other etiologic agents in the diet. Afterwards, the same results were found in several studies but the role of breast milk in the development of DM1, is still subject to controversy. In 1992, Karjalainen et al., compared the blood serum of subjects with and without DM1 and they observed a higher concentration of anti-bovine albumin antibodies among diabetic subjects. The authors suggested that bovine albumin could act as a trigger of the destructive process of the pancreas and, in this way, lead to diabetes; discordant results have been observed in the literature since then. In this paper, we summarise and discuss the results found in different studies on dietary factors and DM1.

Diabetes mellitus-insulin dependent; Milk; Breast-feeding; Diabetes mellitus, epidemiology


Amamentação ao seio, amamentação com leite de vaca e o diabetes mellitus tipo 1: examinando as evidências

Breast- feeding, bottle- feeding and the type 1 diabetes mellitus: examining the evidences

Suely Godoy Agostinho GimenoI; José Maria Pacheco de SouzaII

IDepartamento de Medicina Preventiva, Universidade Federal de São Paulo. Rua Botucatu, 740; 04023-900, São Paulo, SP - Brasil; e-mail: suely@medprev.epm.br

IIDepartamento de Epidemiologia, Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo. Av. Dr. Arnaldo, 715; 01246-904 São Paulo, SP - Brasil

RESUMO

A etiologia do diabetes mellitus tipo 1 (DM1) envolve tanto herança genética como a exposição a fatores ambientais. Evidências de estudos epidemiológicos e experimentais sugerem que a dieta pode ser importante na etiopatogenia dessa doença. Em 1984, Borch-Johnsen e col. sugeriram, com base nos resultados de um estudo caso-controle, que o leite materno seria um fator de proteção para o DM1; esse efeito se daria devido às propriedades anti-infecciosas desse tipo de leite, ou pelo fato de que a amamentação ao seio evitaria que as crianças pudessem ser precocemente expostas a outros agentes etiológicos contidos nos substitutos do leite materno. Esses mesmos achados foram poste-riormente encontrados em diversos estudos, mas o papel do leite materno no aparecimento do DM1 ainda permanece controverso. Em 1992, Karjalainen e col., ao compararem os soros de indivíduos com e sem DM1, observaram, entre os diabéticos, altas concentrações de anticorpos anti-albumina bovina. Os autores postularam a hipótese de que a albumina bovina poderia atuar como desencadeadora do processo destrutivo das células ß do pâncreas e, conseqüentemente, do diabetes. Resultados conflitantes foram observados nas publicações que se sucederam a essa. Neste artigo, resumem-se e discutem-se os achados de diferentes pesquisadores que investigaram a importância desses fatores dietéticos para o aparecimento do DM1.

Palavras-chave: Diabetes mellitus insulino-dependente. Leite. Aleitamento materno. Diabetes mellitus, epidemiologia

ABSTRACT

The aetiology of type 1 diabetes mellitus (DM1) includes genetic heritage and environmental exposure. Evidence from animal and epidemiological studies suggests that some diet components may play a role in the aetiology of DM1. In 1984, Borch-Johnsen et al. suggested, based on a case-control study, that breast-feeding was a protective factor for DM1, probably due its anti-infectious properties or because breast-feeding delays exposure to other etiologic agents in the diet. Afterwards, the same results were found in several studies but the role of breast milk in the development of DM1, is still subject to controversy. In 1992, Karjalainen et al., compared the blood serum of subjects with and without DM1 and they observed a higher concentration of anti-bovine albumin antibodies among diabetic subjects. The authors suggested that bovine albumin could act as a trigger of the destructive process of the pancreas and, in this way, lead to diabetes; discordant results have been observed in the literature since then. In this paper, we summarise and discuss the results found in different studies on dietary factors and DM1.

Keywords: Diabetes mellitus-insulin dependent. Milk. Breast-feeding. Diabetes mellitus, epidemiology

O diabetes mellitus tipo 1 (DMI) ou dependente de insulina (DMDI) ocorre em indivíduos geneticamente susceptíveis, como conseqüência direta de um processo autoimune, que leva à destruição das células ß das ilhotas de Langerhans no pâncreas. É um processo crônico, com um período médio provável de latência de 10 anos1. O pico de incidência da doença ocorre na faixa etária de 10 a 14 anos. Indivíduos com risco de desenvolver essa doença podem ser identificados pela presença, no soro, de auto-anticorpos anti-células das ilhotas, anti-insulina, anti-ácido glutâmico dexcarboxilase, anti-tirosina fosfatase e por uma diminuição da capacidade de produzir insulina1,2.

