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Um modelo dos antecedentes da lealdade no varejo eletrônico

A model of the loyalty antecedents in the eletronic retail

Resumos

Diante do crescimento da Internet no Brasil e do seu papel como agente varejista de compra-venda, esse artigo propõe e testa um modelo teórico dos antecedentes da lealdade no varejo eletrônico. Sete associações são estabelecidas e verificadas por meio de 515 observações, utilizando a modelagem de equações estruturais. Os resultados indicaram que, primeiramente, o principal explicador de lealdade, de quatro possíveis, foi o comprometimento. Logo, comprometimento e qualidade, essa última outra variável latente significativa, são construtos chaves para o consumidor continuar a escolher o site. A segunda conclusão encontra-se no potencial preditor de qualidade no modelo. Todas as três relações em que qualidade era o construto exógeno foram corroboradas, conforme previsto pela literatura. Por fim, lealdade obteve alto coeficiente de determinação de 72%, sendo considerado ótimo valor. Considerações finais, limitações da pesquisa e sugestões para trabalhos futuros são discutidos na parte final.

confiança; comprometimento; lealdade; modelo


Basing on the Internet growth in Brazil and on its role as retail agent of purchase-sale, this article proposes and tests a theoretical model of loyalty antecedents in the electronic retail. In that context, seven hypotheses are established and verified through 515 observations collected, using structural equation modeling. The results indicated that the principal loyalty predictor, of four possible, was commitment. Therefore commitment and quality, that last one other significant latent variable, are key constructs in explaining why the consumers continue to choose the site. The second relevant conclusion is the quality potential in the model. Thus, all the three relationships in which quality was the exogenous construct were corroborated, as foreseen by the literature. Finally, loyalty obtained a high determination coefficient, being 72%. Final considerations, research limitations, and suggestions for future works are discussed in the final part.

trust; commitment; loyalty; model


ARTIGOS

Um modelo dos antecedentes da lealdade no varejo eletrônico

A model of the loyalty antecedents in the eletronic retail

Valter Afonso VieiraI,* * Endereço: Rua Viuvinha, 69, Conjunto Centauro, Arapongas/PR, 86709-349. E-mail: Valter23@yahoo.com ; Luiz Antonio SlongoII

IMestre em Administração pela UFRGS, Porto Alegre/RS, Brasil

IIDoutor em Administração pela USP. Professor na EA/UFRGS, Porto Alegre/RS, Brasil

RESUMO

Diante do crescimento da Internet no Brasil e do seu papel como agente varejista de compra-venda, esse artigo propõe e testa um modelo teórico dos antecedentes da lealdade no varejo eletrônico. Sete associações são estabelecidas e verificadas por meio de 515 observações, utilizando a modelagem de equações estruturais. Os resultados indicaram que, primeiramente, o principal explicador de lealdade, de quatro possíveis, foi o comprometimento. Logo, comprometimento e qualidade, essa última outra variável latente significativa, são construtos chaves para o consumidor continuar a escolher o site. A segunda conclusão encontra-se no potencial preditor de qualidade no modelo. Todas as três relações em que qualidade era o construto exógeno foram corroboradas, conforme previsto pela literatura. Por fim, lealdade obteve alto coeficiente de determinação de 72%, sendo considerado ótimo valor. Considerações finais, limitações da pesquisa e sugestões para trabalhos futuros são discutidos na parte final.

Palavras-chave: confiança; comprometimento; lealdade; modelo.

ABSTRACT

Basing on the Internet growth in Brazil and on its role as retail agent of purchase-sale, this article proposes and tests a theoretical model of loyalty antecedents in the electronic retail. In that context, seven hypotheses are established and verified through 515 observations collected, using structural equation modeling. The results indicated that the principal loyalty predictor, of four possible, was commitment. Therefore commitment and quality, that last one other significant latent variable, are key constructs in explaining why the consumers continue to choose the site. The second relevant conclusion is the quality potential in the model. Thus, all the three relationships in which quality was the exogenous construct were corroborated, as foreseen by the literature. Finally, loyalty obtained a high determination coefficient, being 72%. Final considerations, research limitations, and suggestions for future works are discussed in the final part.

Key words: trust; commitment; loyalty; model.

INTRODUÇÃO

O grande desenvolvimento que o comércio eletrônico vem tendo nos últimos anos adverte que as empresas de varejo deverão possuir um diferencial significativo para atrair e manter seus consumidores dentro da rede, uma vez que custos de mudanças e busca de informação são bem menores na Internet, quando comparados aos canais convencionais (Hernandez, 2001). Comprovando essa idéia, uma investigação de 2005 demonstrou que existem aproximadamente cerca de vinte e cinco milhões de Internautas no Brasil, indicando uma taxa de penetração da Internet de apenas 14%, comparada com uma taxa média de 50% dos países desenvolvidos (Nilsen Net-Ratings, 2006). Nota-se que essa pequena taxa de adesão sugere que ainda existe muito que amadurecer nesse segmento. De fato, o varejo eletrônico brasileiro, uma das potenciais fatias da Internet, tem uma previsão de movimentar 3,9 bilhões de reais em 2005, ou seja, um crescimento de aproximadamente 56% em relação ao ano de 2004 (E-BIT, 2005).

Neste contexto, dentro da literatura de marketing, a lealdade tem sido citada como opção para o estabelecimento de vantagem competitiva (Gommans, Krishnan, & Scheffold, 2001). Entretanto, apesar do crescente aumento de usuários e de movimentações financeiras ano-a-ano, estudar a lealdade no segmento eletrônico ainda está em seu início (Gummerus, Liljander, Pura, & Van-Riel, 2004). Logo, infere-se que os estudos de lealdade eletrônica deveriam ser mais bem considerados, uma vez que possuir clientes leais poderia ser o ponto diferenciador e competitivo para um varejista.

