Acessibilidade / Reportar erro

Ganhos funcionais e sua relação com os componentes de função em trabalhadores com lesão de mão

Functional gains and their relationship with functional components among workers with hand injuries

Resumos

OBJETIVO: Este estudo teve como objetivos documentar os resultados da intervenção da Terapia Ocupacional em pacientes com lesões de mão por acidente de trabalho e examinar a relação entre os escores da avaliação funcional Canadian Occupational Performance Measure (COPM) com as variáveis força de preensão e diagnóstico, em três momentos (admissão, alta e follow-up). METODOLOGIA: Foi realizado um estudo observacional do tipo longitudinal. A amostra foi constituída de 42 indivíduos encaminhados ao Setor de Terapia Ocupacional de um Hospital da rede pública de Belo Horizonte. A instrumentação utilizada consistiu de dinamômetro Jamar para a mensuração da força de preensão, goniômetro de punho e dedos para a amplitude de movimento, monofilamentos de Semmes-Weinstein para a sensibilidade e a avaliação funcional COPM. RESULTADOS: Os parâmetros clínicos (força de preensão, amplitude de movimento, sensibilidade e desempenho funcional) mostraram ganhos importantes após a intervenção. Os escores do COPM inicial dobraram após a Terapia Ocupacional, fornecendo evidência de que os clientes melhoraram e ficaram satisfeitos com seu desempenho funcional. A força de preensão apresentou uma associação de baixa magnitude com as medidas avaliadas pelo COPM. Outros fatores podem estar associados ao uso funcional da mão, sendo que a força pode não ser suficiente para predizer a função da mão. Não foi detectada diferença entre os diagnósticos encontrados na amostra e os escores do COPM. CONCLUSÃO: As relações documentadas neste estudo indicam variáveis relevantes associadas aos ganhos após intervenção da Terapia Ocupacional e podem contribuir para uma atuação mais direcionada dos profissionais, no que concerne às expectativas do cliente.

Terapia Ocupacional; trauma; mão; avaliação funcional; acidente de trabalho


OBJECTIVE: To document the outcomes from occupational therapy intervention among patients with hand injury resulting from work-related accidents, and to examine the relationships between the scores from the Canadian Occupational Performance Measure (COPM) functional assessment and variables such as grip strength and diagnosis, at three times (admission, discharge and follow-up). METHOD: An observational longitudinal study was conducted. The sample consisted of 42 individuals who were referred for occupational therapy services at a public hospital in Belo Horizonte. The instruments used included a Jamar dynamometer to measure grip strength, hand goniometer for wrist and finger range of motion, Semmes-Weinstein monofilaments for sensitivity and the COPM functional test. RESULTS: The clinical parameters (grip strength, range of motion, sensitivity and functional performance) showed significant gains after the intervention. The initial COPM scores doubled after occupational therapy, thus providing evidence that the patients improved and were satisfied with their functional performance. There was a slight association between grip strength and the measurements evaluated by COPM. Other factors may be associated with functional use of the hand, since strength may be insufficient for predicting hand function. No differences were found between the diagnoses found in the sample and the COPM scores. CONCLUSION: The relationships documented in this study indicate the variables that are relevant to gains following occupational therapy interventions. This may contribute towards achieving interventions that are better focused, in terms of patients' expectations.

Occupational Therapy; trauma; hand; functional assessment; work-related accident


ARTIGOS CIENTÍFICOS

Ganhos funcionais e sua relação com os componentes de função em trabalhadores com lesão de mão

Functional gains and their relationship with functional components among workers with hand injuries

Figueiredo IMI; Sampaio RFII; Mancini MCIII; Nascimento MCIV

IHospital Maria Amélia Lins, Belo Horizonte, MG - Brasil

IIDepartamento de Fisioterapia, Escola de Educação Física, Fisioterapia, Terapia Ocupacional, Universidade Federal de Minas Gerais UFMG, Belo Horizonte, MG - Brasil

IIIDepartamento de Terapia Ocupacional, UFMG, Belo Horizonte, MG – Brasil

IVFundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG - Brasil

Correspondência para Correspondência para: Rosana Ferreira Sampaio Rua Juvenal dos Santos, nº 222, apto. 602, Bairro Luxemburgo CEP 30360-530, Belo Horizonte, MG Brasil e-mail: rosana@dedalus.lcc.ufmg.br

RESUMO

OBJETIVO: Este estudo teve como objetivos documentar os resultados da intervenção da Terapia Ocupacional em pacientes com lesões de mão por acidente de trabalho e examinar a relação entre os escores da avaliação funcional Canadian Occupational Performance Measure (COPM) com as variáveis força de preensão e diagnóstico, em três momentos (admissão, alta e follow-up).