Genes do sistema HLA, localizados no cromossoma 6, especialmente os DQA, DQB e DRB, conferem aos indivíduos proteção ou predisposição ao DM1. Mesmo com essa base genética, 80 a 90% dos casos de DM1 representam o único caso da família, sugerindo que fatores ambientais podem estar implicados na etiopatogenia desse tipo de diabetes 2-5.

Drash e colaboradores6 comentam que diferentes fatores ambientais podem estar envolvidos na iniciação e manutenção do processo autoimune, entre eles, as viroses, especialmente aquelas relacionadas ao vírus Coxsackie B, ao citomegalovirus, ao da varicela, ao da rubéola e ao do sarampo7-15. As relações entre o DM1 e 1) algumas toxinas, como por exemplo as nitrosaminas, 2) o estresse emocional e 3) diferentes componentes da dieta, como o leite materno (LM), o leite de vaca (LV), o leite de soja, as carnes defumadas, a água com alto teor de nitrato (efeito tóxico), a idade da introdução de alimentos sólidos na dieta infantil e o consumo de café e de açúcar pela mãe durante a gestação, também têm sido investigadas16-25.

Uma dificuldade para interpretar, como causais, as associações encontradas entre o DM1 e os diferentes fatores de risco é que a destruição das células ß pancreáticas pode ter sido iniciada muitos anos antes do aparecimento clínico da doença, incluindo o período intra-uterino; essas associa- ções podem refletir a presença de certos fatores precipitantes da doença e não, necessariamente, a de promotores da destruição das células ß3,26.

Focalizam-se, neste trabalho, as evidências que apontam o leite materno e o leite de vaca, respectivamente, como fator de proteção e de risco para o DM1. Utilizaram-se as publicações sobre o tema, identificadas a partir de 1980, com a utilização das bases de dados Medline e Lilacs, tendo sido possível a localização e obtenção de cópia, integral ou sob a forma de abstract, desses documentos.

As hipóteses

A autoimunidade do DM1 pode ser desencadeada por um processo conhecido como mimetismo molecular. Em tal processo, um antígeno externo, por exemplo um vírus, provocaria uma resposta imune normal em qualquer parte do corpo. Se este antígeno tiver conformação similar ou for quimicamente semelhante a um componente das células ß, o antígeno poderia também estimular um ataque contra as células pancreáticas27.

Mayer e col.28 e Bognetti e col.29 comentaram que o aleitamento ao seio poderia ser capaz de modificar a história natural do DM1, protegendo a criança contra doenças viróticas, evitando ou retardando o aparecimento da doença. Além disso, o LM compensaria a deficiência na produção de imunoglobulinas e protegeria a criança contra infecções do trato gastrointestinal30. Por outro lado, a amamentação exclusivamente ao seio durante o período em que o trato gastrointestinal ainda é imaturo, evitaria, como conseqüência, a introdução precoce de outros alimentos na dieta infantil, tais como o LV, que poderiam ter ação diabetogênica.

A semelhança observada entre uma dada seqüência de amino-ácidos da albumina bovina (AB) e a proteína p69, encontrada na superfície das células ß pancreáticas, cuja presença é mediada pelo gama-interferon, sugere que o LV poderia ser um desencadeador do DMDI 20. Segundo Karjalainen e col.31, o sistema imune identificaria na AB uma seqüência de 17 amino-ácidos diferente daquela observada na mesma proteína em humanos, produzindo anticorpos contra ela. Esses anticorpos seriam capazes de reagir com a proteína p69, cuja expressão na superfície celular ocorreria a partir de sucessivos eventos infecciosos e não relacionados, que levariam à produção de gama-interferon. O longo período de latência da doença seria explicado, segundo os autores, pela natureza temporária de tais episódios.

As evidências

Em 1984, Elliot e Martin32 relataram que a substituição, no momento do desmame, da proteína do leite de vaca (LV) por proteína semi-sintética levou a importante redução na incidência de DM1 em animais de laboratório. Posteriormente, em 1987, Daneman e col.33 confirmaram os achados de Elliot e Martin32. Martin e col.20, em 1991, observaram que ratos diabéticos tinham titulação aumentada de anticorpos anti-AB quando comparados com os animais controles, confirmando os achados anteriores de Beppu e col.34.