Como conseqüência, encontrar uma resposta (ou algumas possíveis respostas) para uma pergunta de pesquisa pode cooperar na explicação do fenômeno da lealdade nessa atmosfera distinta. Assim, a questão salientada por este trabalho é: quais variáveis auxiliam a explicar significativamente a lealdade no ambiente de varejo virtual? Logo, visando encontrar resposta para a pergunta, este artigo oferta um modelo de antecedentes da lealdade no varejo virtual. Deste modo, o objetivo é verificar como agem determinados preditores da lealdade nesse ambiente. Para tal fim, a próxima etapa discute os argumentos de ligação entre os construtos do modelo proposto e a lealdade.

RELAÇÕES TEÓRICAS PROPOSTAS

Diante da literatura revisada, duas bases sugerem uma associação entre qualidade e confiança. Inicialmente, Henning-Thurau e Klee (1997), desenvolvendo o argumento de relação entre qualidade e confiança, contextualizam que "a ênfase no processo de 'generalização' requer uma seqüência inicial de experiências [entre o cliente e a empresa] que forneça ao consumidor condições de julgar a confiabilidade [do fornecedor e de seu bem]. No início da relação [entre ambos], a fonte predominante de identificação das experiências é a qualidade geral [do serviço prestado], onde o consumidor analisa a performance do fornecedor vs. o padrão atual esperado. Uma seqüência consistente de experiências positivas [criadas], que é, a experiência repetida com o fornecedor que mantém a promessa de prover [no mínimo] a performance esperada, pode levar ao desenvolvimento de confiança através do processo anteriormente descrito de generalização [da seqüência de experiências] para futuras transações" (p. 751). Neste sentido, a qualidade que indica a superioridade e a certeza do serviço, gera aspectos de confiança no comprador por meio de uma seqüência de experiências transacionais positivas entre cliente e empresa. Em segundo plano, Grewal, Monroe e Krishnan (1998) salientam que "os 'modelos baseados no valor' pressupõem o ganho 'líquido da compra' [como componente principal. Assim, para eles] a aquisição percebida de valor do produto será positivamente influenciada pelos benefícios que os compradores acreditam que eles estão conseguindo obter [Neste sentido]. Um importante elemento no ganho líquido é a qualidade do produto ou a percepção de qualidade [que reflete o benefício]" (p. 48). Deste modo, a qualidade aumenta o ganho líquido da compra, uma vez que ela sugere maior valor e esse ganho líquido tende a criar maior confiança do consumidor com o lojista. Tomando como sustentação esses dois argumentos, a hipótese criada é:

H1: Existe uma relação linear positiva entre Qualidade e Confiança.

Boulding, Kalra, Staelin e Zeithaml (1993) propõem a seguinte função para pressupor uma associação entre qualidade e intenções comportamentais. A fórmula é descrita como BIim = f5 (OSQit), onde "BIimt é igual a mésima intenção comportamental [i.e. lealdade, boca a boca etc.] para o indivíduo i ao tempo t. Assim, nós fortemente acreditamos que a qualidade do serviço [OSQ] afeta os resultados comportamentais tais como lealdade e boca a boca positivo" (p. 12). De fato, os resultados apoiaram a hipótese proposta por Boulding et al. (1993) de qualidade como preditora. Noutra perspectiva, Cronin e Taylor (1992) propõem que "as percepções que o consumidor tem de qualidade afetam suas intenções de compra" (p. 59). Se para Cronin e Taylor (1992) qualidade está relacionada com intenção de compra, e se para Oliver (1999) lealdade é um comprometimento em comprar novamente o produto, acredita-se que esses construtos estão diretamente relacionados, uma vez que qualidade afeta intenção de compra e lealdade é uma intenção de compra. Na prática, Cronin e Taylor (1992) mensuram intenções de compra como "no próximo ano, meu uso de __ será (muito freqüente/nada freqüente)" (p. 67), ou seja, indicador próximo da definição de lealdade. Por meio da investigação empírica, os autores encontram significância da hipótese em dois segmentos de quatro investigados. Noutro trabalho, Parasuraman, Berry e Zeithaml (1991) associaram a qualidade, mensurada pela escala SERVQUAL, "com a probabilidade de os consumidores recomendarem o serviço da firma para um amigo, indicando que todos os resultados são estatisticamente significativos" (p. 433). Nota-se que a probabilidade de recomendar o serviço é uma intenção de comportamento, similar à intenção de recomprar um bem, i.e. lealdade. Desse modo, espera-se que qualidade e intenções de comportamentos estejam ligadas positivamente.

H2: Existe uma relação linear positiva entre Qualidade e Lealdade.

Zeithaml (1988) define qualidade "como a superioridade ou excelência do bem. Por extensão, qualidade percebida pode ser definida como o julgamento do consumidor sobre a excelência ou superioridade geral do produto" (p. 3). A idéia é que uma excelência do bem cria uma percepção mais positiva dos benefícios recebidos pelo consumidor. Dado que Zeithaml (1988) define valor como a "avaliação geral de utilidade de um produto baseado nas percepções do que é recebido sobre o que é dado" (p. 14), espera-se que quanto mais qualidade, maior será benefício ou utilidade que o consumidor receberá de um serviço. Assim, o raciocínio é que maior a qualidade, comprovada por desempenho superior do bem, gera maior benefício da compra com menos custo para o consumidor (i.e. formula do valor). Parasuraman e Grewal (2000) comentam que "é amplamente conhecido que valor percebido, um determinante chave da lealdade, [e que valor] é proposto ser um componente do que se 'consegue' [sobre] o que se 'dá'. Muitas das pesquisas escolares sobre o valor percebido tem focado principalmente a qualidade do produto como um componente que se 'consegue'. indicando claramente qualidade do serviço como preditor lógico do valor" (pp. 168-169). Nessa situação, espera-se que:

H3: Existe uma relação linear positiva entre Qualidade e Valor.

