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Programa Universidade Aberta do Brasil: aspectos relevantes na construção de uma metodologia para avaliar sua implementação

'Open Brazilian University' program: relevant aspects in the development of a methodology for implementation assessment

Resumos

Este texto discute as possibilidades de avaliação para uma das mais significativas políticas públicas brasileiras, a política de Educação. Com ênfase na modalidade de ensino a distância, aborda questões envolvidas na construção de um modelo de avaliação para o processo de implantação do programa "Universidade Aberta do Brasil", buscando identificar as suas características e as dificuldades para o seu desenvolvimento. Apresenta um breve resgate do programa UAB relacionado à sua organização formal e aos seus objetivos centrais. Discute a exigência de processos avaliativos para as políticas públicas e conclui sugerindo alguns encaminhamentos para a construção de uma metodologia de avaliação para a UAB.

Políticas públicas; Ensino a distância; Metodologia de avaliação


This paper discusses the possibilities of evaluation for one of the most significant Brazilian public policies, the education policy. With emphasis on the mode of distance education, the paper addresses issues involved in building an evaluation model for the process of implementing the program "Open University of Brazil", identifying the characteristics and difficulties for its development. It presents a brief recovery of the UAB program related to its formal organization and its core objectives. It discusses the demand for evaluation processes of public policies and concludes by suggesting some directions for the construction of an evaluation methodology for UAB.

Public policy; Distance learning; Evaluation methodology


Glenio do Couto Pinto JuniorI; Vera Maria Ribeiro NogueiraII

IUniversidade Federal de Pelotas Pelotas, RS, Brasil. Contato: gleniocoutopinto@gmail.com

IIUniversidade Federal de Santa Catarina. Pelotas, RS, Brasil. Contato: vera.nogueira@pesquisador.cnpq.br

RESUMO

Este texto discute as possibilidades de avaliação para uma das mais significativas políticas públicas brasileiras, a política de Educação. Com ênfase na modalidade de ensino a distância, aborda questões envolvidas na construção de um modelo de avaliação para o processo de implantação do programa "Universidade Aberta do Brasil", buscando identificar as suas características e as dificuldades para o seu desenvolvimento. Apresenta um breve resgate do programa UAB relacionado à sua organização formal e aos seus objetivos centrais. Discute a exigência de processos avaliativos para as políticas públicas e conclui sugerindo alguns encaminhamentos para a construção de uma metodologia de avaliação para a UAB.

Palavras-chave: Políticas públicas. Ensino a distância. Metodologia de avaliação.

ABSTRACT

This paper discusses the possibilities of evaluation for one of the most significant Brazilian public policies, the education policy. With emphasis on the mode of distance education, the paper addresses issues involved in building an evaluation model for the process of implementing the program "Open University of Brazil", identifying the characteristics and difficulties for its development. It presents a brief recovery of the UAB program related to its formal organization and its core objectives. It discusses the demand for evaluation processes of public policies and concludes by suggesting some directions for the construction of an evaluation methodology for UAB.

Keys words: Public policy. Distance learning. Evaluation methodology.

INTRODUÇÃO

Este texto aborda o Sistema Universidade Aberta do Brasil - UAB, detendo-se no processo de implantação desta política pública voltada a expansão da oferta de educação na modalidade de Ensino a Distância (EAD). Instituída em 2005, e tendo sua implementação sido efetivamente iniciada em todo o território nacional a partir de 2006 como iniciativa governamental, o programa UAB é bastante recente, encontrando-se ainda em processo de implantação. Somente a partir de 2011 foram iniciadas algumas iniciativas de avaliação de Polos de Apoio Presencial por parte do Ministério da Educação. Dessa forma, discussões e pesquisas que auxiliem no acompanhamento e na avaliação desse processo de implantação se tornam bastante relevantes, e poderão fornecer subsídios para o aperfeiçoamento e a consolidação futura deste programa.

Neste estudo pretende-se discutir algumas propostas de parâmetros ou critérios que permitam o desenvolvimento de um procedimento metodologicamente consistente para avaliar a implementação da UAB em um Polo de Apoio Presencial, especialmente sob a ótica do seu usuário, o aluno. É o Polo de Apoio Presencial que representa o elo fundamental de ligação entre este aluno e a instituição de ensino e é nele que se desenrolam as atividades fundamentais para a efetivação do programa. Mais especificamente, procurar-se-á debater a questão do que seja, afinal, um curso efetivamente implementado em um polo, questão de difícil compreensão ante a novidade que representa, ainda, o EAD no Brasil e tendo em vista a falta de uma regulamentação mais específica.

Por ser ainda uma política recente, pouco se tem em termos de produção científica relacionada a este tema, portanto, necessário se faz, primeiramente, compreender melhor este projeto, suas causas e implicações e em que momento se pode considerar o programa implantado ou não, antes de abordar a questão de como se avaliar a implantação do programa UAB.

Uma das dificuldades práticas referidas pelos profissionais envolvidos nas experiências junto a UAB é justamente a sua singularidade em termos de modelo de gestão e a dificuldade que daí resulta para se apreender o seu todo. Persistem, no dia a dia, enormes discussões sobre definição de oferta ou não de cursos e turmas, indefinições sobre questões envolvendo desde o fornecimento de atestados e históricos até o tocante a implementação de regimes domiciliares, atestados e situações de infrequência. Itens corriqueiros na oferta de ensino presencial mas extremamente complexos quando se trata de um modelo a distância.

A educação na modalidade a distância, está cada vez mais tem se mostrado uma alternativa para atender as necessidades da sociedade contemporânea. O relevante avanço do Ensino a Distância (EAD) nas ações públicas para a educação é muito mais que um modismo e não pode ser justificado ou compreendido apenas como consequência de um contexto interno do país, ou seja, não é apenas um fruto da história, da cultura, da economia e das forças sociais e políticas nacionais, pois não é um fenômeno apenas brasileiro, apresentando desdobramentos em todo o mundo.

Para se compreender adequadamente esta progressiva ampliação no uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) nas políticas oficiais para a educação, é necessário ampliar um pouco mais a análise, entendendo este fenômeno dentro de um contexto global, e não apenas nacional ou regional. É preciso se compreender o contexto global onde estes fenômenos vem se desenvolvendo, pois, atualmente, não se consegue apreender toda a ação institucional de um Estado apenas a partir do seu contexto interno, mas também a partir da percepção da existência de uma cultura histórica universalmente dominante.