Scott e col.35, ao examinarem os resultados de experimentos com animais, comentaram que, apesar de diversos estudos terem confirmado a associação entre o LV e o DM1, esses achados não foram consistentes e, em alguns casos, como o de Hoofar e colaboradores36, os pesquisadores encontraram evidências de que outras proteínas, tais como a da soja, também poderiam desencadear o diabetes em animais geneticamente susceptíveis.

Estudos ecológicos realizados em diferentes partes do mundo têm também sugerido que o LV pode ser um fator de risco para o DM124,37-39. Dahl-Jorgensen e col.37 mostraram que 94% da variação geográfica observada na incidência do DM1 poderia ser explicada por diferenças no consumo de leite nos países estudados. Muntoni e colaboradores40 não conseguiram reproduzir os achados de Dahl-Jorgensen e col.37, especialmente para a região da Sardenha, na Itália, onde a incidência esperada para o DM1, com base no consumo de leite, foi notadamente inferior à observada.

Os resultados de estudos ecológicos têm que ser interpretados com cautela; as informações utilizadas referem-se a grupos e não a indivíduos. No caso especial do consumo de LV, os dados são relativos a indivíduos em diferentes faixas etárias e não refletem, necessariamente, a dieta na infância. De qualquer forma, estudos ecológicos são úteis como geradores de hipóteses.

Em humanos, a principal evidência de que o LV pode ser diabetogênico é retrospectiva e indireta, baseada em diversos estudos caso-controle sobre o aleitamento ao seio e o DM135.

A partir das observações feitas por Borch-Johnsen e col.17, em 1984, de que crianças com DM1 tinham sido amamentadas por um período de tempo menor que aquelas sem a doença, outros estudos foram conduzidos com o objetivo de conhecer a relação entre o DM1 e a duração do aleitamento ao seio e a idade da introdução do LV na alimentação infantil (Tabela)41-53, com resultados nem sempre coincidentes. Recentemente, três estudos caso-controle foram apresentados, sob a forma de abstract, no 16th Interna-tional Diabetes Federation Congress54-56, confirmando os achados anteriores de Borch-Johnsen e col.17.

Berdanier57 afirma que, dadas as dificuldades para a implementação de estudos epidemiológicos prospectivos, as investigações tipo caso-controle têm sido bastante úteis. Esses estudos são uma boa opção para investigações sobre a etiologia de doenças com baixa incidência, tais como o DM158,59; suas limitações incluem a possibilidade de introdução de vícios 1) na seleção dos indivíduos (casos e controles), 2) na lembrança de eventos distantes que, em algumas situações não pode ser validada e 3) pela ação de confusão exercida por outros fatores60. Tais vieses podem afetar a validade, a magnitude e a direção das associações encontradas. Norris e Scott61 afirmaram que as associações observadas na maioria dos estudos sobre o DM1 e o LV, por serem de pequena magnitude [odds ratio (OR) < 2,0], podem ser resultantes de vieses.

Sempre que possível, estudos caso-controle deveriam incluir, como casos, apenas indivíduos com diagnóstico recente da doença; porém, em áreas onde a incidência da doença é moderada ou baixa, pode ser impraticável o desenvolvimento de investigações que incluam exclusi-vamente casos novos da doença. Além disso, quando a exposição a um determinado fator não está relacionada com a duração da doença, casos prevalentes podem ser utilizados58.

Como pode ser observado na Tabela, resultados não coincidentes foram observados entre as pesquisas que utilizaram casos prevalentes de DM117,18,22,41,42,47,49,52,53. Situação semelhante foi também observada em relação àqueles que utilizaram casos com diagnóstico recente da doença25,26,28,42-46,48,50,51. Norris e Scott61, após meta-análise dos estudos publicados sobre a relação entre o DM1 e o LV, observaram que a significância estatística da associação entre essas variáveis desapareceu quando foram agrupados os resultados dos estudos que utilizaram casos prevalentes (OR: 1,36; IC 95%: 0,93-1,98), feitos em áreas com prevalência de aleitamento ao seio inferior a 85% (OR: 1,41; IC 95%: 0,90-2,20) ou com baixa incidência de DM1 (OR: 1,72; IC 95%: 0,88-3,37) sugerindo, segundo esses autores, possibilidade de viés nos resultados desses estudos.