Sirdeshmukh, Singh e Sabol (2002) argumentam que "a Teoria do Objetivo e da Identificação da Ação sugere uma estrutura para hipotetizar o papel de mediação de valor nas trocas relacionais. Essas teorias propõem: (1) o consumidor é guiado ou identificado por um objetivo que ele busca atingir; (2) objetivos múltiplos e algumas vezes conflitantes podem ser operados em qualquer exemplo; (3) objetivos são organizados hierarquicamente [...]; (4) consumidores regulam suas ações para assegurar o atingimento dos objetivos no mais alto nível" (p. 21). Neste contexto, o papel central do valor é buscar construir consumidores focados no valor. Isso significa que os consumidores sempre buscarão um objetivo superior, como forma de obter mais pelo seu dinheiro. Se é dado que clientes estão recebendo esse valor do fornecedor, é provável que eles continuarão comprando no mesmo lugar, aumentando, portanto, o índice de recompra. Neste contexto, Sirdeshmukh et al. (2002) dizem que "valor, um objetivo superordenado, regula as ações comportamentais de lealdade junto ao provedor de serviços" (p. 21). Por meio dos argumentos, espera-se que valor tenha um impacto direto na lealdade, sugerindo a seguinte relação:

H4: Existe uma relação linear positiva entre Valor e Lealdade.

Chaudhuri e Holbrook (2001) propõem que "confiança na marca e afeto na marca são relacionados à lealdade atitudinal e comportamental. Essa base provém da Teoria de Comprometimento da Marca, advinda do Marketing de Relacionamento" (p. 83). Moorman, Zaltman e Deshpande (1992) dizem que essa relação existe, porque confiança "cria relações de troca que são altamente valiosas, aumentando a credibilidade" (p. 316). Logo, espera-se que por conseqüência da obtenção de tal valor, consumidores continuem recomprando o bem (i.e. lealdade), esperando continuar recebendo o valor nas situações de compra. Lau e Lee (1999) comentam: "se uma parte confia na outra, é provável de desenvolver alguma forma de intenção comportamental para com a outra parte" (p. 352). Para Santos (2001) "o raciocínio é simples: confiança oferece uma garantia quanto ao desempenho consistente e competente da empresa, garantindo que o consumidor continuará a obter valor em negócios futuros com o mesmo fornecedor. Deste modo, reduzindo o risco nas trocas relacionais, a confiança contribui para dar continuidade à relação e criar sentimentos de lealdade. Assim, quanto maior a confiança do consumidor na empresa, maior a probabilidade de realizar futuros negócios com ela e de manter um relacionamento a longo prazo" (p. 5). Neste contexto, Chaudhuri e Holbrook (2001), Lau e Lee (1999), Moorman et al. (1992) e Morgan e Hunt (1994) encontraram evidências empíricas de tal relação. Assim, espera-se que:

H5: Existe uma relação linear positiva entre Confiança e Lealdade.

Bordonaba-Juste e Polo-Redondo (2004) também asseveram: "confiança é um determinante chave de comprometimento, pois ambos, confiança e comprometimento, são formados em estágios sucessivos do desenvolvimento do processo de relacionamento, onde honestidade é desenvolvida num estágio exploratório, benevolência é formada em um estágio de expansão e, conseqüentemente, comprometimento é estabelecido" (p. 105). De acordo com Morgan e Hunt (1994), "devido ao fato de que comprometimento envolve vulnerabilidade, as partes do relacionamento buscarão somente parceiros confiáveis. Assim, de acordo com a Teoria da Troca Social, o princípio de reciprocidade generalizada assegurará que a falta de 'fé' cria falta de confiança, tal qual poderia diminuir o comprometimento na relação" (p. 24), indicando uma associação entre os construtos. Por sua vez, Moorman et al. (1992) hipotetizam: "comprometimento não se altera freqüentemente. Portanto pessoas não são susceptíveis de estarem comprometidas, a menos que elas não tenham valor na relação. Devido ao fato de que a confiança aumenta a extensão em que parceiros se engajam em trocas de risco, aumentando valor, espera-se que a confiança aumente a probabilidade de que usuários se tornarão comprometidos na relação" (p. 316), indicando a associação. Logo, confiança estaria ligada a comprometimento. Nesse contexto acredita-se que:

H6: Existe uma relação linear positiva entre Confiança e Comprometimento.

Bloemer e Odekerken (2002) salientam que "um desejo de continuar na relação e uma vontade de fazer esforços para manter na relação implicam maiores chances de acarretar lealdade comportamental" (p. 72). Assim, acredita-se que esse desejo e vontade implicam o potencial de comprometimento para explicar lealdade, uma vez que o comprometimento é o anseio de persistir na relação. Na prática, Garbarino e Johnson (1999) se baseiam na Teoria de Confiança-Comprometimento de Morgan e Hunt (1994) para argumentar que a confiança é precursora de comprometimento. Assim, para eles, "devido ao fato de que comprometimento envolve vulnerabilidade potencial e sacrifício, as pessoas não serão comprometidas, a menos que a confiança esteja estabelecida. Essa teoria também propõe que confiança e comprometimento são influenciadores das intenções comportamentais futuras de troca de parceiro" (p. 73). Logo, espera-se que o comprometimento tenha impacto em lealdade, desde que esse último é a intenção futura de comportamento. Devido a isso, acredita-se que:

H7: Existe uma relação linear positiva entre Comprometimento e Lealdade.