METODOLOGIA: Foi realizado um estudo observacional do tipo longitudinal. A amostra foi constituída de 42 indivíduos encaminhados ao Setor de Terapia Ocupacional de um Hospital da rede pública de Belo Horizonte. A instrumentação utilizada consistiu de dinamômetro Jamar para a mensuração da força de preensão, goniômetro de punho e dedos para a amplitude de movimento, monofilamentos de Semmes-Weinstein para a sensibilidade e a avaliação funcional COPM.

RESULTADOS: Os parâmetros clínicos (força de preensão, amplitude de movimento, sensibilidade e desempenho funcional) mostraram ganhos importantes após a intervenção. Os escores do COPM inicial dobraram após a Terapia Ocupacional, fornecendo evidência de que os clientes melhoraram e ficaram satisfeitos com seu desempenho funcional. A força de preensão apresentou uma associação de baixa magnitude com as medidas avaliadas pelo COPM. Outros fatores podem estar associados ao uso funcional da mão, sendo que a força pode não ser suficiente para predizer a função da mão. Não foi detectada diferença entre os diagnósticos encontrados na amostra e os escores do COPM.

CONCLUSÃO: As relações documentadas neste estudo indicam variáveis relevantes associadas aos ganhos após intervenção da Terapia Ocupacional e podem contribuir para uma atuação mais direcionada dos profissionais, no que concerne às expectativas do cliente.

Palavras-chave: Terapia Ocupacional, trauma, mão, avaliação funcional, acidente de trabalho.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To document the outcomes from occupational therapy intervention among patients with hand injury resulting from work-related accidents, and to examine the relationships between the scores from the Canadian Occupational Performance Measure (COPM) functional assessment and variables such as grip strength and diagnosis, at three times (admission, discharge and follow-up).

METHOD: An observational longitudinal study was conducted. The sample consisted of 42 individuals who were referred for occupational therapy services at a public hospital in Belo Horizonte. The instruments used included a Jamar dynamometer to measure grip strength, hand goniometer for wrist and finger range of motion, Semmes-Weinstein monofilaments for sensitivity and the COPM functional test.

RESULTS: The clinical parameters (grip strength, range of motion, sensitivity and functional performance) showed significant gains after the intervention. The initial COPM scores doubled after occupational therapy, thus providing evidence that the patients improved and were satisfied with their functional performance. There was a slight association between grip strength and the measurements evaluated by COPM. Other factors may be associated with functional use of the hand, since strength may be insufficient for predicting hand function. No differences were found between the diagnoses found in the sample and the COPM scores.

CONCLUSION: The relationships documented in this study indicate the variables that are relevant to gains following occupational therapy interventions. This may contribute towards achieving interventions that are better focused, in terms of patients' expectations.

Key words: Occupational Therapy, trauma, hand, functional assessment, work-related accident.

INTRODUÇÃO

Ao analisar os resultados de intervenções de reabilitação, podemos observar que se conhece relativamente pouco sobre os seus efeitos e as respectivas mudanças que produzem nos pacientes1,2. Atualmente, discute-se a necessidade de avaliar os resultados de programas de reabilitação. Tal procedimento torna-se relevante pelas características do contexto socioeconômico, nos qual os serviços de reabilitação estão inseridos, e pela demanda por demonstração de eficácia dos procedimentos terapêuticos utilizados pelos profissionais2,3.

Segundo Halpern e Fuhrer4, a avaliação consiste em um processo dinâmico que visa à determinação das necessidades do indivíduo. A crescente disponibilidade de instrumentos de avaliação padronizados, que documentam aspectos da funcionalidade humana, tem contribuído com esse processo5,6. Dessa forma, é importante que a documentação da funcionalidade inclua os diversos componentes e fatores que a influenciam, tais como informações sobre estrutura e função do corpo, atividade e participação do indivíduo. Assim, ao avaliar os resultados da intervenção, o profissional deve registrar não somente as conseqüências físicas de determinada condição de saúde, mas também o impacto dessa condição sobre a capacidade do indivíduo para desempenhar atividades desejadas e esperadas socialmente.

