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Nudging e Arquitetura da Escolha: Perspetivas e Desafios

INTRODUÇÃO

A arquitetura da escolha está presente no quotidiano e o processo pelo qual as decisões são tomadas tem se tornado cada vez mais complexo. Esta edição especial responde à necessidade de explorar as complexidades do nudging e da arquitetura da escolha no contexto do ambiente atual. As decisões podem ser decompostas em um processo de tomada de decisão diversificado e intrincado em que os indivíduos são obrigados a navegar em sucessivos quadros de escolha e a otimizar suas decisões, enquanto enfrentam limitações de tempo, informação e capacidade intelectual para processar opções de escolha e chegar a uma decisão. Por exemplo, tomamos mais de 200 decisões por dia relacionadas com a alimentação (Wansink & Sobal, 2007Wansink, B., & Sobal, J. (2007). Mindless eating: The 200 daily food decisions we overlook. Environment and Behavior, 39(1), 106-123. https://doi.org/10.1177/0013916506295573
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). Algumas dessas decisões são deliberadas e ponderadas, mas a grande maioria é feita automaticamente, através de um período de liberação consciente muito curto, usando atalhos mentais ou hábitos. De facto, 45% dos comportamentos diários resultam de hábitos e tendem a se repetir em contextos semelhantes (Neal, Wood, & Quinn, 2006Neal, D. T., Wood, W., & Quinn, J. M. (2006). Habits-A repeat performance. Current Directions in Psychological Science, 15(4), 198-202. https://doi.org/10.1111/j.1467-8721.2006.00435.x
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). Hábitos são atalhos que não garantem sempre a melhor decisão, mas que podem funcionar muito bem para desencadear uma resposta rápida, o que significa que bons ou maus hábitos tendem a se repetir. As escolhas cumulativas têm consequências, interagem e influenciam as decisões subsequentes que tendem a se repetir ao longo do tempo.

A forma como as opções são apresentadas e enquadradas influencia o curso do processo de decisão e, consequentemente, as escolhas efetuadas. Assim, as escolhas podem ser alteradas positivamente alterando a arquitetura de escolha por meio de nudges, gerando mudanças comportamentais reais e duradouras. Por exemplo, enquanto as pessoas querem ter uma alimentação mais saudável, fazer mais exercícios, adotar um comportamento mais sustentável, ser mais organizadas e produtivas, economizar mais e investir melhor, elas continuam agindo contrariamente às suas intenções, mesmo quando sabem exatamente como devem se comportar para alcançar os seus objetivos. Da mesma forma, não é pela falta de conhecimento sobre quais são as escolhas mais saudáveis que as pessoas mantêm padrões de escolha prejudiciais face às suas intenções e interesses mas devido a hábitos enraizados, atuações usuais e inconscientes e adiamento de um melhor comportamento. Nessas situações, surgem os nudges com o objetivo de mudar a arquitetura da escolha usando dicas simples que levam a uma mudança comportamental positiva.