Diante da base teórica exposta, a Figura 1 resume as associações sugeridas pelo trabalho. Nota-se que qualidade, lealdade e comprometimento são configurados como construtos de segunda ordem, onde os valores das cargas fatoriais padronizadas são apresentados e discutidos no final do artigo.


DESIGN DE PESQUISA

Quanto ao tipo da investigação, uma pesquisa quantitativa de caráter conclusivo-descritivo (Hair, Anderson, Tatham, & Black, 1998), que se caracteriza como um levantamento (survey), de corte transversal único (Malhotra, 2001), foi utilizada, visando testar as relações hipotetizadas. A amostra foi classificada pelos consumidores que compraram qualquer produto ou serviço no ambiente de varejo eletrônico, dentro do prazo mínimo de seis meses. Estipulou-se esse prazo arbitrariamente, para que esses indivíduos ainda lembrassem os acontecidos no momento da compra. Para a coleta de dados, um questionário em formato eletrônico com um texto explicativo foi enviado para um mailing de contatos. Esse mailing inclui comunidades de alunos de pós-graduação da USP São Paulo e Ribeirão Preto, UFRGS, UFPR, UFMG e algumas outras, específicas do Orkut, de pesquisa em marketing. O texto continha apresentações do objetivo da pesquisa, instruções de preenchimento e link para direcionamento ao questionário. O levantamento ocorreu pela Internet durante um tempo aproximado de dois meses, dentre abril 2006 até junho 2006.

Amostra. Em termos de delineamento da amostra houve alguns quesitos ponderados, tais como: consumidores que não compraram em ambientes de varejo eletrônico não foram computados na análise; indivíduos que compraram bens usados em lojas varejo eletrônico também não foram calculados; e compradores que não responderam que tipo de bem compraram não foram ponderados. A técnica de amostragem é classificada como não-probabilística de dois tipos: por conveniência e por bola-de-neve (Malhotra, 2001). Justifica-se a escolha da conveniência por procurar obter uma amostra de elementos cabíveis ao propósito do estudo, ou seja, aqueles que já realizaram a compra pela Internet e que essa compra foi dentro de um período de tempo passado. A amostra também possui caráter do tipo bola-de-neve, pois um grupo inicial de entrevistados é selecionado e este grupo indica novos possíveis respondentes para o questionário. Assim, o processo visa do aumento no número de observações. A amostra inicial foi de 586 casos. Todavia, após a purificação, ela foi reduzida para 515 casos.

Definições dos Construtos. As definições conceituais são apresentadas a seguir, visando auxiliar a compreensão dos conceitos estudados. Valor é a avaliação geral de utilidade de um produto (neste caso do varejista eletrônico), baseado nas percepções do que é recebido sobre o que é dado (Zeithaml, 1988). Comprometimento é (a) desejo e intenção de continuar na relação; (b) desejo de fazer sacrifícios de curto prazo; (c) confiança na estabilidade da relação; (d) a importância da relação; e (e) a identificação da internalização das normas e de valores do parceiro (Kim & Frazier, 1997). Confiança é entendida como a manifestação de segurança dos consumidores na integridade das trocas e confidências de informação com o varejista eletrônico (Morgan & Hunt, 1994). De acordo com Parasuraman, Zeithaml e Malhotra (2005) qualidade é "a extensão pelo qual um web site facilita, de modo efetivo e eficiente, a compra e a entrega" (p. 217). Lealdade para Oliver (1999) é a "existência de um comprometimento profundo em comprar ou utilizar novamente um produto ou serviço consistentemente, no futuro, e assim, causar compras repetidas da mesma marca ou da mesma empresa, apesar de influências situacionais e esforços de marketing terem o potencial de causar um comportamento de mudança" (p. 34).

Medidas. Todos os instrumentos foram demarcados com cinco pontos de variação em escalas do tipo Likert. Exceto por Valor, todas as escalas variaram de discordo totalmente até concordo totalmente. Para mensurar Valor foi utilizada a escala de Sirdeshmukh et al. (2002) com cinco itens. Para medir Comprometimento foi utilizada a escala de Baptista (2005), sendo quatro itens para cada uma das três dimensões. Confiança foi verificada com dois itens do trabalho de Gummerus et al. (2004) e com outros dois itens da investigação de Anderson e Srinivasan (2003). Qualidade foi operacionalizada com base nas quatro dimensões de Parasuraman et al. (2005), sendo: Eficiência (sete itens); Disponibilidade do Sistema (quatro itens); Preenchimento/Cumprimento (sete itens); e Privacidade (três itens). Por fim, para avaliar Lealdade foram retirados quatro itens do trabalho de Harris e Goode (2004), totalizando dezesseis indicadores para as quatro dimensões de lealdade: Cognitiva, Afetiva, Conativa e de Ação.

ANÁLISE DE DADOS

As analises iniciais foram realizadas com o objetivo de purificar e organizar a base de dados, objetivando o teste posterior do modelo. Os principais pontos verificados foram missing values abaixo de 5% e 10%, tanto por observação, quanto por variável (Kline, 1998); aleatoriedade na omissão dos dados (Hair et ai, 1998), outliers univariados (z=±3) e multivariados (D2; p<0,001), curtose e assimetria, linearidade, normalidade (todos resultados Kolmogorov Smirnov p<0,01), e multicolinearidade (tanto com VIF, como com correlação de Pearson; r=±0,90).

Na sequência, verificou-se isoladamente a dimensionalidade de cada construto do modelo por meio da Análise Fatorial Exploratória [AFE]. Para reter os fatores, os critérios empregados foram: cargas fatoriais dos indicadores maiores que λ>0,40 e autovalores deveriam ser acima de um. O procedimento de extração foi o Varimax em conjunto com Análise dos Componentes Principais.