Tradicionalmente, terapeutas ocupacionais que atuam com reabilitação de mão utilizam o modelo biomédico e centram suas ações terapêuticas na doença e na melhora da sintomatologia de determinada condição de saúde. Os desfechos avaliados são principalmente os componentes de função, como força de preensão, amplitude de movimento (ADM) e sensibilidade. Tal ênfase é consistente com o pressuposto de que o desempenho funcional de um indivíduo é resultado direto da integridade dos diferentes componentes de desempenho7.

Contrário a essa perspectiva teórica, tem sido discutido que a integridade de todos esses componentes não é suficiente para explicar o desempenho funcional8,9,10 . Alguns autores argumentam sobre a necessidade de os terapeutas ocupacionais desenvolverem pesquisas e disponibilizarem evidências que esclareçam a relação entre componentes de função e desempenho funcional8,11,12.

Nesse contexto, os objetivos deste estudo foram documentar os resultados da intervenção da Terapia Ocupacional em pacientes acidentados no trabalho com lesões traumáticas da mão, em três momentos (admissão, alta e um período pós-intervenção), e examinar a relação entre os resultados da avaliação funcional – Canadian Occupational Performance Measure (COPM) – com as variáveis força de preensão, idade, sexo, escolaridade, ocupação, tempo de tratamento e tipo de trauma.

MATERIAL E MÉTODOS

Foi realizado um estudo observacional do tipo longitudinal, em que os protocolos escolhidos foram administrados em três momentos: na admissão, na alta e no follow-up de um mês após as intervenções realizadas no Setor de Terapia Ocupacional de um hospital público de Belo Horizonte. A amostra foi selecionada por conveniência, e seu tamanho calculado com base em dois estudos8,12. No período de março a outubro de 2003, selecionaram-se 42 indivíduos, que receberam somente as intervenções da terapia ocupacional durante esse período.

Foram excluídos pacientes com déficits cognitivos ou diagnósticos que envolviam o sistema nervoso central. Os pacientes foram convidados a participarem do estudo e a assinarem um termo de consentimento livre e esclarecido. O projeto de pesquisa para a realização deste estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Maria Amélia Lins. Toda a coleta de dados foi realizada por uma única terapeuta ocupacional, que não se envolveu no tratamento de nenhum paciente. Cada sessão de tratamento foi dirigida para a redução da dor, da rigidez, do edema; para os cuidados com as cicatrizes e feridas e para com a restauração da força perdida em decorrência do trauma, utilizando para esse fim técnicas manuais, exercícios, atividades e órteses.

Dois protocolos foram utilizados para avaliação da amostra. O protocolo um consistiu em um questionário contendo informações sóciodemográficas, clínicas e sobre o acidente. Esse registrou também informações sobre componentes de função da mão lesada, incluindo força de preensão, ADM e sensibilidade.

Para a mensuração da força de preensão, usou-se o dinamômetro Jamar. O procedimento de utilização desse instrumento seguiu as recomendações da American Society of Hand Therapists (ASHT) na qual o paciente se posiciona sentado com o ombro aduzido, cotovelo fletido a 900, antebraço em posição neutra e punho entre 00 e 300 de extensão13. A alça do dinamômetro foi colocada na posição II para todos os participantes14,15. O paciente foi instruído a apertar o dinamômetro o mais forte que pudesse, por três vezes consecutivas, o que permitiu o cálculo de um índice médio de força de preensão da mão de cada paciente. A mensuração da força de preensão foi realizada após cinco semanas completas de pós-operatório em caso de tenorrafias (sutura de tendão), neurorrafias (sutura de nervo) e em caso de fraturas.

Para a medida de ADM, utilizou-se um goniômetro para punho e outro para as articulações digitais. Durante a mensuração da ADM do punho, conforme recomendação da American Society of Hand Therapists (ASHT)13, o goniômetro foi colocado dorsalmente à articulação para registro da amplitude de flexão, e volarmente para o registro da amplitude de extensão. A avaliação das articulações dos dedos foi realizada segundo as recomendações da Federação Internacional das Sociedades de Cirurgia da Mão (IFSSH), que sugere o cálculo de um índice único para cada dedo, denominado Total Active Motion (TAM). O TAM resulta da soma das flexões das articulações metacarpofalangeanas e interfalangeanas menos a soma dos déficits de extensão16. A flexão composta foi medida com o paciente procurando fechar a mão ativamente e mantendo o punho em posição neutra. A perda da extensão composta foi calculada com o paciente estendendo ativamente os dedos e mantendo o punho na mesma posição. Para mensurar a oponência do polegar, mediu-se a distância da face volar da interfalangeana do polegar ao 3º raio metacarpal13.