UMA AGENDA GLOBAL PARA A EDUCAÇÃO

Roger Dale (2004), em sua obra Globalização e Educação: demonstrando a existência de uma "cultura educacional mundial comum" ou localizando uma "agenda globalmente estruturada para a educação" aborda a questão da universalidade da educação e sua relação com a globalização. Para Dale, o rápido crescimento dos sistemas educativos nacionais e a sua surpreendente homogeneidade, mesmo dentro de um universo extremamente diversificado de culturas nacionais, nos fazem compreender, ou ao menos desconfiar, que eles derivam não apenas de um contexto nacional interno, mas também de uma agenda cultural globalizada.

A globalização tem sido comumente retratada como um inevitável desenrolar no sentido da implantação de uma hegemoneidade cultural ou um conjunto de forças capazes de tornarem obsoletos os atuais Estados-Nação, ou mesmo resultar em uma política mundial universal, tendo como reflexo e característica o crescimento irresistível da tecnologia da informação e comunicação. Esse crescimento das TIC é que vem permitindo, num plano mundial, que o capitalismo siga intensificando o seu processo de acumulação, através da mudança de sua base técnica e organizacional, acelerando os processos econômicos de acumulação e exclusão e abrindo um espaço cada vez maior para a difusão das concepções neoliberais (HETKOWSKI; LIMA, 2001, p. 1). Estas, por sua vez, não só influenciam os destinos de um grande número de países, mas passam a influenciar as políticas sociais destes, especialmente países pobres ou em desenvolvimento. Como as políticas públicas repercutem na sociedade como um todo, e as políticas para a educação não são diferentes, suas análises precisam também explicitar estas complexas inter-relações existentes entre Estado, política, economia e sociedade. Portanto, se, de um lado as políticas públicas são manifestações internas, específicas de cada Estado nacional, de outro é inegável que se reconheça que, nas últimas décadas, essa hegemonia neoliberal tem influenciando, de forma homogênea, os rumos das mesmas em boa parte dos países no mundo.

Celina Souza, em sua obra Políticas Públicas: uma revisão de literatura (2006), nos aponta três grandes fatores ou influências que vem atuando sobre a definição e implementação das políticas públicas em todo o mundo. A primeira destas influências, sem dúvida, é a predominância das políticas restritivas de gastos na maioria das agendas nacionais. O segundo fator de forte influência é a mudança gradual na visão do próprio papel do Estado, que vem mudando de um Estado de pleno emprego de recursos para um Estado focado em orçamentos equilibrados e tendo o ajustamento fiscal como orientador das suas políticas públicas. O terceiro e último fator diz mais respeito às jovens democracias dos países em desenvolvimento, mas que também, guardadas as devidas proporções, afeta atualmente alguns países centrais, que apresentam certa incapacidade de formar coalizões políticas sólidas o suficiente para aprovarem políticas públicas de longo prazo, capazes de impulsionar um consistente desenvolvimento econômico e de promover uma efetiva inclusão social.

Este contexto influencia diretamente o embate político sobre a educação no Brasil, especialmente porque, em relação ao Ensino Superior, por exemplo, em que pese a expansão vivenciada pelo sistema educacional nacional, sobretudo na última década, e a despeito desta expansão revelar um substantivo incremento de matrículas, os indicadores ainda revelam a existência de enormes desafios interpostos à garantia de acesso universal a esse nível de ensino (DOURADO, 2008, p. 891-917).

A Universidade Aberta do Brasil (UAB), enquanto política pública, encontra-se inserida nesse contexto de forte influência neoliberal sobre as políticas de educação do país, afinal, se trata de um programa com vasta abrangência territorial e populacional, que alia descentralização e baixo custo com a possibilidade de obtenção de resultados em curto prazo, isto se comparar esta mesma meta, em termos de abrangência e população, quando buscada via ensino presencial tradicional.

O SISTEMA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL

A Universidade Aberta do Brasil (UAB) foi lançada pelo Ministério da Educação (MEC) no ano de 2005, numa parceria com a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES) e empresas estatais, no âmbito do Fórum das Estatais pela Educação com foco nas Políticas e a Gestão da Educação Superior1 1 Conforme histórico da UAB. Disponível em: < http://uab.capes.gov.br>. Acesso em: 13 jun. 2011. . Foi criada oficialmente em 2006 através do Decreto 5.800 de 08 de junho de 20062 2 Dispinível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/decreto/d5800.htm>. Acesso em: 28 fev. 2012 , que instituiu o Sistema Universidade Aberta do Brasil, definido como um programa "voltado para o desenvolvimento da modalidade de educação a distância, com a finalidade de expandir e interiorizar a oferta de cursos e programas de educação superior no País"3 3 Conforme Decreto 5.800/2006. Disponível em: < http://www4.planalto.gov.br/legislacao>. Acesso em: 13 jun. 2011. .

Entretanto, sua origem remonta a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB (1996), que já incentivava, em seu artigo 80, o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino e de educação continuada. Posteriormente, a Lei 10.172 de 10 de janeiro de 2001, que instituiu o Plano Nacional de Educação (PNE) para o decênio 2001-2010, dedicou um capítulo inteiro ao Ensino a Distância e ao uso e difusão das Tecnologias Educacionais nos processos de ensino-aprendizagem. Assim, o ensino à distância não é uma iniciativa nova em termos de política pública no país, e vem assumindo cada um papel cada vez mais central nas políticas educacionais da nação, por vezes sendo defendido como uma espécie de solução para todos os males da educação, especialmente em razão das dimensões continentais do país e do custo-benefício para uma ação de forte expansão do ensino no país (DOURADO, 2008, p. 891-917).

Embora seja denominada de Universidade, a UAB não se constitui numa instituição de ensino, nos moldes das tradicionais Instituições de Ensino Superior (IES) de ensino presencial existentes no país, pois não possui reitor, professores, sedes e nem pessoal próprios. Aliás, como o próprio nome já diz, o Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB), é um sistema formado por uma complexa rede, baseada em uma relação de parceria tripartite onde, em um vértice, temos o Governo Federal, através da Secretaria de Educação a Distância - SEED/MEC e da Diretoria de Educação a Distância - DED/CAPES, que coordena e controla o sistema. É o MEC que regulamenta, através de Decretos e Portarias, o funcionamento do Sistema UAB, definindo as regras, metas, disponibilidade de recursos para investimento e custeio, valores e número de bolsas a serem pagas, bem como define a criação de vagas nas IES para que estas possam contratar o pessoal necessário à implantação do programa. Situa-se, assim, como o grande gestor de todo o sistema UAB em nível nacional.

