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Análise do percurso escolar de um estudante com altas habilidades em um contexto familiar multilíngue: um estudo de caso

ANÁLISIS DEL RECORRIDO ESCOLAR DE UN ESTUDIANTE CON ALTAS HABILIDADES EN UN CONTEXTO FAMILIAR MULTILINGÜE: UN ESTUDIO DE CASO

RESUMO

Este artigo analisa o percurso escolar de um estudante com altas habilidades/superdotação, filho de mãe surda, em um contexto familiar multilíngue. Trata-se de uma pesquisa etnográfica longitudinal que se estendeu dos 5 aos 14 anos de idade do sujeito pesquisado. Em primeiro lugar, analisou-se o contexto familiar multilinguístico em que o sujeito está inserido, visando identificar a sua língua 1 (L1). Posteriormente, investigou-se seu percurso escolar, objetivando distinguir os motivos que o levaram a apresentar inúmeros desafios em sua escolarização. Por meio dessas etapas de pesquisa, foi possível constatar, a princípio, que a língua de sinais brasileira (Libras) e a língua portuguesa são L1 desse sujeito e, na etapa seguinte, que a existência de um contexto familiar multilíngue gerou conflitos no desenvolvimento do seu processo de escrita e suas altas habilidades não foram consideradas na intervenção escolar, levando-o a desenvolver total desinteresse pelos estudos.

PALAVRAS-CHAVE:
altas habilidades; superdotação; filhos ouvintes; pais surdos; inclusão; língua de sinais brasileira; pesquisa etnográfica

RESUMEN

Este artículo analiza el recorrido escolar de un estudiante con altas habilidades/superdotación, hijo de madre sorda, en un contexto familiar multilingüe. Se trata de una investigación etnográfica longitudinal, que se extendió de los 5 a los 14 años de edad del sujeto investigado. Primero, se analizó el contexto familiar multilingüe en el que se inserta el sujeto, con la finalidad de identificar su lengua 1 (L1). En segundo lugar, se investigó su recorrido escolar, buscando identificar los motivos que lo llevaron a presentar innumerables desafíos en su escolarización. Por medio de esta investigación fue posible constatar que la Lengua de Signos Brasileña (Libras) y el portugués son la L1 del sujeto y, en la siguiente etapa, que la existencia de un contexto familiar multilingüe generó conflictos en el desarrollo de su proceso. Las habilidades de escritura y sus altas habilidades no fueron consideradas en la intervención escolar, llevando al sujeto a desarrollar total desinterés por los estudios.

PALABRAS CLAVE:
altas capacidades; superdotación; hijos oyentes; padres sordos; inclusión; lengua de signos brasileña; investigación etnográfica

ABSTRACT

This article analyses the schooling path of a highly-skilled/gifted student, son of a deaf mother, inserted in a multilingual family context. This longitudinal ethnographic research started when the subject was five years old and continued until he turned fourteen. Initially, we analyzed the multilingual family context in which the subject is immersed in order to identify his first language (L1). Thereafter, we focused on his school path, aiming at identifying the reasons that led him to present numerous challenges in his schooling. The two research stages reveal, firstly, that Brazilian Sign Language (Libras) and Portuguese are the subject’s L1; secondly, that the existence of a multilingual family context generated conflicts in the development of his writing process, given that his high skills and giftedness were not considered in the school intervention, leading the subject to develop total disinterest in his studies.

KEYWORDS:
high skills; giftedness; hearing children; deaf parents; inclusion; Brazilian sign language; ethnographic research

INTRODUÇÃO

O presente estudo investiga o percurso escolar de um estudante com altas habilidades/superdotação, filho de mãe surda, inserido em contexto familiar com a presença de diversas línguas: língua portuguesa (LP), língua de sinais brasileira (Libras1 1 Com respaldo em Capovilla et al. (2017), optamos por utilizar a nomenclatura “língua de sinais brasileira” em vez de “língua brasileira de sinais” (Brasil, 2002). Na compreensão desses pesquisadores e na nossa também, não existe uma língua brasileira de sinais. Em outros países que têm a língua de sinais oficializada, usa-se língua de sinais como uma base linguística única, como se as três palavras (língua de sinais) formassem uma só unidade vocabular e se acrescenta a adjetivação pátria ao final. ), língua alemã (LA), língua ucraniana (LU) e língua inglesa (LI). A singularidade do caso, a considerar as características do sujeito (P), de seu contexto familiar multilinguístico e de sua vida escolar ao longo do ensino fundamental, 1º e 2º segmentos, reunida à longitudinalidade da pesquisa, permitiu a reunião de dados de interesse acadêmico-profissional que vão, por um lado, do fracasso escolar e, por outro, à premiação na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP).

No que se refere a trabalhos acadêmicos sobre pessoas ouvintes filhas de pessoas surdas, em revisão realizada entre os anos de 2007 e 2017, encontramos 20 pesquisas - 12 nacionais e oito internacionais. Esse número revela a incipiência em pesquisas nessa área, principalmente quando os dados mostram que, no Brasil, há cerca de 5,7 milhões de pessoas surdas (Brasil, 2014BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. Relatório sobre a política linguística de educação bilíngue: Língua Brasileira de Sinais e Língua Portuguesa. Brasília: Ministério da Educação , 2014.). Ao considerarmos que os surdos têm conquistado cada vez mais os seus direitos e espaço na sociedade, muitos deles têm constituído famílias, aumentando, consequentemente, o número de ouvintes cujos pais são surdos. Há pesquisas que apontam que a maioria dos surdos, mesmo casados entre surdos, possui chance de 90 a 95% de gerarem filhos ouvintes (Lane, 1992LANE, H. A máscara da Benevolência: a comunidade surda amordaçada. Lisboa: Instituto Piaget Divisão Editorial, 1992. (Coleção Horizontes Pedagógicos.); Wrigley, 1996WRIGLEY, O. The politics of Deafness. Washington, D.C.: Gallaudet University Press, 1996.; Quadros, 1997QUADROS, R. M. de. Educação de surdos: a aquisição da linguagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.).