A avaliação da sensibilidade da mão dos pacientes foi realizada com os monofilamentos de Semmes-Weinstein e seguiu as recomendações da ASHT13.

O protocolo dois consistiu na avaliação do desempenho ocupacional pelo Canadian Occupational Performance Measure – COPM. Mediante um questionário semi-estruturado, o paciente indica cinco tarefas funcionais que sejam mais significativas para ele e cujos desempenhos estejam comprometidos, nas áreas de auto-cuidado, produtividade e lazer. Em seguida, esse faz uma auto-avaliação de seu desempenho e de sua satisfação com relação ao desempenho nas respectivas tarefas funcionais. Para a quantificação do desempenho e da satisfação com o desempenho ocupacional, cada um dos problemas apontados foi avaliado, utilizando-se duas escalas de dez pontos. Uma delas foi usada para auto-avaliação do desempenho atual naquela área (o escore 10 indicava "capaz de fazer extremamente bem" e o escore 1 "incapaz de fazer"); a outra escala foi empregada para auto-avaliação da satisfação com o desempenho atual (o escore 10 indicava "extremamente satisfeito" e o escore 1 "nada satisfeito")17.

As mensurações das variáveis força de preensão, ADM, sensibilidade e desempenho e satisfação funcional foram realizadas em duas ocasiões: na fase admissão e no final do tratamento. Dessas variáveis, somente a força de preensão e o desempenho e satisfação funcional foram reavaliados no follow-up de um mês.

A análise estatística consistiu em medidas descritivas, com o objetivo de caracterizar a amostra. A correlação entre o escore COPM, que não seguiu uma distribuição de probabilidade normal, e as variáveis independentes contínuas foi avaliada pelo coeficiente de correlação de Spearman. A comparação das três medidas realizadas (admissão, alta e follow-up) do COPM e da força de preensão realizou-se via testes não-paramétricos de Friedman e de Wilcoxon. A associação entre o escore COPM e as variáveis independentes categóricas foi feita pelo teste Mann-Whitney. Em todos os testes estatísticos, foi ponderado um nível de significância de 5% e as análises foram realizadas no software SPSS 8.0 Inc. (Statistical Package for Social Sciences).

RESULTADOS

Foram recrutados 77 indivíduos, dos quais 42 completaram as avaliações na data estipulada para a coleta de dados. A maioria dos trabalhadores era do sexo masculino (n=37) e a idade variou de 19 a 69 anos, com uma média de 35 anos (DP=11,5). Os participantes da amostra tiveram como diagnóstico principal lesão de tendão (38,1%), seguido de fratura (19,1%), lesão de nervo (19,0%), esmagamento (14,3%) e amputação (9,5%). A média de idade da amostra foi de 35 anos (DP= 11,9), sendo constituída principalmente de homens (88,1%). Quase metade dos participantes apresentava baixo nível de escolaridade (1º grau incompleto) e trabalhava no setor da indústria (69,0%).

Na comparação do TAM e da ADM, foram observadas diferenças estatisticamente significativas entre as medidas realizadas na admissão e na alta, com exceção da ADM de oponência do polegar, em que os valores observados na alta foram maiores.

Na avaliação da força de preensão da mão acidentada, na admissão, alta e follow-up, obteve-se um p<0.0001, evidenciando um aumento significativo de força de preensão da mão lesada nas três avaliações (13,56 ± 11,06; 25,34 ± 10,68 e 27,82± 11,31 KGF, respectivamente).

Na tabela 1, observa-se que as correlações entre as medidas de força de preensão apresentam magnitudes altas, e todas são estatisticamente significativas (p=0,0001). Em especial, chama-se a atenção para a correlação ligeiramente superior a 0,9 entre a medida da força de preensão da mão acidentada na alta e no follow-up. As três medidas são fortemente associadas, ou seja, a força de preensão do paciente, no momento da admissão, pode ser considerada preditiva da sua força no momento da alta e do follow-up, considerando a magnitude dos efeitos dos índices de correlação indicados.