Na Tabela, observa-se que a maioria dos estudos utilizaram, como controles, indivíduos vindos da população geral; Gerstein62, após meta-análise que incluiu treze artigos, afirmou que, apesar das vantagens da utilização desse procedimento, os ORs encontrados nesses estudos podem estar subestimados pois certamente foram incluídos, como controles, indivíduos sem predisposição genética para o DM1.

Variável porcentagem de participação de casos (62 a 100%) e de controles (55 a 100%) foi também constatada, dificultando a interpretação dos resultados (Tabela). Nos estudos feitos por Mayer e col.28 e Verge e col.51 observaram-se as menores porcentagens de participação de casos e controles. As associações entre o DM1 e o LM e o LV encontradas em ambos os trabalhos, apesar de terem o mesmo sentido, mostram-se contraditórias em relação à significância estatística (p<0,05). Norris e Scott61 observaram que o possível efeito protetor do LM (duração do aleitamento materno < 3 meses vs ³ 3 meses) foi mantido quando foram reunidas aquelas pesquisas com porcentagem de participação de casos e controles, maior que 75% (OR: 1,27; IC 95%: 1,06-1,52); situação semelhante foi observada para o LV (exposição ao LV antes dos 3 meses vs a partir dos 3 meses de idade: OR: 1,32; IC 95%: 1,08-1,60), sugerindo que a associação entre o DM e esses fatores pode ser causal.

Nos três estudos onde a validade ou reprodutibilidade do instrumento utilizado para a coleta dos dados foi verificada17,18,53, o efeito protetor para o DM1 do LM e de risco do LV foram confirmados. Contudo, as pesquisas que utilizaram registros existentes22,47 não encontraram associação entre as práticas alimentares na infância e o DM1; esse fato não invalida os demais achados, dado que esses registros não foram sistematicamente coletados e, dessa forma, podem também ser questionados quanto à sua validade.

Boa reprodutibilidade das informações referentes à alimentação da criança, nos primeiros dias de vida, tem sido encontrada por diferentes pesquisadores63,64. Esse fato sugere que, apesar das dificuldades para a determinação precisa do período crítico de risco, é pouco provável a existência de viés nos resultados, para os primeiros dias de vida, encontrados nas diferentes pesquisas. Além disso, Kostraba e col.18 afirmaram ser pouco provável a ocorrência de viés diferencial de memória entre as mães das crianças diabéticas, pois raramente são inquiridas sobre as práticas alimentares e, dessa forma, não associam o aparecimento da doença com esse fato. Destaca-se ainda que, na presença desse tipo de viés em ambos os grupos (casos e controles), os ORs obtidos estariam subestimados, tendendo à unidade, fortalecendo, dessa forma, as hipóteses de existência de efeito protetor do LM e de risco do LV.

Em onze estudos18,25,28,43-46,49-51,53, encontrou-se referência ao controle, na análise dos dados, do possível efeito de confusão exercido por outras variáveis (Tabela). Destaca-se que, em sete deles18,25,46,49-51,53, os ORs ajustados, para o LM ou LV, foram estatisticamente significantes (p<0,05), sugerindo que essas associações podem ser causais.

As observações de que crianças com diagnóstico recente do DM1 possuem níveis aumentados de anticorpos anti-AB têm sido utilizadas como evidência do elo causal entre o LV e o DM1. Segundo Rennie65 e Drash e col. 6, a presença de anticorpos anti-AB é bem tolerada pelo homem, porém, em crianças predispostas ao diabetes, o mecanismo aparentemente fracassa, desencadeando o processo autoimune. Karjalainen e col.31, Savilahti e col.66, 67, Cheung e col.68, Miyazaki e col.69 e Pardini e col.70 encontraram, no soro de indivíduos diabéticos, maiores concentrações de anticorpos anti-AB, quando comparados com aqueles sem a doença. Porém, Atkinson e col.71 e Lorini e col.72,73 não conseguiram reproduzir esses achados. Essas inconsistências podem ser reflexo das diferenças nas técnicas utilizadas nos testes para mensuração dos anticorpos e das características dos indivíduos estudados (idade e tempo de diagnóstico, especialmente). A redução da resposta imune contra a AB, observada algum tempo após o diagnóstico do DM1, fortalece, segundo Sheard74, a existência de relação causal entre o diabetes e o consumo do LV.