Num segundo vértice estão as Instituições de Ensino Superior, que ofertam cursos na modalidade à distância e que são as responsáveis por todo o aspecto pedagógico e operacional do tripé ensino-pesquisa-extensão. São nas IES que estão localizados a maior parte dos profissionais à serviço da UAB, professores, técnicos em informática e produção de mídias, administradores, secretários, entre outros, que, além da produção de aulas também produzem todo o material de apoio (livros, apostilas, mídias em CD ou DVD, etc.), suporte técnico e pedagógico aos Polos de Apoio Presencial, capacitação de tutores, manutenção de rede de dados e toda o sistema de gestão acadêmica do curso. Os alunos da UAB são, na verdade, alunos das IES, todo o processo de criação e reconhecimento dos cursos ofertados pelo sistema, seleção, ingresso, histórico e titulação de alunos se dá dentro do sistema acadêmico de cada IES. Na UAB não há um Registro Acadêmico ou vestibular, nem são emitidos diplomas, isto é feito pelas Instituições que ofertam cursos no Programa, toda a vida acadêmica do aluno UAB é realizada via IES participante.

Finalmente, no último vértice, se encontram os Estados e Municípios, que oferecem a estrutura física colocada à disposição dos alunos e são, portanto, responsáveis pelos denominados Polos de Apoio Presenciais do sistema, onde ocorrem as atividades presenciais dos cursos oferecidos pelo sistema.

Os Polos de Apoio Presencial se constituem fundamentalmente em estruturas físicas colocadas a disposição de alunos e professores do Programa UAB, são salas de aula, de reunião e de atendimento, escritórios, salas de mídias e de informática, providas de rede lógica e acesso a internet, telefones e outros equipamentos exigidos pelo MEC em seu modelo de Polo ideal. Neles são realizadas as aulas presenciais e vídeo conferências previstas nos cursos, bem como provas e outros trabalhos e atividades presenciais. Além disso, atuam nos Polos Coordenadores e Tutores Presenciais, que são remunerados por bolsas fornecidas pela União, sendo o Coordenador do Polo cargo de confiança do Município patrocinador do mesmo e os Tutores selecionados pelos cursos a que estão vinculados.

Cabe ao Município ou Estado (embora atualmente apenas Municípios tenham criado Polos no sistema) fornecer e arcar com o custo de manutenção desta estrutura física, qual seja, o imóvel em condições e sua manutenção, custo com energia e comunicação, despesas operacionais do Polo e algum pessoal de apoio não previsto no sistema de bolsas. Num primeiro momento, como forma de estímulo, o Governo Federal tem financiado uma série de obras e aquisição de equipamentos para a montagem de Polos em diversos municípios pelo país, criando uma rede consistente capaz de dar suporte ao Programa.

Com se pode constatar, o funcionamento da UAB se baseia numa relação de parceria (divisão e descentralização de responsabilidades) entre seus entes componentes (CAPES/MEC, IFES e Municípios ou Estados), onde a União, além de coordenar o sistema e selecionar as IFES e Pólos participantes, através de Editais lançados pelo Governo Federal, é quem basicamente vem mantendo financeiramente o sistema, através da descentralização de recursos federais e do pagamento de bolsas aos seus participantes (alunos, tutores, coordenadores e professores)4 4 Conforme Editais disponíveis em < http://uab.capes.gov.br>, podemos verificar que a União financia desde a construção e equipamentos para montagem de polos pelas prefeituras até o custeio de diárias e passagens, material didático, entre outros. .

Nos últimos anos o Sistema UAB vem se constituindo em algo muito maior que um programa provisório de expansão do acesso ao ensino. Vem se robustecendo e se sedimentando no cenário das políticas públicas para educação, não só como uma política atual, mas com indicativos e perspectivas de expansão pelo próximo decênio, onde se prevê uma expansão, tanto em sua abrangência territorial (inclusive com oferta de cursos na África portuguesa e nos países do Mercosul) quanto na sua ampliação para os níveis de ensino técnico de nível médio e pós-graduação lato e stricto sensu.

Neste caso, o que chama a atenção é o fato de que a UAB é um projeto que contém em sua essência uma revisão do paradigma educacional brasileiro, em termos de modernização, gestão e financiamento (ALMEIDA, 2008, p. 2). Na medida em que for acontecendo, sua implementação provocará importantes desdobramentos para a educação, tanto na incorporação de tecnologias e metodologias inovadoras ao ensino presencial quanto nos possíveis caminhos de se promover educação superior a distância com liberdade e flexibilidade.

No entanto, alcançar esses objetivos não é uma tarefa simples. O desafio de implementar a UAB envolve uma série de fatores importantes, como por exemplo, a articulação das estruturas curriculares, acadêmicas e administrativas em prol do ensino a distância, a revisão das metodologias presenciais com as demandas do uso da mediação tecnológica no processo ensino-aprendizagem e, principalmente, a preparação do quadro docente. Sua implementação precisa ser cercada dos cuidados necessários para se evitar a descaracterização dos objetivos, natureza e missão da Universidade Pública no Brasil.

É Luiz Fernandes Dourado, em sua obra "Nova CAPES - desafios da consolidação da UAB" quem nos alerta para os riscos envolvidos na implantação de um sistema tão centralizado de ensino, baseado no uso das tecnologias de informação e comunicação:

[...] é fundamental reconhecer que a centralidade conferida à forma de oferta de ensino negligencia o essencial, qual seja, o projeto pedagógico, as condições objetivas de ensino-aprendizagem, entre outros (DOURADO, 2008, p. 905).

Alerta o referido autor que, se de um lado, a centralidade põe em risco a qualidade da educação ofertada, de outro, é justamente essa característica que torna o EAD preferencial, reduzindo custos e permitindo um maior controle de conteúdo teórico e ideológico (DOURADO, 2008, p. 905). Nesse sentido, a ênfase na centralidade, dentro de um contexto neoliberal de eficiência na aplicação dos recursos, tende a direcionar o sistema de avaliação da UAB, enquanto política pública, ao aspecto técnico, em prejuízo de uma análise mais profunda da qualidade do ensino.

Para este risco é que alerta Dourado quando diz: "Assim, é fundamental romper com a centralidade conferida ao aparato tecnológico e seu uso como responsáveis diretos pela qualidade ou não do processo educativo" (DOURADO, 2008, p. 905).