A ‘arquitetura da escolha’ refere-se ao cenário ou ambiente de escolha, enquanto os nudges são mudanças no design desse ambiente de escolha com o objetivo de induzir melhores escolhas, mantendo a liberdade de escolha e permitindo que os indivíduos escolham entre todas as opções disponíveis (Leal & Oliveira, 2020Leal, C. C., & Oliveira, B. (2020). Choice architecture: Nudging for sustainable behavior. In C. F. Machado & J. P. Davim (Eds.), Sustainable management for managers and engineers (Chap. 1). London: ISTE and Wiley. https://doi.org/10.1002/9781119804345.ch1
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; Thaler & Sunstein, 2008Thaler, R. H., & Sunstein, C. R. (2008). Nudge: Improving decisions about health, wealth, and happiness. New Haven: Yale University Press.). Assim, os nudges ajudam a redesenhar o ambiente de escolha usando métodos previsíveis e deliberados de mudar o comportamento das pessoas, modificando sinais e ativando processos de pensamento inconscientes na tomada de decisão que permitem que os decisores façam melhores escolhas. Nudging implica que as decisões são voluntárias e que todas as alternativas são oferecidas sem custo ou esforço adicional. Esta perspectiva sugere que os nudges são elementos neutros porque não alteram significativamente os incentivos económicos (Marchiori, Adriaanse, & Ridder, 2017Marchiori, D. R., Adriaanse, M. A., & Ridder, D. T. D. (2017). Unresolved questions in nudging research: Putting the psychology back in nudging. Social and Personality Psychology Compass, 11(1), e12297. https://doi.org/10.1111/spc3.12297
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) e, em simultâneo, poderosos porque não assentam em processos que exijam grande esforço mas na natureza intuitiva do processo de decisão, apelando a vieses cognitivos (Kroese, Marchiori, & Ridder, 2016Kroese, F. M., Marchiori, D. R., & Ridder, D. T. D. (2016). Nudging healthy food choices: A field experiment at the train station. Journal of Public Health, 38(2), e133-e137. https://doi.org/10.1093/pubmed/fdv096
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). Uma das vantagens mais salientes do nudging é a facilidade de implementação a um baixo custo e com resultados eficazes. As intervenções para gerar mudança de comportamento serão mais bem-sucedidas se considerarem hábitos no design de nudging, quer alterando o ambiente para eliminar maus hábitos, quer adicionando pistas para gerar novos bons hábitos (Verplanken & Wood, 2006Verplanken, B., & Wood, W. (2006). Interventions to break and create consumer habits. Journal of Public Policy & Marketing, 25(1), 90-103. https://doi.org/10.1509/jppm.25.1.90
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). Adicionalmente, comportamentos repetitivos que podem parecer sem importância têm o potencial de acumular ao longo do tempo e, como um todo, produzir um impacto substancial em muitos indivíduos. Por exemplo, reduzir a quantidade de açúcar que se coloca no café reduzindo o tamanho da colher pode ter um efeito significativo na quantidade de açúcar consumida sem proibir alguém de adicionar duas colheres de açúcar. Contudo, pode ser possível melhorar a condição de saúde ao longo do tempo através deste simples hábito.

AGENDA DE PESQUISA DE NUDGING

O principal objetivo do nudging é sempre apontar a melhor opção e desencadear escolhas alinhadas com o melhor interesse do indivíduo. No entanto, não há evidências claras de que um nudge influencie o comportamento e a escolha para além de cada caso específico (Marchiori et al., 2017Marchiori, D. R., Adriaanse, M. A., & Ridder, D. T. D. (2017). Unresolved questions in nudging research: Putting the psychology back in nudging. Social and Personality Psychology Compass, 11(1), e12297. https://doi.org/10.1111/spc3.12297
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) e a utilização de nudges enfrenta alguma controvérsia. Por exemplo, enquanto os políticos acolheram com entusiasmo o nudging, acadêmicos ou o público criticaram ou questionaram essa abordagem (Ridder, Kroese, & van Gestel, 2022Ridder, D., Kroese, F., & van Gestel, L. (2022). Nudgeability: Mapping conditions of susceptibility to nudge influence. Perspectives on Psychological Science, 17(2), 346-359. https://doi.org/10.1177/1745691621995183
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). O nudging está condicionado à confiança que as pessoas têm em determinado sistema, seja ele governamental, institucional ou corporativo. Há um debate sobre a legitimidade do nudge, pois embora se considere que o nudge promova a tomada de decisões no próprio interesse do indivíduo, este pode violar princípios de transparência e liberdade de escolha (Leal & Oliveira, 2020Leal, C. C., & Oliveira, B. (2020). Choice architecture: Nudging for sustainable behavior. In C. F. Machado & J. P. Davim (Eds.), Sustainable management for managers and engineers (Chap. 1). London: ISTE and Wiley. https://doi.org/10.1002/9781119804345.ch1
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; Ridder et al., 2022). Adicionalmente, há pouca pesquisa sobre as consequências dos nudges em diferentes grupos sociais (Ghesla, Grieder, & Schubert, 2020Ghesla, C., Grieder, M., & Schubert, R. (2020). Nudging the poor and the rich - A field study on the distributional effects of green electricity defaults. Energy Economics, 86, 104616. https://doi.org/10.1016/j.eneco.2019.104616
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). Existem algumas exceções a essa escassez de pesquisa, incluindo uma análise da suscetibilidade à influência de nudges em certos grupos de pessoas com base em seu status socioeconômico (Ghesla et al., 2020; Marteau, Hollands, & Fletcher, 2012Marteau, T. M., Hollands, G. J., & Fletcher, P. C. (2012). Changing human behavior to prevent disease: The importance of targeting automatic processes. Science, 337(6101), 1492-1495. https://doi.org/10.1126/science.1226918
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; Ridder et al., 2020). Por exemplo, um inquérito realizado entre consumidores de eletricidade gerou a necessidade de desenhar uma política de escolhas padrão para alcançar objetivos de sustentabilidade. Contudo,