Valor foi o primeiro construto a ser ponderado na AFE. Na configuração do instrumento, ele foi montado como unidimensional, conforme previa Sirdeshmukh et ai. (2002). Devido a isso, esperava-se uma estrutura carregada em apenas um fator. Os indicadores da análise fatorial exploratória demonstraram bons resultados: KMO = 0,75; Bartlett's χ2 = 578,632; d.f.=6; p<0,001. Além do mais, as variáveis carregaram realmente em uma única dimensão, demonstrando um alpha de α=0,77.

O próximo construto ponderado foi o Comprometimento. Esperava-se uma estrutura de três fatores. No primeiro momento, uma análise dos indicadores da Análise Fatorial Exploratória demonstrou bons resultados, sendo: KMO = 0,85; Bartlett's χ2 = 2438,082; d.f.=55; p<0,001. Em termos de observações gerais, a porcentagem acumulada da estrutura foi de: 42,36%; 56,20% e 67,37%. Os autovalores foram de 4.66 até 1.22 e a análise de confiabilidade sugeriu: α=0,79 para Calculativo; α=0,84 para Afetivo e α=0,80 para Resistência, respectivamente. Como interpretação dos achados, pode-se dizer que os itens obtidos do trabalho de Baptista (2005) obtiveram boa compreensão pelos entrevistados e carregaram exatamente como previsto, tanto naquele trabalho como neste. A próxima variável latente verificada foi a Confiança. Todas as cargas fatoriais tiveram valores acima de λ=0,80, e a unidimensionalidade foi corroborada. Uma análise dos indicadores da análise fatorial demonstrou excelentes resultados: KMO = 0,81; Bartlett's χ2 = 1438,282; d.f. = 6; p<0,001. Além do mais, o valor alpha foi muito bom, sendo de a=0,91.

No que tange à Qualidade, esperava-se uma estrutura com quatro fatores, formado por Eficiência, Preenchimento, Sistema e Privacidade, conforme sugere a literatura de Parasuraman et al. (2005). Inicialmente, uma ponderação dos indicadores da análise fatorial exploratória demonstrou ótimos resultados apropriados: KMO = 0,92; Bartlett's χ2 = 5389,70; d.f.=210; p<0,001. Todavia a variável "q_preenchimento_7 <O site __ faz promessas sobre a entrega dos produtos>" não somente carregou em um fator diferente do esperado, como também obteve baixa carga fatorial na sua respectiva dimensão, indicando a sua exclusão. Após a confirmação empírica da multidimensionalidade, todos os construtos sofreram aferição de alpha de Cronbach. A Qualidade de Eficiência teve um alpha de α=0,90; a Qualidade Preenchimento teve um alpha de a=0,85; a Qualidade Sistema teve um Alpha de a=0,82 e a Qualidade Privacidade teve um alpha de α=0,79. Em geral, a porcentagem acumulada foi de 36,82% no primeiro fator; 46,05% no segundo; 53,38% no terceiro e 59,95% no último, com autovalores variando de 8.10 até 1.44. A estrutura dimensional pode ser visualizada na Figura 1.

O próximo, e último, construto verificado foi a Lealdade. Esperava-se um arcabouço de 4 fatores, conforme sugerido pela Teoria Cognição Afeto Conação de Oliver (1999). Uma análise inicial dos indicadores da análise fatorial exploratória demonstrou bons resultados: KMO = 0,89; Bartlett's χ2=3713,408; d.f.=105; p<0,001. Todavia o carregamento dos indicadores nas dimensões apresentou problemas de unidimensionalidade. A primeira dimensão misturou itens dos conceitos afetivo, conativo e ação. A segunda dimensão apresentou maior quantidade de itens da lealdade Afetiva com uma mistura de cognitiva. Por fim, a terceira dimensão ficou mais próxima da lealdade de ação. Para tentar minimizar o problema da dimensionalidade da lealdade, os alphas foram calculados utilizando a opção if item deleted. Era esperado que tal procedimento pudesse encontrar variáveis que estariam prejudicando o desempenho dos respectivos subconstrutos. Esse exame sugeriu a exclusão de determinados itens. Por consequência, novas análises foram realizadas e resultados de uma estrutura clara de quatro dimensões não emergiu.

Optou-se, então, por uma nova AFE; todavia não mais com o número de fatores baseados no autovalor acima de um, mas sim com os fatores fixados em quatro dimensões, conforme prevê a teoria. Depois de várias combinações possíveis (excluindo alguns outros indicadores), chegou-se a uma solução ideal apresentada na Tabela 2. Os valores alphas foram recalculados, atingindo os seguinte resultados: Cognitivo α=0,76; Afetivo α=0,71; Conativo α=0,87 e Ação α=O,83. Todos os alphas ficaram acima de 0,70 (Malhotra, 2001). A estrutura final apresentou as seguintes informações: KMO = 0,833; Bartlett's χ2=2108,29; d.f.=36; p<0,000. Total da variância explicada pelos quatro fatores foi igual a 80,90%.

Dando seqüência, buscou-se verificar se construtos diferem realmente dos outros por meio da Análise Discriminante. A sugestão seguida para tal constatação foi a de Fornell e Larcker (1981). A matriz de correlação dos construtos é exposta na Tabela 3. Como interpretação geral, a maioria das correlações são significativas a p<0,001. A maior correlação encontrada foi entre os construtos Lealdade Conativa e Lealdade Cognitiva (r=0,76; p<0,001), sugerindo uma compartilhação de 58% da variância comum.