Daí a importância em se desenvolver um processo de avaliação de políticas como a UAB, pois é através de uma séria avaliação dos resultados de sua implementação que poderemos responder aos questionamentos do atual projeto educacional da nação. Possibilitaria verificar se este está servindo efetivamente para garantir o acesso a educação para todos os brasileiros, especialmente aqueles que vivem em situação de maior fragilidade ou exclusão, ou se constitui apenas em mais um passo na instrumentalização pelo capital de uma educação "treinamento", para permitir ao país concorrer no mercado global de mão de obra.

AVALIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, UM PROCESSO EM CONSTRUÇÃO

Com o aprofundamento da crise do Welfare State, especialmente a partir dos anos 70, o Estado passa a ser fortemente questionado em suas funções e, especialmente, no que diz respeito a sua real eficácia. Passa-se, com isso, a compreensão de que o sucesso ou fracasso das políticas públicas está diretamente vinculado ao desempenho da administração pública (BELLEN; TREVISAN, 2008, p. 530).

A partir da década de 1990, segundo Carlos Faria, se começa a buscar, na América Latina em particular, o fortalecimento da "função avaliação" na gestão governamental, tendo sido implementados a partir desta época, em diversos países latino-americanos, sistemas de avaliação das suas respectivas políticas públicas (FARIA, 2005, p. 97), sob a principal justificativa da necessidade de "modernização" da gestão pública, em um contexto de busca de legitimação para uma reforma do Estado, visando principalmente a redução de gastos públicos e o aumento de sua eficiência.

Nesse contexto, as iniciativas de reforma do Estado, que passam então se realizar em grande parte dos países do mundo, mais especificamente nos países capitalistas avançados e em processo de desenvolvimento, trazem consigo o desafio de fazer este mesmo Estado funcionar melhor, com um custo menor, e o alcance deste objetivo passa, necessariamente, pela avaliação de desempenho dos seus diversos programas públicos (COSTA; CASTANHAR, 2003, p. 971-972).

Quando se estabelecem critérios de eficiência, eficácia e efetividade como medidas de sucesso ou fracasso de uma ação do Estado, necessário se faz criar os meios adequados para se avaliar as diferentes alternativas para se obter resultados equivalentes. Além disso, a medida que o poder público também passa a delegar a agências autônomas e a empresas privadas a execução de seus serviços, cresce a necessidade de avaliação destes serviços (COSTA; CASTANHAR, 2003, p. 971-972).

A adoção de modelos descentralizados para a implementação e execução de programas públicos, como é o caso da UAB, passa a exigir o desenvolvimento e a definição de indicadores e medidas de sucesso previamente estabelecidos, instrumentos e metodologias de avaliação ágeis e de baixo custo, e que sejam capazes de oferecer aos gestores públicos bases mais sólidas para a tomada de decisão em matéria de políticas públicas, bem como oferecer à sociedade em geral uma maior transparência sobre o desempenho de tais políticas (COSTA; CASTANHAR, 2003, p. 971-972).

Conforme Bellen e Trevisan (2008, p. 533), embora os estudos na área de políticas públicas tenham apresentado um crescimento significativo nos últimos anos, a área ainda se ressente de uma baixa capacidade de acumulação de conhecimento, especialmente em função da proliferação horizontal de estudos de caso e da ausência de pesquisa, sendo um dos primeiros problemas a serem superados quando se pensa na questão da avaliação.

Bellen e Trevisan (2008, p. 534) alerta, ainda, para outra dificuldade que se apresenta na área da análise e avaliação de políticas públicas que, por ser muito ampla, apresenta grande quantidade de estudos setoriais, o que resulta na grande diversificação de objetos empíricos que acabam se expandindo horizontalmente, em prejuízo de um fortalecimento vertical da produção científica, afinal, esta disciplina envolve, no mínimo, análises sobre a identificação do que poderá ou não se transformar em uma política, formulação e legitimação, gestão, implementação e avaliação de políticas, sendo da essência da área a multidisciplinaridade. Une-se ainda a esta crítica do autor a notória carência de estudos dedicados aos processos e às metodologias de avaliação, além da rara utilização da avaliação como instrumento de gestão pelo setor público do Brasil, nas três esferas de governo.

CONSTRUINDO UM PROCESSO AVALIATIVO PARA A UAB

Alves (2009, p. 1) assinala que, se de um lado a Educação à Distância tem recebido apoio expressivo de órgãos de fomento no país, com a UAB sendo o maior exemplo disso, e tendo muitas universidades passado a ofertar esta modalidade de ensino, há ainda, de outra parte, resistência por parte de outras tantas instituições que, aliado ao grande desconhecimento que ainda existe por parte de muitos docentes, fazem uma crítica negativa a EAD/UAB, constrangendo alunos e docentes que integram ou integraram esta modalidade de ensino no país.

Como avaliador do MEC, Moran Costas (2011, p. 4) faz referência aos repetidos testemunhos que ouviu sobre os inesperados resultados dos bons cursos em EAD, mas reconhece também que costuma haver certa desconfiança inicial nas universidades e, por vezes, até um distanciamento generalizado, e mesmo abandono do curso, por parte daqueles alunos que não se sentem motivados por essa modalidade de ensino.

Portanto, boa parte das opiniões e expectativas correntes sobre a EAD no país vem sendo baseadas em experiências pessoais, no conhecimento ou mesmo no desconhecimento sobre o tema, existindo uma enorme carência de estudos científicos capazes de fundamentar ações para sua consolidação e melhoria.

O processo de implantação desta política pública para a educação, denominada Sistema Universidade Aberta do Brasil, voltada a oferta de ensino na modalidade a distância, carece ainda de uma análise mais efetiva, capaz de fundamentar a tomada de decisão do gestor público ou garantir a devida transparência que tal processo exige. Nesse sentido, para que se possa realmente avaliar essa implantação, primeiramente será necessário a construção de um modelo de análise e a avaliação que seja capaz de dar conta deste objetivo de modo válido e significativo.

O Sistema UAB está calcado em uma complexa relação entre Governo Federal, Municípios, Instituições de Ensino, órgãos de fomento e fundações de apoio que, no mais das vezes costumam ser analisadas, avaliadas e fiscalizadas de forma individual e não em sua ação conjunta dentro do programa, ou seja, atuando dentro de um deles temos apenas a visão parcial deste ator, o que cria imensas dificuldades em temos de avaliação global do programa.