As pesquisas realizadas por Bull (2013BULL, T. H. Deaf Family Issues: CODAS and Identity. 2013. Disponível em: Disponível em: https://silo.tips/download/deaf-family-issues-codas-and-identity . Acesso em: 9 mar. 2018.
https://silo.tips/download/deaf-family-i...
), Pereira (2013PEREIRA, O. R. Nascidos no silêncio: as relações entre filhos ouvintes e pais surdos na educação. 2013. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdades de Humanidades e Direito, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2013.), Souza (2014SOUZA, J. C. F. Intérpretes Codas: construção de identidades. 2014. Dissertação (Mestrado em Estudos da Tradução) − Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2014.), Streiechen, Cruz e Krause-Lemke (2015STREIECHEN, E. M.; CRUZ, G. C.; KRAUSE-LEMKE, C. Ouvintes e surdos, em casa e na escola: algumas intersecções (possíveis?). In: OLIVEIRA, J. P.; ANTOSZCZYSZEN, S.; SORIANO, K. R. (org.). Educação Especial: desenvolvimento infantil e processos educativos. Curitiba: CRV, 2015. p. 89-112.) e Quadros (2017QUADROS, R. M. de. Língua de herança: língua brasileira de sinais. Porto Alegre: Penso, 2017.) revelam que os filhos ouvintes de pais surdos, habitualmente, deparam com sérios conflitos de ordem psicossocial. Esses autores destacam que a maioria deles pode apresentar dificuldades para aprender a língua oral e a escrita, uma vez que estão habituados a falar sempre por meio da Libras, com os pais surdos.

Apesar de as crianças ouvintes de pais surdos estarem imersas no mundo ouvinte e em contato permanente com a LP desde bebês (com avós, tios, primos, vizinhos etc.), as pessoas com quem elas mais interagem em casa normalmente são os pais. Isso tem peso relevante ao considerarmos que o modo como os surdos se comunicam, por meio da língua de sinais (LS), difere de maneira significativa do modo como os ouvintes se comunicam.

Tendo em vista o cenário brasileiro, os filhos dos surdos acabam adquirindo, natural e simultaneamente, as duas estruturas linguísticas (LS+LP), ou, ainda, outras línguas, a depender do contexto dos sujeitos. Às vezes, dependendo do contexto familiar em que a criança está exposta, é possível que a cultura linguística da LS se sobreponha à LP. O que ocorre é que, na escola, essa criança, que está muito mais habituada com a LS, precisa utilizar as regras apenas da LP e libertar-se da estrutura da LS. Nesse panorama, Pereira (2013PEREIRA, O. R. Nascidos no silêncio: as relações entre filhos ouvintes e pais surdos na educação. 2013. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdades de Humanidades e Direito, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2013., p. 57-58) ressalta: “Ao escrever esse aluno pode trazer elementos da ordem de construção da língua de sinais, levando a professora, que desconhece essa língua, a acreditar que ele está apresentando dificuldades de aprendizagem”.

Quadros (2017QUADROS, R. M. de. Língua de herança: língua brasileira de sinais. Porto Alegre: Penso, 2017., p. 221), com base nos relatos de participantes de suas pesquisas, bem como ancorada em sua própria experiência, visto que a autora é filha de pais surdos, destaca: “A escola é um acontecimento na vida desses sujeitos, que apresenta um impacto significativo nas relações estabelecidas pelas zonas de contato. Inicialmente, a escola representa um espaço de desconforto para a maioria dos entrevistados”. De acordo com Streiechen, Cruz e Krause-Lemke (2015STREIECHEN, E. M.; CRUZ, G. C.; KRAUSE-LEMKE, C. Ouvintes e surdos, em casa e na escola: algumas intersecções (possíveis?). In: OLIVEIRA, J. P.; ANTOSZCZYSZEN, S.; SORIANO, K. R. (org.). Educação Especial: desenvolvimento infantil e processos educativos. Curitiba: CRV, 2015. p. 89-112., p. 90-91):

Uma pessoa ouvinte, filha de pais surdos, pode tornar-se um ouvinte diferente dos outros, por apresentar identidade “surda” e, ainda, diferente dos surdos por ter experiências auditivas. E o fato desses sujeitos conviverem com duas culturas distintas, surda e ouvinte, em seu cotidiano, pode desencadear situações embaraçosas e conflitantes; a maioria dos filhos ouvintes que têm pais surdos torna-se bilíngue e, inevitavelmente, intérprete de seus pais; a língua de sinais, muitas vezes, torna-se a primeira língua (L1) dessas pessoas; o fato de participarem ativamente da cultura de seus pais acabam internalizando e, consequentemente, praticam tais culturas de forma natural em seu cotidiano; alguns podem passar por conflitos de identidade por não saberem a qual comunidade realmente pertencem ou se identificam melhor, visto que ora preferem estar entre surdos, ora entre ouvintes; um dos principais desafios enfrentados por eles é o olhar curioso e/ou preconceituoso da sociedade em relação aos pais surdos e o excesso de responsabilidades com os irmãos mais novos. O estudo revela, ainda, que essas pessoas podem apresentar problemas relacionados às questões emocionais, sociais, escolares e outras.

Contudo, no Brasil, não há discussões que contemplem a inclusão escolar de filhos ouvintes de pais surdos. Assim, a desinformação da maioria dos professores sobre a cultura e as questões linguísticas desses alunos normalmente é nutrida por rótulos que podem ocasionar marcas profundas na escolarização e na vida desses sujeitos.