Quanto aos testes de sensibilidade dos oito trabalhadores que tiveram lesão de nervo foi constatada melhora qualitativa da sensibilidade.

Nas avaliações realizadas com o COPM, as atividades mais mencionadas, que representam as dificuldades funcionais foram: amarrar calçados; tomar banho; escovar dentes; cortar unha; abotoar roupas; fazer barba; servir prato; varrer casa; lavar roupa; preparar refeições; lavar louça ou vasilha; picar verdura e legume; carregar sacola; segurar-se no ônibus; firmar ferramentas de trabalho e peças pequenas e carregar peso.

Os resultados do COPM para os domínios de desempenho e de satisfação, nos três momentos de avaliação, apresentam aumento sistemático com o passar do tempo, o que foi especialmente observado entre os momentos de admissão e de alta. A figura 1 chama a atenção para o comportamento semelhante existente entre os domínios desempenho e satisfação do COPM.


Para a comparação simultânea entre os três momentos da avaliação para os dois domínios do COPM, o nível de significância foi corrigido, sendo consideradas significativas aquelas diferenças cujo valor p for inferior a 0,017. Observou-se que o comportamento do COPM-desempenho e do COPM-satisfação foi praticamente o mesmo. Houve melhora significativa entre a admissão e a alta e também entre a admissão e o follow-up (p<0.001). Entretanto, não foi constatada diferença estatisticamente significativa entre as avaliações realizadas no momento da alta e do follow-up (p=0.040).

Na tabela 2, são apresentadas as correlações entre as três medidas do COPM. Os escores do COPM na alta e no follow-up não se associaram ao COPM obtido na admissão. Por outro lado, há uma correlação significativa e de alta magnitude entre os escores do COPM na alta e no follow-up, indicando que os pacientes que recebem alta, com escores altos na avaliação funcional, são aqueles que tiveram boa avaliação no follow-up.

As tabelas 3 e 4 apresentam os resultados da correlação entre o componente força de preensão e a avaliação funcional COPM e a correlação entre o ganho de força e os escores dos dois domínios do COPM. A correlação entre as medidas de força de preensão e os escores COPM é estatisticamente significativa. Na admissão é significativa a correlação entre a força de preensão e o escore COPM-desempenho, assim como no follow-up.

A tabela 4 apresenta a correlação significativa entre ganho de força e os escores do COPM. Embora tal correlação não seja de grande magnitude, é um pouco superior à observada entre a força de preensão e os escores do COPM.

Para os resultados da comparação dos escores do COPM com os diagnósticos, realizou-se o teste não-paramétrico de Kruskal Wallis. Houve diferença significativa entre os diagnósticos apenas em relação ao COPM-satisfação na alta (valor p<0,05); sendo o COPM dos pacientes que sofreram amputação estatisticamente inferior ao COPM daqueles que tinham outro diagnóstico.

As outras variáveis independentes: idade, sexo, escolaridade, ocupação e tempo de tratamento não apresentaram associações com o nenhum dos domínios do COPM.

DISCUSSÃO

Resultados descritivos informam que a clientela desse serviço é constituída por trabalhadores predominantemente do sexo masculino, em idade produtiva, o que reflete o perfil encontrado nas estatísticas de acidente de trabalho do Ministério da Previdência e Assistência Social. Os parâmetros clínicos considerados mostraram ganhos importantes após o tratamento. Esses achados são similares aos de outras investigações que avaliaram os resultados do tratamento de variadas condições de saúde pela Terapia Ocupacional1,2,7,9.

No presente estudo, foi encontrado que a média de força de preensão dos participantes, na alta, aumentou 11,78 kg em relação à admissão. Nitschke et al. observaram que somente um aumento da força de preensão superior a 6 kg pode ser atribuído a uma verdadeira mudança na força de preensão12. Estudos relatam que uma força de preensão de, no mínimo, 9 kg é necessária para a realização da maioria das atividades de vida diária (AVD)18,19,20. Abaixo desse nível, os pacientes começam a apresentar dificuldades para levantar e manusear objetos. Por outro lado, não existe ainda consenso quanto à quantidade mínima de força de preensão para o uso funcional da mão. Rice et al.21, por exemplo, reportaram que índices inferiores a 9 kg de força de preensão foram suficientes para o desempenho de AVD. Assim, um aumento médio da força de preensão de 11,78 kg, encontrado no momento da alta em relação à admissão, mostrou que, do ponto de vista clínico, houve realmente um ganho de força.