Outra questão relevante é a visão a partir da qual o sistema é gerido e pensado, sempre do centro para a periferia, do órgão gestor centralizado (União) até o Polo de Apoio Presencial, ao invés de se analisar o sistema a partir da visão de seu usuário final, o aluno. Assim, para que se possa alcançar o referido objetivo de avaliação da UAB, é preciso, primeiramente, identificar se o programa foi efetivamente implementado a partir das necessidades de seu usuário e não da Administração Públicas. Afinal, o Programa UAB tem como objetivo a expansão da oferta de ensino superior, ou seja, oferta de ensino em toda a sua plenitude, nos mesmos moldes do ensino presencial oferecido nos grandes centros universitários, do contrário a referida ação estatal estaria sendo ineficaz em suas metas. Desta forma, é fundamental identificar em que momento podemos considerar que um estudante está efetivamente tendo acesso pleno ao ensino superior através do programa UAB e não apensas se cursos e polos estão atendendo os requisitos da União.

Responder esta questão é uma exigência prévia a quem pretende conhecer como está se dando a implementação do programa. Conforme Mynayo (2009, p. 84), para se conhecer se os objetivos de uma proposta estão sendo bem conduzidos ou mesmo se foram alcançados, precisamos nos valer de sinalizadores da realidade, parâmetros capazes de dar sentido de medida e balizamento de processos de construção da realidade ou de elaboração de investigações avaliativas.

No caso da UAB, é preciso construir indicadores que sejam adequados e representativos da sua realidade, a qual se deseja avaliar, o que não vem ocorrendo, ao menos de forma sistemática e que realmente permita dar maiores subsídios a atuação dos profissionais envolvidos na implementação e operação da referida política pública. Daí a importância em se definir parâmetros de implantação da UAB e indicadores que nos sinalizemar esta realidade.

Atualmente o Sistema UAB é constituído por 88 instituições, entre Universidades Federais, Universidades Estaduais e Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IFETs), 720 polos de apoio presencial e mais de 100.000 alunos. Além disso, são ofertadas bolsas (através do Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação - FNDE) para que milhares de professores das redes públicas municipais e estaduais possam frequentar os cursos da UAB, além de bolsas para a contratação de Tutores, Professores e Coordenadores que atuam no sistema. Através da Diretoria de Educação a Distância - DED/CAPES, o Sistema UAB ainda financia uma vasta infraestrutura voltada ao fomento da participação das IFES e dos Municípios no sistema, tais como vagas para os quadros de servidores permanentes nas IFES, recursos para a produção e distribuição de material didático impresso utilizado nos cursos, aquisição de livros para compor as bibliotecas, recursos de Tecnologias de Informação e Comunicação para interação entre os professores, tutores e estudantes, aquisição de laboratórios pedagógicos, infraestrutura dos núcleos de educação a distância nas IES participantes, recursos para a capacitação dos profissionais envolvidos e para a realização de encontros presenciais.

Nesse contexto, o processo de implementação do Sistema UAB em uma determinada comunidade é eivado de complexidade, pois envolve a coordenação de diversos atores nos três níveis federativos (União, Estados e Municípios). Esse processo, hoje, se encontra fragmentado, tratando-se cada parte de forma individualizada. Assim, para poder aderir ao sistema, primeiramente os governos locais - Estados e Municípios - e Instituições de Ensino Superior necessitam recorrer aos Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à Formação Docente, criados pelo Decreto nº 6.755, de 29 de janeiro de 2009, que balizam o atendimento de pedidos de aprovação de novos Polos e cursos feitos à Diretoria de Educação a Distância da CAPES/MEC.

A partir deste ponto, o caminho de Polos e cursos se descola. No que diz respeito a implantação dos Polos de Apoio Presencial, os Municípios devem apresentar ao MEC uma infraestrutura local que atenda a um rol de especificações de instalações, equipamentos e pessoal de apoio, definidos a partir de um "Modelo de Polo" predefinido pela CAPES, e que habilita o município a constituir um Polo de Apoio Presencial. Uma vez atendidos os requisitos o Polo de Apoio Presencial é autorizado a receber cursos do Programa UAB.

Um aspecto interessante deste processo é que, no rol de quesitos a serem atendidos pelo Município5 5 Conforme Formulário de Avaliação de Polo. se encontra a relação de cursos a serem ofertados, ou seja, para que um Município ou Estado encaminhem e tenham aprovada pela CAPES/MEC uma proposta de criação de Polo de Apoio Presencial é necessário que antes já tenha negociado com alguma Instituição de Ensino Superior a possibilidade de oferta de cursos naquele pólo. Assim, a criação de Polos depende da existência e intenção prévia de oferta de curso do programa o que, veremos a seguir, cria uma primeira incerteza a ser vencida pelo processo de implantação.

A oferta de cursos a distância dentro do programa UAB desenvolve outro caminho, que é traçado pela Instituição de Ensino Superior, que deve propor cursos que atendam aos "REFERENCIAIS DE QUALIDADE PARA EDUCAÇÃO SUPERIOR A DISTÂNCIA" definidos pelo MEC. Este processo, no entanto, é bastante tortuoso, pois existe uma enorme dependência de recursos para a efetiva oferta destes cursos e uma certa indefinição sobre sua origem e gestão.

Como dito anteriormente, a UAB não é efetivamente uma Universidade, portanto, não possui cursos próprios. Os cursos ofertados pelo Programa UAB são cursos das Instituições de Ensino Superior que participam do referido consórcio. Assim, legalmente, para que uma IES possa ofertar cursos pelo Programa precisa criar internamente estes cursos, via procedimento interno da própria Universidade. Entretanto, é a União, através da CAPES, quem financia o custeio destes cursos, através de orçamento específico, descentralizado pelo órgão central, não fazendo parte do orçamento geral das universidades que os criam.

Isto vem gerando um enorme grau de incertezas e indefinições, pois o planejamento da CAPES e sua execução orçamentária nem sempre segue ou coincide com os objetivos e metas definidas pelas universidades onde estes cursos são criados. As IES temem assumir responsabilidades que posteriormente não recebam o devido aporte por parte da CAPES, o que comprometeria o orçamento da instituição frente a outros compromissos assumidos em outras frentes, portanto, estas questões envolvendo a gestão e execução dos cursos da UAB, uma vez que ficam atrelados a esta dupla e muitas vezes concorrente forma de gestão (CAPES e IES), acabam muitas vezes tornando a criação e implementação dos cursos um verdadeiro "tiro no escuro", e isso acaba interferindo nos Polos, pois os mesmos dependem da garantia de oferta de cursos para serem efetivamente implementados.