Continuando, a matriz de correlação destaca que Lealdade Afetiva não teve associações significativas com os construtos Comprometimento Calculativo, Comprometimento de Resistência, ou seja, aspectos de gostar/afeto não estiveram associados a características de compromisso obrigatório e de resistência de opções: reflexos até certo modo negativos de comprometimento. Adicionalmente, nota-se que o valor teve associações numa média de r=0,35; p<0,001 com os quatro construtos de lealdade. Assim, esse resultado pode ser considerado uma associação fraca entre eles.

Com relação ao cálculo de Média da Variância Extraída [AVE], bem como o da Confiabilidade Composta [CR], os resultados podem ser vistos na Tabela 4. Os construtos valor e comprometimento calculativo tiveram resultados abaixo de 0,50 no AVE e, portanto, foram recalculados após exclusão dos indicadores com menor carga fatorial. Na lealdade cognitiva o problema estava na falta de discriminação com outros construtos, sendo lealdade, ação e conação. Logo, identificou-se e excluiu-se o item "lealdade_cognitiva_2" para superar esse problema e os valores de AVE e CR foram refeitos, melhorando a performance de lealdade cognitiva e confirmando a existência do discernimento entre eles. Enfim, com os valores finais de AVE, comparados aos da variância compartilhada, todos os construtos do modelo são distintos entre si.

Dado que existe validade discriminante e confiabilidade, partiu-se para averiguação do desempenho do modelo final de medidas, que foi o mesmo para fazer a Validade Convergente. Para Klem (2002) o modelo de medidas "é a parte do modelo completo que relaciona as variáveis não mensuráveis com o indicadores" (p. 256). Os resultados foram χ2/d.f.= 2.305; p<0.000; GFI=0.84; AGFI=0.82; IFI=0.90; CFI=0.90 e RMSEA=0.05. Nota-se que as medidas de ajuste geral (χ2/d.f. e RMSEA) e ajuste comparativo (CFI e IFI) estão perfeitamente dentro dos níveis aceitáveis e indicados pela literatura (Kline, 1998). O GFI e AGFI estão levianamente abaixo de 0,90. Um único problema foi o p-valor sendo significativo a p<0.001. Após a análise fatorial confirmatória do modelo de medidas, partiu-se para o modelo estrutural.

Os seguintes achados decretaram a performance do modelo estrutural: χ2/d.f.= 2.27; p<0.000; GFI=0.83; AGFI=0.82; M=0.90; CFI=0.90; RMSEA=0.05 e AIC=2531.79. Tomando no geral, percebe-se que os índices de ajustamento do modelo estrutural (i.e. χ2/d.f., e RMSEA) e índices comparativos (CFI; IFI) são satisfatórios e que outros índices (GFI; AGFI) estão bem próximos do indicado pela literatura (Kline, 1998). De certo modo, por meio dessas informações, infere-se que o modelo teórico se ajusta satisfatoriamente aos dados coletados. Nesse contexto, a Tabela 5 demonstra os valores e significância da regressão e teste das hipóteses.

O primeiro pressuposto foi uma relação linear positivia ente qualidade e confiança. O resultado o modelo apóia a primeira hipótese (p<0,001) e os argumentos de Henning-Thurau e Klee (1997) e Grewal et al. (1998). Logo, os resultados sugerem que quanto maior for a excelência proposta pelo serviço (no caso maior a qualidade com aspectos de eficácia, de plataforma, de cumprimento das obrigações varejistas e da privacidade do cliente), maior será a confiança do consumidor no fornecedor. Portanto, nota-se que a experiência repetida com o fornecedor, que mantém a promessa de prover a performance esperada de qualidade, impacta no desenvolvimento de confiança. O impacto de qualidade sobre confiança foi forte, sendo β=0.76.

A segunda hipótese prevê uma associação entre qualidade e lealdade. Os resultados apoiaram a ligação entre as variáveis. O peso do impacto foi mediano, sendo de β=0.42; contudo confirmam os argumentos de Boulding et ai. (1993), Parasuraman et ai. (1991) e Cronin e Taylor (1992). Importante nesse ponto é notar a qualidade como preditora das intenções comportamentais, traduzida aqui como a lealdade. Logo, verifica-se que quanto maior for a qualidade prestada pelo varejista eletrônico, maior será a intenção comportamental de continuar a escolher as ofertas do site em compras futuras.

Os resultados confirmam a terceira relação entre qualidade e valor, com um peso de β=0.71. Nessas circunstâncias, Grewal et ai. (1998, p. 48) acreditam que a explicação é em decorrência dos "modelos baseados no valor, que conceitualizam os ganhos 'líquidos' associados aos produtos ou serviços. Isso significa que a aquisição do valor de um produto será positivamente influenciada pelos benefícios que o comprador acredita estar obtendo na compra e no uso [...]. Um importante elemento desse ganho 'líquido' é a qualidade do produto", uma vez que, quando mais qualidade é experimentada, maior será a facilidade de tornar positiva a relação entre o que é pago sobre o que é recebido: isto é, "ganho líquido" da transação de compra.

A quarta hipótese prevê o valor como explicador da lealdade. Os dados não indicaram um suporte para a associação. Nota-se que valor, nesse estudo, é entendido como a relação de custo vs. benefícios advindos do tempo gasto na compra, do preço dos produtos dentro do site, dos esforços na compra e da experiência global da compra. Lealdade é mensurada como intenção de recomprar sempre no mesmo site, de gostar da página (afeto), de preferir o site, entre outras. Deste modo, valor não prediz a fidelidade. Inicialmente, acreditou-se que qualidade poderia estar influenciando indiretamente a relação valor-lealdade. Se isso fosse verdade, então a exclusão de qualidade do modelo poderia alterar os resultados. Assim, o impacto de qualidade sobre valor foi fixado em zero, objetivando deixar valor como um construto enxógeno livre no modelo. A estrutura foi recalculada e novamente o impacto permaceu não significativo p=0,478. Embora Sirdeshmukh et al. (2002) e Agustín e Singh (2005) tenham confirmado a associação no ambiente convencional, nessa investigação não foi o caso. De certo modo, os achados aqui corroboram outros dois estudos.