A albumina é a proteína plasmática mais abundante; é encontrada no sangue de todos os mamíferos e uma pequena parte, aproximadamente 1% do total de proteínas, está presente no leite. Fórmulas baseadas em LV são freqüentemente consumidas por ocasião do desmame ao seio. Concentrações de AB (como porcentagem do total de proteínas) iguais ou superiores àquelas encontradas no LV foram observadas por Monte e col.75 em três produtos lácteos infantis; como advertem os pesquisadores, se a AB é um desencadeador do DM1, sua presença em alguns produtos é particularmente perigosa, dado que, em geral, são consumidas em uma fase da vida em que o sistema digestivo ainda está imaturo.

Apesar das evidências existentes até o momento, não se pode afirmar que o desmame precoce e a conseqüente introdução do LV na alimentação infantil sejam causa de DM1; a importância desses fatores e da reatividade a AB para o desenvolvimento do DM1 permanece controversa. À luz do conhecimento atual, acredita-se ser indicada, como forma de prevenir o aparecimento do DM1, a amamentação exclusiva ao seio por pelo menos três meses, evitando-se a introdução precoce, na alimentação infantil, do leite de vaca e de seus derivados.

O desenvolvimento de estudos epide-miológicos prospectivos, tais como o que está sendo coordenado por Äkerblom e col.30, talvez possa, nos próximos anos, esclarecer alguns aspectos sobre a relação desses fatores de risco e o DM1. Além disso, é também necessário o desenvolvimento de investigações que examinem a relação entre o diabetes e a exposição precoce aos outros substitutos do LM, tais como a soja e o trigo.

Summary

The destruction of pancreatic beta cells that occurs in patients with type 1 diabetes mellitus (DM1) is autoimmune in nature, although the cause of the autoimmune process is not known. Several recessive genes map the risk of diabetes, but the concordance in identical twins is less than 50%, suggesting that one or more environmental factors trigger the disease. Evidence from animal and epidemiological studies suggest that some diet components may play a role in the aetiology of DM1. In 1984, Borch-Johnsen et al. suggested, based on a case-control study, that breast-feeding (BF) was a protective factor for DM1, probably due to its anti-infectious properties or because breast feeding delays exposure to other etiologic agents in the diet. The same results were found in several studies afterwards but, according to Norris & Scott, subsequent case-control studies have varied in their findings. Certain studies suggested that the longer children had been breast-fed, the lower was their risk for developing diabetes, whereas other studies did not show increased protection with longer duration of BF. In two animal models, the BB rat and the NOD mouse, Elliot & Martin and Daneman et al. found that the incidence of spontaneously developing diabetes may be reduced by withdrawing the cow's milk (CM) protein from the diet before weaning. In 1992, Karjalainen et al. compared the blood serum of subjects with and without DM1 and they observed a higher concentration of antibovine albumin antibodies among diabetic subjects. The authors suggested that bovine albu- min could act as a trigger of the des- tructive process of the pancreas and, in this way, of DM1; discordant results have since been observed in the literature. Norris & Scott commented that as most effect estimates for BF and CM were relatively weak (odds ratio < 2.0), their interpretation can be tricky, since weak associations can be more readily explained by bias. In this paper, we summarise and discuss the results found in different studies on the relationship between DM1 and BF and DM1 and CM.

Auxílio financeiro

Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP: 94/0943-0)