Mesmo com todo este entrelaçamento de ações não há, nesse processo, uma abordagem sistêmica CURSO-POLO, que permita identificar quão efetivamente está implantado localmente o Sistema UAB, apenas avaliações distintas de Pólos e de Cursos. Entretanto, um Pólo pode estar implantado mas, em relação a determinado curso não esteja atuando plenamente, da mesma forma, um Curso pode estar formalmente reconhecido, mas não estar operando no Polo como deveria. Esta abordagem segmentada permite, por exemplo, termos formalmente a aprovação do Polo e do Curso ao mesmo tempo em que, de fato, os alunos do curso, naquele polo, não estejam sendo efetivamente atendidos. Portanto, a mera aprovação do curso e do polo não são indicadores confiáveis de que o programa UAB esteja efetivamente implantado e disponível em uma determinada comunidade.

Mapear este processo e definir conceitualmente a efetiva implementação do polo UAB se torna um objeto que precisa ser necessariamente alcançado para uma avaliação consistente, devendo-se buscar também identificar as maiores dificuldades e limitações encontradas neste caminho. A implementação da referida política precisa ser analisada em todos os seus elementos constitutivos e caracterizadores, o que passa, necessariamente, pelo desafio de identificar em que momento se dá a efetiva implementação da política pública de educação do governo federal denominada Sistema Universidade Aberta do Brasil em um Polo de Apoio Presencial a partir do objetivo proposto a ser atingido junto ao público-alvo desta política e, posteriormente, propor uma metodologia para avaliar este processo de implantação, tendo como questão chave os requisitos para se considerar efetivamente implantado o programa Universidade Aberta do Brasil em um Polo de Apoio Presencial.

Alcançar este objetivo envolve, necessariamente algumas outras questões, que necessitam ser respondidas, tais como: - Quais critérios são válidos e capazes de indicar a implementação do programa UAB em um Polo de Apoio Presencial a partir da necessidade de seu público-alvo (estudante universitário)? - Que parâmetros devem ser atendidos por estes critérios para considerá-los plenamente atendidos? - Como se pode mensurar validamente esses critérios?

PROPONDO UMA METODOLOGIA

Para tais objetivos, necessário se faz percorrer um caminho que permita: mapear o processo global de implementação da UAB; definir os critérios e parâmetros indicativos de implementação da UAB, sob a ótica do aluno; construir ferramentas capazes de mensurar estes critérios; identificar as maiores dificuldades e limitações encontradas; registrar as soluções e resultados implementados e não previstos inicialmente no processo de implementação da UAB.

O referencial proposto por Viegas (2003, p. 1), permite a construção de um processo de avaliação para a implantação da UAB apoiado nas quatro categorias pilares, esquematizadas pelo autor, quais sejam: procedimentos, orientação, conteúdo e técnicas. Os dois primeiros (procedimentos e orientação) conferem um cunho qualitativo a avaliação, e os dois últimos (conteúdo e técnica) são de natureza predominantemente quantitativa. O processo de avaliação, porém, não subsiste se faltar alguma dessas colunas.

Procedimentos - Segundo Viegas, os procedimentos "constituem a maneira peculiar de conduzir os pensamentos no sentido de se conseguir obter uma imagem mental do objeto de tal forma clara e distinguível" (2003, p. 1), ou seja, são o fio condutor através do qual construímos nosso objeto.

Portanto, se faz necessário distinguir a natureza do objeto a ser pesquisado, decompondo-o em suas partes constitutivas, desnudando a relação que as une. Nesse sentido, o primeiro passo metodológico para a construção de um modelo de análise da implantação da UAB será a construção do que Viegas chamou de "imagem mental" da mesma.

A Universidade Aberta do Brasil se constitui num sistema de ensino que é baseado na modalidade de ensino a distância. Nesse sentido, o conceito legal corrente de ensino a distância se aplica perfeitamente ao modelo de ensino da UAB, qual seja, de que o Ensino a Distância é um processo de ensino-aprendizagem mediado por tecnologias de informação e comunicação onde professor e aluno se encontram separados espacial e, na sua maior parte, temporalmente. Entretanto, mesmo este conceito de EAD não se constitui em uma única modalidade, assim, seguindo as modalidades de EAD definidas por Moran Costas (2009, p. 61), podemos ainda classificar a UAB com sendo um modelo de EAD que o autor denomina como modelo WEB. Este modelo é caracterizado pelo uso intensivo da internet. Embora os alunos deste modelo de EAD normalmente recebam algum tipo de material impresso, predomina a atividade via rede mundial de computadores e, em alguns casos, com o uso de webconferências.

Essa modalidade (WEB) se subdivide ainda em modelos de cursos inteiramente online, onde toda a atividade é realizada com o distanciamento aluno-professor, e cursos semi-presenciais, aqueles onde, em certos momentos, os alunos se encontram presencialmente para avaliações ou outras atividades específicas em polos presenciais, modelo típico da UAB.

Finalmente, outro elemento importante do Sistema UAB é a sua forma de construção, pois o programa é construído na modalidade de EAD de rede ou consórcio (ALMEIDA, 2008, p. 6). Nessa modalidade, o funcionamento se baseia na divisão de responsabilidades entre diversas organizações que se associam para a oferta do curso. Em geral utiliza-se o modelo de rede ou consórcio para programas destinados a uma grande massa de alunos, que recebem um material de apoio impresso e obtém a maior parte das informações diretamente da internet, estes se reúnem em pequenos grupos (polos presenciais) em determinados momentos presenciais e avaliações e recebem suporte presencial de um tutor local e acesso remoto a um tutor a distância.

No caso da UAB, cabe a União coordenar e financiar o sistema, as IFES elaborar e ministrar cursos, além do suporte pedagógico e produção de material de apoio e tutoria, e aos Municípios a implantação e manutenção dos polos presenciais.

Assim visualizado o Sistema UAB, pode-se identificar os seguintes elementos constitutivos: a) é um processo de ensino-aprendizagem a distancia, mediado via web; b) seu desenvolvimento é semi-presencial, com uso de polos de apoio presencial; c) seu sistema de gestão é complexo, por rede ou consórcio.

Por serem suas partes constituintes, estes elementos se constituem num fio condutor, o "como proceder" de Viegas, pois devem estar presentes no final do processo de implantação da UAB e, a partir deles, se pode pensar a construção de critérios para sua avaliação.

Dada a complexidade que demonstra a UAB, pode-se afirmar com segurança que o aspecto tecnológico é certamente um dos itens principais na sua implementação, sem um bom e estável acesso a rede mundial de computadores e sem um razoável suporte de máquinas no polo e nas IES o programa UAB não funciona.

Outros dois elementos se mostram relevantes, o apoio de polos presenciais e um sistema de gestão acadêmico-administrativa capaz de dar conta das relações complexas de um sistema em rede como a UAB.