No que diz respeito a altas habilidades/superdotação (AH/S), a Resolução nº 2/2001, em seu Art. 5º, caracteriza alunos com AH/S aqueles que possuem “grande facilidade de aprendizagem que os levem a dominar rapidamente conceitos, procedimentos e atitudes” (Brasil, 2001BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Resolução CNE/CEB nº 2/2001. Diário Oficial da União, Brasília, Seção 1E, p. 39-40, 14 set. 2001., p. 2). Por sua vez, a Resolução nº 4/2009, que institui Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica, modalidade Educação Especial, no Art. 4º, descreve os alunos com AH/S como os que “apresentam um potencial elevado e grande envolvimento com as áreas do conhecimento humano, isoladas ou combinadas: intelectual, liderança, psicomotora, artes e criatividade” (Brasil, 2009BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Resolução nº 4, de 2 de outubro de 2009. Brasília: Ministério da Educação, 2009. Disponível em: Disponível em: http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/rceb004_09.pdf . Acesso em: 10 abr. 2018.
http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/rce...
, p. 1). Conforme a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, alunos com AH/S são aqueles que

demonstram potencial elevado em qualquer uma das seguintes áreas, isoladas ou combinadas: intelectual, acadêmica, liderança, psicomotricidade e artes. Também apresentam elevada criatividade, grande envolvimento na aprendizagem e realização de tarefas em áreas de seu interesse. (Brasil, 2008BRASIL. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília: MEC/SEESP, 2008. Disponível em: Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=16690-politica-nacional-de-educacao-especial-na-perspectiva-da-educacao-inclusiva-05122014&Itemid=30192 . Acesso em: 10 jan. 2019.
http://portal.mec.gov.br/index.php?optio...
, p. 15)

Martins, Pedro e Ogeda (2016MARTINS, B. A.; PEDRO, K. M.; OGEDA, C. M. M. Altas habilidades/superdotação: o que dizem as pesquisas sobre estas crianças invisíveis? Psicologia Escolar e Educacional, Maringá, v. 20, n. 3, p. 561-568, 2016. http://doi.org/10.1590/2175-3539201502031046
https://doi.org/http://doi.org/10.1590/2...
, p. 562) afirmam que a identificação das AH/S é bastante “relevante na medida em que a atenção educacional destinada a esses estudantes depende, inicialmente, de tal processo, o qual deve realizar-se o quanto antes, desde a educação infantil”, uma vez que esses alunos podem enfrentar diversos desafios de ordem psicossocial. Por sua vez, Martins (2006MARTINS, C. S. R. A identificação do aluno com potencial para Altas habilidades/superdotação no Sistema Educacional Adventista de Manaus. 2006. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2006., p. 25), com o intuito de desconstruir o mito de que esses educandos obtêm as melhores notas em tudo e apresentam bom rendimento acadêmico em todas as áreas, enfatiza:

O aluno que apresenta uma combinação de pontos forte e fracos acadêmicos vem a ser a regra, e não a exceção. Assim, ele pode ser superdotado em uma área acadêmica e mostrar-se incapacitado e até com distúrbio de aprendizagem em outra, que não seja do seu interesse, provando que a superdotação por si só não garante o sucesso educacional.

Por meio de um levantamento de dissertações e teses, entre 2005 e 2014, Martins, Pedro e Ogeda (2016MARTINS, B. A.; PEDRO, K. M.; OGEDA, C. M. M. Altas habilidades/superdotação: o que dizem as pesquisas sobre estas crianças invisíveis? Psicologia Escolar e Educacional, Maringá, v. 20, n. 3, p. 561-568, 2016. http://doi.org/10.1590/2175-3539201502031046
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) encontraram 91 pesquisas sobre AH/S. Ao denunciarem a carência em pesquisas nessa área e a falta de cientificidade nos instrumentos utilizados para a identificação de alunos com AH/S, os autores apontam: “Tais carências fazem com que os estudantes AH/S sejam invisíveis dentro do contexto escolar, sendo que muitas vezes seu potencial passa despercebido e/ou não é valorizado” (Martins, Pedro e Ogeda, 2016MARTINS, B. A.; PEDRO, K. M.; OGEDA, C. M. M. Altas habilidades/superdotação: o que dizem as pesquisas sobre estas crianças invisíveis? Psicologia Escolar e Educacional, Maringá, v. 20, n. 3, p. 561-568, 2016. http://doi.org/10.1590/2175-3539201502031046
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, p. 565-566).

As AH/S são citadas em toda a legislação que ampara a educação especial e inclusiva, contudo esses alunos não apresentam deficiência aparente - como os deficientes físicos, deficientes intelectuais, cegos etc. Assim, a identificação nem sempre ocorre em tempo hábil de se ofertar o atendimento especializado de que eles necessitam. O impacto disso relaciona-se diretamente aos critérios, aos instrumentos e às estratégias utilizadas no processo de identificação daqueles encaminhados para programas especiais (Alencar, 2007ALENCAR, E. M. L. S. Características sócio-emocionais do superdotado: questões atuais. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 12, n. 2, p. 371-378, maio/ago. 2007. http://doi.org/10.1590/S1413-73722007000200018
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), podendo, em vez de enaltecer, suprimir as aptidões desses alunos e gerar sequelas que dificilmente serão reparadas no futuro.

Desse modo, entendemos ser de interesse acadêmico-profissional avançar na discussão sobre alunos com AH/S para que se dê mais consistência à intervenção pedagógica, a fim de que as habilidades desses educandos não se percam no percurso escolar. Portanto, o presente estudo teve como objetivos:

  • identificar qual(is) a(s) língua(s) materna(s) ou língua(s) 1 (L1) do sujeito P inserido em um contexto familiar multilinguístico composto de cinco línguas envolvidas;

  • analisar o percurso escolar de P com foco nas implicações do contexto multilíngue e de suas AH/S em relação ao seu processo de escolarização.