  • 01. Zimmet P. Antibodies to glutamic acid decarboxylase in the prediction of insulin dependency. Diabetes Res Clin Pract 1996; 34: 125-31.
  • 02. Gavin JR, Alberti KGMN, Davidson MB et al. Report of expert committe on diagnosis and classification of diabetes mellitus. Diabetes Care 1997; 20: 1183-97.
  • 03. Green A. The role of genetic factors in development of insulin-dependent diabetes mellitus. Curr Top Microbiol Immunol 1990; 164: 3-16.
  • 04. Dorman JS, MaCarthy B, McCanlies E et al. Molecular IDDM epidemiology: international studies. Diabetes Res Clin Pract 1996; 34: 107-16.
  • 05. Matsuura N, Ko KW, Park, YS et al. Molecular epidemiology of IDDM in the Western Pacific Rim Region. Diabetes Res Clin Pract 1996; 34: 117-23.
  • 06. Drash AL, Kramer MS, Swanson J et al. Infant feeding practices and their possible relationship to the etiology of diabetes mellitus. Pediatrics 1994; 94: 752-5.
  • 07. Gamble DR. The epidemiology of insulin-dependent diabetes with particular reference to the relationship of virus infection to its etiology. Epidemiol Rev 1980; 2: 49-70.
  • 08. Champsaur HF, Bottazzo GF, Bertrans J et al. Virologic, immmunologic and genetic factors on insulin-dependent diabetes mellitus. J Pediatr 1982; 100: 15-20.
  • 09. Tuveno T, Dahlquist G, Frisk G et al. The Swedish childhood diabetes study III: IgM against coxsackie B viruses in newly diagnosed type I (insulin-dependent) diabetes children - no evidence of increased antibody frequency. Diabetologia 1989; 32: 745-7.
  • 10. Yoon JW. The role of viruses and envirommental factors in the induction of diabetes. Curr Top Microbiol Immunol 1990; 164: 95-123.
  • 11. Sumburèru D. Insulin-dependent diabetes mellitus: an etiologic model. Med Hypotheses 1991; 35: 363-8.
  • 12. D'Allessio DJ. A case-control study of group B coxsackie virus immunoglobulin M antibody prevalence and HLA-DR antigen in newly diagnosed case of insulin-dependent diabetes mellitus. Am J Epidemiol 1992; 135: 1331-8.
  • 13. Makeen AM. The association of infective hepatitis type A (HAV) and diabetes mellitus. Trop. Geogr. Med. 1992;4:362-4.
  • 14. Dahlquist G. Non-genetic risk determinants of type I diabetes. Diabetes Metab 1994; 20: 251-7.
  • 15. Cavallo MG, Baroni MG, Toto A et al. Viral infection induces cytokine release by beta islet cells. Immunology 1992; 75: 664-8.
  • 16. Bain SC, Rowe BR, O'Donnel MJ et al. Coffee consumption as trigger for diabetes in childhood [Letter]. BMJ 1990; 300: 1012.
  • 17. Borch-Johnsen K, Mandrup-Poulsen T, Zachau-Christiansen, B et al. Relationship between breast feeding and incidence rates of insulin-dependent diabetes mellitus: a hypothesis. Lancet 1984; 2: 1083-6.
  • 18. Kostraba JM, Dorman JS, LaPorte R et al. Early infant diet and risk of IDDM in blacks and whites. Diabetes Care 1992; 15: 626-31.
  • 19. Kostraba JN, Gay EC, Rewers M et al. Nitrate levels in community drinking waters and risk of IDDM. Diabetes Care 1992; 15:1505-8.
  • 20. Martin JM, Trink B, Daneman D et al. Milk proteins and etiology of insulin-dependent diabetes mellitus. Ann Med 1991; 23: 447-52.
  • 21. Matthews DR, Spivey RS, Kennedy I. Coffee consumption as trigger for diabetes in childhood [Letter]. BMJ 1990; 300: 1012.
  • 22. Nigro G, Campea L, Denovellis A et al. Breast feeding and insulin-dependent diabetes mellitus. Lancet 1985; 1: 467.
  • 23. Pozzilli P, Bottazzo GF. Coffee or sugar: wich is to blame in IDDM. Diabetes Care 1991; 14: 144-5.
  • 24. Scott FW. Cow milk and insulin-dependent diabetes mellitus: is there a relationship? Am J Clin Nutr 1990; 51: 489-91.
  • 25. Virtanen SM, Räsänen L, Aro A et al. Feeding in infancy and the risk of type 1 diabetes mellitus in Finnish children. Diabet Med 1992; 9: 815-9.
  • 26. Soltèsz G, Jeges S, Dahlquist G et al. Non-genetic risk determinants for type I (insulin-dependent) diabetes mellitus in childhood. Acta Paediatr 1994; 83: 730-5.