“usar padrões para desencadear escolhas mais ecológicas pode efetivamente funcionar como um imposto oculto sobre os pobres. As famílias mais pobres são mais propensas a manter a opção padrão e também são mais propensas a preferir produtos mais baratos e menos claros” (Ghesla et al., 2020Ghesla, C., Grieder, M., & Schubert, R. (2020). Nudging the poor and the rich - A field study on the distributional effects of green electricity defaults. Energy Economics, 86, 104616. https://doi.org/10.1016/j.eneco.2019.104616
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, p. 14).

O nudging tem sido aplicado com sucesso em diversas áreas, como saúde ou consumo sustentável. No entanto, ainda existem muitas oportunidades para explorar novos contextos, questões e preocupações, como aqueles em torno da legitimidade, transparência, receptividade, eficácia e duração do nudging. Essas áreas merecem atenção adicional de pesquisa.

Legitimidade do nudging: O debate sobre a legitimidade e os limites do uso do nudging precisa explorar mais profundamente os argumentos que sustentam posições opostas. Enquanto uma corrente de pesquisa se concentra nos princípios de liberdade de escolha e autonomia individual, algumas intervenções consideram que a melhor decisão do ponto de vista do indivíduo é aquela que melhora o bem-estar individual e social (Nys & Engelen, 2017Nys, T. R., & Engelen, B. (2017). Judging nudging: Answering the manipulation objection. Political Studies, 65(1), 199-214. https://doi.org/10.1177/0032321716629487
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; Ridder et al., 2020Ridder, D., Feitsma, J., van Den Hoven, M., Kroese, F., Schillemans, T., Verweij, M., Venema, T., Vugts, A., & Vet, E. D. (2020). Simple nudges that are not so easy. Behavioural Public Policy, 1-19. https://doi.org/10.1017/bpp.2020.36
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; Schubert, 2017Schubert, C. (2017). Green nudges: Do they work? Are they ethical? Ecological Economics, 132, 329-342. https://doi.org/10.1016/j.ecolecon.2016.11.009
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).

Transparência do nudging: Para resolver os problemas de legitimidade mencionados acima, tem sido sugerido divulgar a presença e a finalidade de um nudge, para que estes sejam transparentes. Reivindica-se tornar as intervenções de nudging transparentes para lidar com preocupações éticas (Wachner, Adriaanse, & Ridder, 2020Wachner, J., Adriaanse, M., & Ridder, D. (2020). The influence of nudge transparency on the experience of autonomy. Comprehensive Results in Social Psychology. https://doi.org/10.1080/23743603.2020.1808782
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). Pesquisas adicionais sobre o impacto da transparência na eficácia do nudge, autonomia individual e satisfação sobre as intervenções usando nudges são necessárias para compreender como isso influencia o impacto das intervenções comportamentais.