Outra variável investigada neste estudo foi ADM. Mensurações goniométricas são usadas para quantificar as limitações de movimento, decidir sobre intervenções terapêuticas apropriadas e documentar a efetividade das intervenções22. Os participantes deste estudo apresentaram melhora estatisticamente significativa da ADM dos dedos e do punho após o tratamento. Alguns autores observam que nem sempre um bom resultado medido pelo método goniométrico TAM corresponde a um resultado igualmente satisfatório na avaliação funcional. Tais achados sugerem que, para melhor compreensão das habilidades requeridas para o uso funcional da mão, é necessário acrescentar à avaliação goniométrica uma avaliação funcional14,23.

A terceira variável analisada neste estudo foi a sensibilidade, componente geralmente afetado nos traumas de mão com lesão do nervo periférico. A perda de sensibilidade pode trazer dificuldades e diminuir o poder de preensão, especialmente para aqueles que desempenham tarefas que exigem manipulações finas da mão, acarretando perdas funcionais importantes para o indivíduo24. No presente estudo, em todos os pacientes que tiveram lesão de nervo, foi detectado melhora da sensibilidade, indicando progresso de regeneração neural.

Os resultados encontrados mostraram que os pacientes dobraram os escores do COPM inicial após a intervenção da Terapia Ocupacional, mostrando que o desempenho das atividades enumeradas pelos pacientes como difíceis de realizar melhoraram segundo a percepção dos próprios trabalhadores na alta do serviço.

Outro estudo, ao empregar o COPM como um dos instrumentos de avaliação, encontrou resultados similares, mostrando que o instrumento foi sensível às mudanças dos clientes1. Neste estudo, o tamanho do efeito documentado para o COPM foi de 2,45 para desempenho e 2,52 para satisfação. Na presente pesquisa foi encontrado o valor de 1,99 para desempenho e 1,55 para satisfação. Esses valores demonstram uma melhora clinicamente relevante. As diferenças dos dois estudos concentraram-se nas atividades mais comumente mencionadas pelos pacientes. No estudo de Case-Smith1, a mais citada foi dirigir automóvel. Por sua vez, no presente estudo, somente dois trabalhadores escolheram essa mesma atividade. Tarefas de lazer também foram pouco mencionadas pelos participantes. Esses dados caracterizam as diferenças entre grupos de contexto cultural diferente e refletem condição socioeconômica distinta. A percepção das pessoas de sua condição de vida, no seu contexto cultural e sistemas de valores, interfere nas suas metas e expectativas 25. Portanto, serviços de reabilitação devem levar em consideração a satisfação e as prioridades dos indivíduos a fim de produzir resultados satisfatórios e condizentes com os desejos e as metas de cada um.

O COPM foi capaz de detectar que, para os pacientes com amputação de dedos, apesar de os escores de desempenho terem sido altos, os escores de satisfação foram baixos em relação aos demais participantes. Pillet26 considera a aparência da mão um componente estético importante, que afeta a socialização do indivíduo. Esse resultado enfatiza a necessidade de introduzir, na prática clínica, abordagens centradas no cliente, as quais dimensionem o impacto de uma condição de saúde na vida dele.

Mcaniff e Bohannon27 analisaram a relação do ganho de força de preensão com o tempo de tratamento e avaliaram se o ganho refletia em melhora de desempenho de atividades de autocuidado. Concluíram que a associação entre força de preensão, tempo de tratamento e uso da mão, em atividades de autocuidado, apresentou fraca magnitude. Em consonância com os achados desta pesquisa, a força de preensão e o ganho de força dos trabalhadores avaliados, no presente estudo, correlacionaram com escores funcionais documentados pelo COPM também com baixa magnitude. Os ganhos de força de preensão observados no período da alta explicaram somente 9% do desempenho e da satisfação, mostrando que nem todo ganho de força significa diretamente melhora do desempenho de AVD.