  • 27. Atkinson MA, MacLaren NK. What causes diabetes? Sci Am 1990; 2: 42-9.
  • 28. Mayer EJ, Hamman RF, Gay EC et al. Reduced risk of IDDM among breast-feed children. Diabetes 1988;37:1625-32.
  • 29. Bognetti E, Meschi F, Malavasi C et al. HLA antigens in Italian Type 1 diabetic patients: role of DR3/DR4 antigens and breast feeding in the onset of the disease. Acta Diabetol 1992; 28: 229-32.
  • 30. Äkerblom HK, Savilahti E, Saukkonen TT et al. The case for elimination of cow's milk in early infancy in the prevention of type 1 diabetes: the Finnish experience. Diabetes Metab 1993; 9: 269-78.
  • 31. Karjalainen J, Martin JM, Kinip M et al. A bovine albumin peptide as a possible trigger of insulin-dependent diabetes mellitus. N Engl J Med 1992; 327: 302-7.
  • 32. Elliot RB, Martin JM. Dietary protein: a trigger of insulin-dependent diabetes in BB rat? Diabetologia 1984;26:297-9.
  • 33. Daneman D, Fishman L, Clarson C et al. Dietary triggers of insulin-dependent diabetes in BB rat. Diabetes Res 1987; 5: 93-7.
  • 34. Beppu H, Winter WE, Atkinson MA et al. Bovine albumin antibodies in NOD mice. Diabetes Res 1987; 6: 67-9.
  • 35. Scott F, Norris JN, Kolb H. Milk and type I diabetes: examining the evidence and broadening the focus. Diabetes Care 1996; 19: 379-83.
  • 36. Hoofar J, Scott FW, Cloutier HE. Dietary plants materials and development diabetes in BB rats. J Nutr 1991; 121: 908-16.
  • 37. Dahl-Jorgensen KD, Jones G, Hanssen KF. Relationship between cow's milk and incidence of IDDM in childhood. Diabetes Care 1991; 14: 1081-3.
  • 38. Fava D, Leslie RDG, Pozzilli P. Relationship between dairy product consumption and incidence of IDDM in childhood in Italy. J Pediatr Gastroenterol. Nutr 1995; 20: 91-4.
  • 39. Yang Z, Wang K, Li T et al. Food/nutrient consumption and the incidence of insulin-dependent diabetes in China [abstract]. Diabetologia 1997; 40: 60.
  • 40. Muntoni S, Lodro S, Stabilini M et al. Cow's milk consumption and IDDM incidence in Sardinia. Diabetes Care 1994; 17: 346-7.
  • 41. Fort P, Lanes R, Dahlem S et al. Breast-feeding and insulin-dependent diabetes mellitus in children. J Am Coll Nutr 1986; 5: 439-41.
  • 42. Glatthaar C, Whittall DE, Welborn TA et al. Diabetes in Western Australian children: descriptive epidemiology. Med J Aust 1988; 148: 117-23.
  • 43. Blom L, Dahlquist G, Nystrom L et al. The Swedish Childhood Diabetes Study: social and perinatal determinants for diabetes in childhood. Diabetologia 1989; 32: 7-13.
  • 44. Dahlquist G, Blom L, Lonnberg G. The Swedish Childhood Diabetes Study: a multivariate analysis of risk determinants for diabetes in different age groups. Diabetologia 1991; 34: 757-62.
  • 45. Siemiatycki J, Colle E, Campbell S et al. Case-control study of IDDM. Diabetes Care 1989; 12: 209-16.
  • 46. Virtanen SM, Räsänen L, Aro A et al. Infant feeding in Finnish < 7 year of age with newly diagnosed IDDM. Diabetes Care 1991; 14: 415-7.
  • 47. Kyvik KO, Green A, Svendsen A et al. Breast-feeding and the development of type 1 diabetes mellitus. Diabetic Med 1992; 9: 233-5.
  • 48. Metcalfe MA, Baum JD. Family characteristics and insulin-dependent diabetes. Arch Dis Child 1992; 67: 731-6.
  • 49. Kostraba JN, Cruiekshanks J, Lawer-Heavner J et al. Early exposure to cow's milk and solid food in infancy, genetic predisposition and risk of IDDM. Diabetes 1993;42:288-95.
  • 50. Virtanen SM, Saukkonen T, Savilahti E et al. Diet, cow's milk protein antibodies and the risk of IDDM in Finnish children. Diabetologia 1994; 37: 381-7.
  • 51. Verge CP, Howard NJ, Irwig L et al. Environmental factors in childhood IDDM: a population-based case-control study. Diabetes Care 1994; 17: 1381-9.