Receptividade do nudging: Um novo conceito relacionado é o conceito de ‘nudgeability’ e refere-se a condições que determinam até que ponto as pessoas são receptivas à influência dos nudges (Ridder et al., 2022Ridder, D., Kroese, F., & van Gestel, L. (2022). Nudgeability: Mapping conditions of susceptibility to nudge influence. Perspectives on Psychological Science, 17(2), 346-359. https://doi.org/10.1177/1745691621995183
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). É necessária investigação adicional para determinar a disposição dos indivíduos em aceitar nudges e como aumentar a receptividade às intervenções.

Eficácia do nudging: As intervenções de arquitetura da escolha promovem mudanças de comportamento positivas em uma localização geográfica ou na população-alvo. No entanto, isso pode variar dependendo da técnica e do domínio de intervenção. Por exemplo, os domínios alimentares são mais propensos a mudanças comportamentais do que outras áreas de intervenção, bem como a modelação do design da estrutura de decisão tende a ser mais eficaz do que outras técnicas (Mertens, Herberz, Hahnel, & Brosch, 2021Mertens, S., Herberz, M., Hahnel, U. J. J., & Brosch, T. (2021). The effectiveness of nudging: A meta-analysis of choice architecture interventions across behavioral domains. Proceedings of the National Academy of Sciences, 119(1), e2107346118. https://doi.org/10.1073/pnas.2107346118
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).

Duração do efeito do nudging: Pouco se sabe sobre a duração do efeito de um nudge ao longo do tempo. Alguns autores sugerem que para alguns nudges padrão, o efeito pode permanecer, mas não para todos os tipos de nudges (Van Rookhuijzen, Vet, & Adriaanse, 2021Van Rookhuijzen, M., Vet, E. D., & Adriaanse, M. A. (2021). The effects of nudges: One-shot only? Exploring the temporal spillover effects of a default nudge. Frontiers in Psychology, 12, 683262. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2021.683262
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). É necessária investigação adicional para determinar quais os comportamentos que podem produzir impacto duradouro e quais os nudges específicos que podem ter efeitos de permanência no tempo.

Acreditamos que pesquisas futuras devem ter como objetivo fornecer uma compreensão aprofundada dessas preocupações ao nível teórico e empírico. Essas preocupações e complexidades serão centrais para futuros debates sobre intervenções de nudging e arquitetura da escolha para mudança comportamental.

A EDIÇÃO ESPECIAL

Esta edição especial apresenta vários tópicos centrados na arquitetura da escolha, trazendo discussões teóricas e contribuição empírica para a literatura sobre nudging. Esta edição especial contém um artigo teórico que discute a ética das políticas de nudging, dois trabalhos empíricos que abordam informações na arquitetura da escolha e intervenções comportamentais para uma melhor tomada de decisão, e uma carta executiva que oferece a visão de uma instituição bancária sobre o nudging. Estes mostram evidências de algumas das complexidades da arquitetura da escolha e do nudging, no atual contexto de incerteza.

O artigo “Políticas nudge no contexto da COVID-19: uma ação necessária ou dilema ético?” (Correa, Ames, & Zappellini, 2022Correa, A. L., Ames, M. C. F. D. C., & Zappellini, M. B. (2022). Nudge policies in COVID-19 context: A necessary action or ethical dilemma? Revista de Administração Contemporânea, 26(5), e210033. https://doi.org/10.1590/1982-7849rac2022210033.en
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) tem como objetivo discutir os nudges a partir de uma perspetiva teórica no contexto da pandemia de SARS-CoV-2. Os resultados sugerem que o comprometimento dos indivíduos tem vindo a aumentar, especialmente para incentivar as pessoas para o comportamento preferido e intensificar a adesão às políticas. Este artigo revisita questões de questionamento ético em torno da autonomia, dignidade e bem-estar para discutir a eficiência das políticas de nudging no cenário de crise da COVID-19. Os autores refletem sobre as teorias morais como forma de lidar com algumas das ineficiências da teoria do nudge. Ao mesmo tempo, eles identificam algumas das possíveis razões subjacentes a essas inconsistências num contexto de pandemia (por exemplo, saturação de mensagens, interrupção digital). Este trabalho conceitual fornece uma revisão crítica de algumas das principais tendências e objetivos do nudging durante este período desafiador e uma discussão sobre sua eficácia, sugerindo um plano de ação. As dimensões mais interessantes deste artigo são uma reflexão sobre os principais dilemas éticos (por exemplo, autonomia, dignidade e bem-estar) no ambiente pandêmico e a contribuição para as discussões existentes sobre teorias morais normativas. Esta pesquisa mostra como abordagens como utilitarismo, deontologia e ética virtual podem ser úteis para entender algumas das inconsistências observadas na teoria do nudging durante o período pandémico de COVID-19 enquanto contexto de crise e gerar conhecimento para a política de nudging em futuras situações desafiadoras.