Orientação - Por orientação Viegas (2003, p. 2) define a "forma de perceber o objeto", ou seja, o seu contexto sistêmico com o seu tempo e com seu ambiente.

O tema relativo a Universidade Aberta do Brasil (UAB), enquanto política pública, e seu contexto de forte influência neoliberal sobre as políticas públicas no Brasil já foi discutido anteriormente neste texto, permitindo perceber que a EAD não é um fenômeno isolado e casual, mas resultado de um contexto que lhe dá sentido e força, permitido uma análise mais consistente. A atual expansão do ensino na modalidade a distância está intimamente ligada ao processo de intensificação tecnológica e racionalização econômica das ações públicas, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo.

Conteúdo - É no conteúdo que, segundo Viegas (2003, p. 2), se percebe o elemento mais palpável e perceptível da avaliação. Trata-se de buscar conhecer o objeto pela descrição física do sujeito e do objeto, através de suas circunstâncias de lugar, tempo, modo e quantidade, ou seja, trata-se, portanto, de se definir os critérios de avaliação. Que critérios, no entanto, nos permitiriam aferir a implantação da UAB?

Para responder a esta pergunta quem fornece um bom referencial é Moran Costas, no texto "O que é um bom curso a distância?", nele se identificam referências rumo a identificação dos critérios de implantação da UAB. Moran Costas (2011) parte de uma impressão pessoal do que seja um bom curso a distância e daí começa a construir categorias de análise de um curso em EAD, as quais denomina "ingredientes". Segundo este autor, um bom curso de EAD depende primeiramente de um tripé formado por um corpo docente maduro, capacitado e motivado, de alunos interessados e motivados, e de administradores, diretores e coordenadores que entendam as dimensões que estão envolvidas no processo pedagógico e que sejam capazes de equilibrar o gerenciamento de recursos materiais, tecnológicos e humanos. Num segundo momento, alerta para a necessidade de uma boa infraestrutura física, incluindo salas, equipamentos, bibliotecas, etc. capaz de propiciar os momentos de encontro necessários a produção do conhecimento. Para um bom curso de EAD é fundamental, ainda, a integração entre todos os seus elementos, com uma intensidade de atuação na forma de grupos interdisciplinares, além da produção de materiais de apoio e programação de trabalhos e de pesquisas com uma lógica própria e adequada ao ensino mediado pela tecnologia de comunicação. Finalmente, um bom curso de EAD carece de um planejamento bem elaborado, posto que o EAD permite menos improvisações que uma sala de aula presencial, mas que seja capaz de absorver a flexibilidade exigida por essa modalidade de ensino, capaz de manter um equilíbrio que não seja nem um planejamento hermético e nem uma criatividade desorganizada mas que, principalmente, seja capaz de se adaptar às necessidades dos alunos, integrando as diferenças locais e contextos culturais.

Visualizando estes elementos através das lentes dos três pilares do procedimento de Viegas, pode-se considerar alguns critérios indicativos da implantação para a UAB: a) a existência de um quadro docente habilitado e qualificado, integrado a uma equipe de tutores igualmente capacitada a fazer este elo de ligação entre aluno e professor; b) uma estrutura administrativa, formada por profissionais capazes de dar conta dos processos de gestão; c) a disponibilidade de um grupo de técnicos de apoio ligados a área de suporte de informática e tecnologia da informação, produção e editoração de materiais gráficos, mídia eletrônica e vídeo, qualificados e capacitados a um trabalho interdisciplinar; d) uma estrutura física composta por salas de aula, escritórios, biblioteca com acervo adequado ao curso oferecido, equipamentos em número e qualidade suficiente para atender a demanda, bem como o respectivo suporte de acesso a internet, linhas telefônicas e equipamentos correlatos; e) um projeto pedagógico capaz de dar conta das peculairdades de um curso a distância e das diferenças locais e de contexto de um universo extremamente diversificado de alunos; e f) um grupo de alunos com formação estudantil adequada e devidamente selecionados e matriculados. Assim, segundo Moran Costas (2011), um bom curso de EAD precisa contemplar todos estes pilares, do contrário, não conseguirá jamais atender os propósitos que lhe servem de fundamento.

Entretanto, não basta a simples presença destes elementos para que se tenha um curso superior em pleno funcionamento. Conforme Almeida (2008, p. 6), a implementação da UAB envolve uma série de fatores importantes como a articulação das estruturas curriculares, acadêmicas e administrativas em prol do ensino a distância. A opção e o uso da tecnologia digital muda a dinâmica do processo, assim, é fundamental que a gestão do ensino seja eficiente e eficaz. Almeida reforça, ainda, a importância da gestão no ensino a distância, porém, destaca que quase toda a literatura sobre gestão e administração refere-se ao ensino presencial, e que existe ainda pouca produção científica tratando especificamente dos sistemas de gestão do ensino a distância.

Como critério para identificação do sistema de gestão se identificam os parâmetros nas "Referências de qualidade para educação superior a distância" do próprio MEC (2007), onde se destaca o seguinte:

[...] A Instituição deve explicitar seu referencial de qualidade em seu processo de gestão, apresentando em seu projeto de sistema de educação a distância, o atendimento, em particular, a serviços básicos como:

a) um sistema de administração e controle do processo de tutoria especificando, quando for o caso, os procedimentos logísticos relacionados com os momentos presenciais e a distância;

b) um sistema (logística) de controle da produção e distribuição de material didático;

c) um sistema de avaliação de aprendizagem, especificando a logística adotada para esta atividade.

d) bancos de dados do sistema como um todo, contendo em particular: cadastro de estudantes, professores coordenadores, tutores, etc;

e) cadastro de equipamentos e facilidades educacionais do sistema;

f) sistema de gestão dos atos acadêmicos tais como: inscrição e trancamento de disciplinas e matrícula;

g) registros de resultados de todas as avaliações e atividades realizadas pelo estudante, prevendo-se, inclusive recuperação e a possibilidade de certificações parciais;

h) um sistema que permita ao professor ter autonomia para a elaboração, inserção e gerenciamento de seu conteúdo, e que isso possa ser feito de maneira amigável e rápida, com liberdade e flexibilidade6 6 Referenciais de qualidade para educação superior a distância - Secretaria de Educação a Distância - MEC, 2007 - p. 29-30. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/legislacao/refead1.pdf>. .

Estes elementos se constituem em critérios suficientemente objetivos e mensuráveis, capazes de indicar a possibilidade ou não de considerar que o Programa UAB esteja efetivamente implantado em relação a um determinado público-alvo.