Um estudo conduzido com 15 participantes com trauma de mão analisou a associação entre ganho de força de preensão e os escores obtidos na avaliação funcional Michigan Hand Outcomes Questionnaire – MHQ. Os resultados mostraram que a recuperação da força de preensão prediz 37% do desempenho de AVD e 35% da função total da mão. Com base nos resultados dos dois estudos, a força de preensão é uma variável importante relacionada à função da mão, mas não é a preditora mais forte. Essa medida deve ser usada com outros parâmetros para avaliar a função da mão após uma lesão12.

Algumas limitações do presente estudo devem ser apontadas. Apesar de os trabalhadores atendidos apresentarem mudanças significativas em todos os parâmetros avaliados, outras variáveis, que não foram analisadas, podem contribuir para o progresso do cliente como motivação intrínseca e extrínseca do paciente, enfrentamento da doença, suporte ambiental e familiar e melhora espontânea28. Outra limitação é a variedade de diagnósticos incluídos na amostra. Embora essa seja uma ocorrência comum nos serviços de reabilitação e contribua para a generalização dos resultados, os diferentes diagnósticos, aliados ao tamanho da amostra, podem criar dificuldades na interpretação dos resultados. O tempo de follow-up, após a alta do serviço, foi de um mês e, por isso, pode ser considerado uma limitação. Por fim, por se tratar de um estudo descritivo, ressalta-se a necessidade de se realizar em pesquisas experimentais controladas para avaliar rigorosamente a eficácia das intervenções de reabilitação.

O resultado desta investigação está em concordância com o pressuposto de que força de preensão não deve ser usada como determinante de função da mão. Medidas de força de preensão, ADM e sensibilidade deveriam ser usadas em associação com parâmetros que documentassem apropriadamente desempenho funcional. Mathiowetz7 relata que, mesmo quando valores de força de preensão se encontram dentro de limites considerados normais, é possível que o indivíduo apresente dificuldade para executar alguma tarefa funcional. Contudo, força de preensão abaixo dos limites normais pode ser suficiente para o desempenho de todas as tarefas habituais do indivíduo. Conseqüentemente, as necessidades funcionais do cliente devem ser consideradas para que as propostas de intervenção correspondam às suas expectativas7.

No entanto, a prática centrada no cliente ainda é pouco implementada. A utilização do COPM propiciou a identificação das principais atividades nas quais os pacientes apresentavam dificuldades e que eram significativas para eles, permitindo mensurar a melhora no desempenho e na satisfação das atividades escolhidas. O COPM tem recebido atenção internacional como um importante instrumento para guiar intervenções da Terapia Ocupacional e constitui-se numa forma de avaliação que facilita a implementação da prática centrada no cliente. Nesse sentido, sugere-se que serviços de Terapia Ocupacional considerem a possibilidade de utilização do COPM para melhor direcionar suas intervenções.