Um segundo manuscrito intitulado “Expectativas, incerteza econômica e sentimento” (Franco, 2022Franco, D. M. (2022). Expectations, economic uncertainty, and sentiment. Revista de Administração Contemporânea, 26(5), e210029. https://doi.org/10.1590/1982-7849rac2022210029.en
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) analisa a interação entre a incerteza econômica e a estrutura informacional do sentimento. Neste estudo, os autores inovam ao tratar explicitamente das relações dinâmicas entre as estruturas informacionais de incerteza e sentimento, bem como a interpretação econômica de tais relações. Por meio de uma abordagem empírica aplicada ao Brasil, os autores estudam a relação entre incerteza e sentimento usando medidas de incerteza e sentimento. A metodologia emprega um teste de causalidade não linear e não paramétrico. Os resultados mostram que o sentimento acompanha a incerteza gerada na mídia e pode ser visto como um canal de indecisão pelo tom das expectativas e expectativas incorretas. Esta pesquisa aponta um novo olhar sobre a utilidade dos indicadores de incerteza econômica ex-ante, pois podem sinalizar o momento propício à obtenção de ganhos com a alocação de maior atenção às informações. Isso dá origem a intervenções comportamentais como o uso de nudges para aumentar a criação de expectativas mais racionais para promover decisões mais eficientes.

O trabalho de pesquisa final desta edição especial sobre “Economia comportamental e seguros de automóveis: o papel dos vieses e heurísticas” (Graminha & Afonso, 2022) aborda os seguros automóveis e analisa como os efeitos de enquadramento, ancoragem e de certeza afetam o comportamento do consumidor neste setor. Para tal, e com base nas teorias da economia comportamental, os autores aplicam seis versões de um questionário com catorze questões a respondentes de uma instituição de ensino. Os resultados mostram que vieses e heurísticas podem afetar o julgamento dos compradores de seguros. A pesquisa corrobora estudos anteriores e conclui que a compra de seguros pode ser feita de forma subótima devido a vieses e heurísticas. Esses resultados enfatizam que os fatores comportamentais desempenham um papel importante no processo de decisão dos consumidores no setor de seguros. Como resultado, uma arquitetura da escolha adequada e o uso de nudges podem aumentar a eficiência do mercado ao reduzir escolhas abaixo do ideal. Além de contribuir para o conhecimento no âmbito do processo de tomada de decisão, esta pesquisa tem implicações importantes para seguradoras, consumidores e reguladores. De fato, o desenvolvimento de uma arquitetura da escolha regulatória pode induzir escolhas que maximizem o bem-estar individual e atendam ao interesse público no contexto da indústria de seguros.