Primeiramente, Baptista (2005), em ambiente eletrônico, mensurou o valor do mesmo modo que esse estudo e lealdade como construto de segunda ordem, sendo composto por: recompra, preferência e indicação. Na discussão dos dados, Baptista (2005) não ofereceu explicação do resultado não significativo. Por sua vez, Warrington (2002) explica o achado não significativo da associação valor-lealdade como decorrência das "expectativas [prévias onde] a literatura freqüentemente vê valor como uma comparação das percepções relativas com as expectativas; assim, compradores podem ter distintas expectativas de valor em lojas tradicionais, contudo valor em varejistas eletrônicos é bem menos definido, dificultando sua compreensão" (pp. 108-110). Se esse argumento estiver correto, seria necessário estabelecer previamente o que o consumidor espera por valor em ambientes de compra. Por conseqüência, a relação poderia tornar-se significativa, se sites provessem exatamente aquilo que o indivíduo estava presumindo.

Como outra possível explicação do resultado não significativo, os varejistas eletrônicos podem estar provendo outro tipo de valor agregado na experiência de compra, diferentemente daquele sugerido por Zeithaml (1988). Por exemplo, a literatura indica algumas alternativas. Primeiramente, Parasuraman e Grewal (2000) identificaram quatro tipos de valor: Valor de Aquisição são os benefícios (relativos a custos monetários) que os compradores acreditam que eles estão obtendo pela compra/aquisição de um produto ou serviço. Valor de Transação é o prazer de conseguir um bom acordo/transação. Valor em Uso é a utilidade derivada de utilizar o produto/serviço, ou seja, o ganho obtido por meio do real uso do bem e Valor de Redenção é o benefício residual no tempo da comercialização ou no final de vida do produto ou serviço. Em outra investigação, Grewal et al. (1998) também fizeram divisões similares para capturar mais fielmente o fenômeno do valor – Aquisição e Transação. Lee e Overby (2004) também propuseram dois tipos: Valor Experimental é representação geral dos benefícios experimentados do entretenimento, do escape, do apelo visual e da interação com a compra on-line e Valor Utilitário é a avaliação geral dos benefícios de incorporar o preço, o serviço, a economia de tempo e a seleção de mercadoria. Nesse contexto, valor de transação pode ser um potencial explicador da relação valor-lealdade, uma vez que em trabalhos no ambiente convencional o valor em uso é o mais conhecido e experimentado pelo consumidor.

A quinta suposição prediz confiança como explicadora de lealdade. Os resultados indicaram uma relação não significativa (p>0,05), refutando a hipótese. Confiança seria acreditar na integridade e nas características do lojista, conforme refletem os indicadores. Contudo essas condições não predizem significativamente a intenção do consumidor em voltar a comprar no site. A relação não significativa também já foi encontrada em outro trabalho. Por exemplo, Kockanny, Marchetti e Prado (2003), pesquisando a relação confiança-lealdade com um Modelo de Avaliação de Programas de Fidelidade, salientam que o resultado "não permitiu verificar a hipótese sete, que representa a relação entre a confiança [disposição do consumidor em tratar a empresa como uma parceira à qual pode fazer confidências] e a lealdade" (pp. 13-14).

Como possível explicação, devido à facilidade e freqüência de roubos na Internet nos últimos tempos, consumidores podem possuir dificuldades de gerar confiança no site e no sistema de compra/pagamento a ponto de predizer uma lealdade futura. Para Brandão (2006) "de janeiro a setembro deste ano [2005], o volume acumulado de fraudes pela Internet saltou 688% comparado a igual período de 2004, disparando de 2.340 para 18.443 incidentes. Só no último trimestre desse ano foram registrados cerca de 8.288 casos, segundo o Centro de Estudos, Resposta e Tratamento de Incidentes de Segurança no Brasil, do Comitê Gestor da Internet". Por conseqüência, dada essa grande quantidade de fraudes, confiar no varejista ou mesmo no sistema eletrônico de compra/venda fica de certo modo prejudicado. Assim, consumidores acabam não percebendo confiança como diferencial significativo para um comportamento de recompra.

A sexta hipótese apresentava uma relação entre confiança como antecedente do comprometimento. Essa hipótese foi apoiada (p<0,001). Bloemer e Odekerkern-Schröder (2002) explicam esse achado comentando que relações "caracterizadas pela confiança são tão valiosas que as partes se comprometem entre elas, visando melhorar a relação de ambas, indicando assim uma associação entre confiança e comprometimento" (p. 69). O resultado corrobora a sugestão de Bordonaba-Juste e Polo-Redondo (2004) que "confiança é um determinante chave de comprometimento" (p.105). No caso específico deste trabalho, consumidores possuem confiança de que o varejista vai cumprir com suas obrigações de fornecedor. Por consequência da confiança, os mesmos consumidores tenderão a possuir maior comprometimento em ficar comprando e/ou mantendo-se na relação de troca. O impacto de confiança sobre comprometimento foi de β=0.31, considerada leviana. O potencial de explicação de comprometimento foi pequeno, sendo de R2=10%. Logo, existe a necessidade de encontrar outros construtos que expliquem a variação de comprometimento.