Técnicas - o último pilar metodológico de Viegas (2003) é a técnica. As técnicas de levantamento de dados são um pilar ainda mais perceptível que o conteúdo, pois seu uso implica ações e atividades várias claramente definidas e observáveis e, nesse sentido, com frequência, são confundidas com a própria metodologia. Segundo este autor, são as técnicas que permitem ao avaliador acessar o objeto, de modo a visualizá-lo sob o parâmetro da pertinência e da teleologia. Existem muitas classificações de técnicas de levantamento. Todavia, elas podem ser agrupadas em quatro categorias, segundo os graus de envolvimento do objeto a ser investigado. Dessa forma, as técnicas podem ser agrupadas em: pesquisa bibliográfica e documental, observação, questionários e entrevistas.

No caso proposto, onde há bases sólidas para a definição de indicadores, uma avaliação de implantação de um determinado curso da UAB, em um determinado Polo de apoio presencial, pode ser realizada majoritariamente através da análise de documentos e aplicação de questionários, que demonstrem a existência e efetividade dos indicadores de efetiva implantação da política.

Além da documentação relativa a aprovação do polo e do atendimento dos requisitos exigidos pela CAPES/MEC, bem como do atendimento de todo o trâmite legal de reconhecimento do curso oferecido, a identificação de implementação ou não do Programa UAB passa pela aplicação de ferramentas que devem identificar que o aluno daquele curso e Polo: a) tem acesso aos elementos identificados por Moran Costas para um bom curso de EAD; b) é atendido segundo os elementos identificados pelos Referenciais de Qualidade do MEC.

O grau de implementação do Programa será tanto maior quanto mais próximo estiver do atendimento de todos estes indicadores.

Sujeitos da pesquisa - Nesse ponto, em face do conhecimento que se tem do papel relevante de cada um no processo, pode-se identificar em um processo de implantação da UAB, os seguintes sujeitos: o Coordenador UAB da IES ofertante do curso de EAD e os respectivos Coordenadores de Cursos, o Coordenador do Polo de Apoio Presencial e os Secretários de Educação dos Municípios sede dos polos, professores e tutores (presenciais e a distância) envolvidos no desenvolvimento dos referidos cursos, servidores técnicos-administrativos envolvidos na gestão do curso e do polo e, principalmente, os alunos do curso no polo, público-alvo desta política, além de outros sujeitos que vierem a ser identificados e que, de alguma forma, estejam envolvidos no processo.

Campos de análise - Outra questão relevante em um processo de avaliação é que o Sistema UAB em âmbito nacional seria um objeto muito amplo para uma avaliação que atenda a um prazo de retorno viável em termos de tomada de decisão, por exemplo. Deste modo, necessário se faz um recorte em torno de uma alternativa mais viável. Nesse sentido, o de viabilizar uma avaliação dentro de um espaço razoável de tempo, o objeto de avaliação deve ser definido em termos de um objetivo local, ou seja, em relação a implantação do programa UAB em um Polo de município específico.

A escolha do Polo e do município depende do âmbito em que se pretende utilizar a avaliação, e pode ser definido em face de alguns critérios de seleção como: a) município com histórico significativo, ou seja, participante do programa desde sua primeira edição, permitindo a análise da implantação do programa em todas as suas etapas; b) presença da totalidade ou da maioria dos cursos EAD oferecidos pela IES interessada na avaliação, uma vez que é do interesse do avaliador obter subsídios para a atuação da IES onde atua profissionalmente, além de permitir maior quantidade e facilidade de acesso a dados e sujeitos da pesquisa; predominância da presença de cursos da IES interessada no polo, evitando distorções que poderiam ser ocasionadas pela implementação promovida simultaneamente por diversas IES, o que aumentaria a complexidade dos dados e da análise;

Assim, com base nestes critérios, a avaliação recairia sobre um polo representativo e significativo do processo de implantação, permitindo uma avaliação mais profunda e capaz de, efetivamente, fornecer subsídios para melhoria do programa UAB em relação ao interesse do avaliador.

Resultados esperados - A construção deste modelo de avaliação deve ser capaz de identificar os seguintes aspectos: a. em que momento se pode considerar o programa UAB efetivamente implantado junto a uma determinada comunidade estudantil, b. quais os elementos que efetivamente estão presentes no desenrolar das atividades relativas aos cursos de EAD quando ofertados pelo sistema UAB em um determinado polo de apoio presencial, c. de que modo se pode avaliar o grau de implantação do programa em um determinado Polo.

Dessa forma, se procurará fornecer subsídios aos profissionais que atuam na implantação e operação do programa e, principalmente, dotar os usuários e associados do consórcio (alunos, Estados e Prefeituras) de ferramentas que lhes permitam mensurar suas realidades e obterem subsídios para suas reivindicações e negociações junto ao órgão dirigente do programa (CAPES/MEC).

Recebido: 03 jul. 2012

Aprovado: 08 abr. 2013

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  • Programa Universidade Aberta do Brasil: aspectos relevantes na construção de uma metodologia para avaliar sua implementação

    'Open Brazilian University' program: relevant aspects in the development of a methodology for implementation assessment
  • 1
    Conforme histórico da UAB. Disponível em: <
    http://uab.capes.gov.br>. Acesso em: 13 jun. 2011.
  • 2
    Dispinível em: <
  • 3
    Conforme Decreto 5.800/2006. Disponível em: <
    http://www4.planalto.gov.br/legislacao>. Acesso em: 13 jun. 2011.
  • 4
    Conforme Editais disponíveis em <
    http://uab.capes.gov.br>, podemos verificar que a União financia desde a construção e equipamentos para montagem de polos pelas prefeituras até o custeio de diárias e passagens, material didático, entre outros.
  • 5
    Conforme Formulário de Avaliação de Polo.
  • 6
    Referenciais de qualidade para educação superior a distância - Secretaria de Educação a Distância - MEC, 2007 - p. 29-30. Disponível em: <
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Mar 2014
    • Data do Fascículo
      Mar 2014

    Histórico

    • Recebido
      03 Jul 2012
    • Aceito
      08 Abr 2013
    Publicação da Rede de Avaliação Institucional da Educação Superior (RAIES), da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e da Universidade de Sorocaba (UNISO). Rodovia Raposo Tavares, km. 92,5, CEP 18023-000 Sorocaba - São Paulo, Fone: (55 15) 2101-7016 , Fax : (55 15) 2101-7112 - Sorocaba - SP - Brazil
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