Recebido: 13/10/2005

Revisado: 10/05/2006

Aceito: 26/06/2006

  • 1. Case-Smith J. Outcomes in hand rehabilitation using occupational therapy services. Am J Occup Ther. 2003; 57(5): 499-506.
  • 2. Hart DL, Tepper S, Lieberman D. Changes in health status for persons with wrist or hand impairments receiving occupational therapy or physical therapy. Am J Occup Ther. 2001; 55 (1): 68-74.
  • 3. Sampaio RF, Mancini MC, Fonseca ST. Produção científica e atuação profissional: aspectos que limitam essa integração na Fisioterapia e Terapia Ocupacional. Rev. Bras. Fisioter. 2002; 6(3): 113-8.
  • 4. Halpern AS, Fuhrer MJ. Functional assessment in rehabilitation. London: Paul H. Brookes; 1984.
  • 5. Ripat J, Etcheverry E, Cooper J, Tate R. A comparison of the Canadian Occupational Performance Measure and the health assessment questionnaire. Can J OccupTher. 2001; 68(4): 247-53.
  • 6. Melville LL, Baltic TA, Betcher WT, Nelson DC. Patients' perspectives on the self-identified goals assessment. Am J Occup Ther. 2002; 56(6): 650-9.
  • 7. Mathiowetz V. Role of physical performance component evaluations in occupational therapy functional assessment. Am J Occup Ther. 1993; 47(3): 225-30.
  • 8. Michener SK. Relationship among grip strength, functional outcomes, and work performance following hand trauma. Work. 2001; (16): 209-17.
  • 9. Costner W. Occupation-centered assessment of children. Am J Occup Ther. 1998; 52(5): 337-44.
  • 10. Trombly C. Anticipating the future: assessment of occupational function. Am J Occup Ther. 1993; 47(3): 253-257.
  • 11. Velozo CA. Work evaluations: critique of the state of the art of functional assessment of work. Am J Occup Ther. 1993; 47(3): 203-9.
  • 12. Nitschke JE, McMeeken JM, Bunny HC, Matyas TA. When is a change a genuine change? A clinically meaningful interpretation of grip strength measurements in healthy a disabled women. J Hand Ther. 1999; p. 25-30.
  • 13. American Society of Hand Therapists. Clinical Assessment Recommendations. Chicago; 1992.
  • 14. Goldman S, Cahalan TD, AN, K. The injured upper extremity and the Jamar five-handle position grip test. Am J Phys Med Rehabil. 1991; 70(6): 306-8.
  • 15. Firrel JC, Crain GM. Which setting of the dynamometer provides maximal grip strength? J Hand Surg. 1996; 21(3): 397-401.
  • 16. Araújo PMP. Avaliação dos resultados na reparação das lesões dos tendões flexores na mão análise comparativa entre o método goniométrico "TAM" e o método funcional "Minnesota". [Tese]São Paulo: Universidade Federal de São Paulo. Escola Paulista de Medicina; 1996.
  • 17. Law M, Baptiste S, Carswell A, McColl MA, Polajko H, Pollock N. Canadian Occupational Performance Measure. Manual, 2.ed., CAOT Publications Ace, 1994. Toronto. 58p.
  • 18. Hunter JM, Mackin EJ, Callahan AD. Rehabilitation of the hand: surgery and therapy. 4Ş ed. St. Louis: Mosby, 1995.
  • 19. Terrono AL, Nalebuff EA, Philips CA. The rheumatoid thumb. In: Hunter JM, Mackin EJ, Callahan AD. Rehabilitation of the hand: surgery and therapy. 4ş ed. St. Louis: Mosby, 1995.
  • 20. Rahman N, Thomas JJ, Rice MS. The relationship between hand strength and the forces used to access containers by well elderly persons. Am J Occup Ther. 2002; 56(1): 78-85
  • 21. Rice MS, Leonard C, Carter M. Grip strengths and required forces in accessing everyday containers in a normal population. Am J Occup Ther. 1998; 52(8): 621-6.
  • 22. Gajdosik RL, Bohannon RW. Clinical Measurement of range of motion: review of goniometry emphasizing reliability and validity. Physical Therapy. 1987; 67(12): 1867-72.
  • 23. Jansen CWS, Watson MG. Measurement of range of motion of the finger after flexor tendon repair in zone II of the hand. J Hand Surg. 1993; (18A): 411-7.
  • 24. Stanley BG, Tribuzzi SM. Concepts in hand rehabilitation. Philadelphia: F. A. Davis Company; 1992.
  • 25. Sussenberber BB. Fatores socioeconômicos e suas influências sobre o desempenho ocupacional. In: Neistadt ME, Crepaeau EB. Terapia Ocupacional de Willard & Spackman. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan S. A., 2002, cap. 7, p. 58-68. Traduzido pela Editora Guanabara Koogan S. A.
  • 26. Pillet J. The hand revealed its beauty: moving toward aesthetics. J Hand Ther. 1997; (10): 258-61.
  • 27. Mcaniff CM, Bohannon RW. Validity of grip strength dynamometry in acute rehabilitation. J Phys Ther Sci. 2002; 14(1): 41-6.
  • 28. Macdermid JC. Outcome measurement in the upper extremity. In: Mackin, EJ, et al. Rehabilitation of the hand and upper extremity. 5Ş ed. St. Louis: Mosby; 2002.
  • Correspondência para:

    Rosana Ferreira Sampaio
    Rua Juvenal dos Santos, nº 222, apto. 602, Bairro Luxemburgo
    CEP 30360-530, Belo Horizonte, MG Brasil
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Jan 2007
    • Data do Fascículo
      Dez 2006

    Histórico

    • Aceito
      26 Jun 2006
    • Revisado
      10 Maio 2006
    • Recebido
      13 Out 2005
    Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-Graduação em Fisioterapia Rod. Washington Luís, Km 235, Caixa Postal 676, CEP 13565-905 - São Carlos, SP - Brasil, Tel./Fax: 55 16 3351 8755 - São Carlos - SP - Brazil
    E-mail: contato@rbf-bjpt.org.br