O CAMPO DE PESQUISA E A NATUREZA DOS DADOS

Para o desenvolvimento deste estudo, optou-se pela realização de uma pesquisa qualitativa, com abordagem etnográfica longitudinal (Fonseca, 1999FONSECA, C. Quando cada caso NÃO é um caso: pesquisa etnográfica e educação. Revista Brasileira de Educação, n. 10, p. 58-78, jan./abr. 1999.) e assentada em um estudo de caso. Como método de trabalho para a geração e transcrição de dados, utilizamos os pressupostos da sociolinguística interacional, conforme Garcez (2002GARCEZ, P. M. Apresentação à nova edição. In: RIBEIRO, B. T.; GARCEZ, P. M. (org.). Sociolinguística interacional. 2ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 2002. p. 7-11.). Destacamos que essa abordagem tem como premissa o “estudo da organização social do discurso em interação, ressaltando a natureza dialógica da comunicação humana” (Garcez, 2002GARCEZ, P. M. Apresentação à nova edição. In: RIBEIRO, B. T.; GARCEZ, P. M. (org.). Sociolinguística interacional. 2ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 2002. p. 7-11., p. 8). Por meio desse método, é possível dar maior atenção ao fenômeno linguístico em si ou ao fenômeno interacional. Outro aspecto muito importante é a noção de contexto, considerando que a interação sempre acontece de forma situada, tendo em vista os participantes - por exemplo, quem fala para quem -; a noção de tempo - em que momento se fala -; o espaço - em que lugar se realiza a interação -; e a referência - sobre o que se fala. A geração de dados, portanto, esteve pautada na gravação de vídeos e na sua transcrição levando-se em conta esses elementos.

O número total de dados não foi quantificado, visto que estes foram muitos. Assim, selecionamos aqueles que nos pareceram mais significativos para a análise qualitativa e etnográfica, definidos com base no estudo de caso e que atendessem aos objetivos delineados para a pesquisa tanto no contexto familiar quanto no escolar.

No que tange à análise dos dados, esta baseia-se na análise textual discursiva, a qual se define como um “processo de desconstrução, seguido de construção, de um conjunto de materiais linguísticos e discursivos, produzindo-se, a partir disso, novos entendimentos sobre os fenômenos e discursos investigados” (Moraes e Galiazzi, 2016MORAES, R.; GALIAZZI, M. C. Análise textual discursiva. 3. ed. Ijuí: Ed. Unijuí, 2016., p. 134). Ressalta-se que a perspectiva qualitativa e longitudinal foi crucial para a compreensão do contexto de pesquisa, para a geração de dados e para a construção do quadro analítico.

Os dados, gerados em áudio e vídeo, constituíram-se de interações familiares, as quais foram transcritas e organizadas em diferentes segmentos e cuja finalidade foi discutir os seguintes aspectos: a intimidade de P com as línguas envolvidas no contexto multilinguístico a que ele e seu irmão estão expostos; a importância que cada língua representa para P na efetivação da comunicação; a alternância de línguas, fenômeno detectado em situações comunicativas entre P, seu irmão e a mãe; bimodalismo (duas línguas simultâneas) presente em alguns contextos comunicativos de P com os membros da família; e situações de conversação em Libras entre P, seu irmão e a mãe.

O período pesquisado iniciou-se em 2008 e seguiu até 2018, dividido em diferentes etapas, as quais são descritas na sequência. O sujeito em questão (P, de 14 anos de idade) é filho de mãe surda e pai ouvinte. Ele reside com os pais e avós maternos em uma cidade do interior do estado do Paraná. As primeiras informações do estudo são oriundas de entrevistas realizadas com P e com sua mãe quando P tinha 5 anos de idade, no ano de 2009. Diante da descoberta de que P apresentava facilidade para se comunicar com sua mãe surda, por meio da Libras, e apresentava disposição para aprender outras línguas, a pesquisa estendeu-se entre 2012 e 2014 (Streiechen, 2014STREIECHEN, E. M. A aquisição da Libras por crianças ouvintes filhas de mãe surda em um contexto multilinguístico: um estudo de caso. 2014. 130f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Estadual do Centro-Oeste, Paraná, 2014.).

Nessa etapa, o foco estava centrado nas línguas do contexto familiar de P (8 anos de idade, à época) e teve como intuito identificar qual ou quais eram as línguas maternas desse sujeito. Os dados foram coletados por meio de entrevistas e diário de campo, gravados em vídeo, de 2012 a 2013, quinzenalmente, com cerca de duas horas diárias, em diversos momentos e situações: enquanto P brincava e interagia com seu único irmão (3 e 4 anos de idade, na época); em contato com a mãe e com outros membros da família; ou enquanto ele tentava realizar as tarefas escolares em casa.

Aos 5 anos de idade, além da fluência na LS e na LP, P pronunciava palavras e frases em alemão e compreendia parte das conversas nessa língua entre seus avós maternos, conseguia ler textos longos com certa fluência, apresentava vocabulários mais rebuscados da LP e elaborava frases com concordância, estabelecendo marcações de gênero e número. Seu hobby era estudar inglês, e algumas de suas revistas em quadrinho (gibis) eram escritas nessa língua. Nessa idade, P ainda não frequentava a escola, mas já havia aprendido a ler e a escrever com sua mãe (surda).