  • 52. Mijac V, Arrieta J, Mendt C et al. Papel de los factores ambientales en el desarollo de la diabetes mellitus insulino dependiente (DMID) en niños venezolanos. Invest Clin 1995; 36:73-82.
  • 53. Gimeno SGA, Souza JMP. IDDM and milk consumption: a case-control study in São Paulo, Brazil. Diabetes Care 1997; 20: 1256-60.
  • 54. Perez-Bravo F, Santos JL, Calvillan M et al. Genetic and environmental factors in type 1 (insulin-dependent) diabetes mellitus in Chilean children [abstract]. Diabetologia 1997; 40: 52.
  • 55. Arbel A, Sprecher E, Josefserg Z et al. No IDDM protective effect of breast-feeding in Israel [abstract]. Diabetologia 1997; 40: 62.
  • 56. Kurbanov TH, Gaisina AA. Breast-feeding, development diabetes mellitus [abstract]. Diabetologia 1997; 40: 62.
  • 57. Berdanier CD. Diet, autoimmunity, and insulin-dependent diabetes mellitus: a controversy. Proc Soc Biol Med 1995; 209: 223-30.
  • 58. Rothman KJ. Modern epidemiology Boston: Little Brown and Company; 1986.
  • 59. Schlesselman JJ. Case-control studies: design, conduct and analysis Oxford: Oxford University Press; 1982.
  • 60. Kopec JA, Edaile JM. Bias in case-control studies: a review. J Epidemiol Community Health 1990; 44: 179-86.
  • 61. Norris JM, Scoot FW. A meta-analysis of infant diet and insulin-dependent diabetes mellitus: do biases play a role? Epidemiology 1996; 7: 87-92.
  • 62. Gerstein HC. Cow's milk exposure and type 1 diabetes mellitus: a critical overview of the clinical literature. Diabetes Care 1994; 17: 13-9.
  • 63. Vobecky JS, Vobecky J, Froda S. The reliability of the maternal memory in a retrospective assessment of nutritional status. J Clin Epidemiol 1988; 41: 261-5.
  • 64. Gimeno SGA, Souza JMP. Reprodutibilidade de informações em estudos sobre fatores de risco para o diabetes mellitus insulino-dependente. Rev Saúde Pública 1997; 31: 391-4.
  • 65. Rennie J. Formula for diabetes? Cow's milk for in-fants may contribute to disease. Sci Am 1992; 2: 13.
  • 66. Savilahti E, Saukkonen TT, Virtala ET et al. Increased levels of cow's milk and ß-lactoglobulin antibodies in young children with newly diagnosed IDDM. Diabetes Care 1993; 16: 984-9.
  • 67. Salvilahti E. Levels of antibodies to cow's milk and ß-lactoglobulin associate with age at onset of clinical IDDM and type of infant-feeding. Diabetes Care 1994; 17: 781-2.
  • 68. Cheung R, Karjalainen J, Vandermeulen J et al. T cells from children with IDDM are sensitized to bovin serum albumin. Scand J Immunol 1994; 40: 623-8.
  • 69. Miyasaki I, Cheung RK, Gaedigk R et al. T cell activation and energy to islet cell antigen in type 1 diabetes. J Immunol 1995; 154: 1461-9.
  • 70. Pardini VC, Vieira JGH, Miranda W et al. Antibodies to bovine serum albumin in Brazilian children and young adults with IDDM. Diabetes Care 1996;19:126-9
  • 71. Atkinson MA, Boman MA, Kao KJ et al. Lack of immune responsiveness to bovine serum albumin in insulin-dependent diabetes. N Engl J Med 1993; 329: 1853-8.
  • 72. Lorini R, Avanzini MA, Vitali L. Follow-up of anti-lactoglobulin antibodies in children with type 1 (insulin-dependent) diabetes mellitus. Diabetologia 1993; 36: 683-4.
  • 73. Lorini R, Avanzini MA, Vitali L. Anti-beta lactoglobulin antibodies in newly diagnosed children with IDDM and their sibilings. Diabetes Care 1994; 17: 780-1.
  • 74. Sheard NF. Cow's milk, diabetes and infant feeding. Nutr Rev 1993; 51: 7981.
  • 75. Monte CW, Johnson CS, Role LE. Bovin serum albumin detected in infant formula is a possible trigger for insulin-dependent diabetes mellitus. J Am Diet Assoc 1994; 94: 314-6.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Jul 2007
  • Data do Fascículo
    Abr 1998
Associação Brasileira de Saúde Coletiva Av. Dr. Arnaldo, 715 - 2º andar - sl. 3 - Cerqueira César, 01246-904 São Paulo SP Brasil , Tel./FAX: +55 11 3085-5411 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revbrepi@usp.br