O impacto de comprometimento sobre lealdade configura a última proposição do modelo. Das três relações hipotetizadas serem antecedentes de lealdade, comprometimento teve o maior impacto, comprovando a sétima hipótese (β=0.64; p<0,00í). Assim, corrobora-se o argumento de Garbarino e Johnson (1999), solidificado na Teoria de Confiança-Comprometimento. Os resultados apontam que a intenção em permanecer no relacionamento com a empresa induz a um comportamento de revisita ao site em compras futuras.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo do artigo foi verificar como agem os preditores da lealdade no ambiente virtual. Justifica-se uma pesquisa desse tipo, uma vez que a amplamente conhecida ligação entre lealdade e performance (Harris & Goode, 2004) é fundamental para organizações. Essa ligação indica que "para o varejista eletrônico, lealdade é argumentada ser a mais importante preocupação, como evidenciado pelo fato de que mais de 92% dos comerciantes on-line estão ativamente construindo programas de lealdade" (International Data Corpotation, 1999 como citado em Abbott, Chiang, Hwang, Paquin, & Zwick, 2000, p. 145).

Nessa situação, algumas considerações finais são apresentadas. Primeiramente, o principal explicador de lealdade, de quatro possíveis, foi o comprometimento, onde o peso do impacto foi de β=0.64, reforçando a preocupação de varejistas eletrônicos de terem mais foco nesse conceito. Logo, comprometimento e qualidade, essa última outra variável latente significativa, são construtos chaves para o consumidor continuar a escolher o site, dar prioridades às ofertas do varejistas, dizer aos colegas onde são executadas as compras, entre outros.

A segunda conclusão encontra-se no potencial preditor de qualidade no modelo. As três relações em que qualidade era o construto exógeno foram corroboradas, conforme previsto na literatura. Isso quer dizer que a qualidade aumenta a confiança (β=0.76), a qualidade torna mais positiva a grandeza da relação custo vs. benefícios (β=0.71) e a qualidade auxilia a explicar um comportamento de recompra (β=0.42). Adicionalmente, o construto qualidade do varejista eletrônico é reflexo das quatro variáveis latentes denominadas: Eficiência, Preenchimento, Suporte do Sistema e Privacidade, sendo eficiência o maior valor lambda encontrado (λ=0.82). Assim, nota-se a importância dos profissionais de marketing investirem nesses conceitos para poder fazer que a qualidade impacte em outros indicadores.

Uma terceira consideração está no potencial da variância explicada pelos pretidores de lealdade. Lealdade obteve alto coeficiente de determinação de 72%, sendo considerado ótimo valor. Nota-se que satisfação não foi utilizada nesse modelo; mesmo assim, lealdade obteve alto R2, evidentemente sendo muito explicada por comprometimento e qualidade. Quarto, confirmou-se a multidimensionalidade e corroboração da teoria de Oliver (1999) e de Parasuraman et al. (2005), uma vez que a análise fatorial exploratória e as cargas fatoriais da AFC (ver os λ's padronizadas na Figura 1) tiveram elevados valores, refletindo os conceitos de lealdade e qualidade, conforme previsto pela literatura. Logo, este estudo contribui para a teoria por avaliar um instrumento específico para mensurar qualidade em ambientes eletrônicos, fugindo dos modelos tradicionais da SERVQUAL e SERVPERF. Em segundo plano, contribui por mensurar de forma multidimensional a lealdade, onde outras pesquisas ponderaram apenas de forma unidimensinal (Lee & Overby, 2004; Sirdeshmukh et al., 2002; Warrington, 2002). Portanto futuros trabalhos podem utilizar essas medidas para refletir mais fielmente a variável latente em questão.

Limitações do Trabalho. Algumas limitações do trabalho devem ser destacadas para existir evolução em estudos futuros. Inicialmente, essa investigação não trabalhou com um varejista eletrônico específico, mas sim como o 'processo de compra'. Assim, não se pode inferir precisamente se existe lealdade em bancos (ex. para com o Itaú), em livrarias (Cultura), em lojas (Casas Bahia) etc. Isso quer dizer que o trabalho não mensurou especificamente em seus indicadores a loja 'Itaú', mas sim mensurou a loja '__' (i.e. aquela que vem à memória do consumidor). Neste sentido, outros trabalhos podem avaliar um varejista especifico e verificar condições de lealdade, tanto para com a loja, quanto para a marca que está sendo vendida. Amostra não probabilista tem problemas de generalização e, portanto, as conclusões se aplicam unicamente a esse estudo. Adicionalmente, valor foi mensurado numa perspectiva de valor de aquisição (custo/benefício do bem), ao invés de uma perspectiva transacional, o que poderia gerar outros resultados no trabalho.

Pesquisas Futuras. Inicialmente, futuros trabalhos podem criar mais indicadores em etapas qualitativas para representar melhor o conceito de lealdade. Isso porque dois indicadores por construto é muito pouco para explicar uma variável latente, embora lealdade seja reflexo de nove variáveis totais. Segundo, artigos com outras medidas de qualidade (em termos de dimensões) podem vir a contribuir adicionalmente na estrutura de Parasuraman, Zeithaml e Malhotra (2005). Assim, escalas que mensurem outras dimensões de qualidade em ambientes eletrônicos podem sugerir novos achados. Terceiro, com relação ao modelo estrutural, novos construtos podem explicar ainda mais a lealdade, tais como: satisfação, imagem de loja, preço e custo de mudança; portanto devem ser insertos em modelos futuros. Por fim, um trabalho de interação de construtos, ou mesmos efeitos curvilineares, poderia ajudar a explicar fenômenos não pesquisados na literatura.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem os comentários de Carlos A. V. Rossi, Cláudio Damacena e Cristiane P. Santos, bem como as sugestões dos revisores.

Artigo recebido em 11.08.2006.

Aprovado em 02.08.2007.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Ago 2008
    • Data do Fascículo
      2008

    Histórico

    • Recebido
      11 Ago 2006
    • Aceito
      02 Ago 2007
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