Em certa ocasião, aos 8 anos de idade, P desenhou e explicou todo o sistema solar, destacando as proximidades entre os planetas, bem como a remota possibilidade de existência de vida em cada um deles. Ele sabia da existência de novos planetas, falava o nome de cada um, em ordem e sem titubear. P desenhou uma figura que, segundo ele, demonstrava o modo como as imagens são transmitidas pela televisão, apresentando conhecimentos de física. Explicou a legenda da construção de uma escola que ele havia desenhado, utilizando conhecimentos matemáticos de espaço e cálculos, por exemplo. Apesar da notável habilidade de P em adquirir línguas, demonstrar interesse e aprender assuntos complexos para sua idade, a maioria de suas notas nos boletins escolares no ensino fundamental (1º ao 5º ano) era abaixo da média, que era 7.

No decorrer da pesquisa inicial (Streiechen, 2014STREIECHEN, E. M. A aquisição da Libras por crianças ouvintes filhas de mãe surda em um contexto multilinguístico: um estudo de caso. 2014. 130f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Estadual do Centro-Oeste, Paraná, 2014.), surgiram vários aspectos em torno da escolarização de P que extrapolavam os objetivos delineados para o estudo desenvolvido naquele momento. Após ter conhecimento de diversos bilhetes da escola encaminhados à mãe, com queixas sobre o rendimento escolar, comportamento e notas baixas de P, decidiu-se que era preciso dar sequência à investigação. Isso se traduzia em um paradoxo que se observava entre a capacidade intelectual de P - desde os seus 5 anos de idade - e as reclamações da escola, por intermédio dos bilhetes.

Tendo em vista esse fato, na segunda etapa do estudo, concentrou-se na análise do percurso escolar de P do 1º ao 9º ano do ensino fundamental, que compreende as idades entre 6 e 14 anos do sujeito. Nos anos iniciais do ensino fundamental, P estudou em uma escola da rede municipal e, nos anos finais, em uma escola estadual. Apesar de ingressar na escola com 5 anos de idade diretamente no 1º ano, sem passar pela pré-escola, sabendo ler e escrever, esse aluno não se sentia motivado para realizar as atividades na escola, sobretudo nos anos iniciais, conforme relatado pela família e pela escola.

Assim, delineou-se um estudo em duas escolas públicas (uma municipal e uma estadual) cujos participantes foram, além de P, sujeito de nossa pesquisa, sua família, professores, psicólogos, diretores e equipe pedagógica. Os dados acerca de seu percurso escolar foram reunidos, entre os anos de 2015 e 2018, por meio de entrevistas gravadas em áudio e/ou em vídeo2 2 Os vídeos foram necessários para gravar as entrevistas com a mãe, visto que a comunicação com ela ocorreu por meio da língua de sinais. A primeira autora deste artigo é tradutora/intérprete de língua de sinais. . Em 2015, quando iniciamos a coleta de dados na escola dos anos iniciais (I13 3 Usaremos a sigla I1 para nos referirmos à escola dos anos iniciais e I2 para a escola dos anos finais. Ambas as instituições são da rede pública de ensino e estão localizadas na mesma cidade do interior do estado do Paraná. ), P já estava cursando o 6º ano em outra escola (I2). Por conseguinte, os relatos dos professores da I1 foram com base em suas memórias sobre a escolarização desse aluno, diferentemente da I2, em que a escolarização ocorreu ao mesmo tempo da pesquisa. Entrevistamos um total de 19 profissionais, individualmente, sendo três diretoras, duas pedagogas, duas psicólogas e 12 professores.

As entrevistas com os professores e demais participantes foram realizadas individualmente, com o propósito de deixá-los à vontade e estimulá-los a narrar todos os episódios por eles lembrados acerca do processo de escolarização de P. No contexto familiar, além da investigação diretamente com P, fizeram-se entrevistas com a mãe e a avó materna de P, pessoas que passam a maior parte do tempo com ele, cujas entrevistas ocorreram uma ou duas vezes por mês no período de 2015 a 2018. Com P, as entrevistas foram quase sempre em forma de conversas espontâneas e informais, gravadas com o celular ou a câmera. Esses momentos, que se configuraram como geração de dados, foram guiados, na maioria das vezes, por um incidente relatado pela mãe ou pela avó sobre algum episódio escolar, como as queixas dos professores, as chamadas de atenção ou as tarefas que P não queria fazer em casa.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nesta seção, apresentamos alguns dados relativos, em primeiro lugar, à descrição e ao funcionamento do contexto multilinguístico no qual P estava inserido e, em seguida, segmentos selecionados de entrevistas realizadas com a equipe escolar acerca do desenvolvimento do processo de aprendizagem do sujeito pesquisado.

Em relação à primeira etapa de nossa pesquisa, a qual trata do contexto multilinguístico do sujeito do estudo, destacamos o segmento em que P expressa seu conhecimento de três línguas - alemão, inglês e Libras -, durante uma entrevista de 2013, quando ele tinha 8 anos de idade. Tal entrevista teve como objetivo verificar se P tinha consciência da diversidade linguística em que está envolvido:

Pesquisadora (pesq.): Você sabe alguma coisa em alemão? Sujeito da pesquisa (P.): Heiẞ. Pesq.: Heiẞ? O que quer dizer isso? P.: Heiẞ quer dizer quente. Pesq.: Seus avós conversam em alemão? P.: Sim. Pesq.: E como você aprendeu inglês? P.: Pelo computador. Sabia que A em inglês é E? Pesq.: Fale alguma coisa em inglês pra eu ver. P.: Loveu, Loviu lo [‘lʌv]. Pesq.: Love. O que quer dizer love? P.: Love quer dizer amo. Pesq.: O que mais que você sabe? P.: Também sei hello. Pesq.: Hello quer dizer o quê? P.: Oi. Pesq.: Oi? Hum, o que mais? P.: [olhou para o cachorro, que estava na casinha ao lado] dog. Pesq.: Dog é o quê? P.: Dog é cão. Pesq.: E em Libras, como faz cão? P.: [sinaliza cachorro]. Pesq.: Hum. E o que mais você sabe em Libras? P.: [sinaliza borboleta]. Pesq.: O que é isso? P.: Borboleta [sinaliza aranha e outros animais].