Esta edição especial contém ainda a carta executiva “O nudging e a arquitetura da escolha no contexto da banca” (Rosa, 2022Rosa, P. M. (2022). Nudging is the architecture of choice in the world of banking. Revista de Administração Contemporânea, 26(5), e220073. https://doi.org/10.1590/1982-7849rac2022220073.en
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), de Paulo Monteiro Rosa, economista sénior do Banco Carregosa, que traz a perspetiva de uma instituição de banca privada sobre os benefícios do nudging para levar seus clientes a um melhor percurso no seu processo de decisão. Esta instituição bancária reconhece o uso de nudges para ajudar os investidores a alcançar as suas melhores expectativas. As técnicas de nudging incluem o envio de mensagens informativas, a criação de ações automáticas, e o uso de tecnologia como aplicativos bancários para apresentar informação ou dar conselhos para melhorar o bem-estar no longo prazo. Por exemplo, várias ações de nudging são definidas em torno da poupança. As instituições bancárias podem desempenhar um papel educativo na promoção de hábitos de poupança, particularmente poupanças para a reforma. Nudges para informar, simplificar ou automatizar podem ser facilmente implementados e ajudam os investidores a superar os seus vieses comportamentais ao investir. Por exemplo, os investidores tendem a sofrer de aversão a perdas e, consequentemente, enfrentam dificuldades ao vender ativos com prejuízo. Isso geralmente tende a prejudicar o desempenho da sua carteira porque eles tendem a manter ativos com perdas por muito tempo, incorrendo muitas vezes em perdas adicionais. O uso de nudges para disciplinar no processo de decisão, evitando erros comportamentais, é fundamental durante a decisão de investimento. Definir regras, usar dicas e fornecer informação relevante sobre a situação global do património ajuda a lidar com a aversão a perdas e direciona os investidores para a melhor decisão. Adicionalmente, esta carta executiva refere o uso do nudging por parte das instituições financeiras para promover a escolha de fundos socialmente responsáveis em face dos fundos tradicionais. O mundo bancário usa mecanismos de nudging para ajudar os investidores a passar da intenção à ação, reconhecendo que os investidores tendem a ter preocupações sociais e ambientais e que a agenda da sustentabilidade é uma agenda para a qual todos devem contribuir (por exemplo, na forma como consomem, como investem e como escolhem a sua alocação de recursos). No geral, pequenas mudanças na arquitetura da escolha produzem melhor planejamento, poupança e investimento, ao mesmo tempo que alinham as decisões dos investidores com suas intenções iniciais, gerando melhores padrões e obtendo melhores resultados sem grande esforço.

Esta edição especial tem implicações para governos, bancos centrais, legisladores e reguladores. Primeiro, entender os desafios éticos do nudging e como o desenho de políticas pode gerar adesão. Especialmente, como o artigo de Correa, Ames e Zappellini (2022Correa, A. L., Ames, M. C. F. D. C., & Zappellini, M. B. (2022). Nudge policies in COVID-19 context: A necessary action or ethical dilemma? Revista de Administração Contemporânea, 26(5), e210033. https://doi.org/10.1590/1982-7849rac2022210033.en
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) discute, como lidar com dilemas éticos e usar o nudging em contextos de crise. Segundo, entender como expectativas e sentimentos em contextos de incerteza influenciam o processo de tomada de decisão e como usar heurísticas e enquadramentos para alterar a arquitetura de escolha para maximizar o bem-estar individual. Por fim, a carta executiva fornece uma visão sobre como esse conhecimento está sendo aplicado atualmente no mundo da banca. Assim, governos, bancos centrais, legisladores e reguladores podem beneficiar-se de uma compreensão mais profunda do uso desses mecanismos de intervenção para mudança de comportamento ou para regulação de seu uso dentro de limites éticos.

AGRADECIMENTOS

Gostaríamos de expressar nossa gratidão aos editores-chefes da Revista de Administração Contemporânea, a saber, Professor Wesley Mendes-da-Silva e Professor Marcelo de Souza Bispo, pelo convite para produzir esta edição especial e por todo o apoio durante o processo. Além disso, agradecemos aos revisores anônimos por seu trabalho em várias rodadas de revisão por seu profissionalismo e compromisso com a qualidade e o rigor científicos. Por fim, agradecemos a todos os autores que submeteram seus trabalhos para consideração nesta edição.

REFERENCES

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    2022
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