É pertinente ressaltarmos que, diante da câmera, P ficava um pouco inseguro para falar as línguas. Ele não estava habituado com essa situação e, além do mais, não foi incentivado para a pronúncia das palavras, já que em seu entorno não havia essa preocupação. No caso da LI, como aprendiz autônomo, não há com quem compartilhar momentos de interação, e seus materiais de estudo, na grande maioria, são livros e revistas. No caso de P, o uso das línguas - sobretudo LS, LP e LA - está atrelado a fins comunicativos, haja vista a constituição multilinguística de seu entorno familiar. Ela se dá, pois, de forma natural, sem correções de outros. De acordo com Krashen (1981KRASHEN, S. Second language acquisition and second language learning. Oxford: Pergamon, 1981., p. 1), “os falantes não estão preocupados com a forma de suas sentenças, mas sim com as mensagens que eles estão exprimindo e entendendo”. Muito embora algumas pronúncias de P em relação ao inglês fujam dos padrões da língua, é importante reiterar seu esforço de aprendizagem autônoma, já que não há ninguém em casa que lhe dê um feedback.

Na citação apontada anteriormente, P sinaliza alguns animais, tais como cachorro, aranha e borboleta. Ao analisarmos os vídeos de P sinalizando tais elementos4 4 Tendo em vista o atendimento aos protocolos éticos, não divulgamos as imagens de P sinalizando em Libras. , observamos que ele utiliza os parâmetros linguísticos da Libras - a configuração de mãos (forma das mãos), a locação (lugar do corpo onde incide a mão configurada) e o movimento - com muita eficiência. Isso se configura em fluência da Libras, visto que os sinais decorrem naturalmente. Ainda, a surdez da mãe não causou nenhum tipo de prejuízo ao desenvolvimento linguístico de P. Não foi identificado nenhum tipo de dificuldade comunicativa entre P, como ouvinte, e sua mãe, surda, nem vice-versa. Tampouco houve vestígios de atraso no desenvolvimento da linguagem. Ao contrário, verificou-se que P apresentou nível elevado de conhecimento para sua idade e, além disso, demonstrou muita facilidade em adquirir línguas. Não há, por parte de P, rejeição a nenhuma das línguas presentes no contexto no qual se encontra inserido, sem superioridade ou inferioridade entre as línguas envolvidas. Todas são consideradas línguas com igual valor.

Desse modo, observa-se que a aquisição da linguagem de P se direciona para o desenvolvimento de um sujeito plurilíngue, e ele mostra-se competente para gerenciar o uso das línguas conforme os diferentes contextos e necessidades. Os dados da pesquisa mostraram que tanto a LP quanto a Libras são uma constante em quase todas as situações comunicativas entre P e sua mãe e, portanto, ele adquiriu as línguas simultaneamente e de forma natural. Diante disso, podemos afirmar que ambas as línguas, Libras e LP, são as línguas maternas de P. A presença de P nesse contexto multilinguístico torna-se extremamente importante para o desenvolvimento da linguagem de seu irmão, já que a Libras é utilizada por eles em tempo integral, facilitando ainda mais o processo de aquisição da linguagem do seu irmão menor, o que se coaduna aos estudos de Morais (2001MORAIS, C. A. L. de A. Estudo dos efeitos linguístico-discursivos na interação criança - criança: suas implicações na fonoaudiologia. 2001. Dissertação (Mestrado em Fonoaudiologia) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2001. Disponível em Disponível em http://www4.pucsp.br/linguagemesubjetividade/PDF/09_08_2010_claudiangelica.pdf . Acesso em: 14 maio 2019.
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), ao defender a interação criança-criança nesse processo.

Foi possível verificar, ainda, que as fronteiras entre as línguas de sinais e orais presentes nos contextos multilinguísticos fazem com que os interlocutores busquem estratégias que facilitem ou que efetivem a comunicação. Entre essas estratégias, destacam-se: a alternância de línguas, fenômeno bastante frequente e comum nos diálogos das pessoas bilíngues; e o bimodalismo, gestos que são recursos estratégicos importantes e que possuem também significados semânticos nos diferentes enquadres interacionais.

No tocante à segunda etapa de nossa pesquisa, a qual trata do desenvolvimento escolar de P, entre os dados produzidos, sublinhamos alguns depoimentos dos docentes que revelam as implicações da diversidade linguística e das AH/S no processo de aquisição da escrita e da oralidade de P. Tendo como eixo condutor a análise textual discursiva (Moraes e Galiazzi, 2016MORAES, R.; GALIAZZI, M. C. Análise textual discursiva. 3. ed. Ijuí: Ed. Unijuí, 2016.), é possível sintetizar os elementos presentes nos depoimentos em duas vertentes, que podem ter desencadeado os percalços no processo de ensino e aprendizagem de P, sendo um deles a interferência das línguas presentes no ambiente familiar e o outro as suas AH/S.

O fato de P viver entre LS e LP e se comunicar por meio de ambas ocasionou consequências em seu processo de escrita - principal queixa dos professores. Essas línguas apresentam estruturas sintáticas diferentes e P, que as adquiriu de forma concomitante, nem sempre conseguia separá-las no momento da elaboração da escrita, gerando, assim, certa confusão. De acordo com Pereira (2013PEREIRA, O. R. Nascidos no silêncio: as relações entre filhos ouvintes e pais surdos na educação. 2013. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdades de Humanidades e Direito, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2013., p. 57-58):

No ambiente escolar não podemos nos esquecer de que o aluno ouvinte filho de pais surdos em sua casa usa a língua de sinais com os pais, e de que essa língua possui uma outra estrutura e uma ordem de uso diferente da Língua Portuguesa. Ao escrever, esse aluno pode trazer elementos da ordem de construção da língua de sinais, levando a professora, que desconhece essa língua, a acreditar que ele está apresentando dificuldades de aprendizagem.

Apesar de P estar imerso no mundo ouvinte e em contato permanente com a LP (com seu pai, avós, tios, primos etc.), a pessoa com quem ele mais interage em casa é a mãe, e torna-se importante frisarmos que P foi alfabetizado por sua mãe. Isso tem peso relevante ao considerarmos que o modo como os surdos se comunicam, por meio da LS, difere significativamente do modo como os ouvintes se comunicam, por intermédio da LP (ou outras línguas), e, provavelmente, a mãe, sendo surda, utilizou os critérios, ou seja, a estrutura de sua L1, da Libras, para alfabetizar seu filho. Ao aprender a escrever com a sua mãe, P internalizou muito mais as regras da LS - a ausência de conjunções/preposições, a estrutura sintática, os verbos (no infinitivo), conforme relatado pela professora de Ciências da I2: “Eu quase não conseguia entender o que ele escrevia. Ele não usava muito o ‘e’, o ‘mas’”. Logo, ao ingressar na escola, P precisou se libertar de tudo aquilo que havia aprendido em casa e substitui-lo pelas regras da LP, uma vez que seu modo de escrever foi considerado um erro pela escola, visto que:

A escola é o espaço que privilegia a língua portuguesa, em suas modalidades, falada e escrita, e costumeiramente não considera outras línguas em seu currículo. [...] Como a língua falada é usada para mediar as relações na escola, a instituição não consegue atribuir sentido nas relações a partir da língua de sinais. Assim, a escola pode não ter sentido para alguns filhos de surdos ou incitar estranhamento (raiva, negação). (Quadros, 2017QUADROS, R. M. de. Língua de herança: língua brasileira de sinais. Porto Alegre: Penso, 2017., p. 221)

Ao considerarmos as diferenças implícitas nas duas línguas, LS e LP, podemos entender que tais diferenças ocasionaram conflitos no processo de aquisição da escrita de P. Por isso, ele utilizava a estratégia de fuga, ou seja, evitava escrever, conforme relatado pelos docentes: “Ele não gostava de escrever, não gostava de passar para o papel e, quando ele passava, era só a ideia principal. Às vezes, ele maltratava a gente, porque ele dizia que odiava escrever, daí odiava a professora e tudo” (professora do 4º ano, I1, 2016); “ele simplesmente não gostava de escrever. E a dificuldade maior dele também era no português, normas da língua, parágrafo, acentuação, trocas de letras, produção de texto” (professora do 5º ano, I2, 2016); “ele tinha as dificuldades dele de escrever […]. Até que a intérprete de Libras que entrou, porque tinha um outro aluno surdo, ela começou a auxiliar o P a corrigir essa parte da grafia, da escrita dele” (pedagoga da I2, 2017); “nunca reclamou da matéria, mas percebia que ele preferia os momentos onde eu estava explicando os conteúdos aos momentos que precisávamos produzir manualmente” (professora de História, I2, 2018).

Virgolim (2014VIRGOLIM, A. M. R. A contribuição dos instrumentos de investigação de Joseph Renzulli para a identificação de estudantes com altas habilidades/superdotação. Revista Educação Especial, Santa Maria, v. 27, n. 50, p. 581-610, 2014. https://doi.org/10.5902/1984686X14281
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, p. 586) explica que uma criança com AH/S “pode ler precocemente ou mostrar um interesse aprofundado por uma disciplina em particular e não demonstrar o mesmo interesse ou habilidades em momentos posteriores”. Com essa explicação, é possível afirmar que, para P, a leitura pode ser o caminho para a aquisição de conhecimento, enquanto escrever é uma área que não lhe proporciona nenhum prazer. Essa falta de interesse de P pela escrita pode ser fruto tanto do seu contexto familiar multilinguístico quanto de suas AH/S.

Nos depoimentos dos docentes, há uma queixa relativa à caligrafia, incompreensível, que dificultava a avaliação da escrita de P. Existem pesquisadores (Martins, 2006MARTINS, C. S. R. A identificação do aluno com potencial para Altas habilidades/superdotação no Sistema Educacional Adventista de Manaus. 2006. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2006.; Alencar, 2007ALENCAR, E. M. L. S. Características sócio-emocionais do superdotado: questões atuais. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 12, n. 2, p. 371-378, maio/ago. 2007. http://doi.org/10.1590/S1413-73722007000200018
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, entre outros) que postulam que alunos com AH/S podem apresentar diversos problemas escolares, entre eles dificuldade com a caligrafia:

Alunos academicamente superdotados são, às vezes, desiguais em seus perfis escolásticos, podendo até apresentar distúrbios de aprendizagem em algum domínio, como por exemplo, a dislexia e dificuldade de aprender a ler, problemas com a matemática, problemas perceptuais-motores, dificuldade em caligrafia ou ainda, inabilidade de focalizar e prestar atenção. (Martins, 2006MARTINS, C. S. R. A identificação do aluno com potencial para Altas habilidades/superdotação no Sistema Educacional Adventista de Manaus. 2006. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2006., p. 25, grifo nosso)

Ao compararmos esses “domínios” a que Martins (2006MARTINS, C. S. R. A identificação do aluno com potencial para Altas habilidades/superdotação no Sistema Educacional Adventista de Manaus. 2006. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2006.) se refere com nossos dados acerca do processo de escolarização de P, podemos afirmar que esse aluno não apresentou problemas relacionados à maioria das áreas descritas na citação. No item “dificuldade de aprender a ler”, os dados demonstram que P lê desde os 5 anos de idade, e, na área de matemática, é capaz de resolver expressões e cálculos matemáticos mentalmente. No 6º e no 9º ano, ele foi até mesmo medalhista da OBMEP, com direito à bolsa. Nas demais áreas (geografia, história e ciências), apesar das notas baixas nos boletins escolares na I1, P sempre foi aluno destaque na I2, com notório interesse e notas elevadas.

No que diz respeito aos domínios perceptual-motores, dificuldade em caligrafia ou, ainda, inabilidade de focalizar e prestar atenção - domínios também destacados por Martins (2006MARTINS, C. S. R. A identificação do aluno com potencial para Altas habilidades/superdotação no Sistema Educacional Adventista de Manaus. 2006. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2006.), no excerto anterior -, nossos dados sugerem que aí residem as maiores dificuldades de P, o que os professores apontam como um problema: “A escrita dele eu quase não conseguia entender, o que ele escrevia nas provas” (professora de Ciências, 2018); “a ortografia dele […] ele não gostava, ele não fazia, ele se revoltava, não gostava de escrever. E por isso, talvez, as notas dele não foram muito boas” (professora do 4º ano, 2018); “essa dificuldade que ele tinha de escrever, no momento que era pra registrar alguma coisa no caderno, ele se recusava” (professora do 5º ano, 2018).

Em um dos bilhetes da professora do 4º ano, também pudemos observar a preocupação da docente com a caligrafia do aluno, quando ela recomenda, à mãe, para comprar um caderno de caligrafia para P. Com essas constatações, concluímos que não foi somente do ambiente multilinguístico, onde P está imerso, que derivaram os obstáculos em seu processo de escrita e, consequentemente, em seu percurso escolar como um todo, mas a junção desse contexto com suas AH/S.

Entretanto, as AH/S de P só foram detectadas no ano de 2015, quando ele frequentava o 6º ano (11 anos de idade). Apesar das evidências de que P é um aluno com AH/S, a maioria dos docentes não as mencionou nas entrevistas. As atas de conselhos também não revelam nada nesse sentido. Mesmo assim, há vários relatos dos participantes, de ambas as instituições, que comprovam que alguns desafios escolares de P estão diretamente relacionados às suas AH/S, sem que os profissionais se dessem conta disso. Acreditamos que as AH/S de P não foram identificadas, uma vez que ainda predomina a ideia de que um aluno só pode ser considerado com AH/S se “apresentar domínio em diversas áreas, como ‘um gênio’; aquele que é ‘nota 10,0’ em tudo’” (Martins, 2006MARTINS, C. S. R. A identificação do aluno com potencial para Altas habilidades/superdotação no Sistema Educacional Adventista de Manaus. 2006. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2006., p. 14).

Embora esteja destacado em um dos relatórios psicológicos realizados em 2010, quando P frequentava o 1º ano, que ele é um aluno com desempenho acima da média, o foco e as queixas dos docentes sempre recaíam nas dificuldades, e não nas potencialidades desse aluno. Vejamos a parte do relatório da psicóloga com tal informação:

O aluno possui grande capacidade intelectual, aos 6 anos, no 1º ano sabe ler e escreve muitas palavras. P possui grande potencial intelectual e facilidade para expressar-se num nível superior ao de crianças para sua idade. O aluno foi submetido a um teste não-verbal de inteligência para crianças, e no momento em que foi avaliado, apresentou desempenho MUITO ACIMA da média esperada para crianças de sua faixa etária, sendo que seus escores situam-se no melhor nível de desempenho de crianças de 9 anos. (Psicóloga, 2010, grifo do original5 5 Nas entrevistas, os docentes mencionaram que P fora encaminhado à psicóloga, mas nenhum deles sabia dizer o que continha nos relatórios. )

Resumidamente, as principais justificativas dos participantes em relação às dificuldades de trabalhar com P foram: “Ele não aproveitou tudo isso, o potencial que ele tinha. [...] O professor não está preparado para trabalhar com esse aluno, porque o aluno que tem uma inteligência acima ele vai pra escola especial” (professora do 1º ano, 2018); “era difícil de ler ele [...]. Eu não tinha preparação naquela época” (professora do 2º ano, 2018); “ele não se adaptava ao nível da escola. [...] Ele não queria acompanhar a turma. Não tinha todo amparo, o suporte, não tinha internet na escola, era bem menos o recurso que tinha” (professora do 4º ano, 2018); “eu não tinha o tempo de atender ele [...]. Não poderia ir só pra área que ele tinha interesse” (professora do 5º ano, 2018).

Ao identificarem a limitação de informações e ideias distorcidas dos docentes a respeito da identificação e do trabalho com os alunos que possuem AH/S, Martins e Alencar (2011MARTINS, A. C. S.; ALENCAR, E. S. Características desejáveis em professores de alunos com altas habilidades/superdotação. Revista de Educação Especial, Santa Maria, v. 24, n. 39, p. 31-46, jan./abr. 2011. https://doi.org/10.5902/1984686X1881
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) enfatizam a necessidade e urgência de políticas públicas educacionais que proponham a formação de educadores para atuarem nessa área. Esses autores denunciam que “há grandes desafios a serem superados para que o atendimento especial a alunos com AH/S aconteça de forma expressiva no país, a começar pela formação do professor, a base de todo o processo” (Martins e Alencar, 2011MARTINS, A. C. S.; ALENCAR, E. S. Características desejáveis em professores de alunos com altas habilidades/superdotação. Revista de Educação Especial, Santa Maria, v. 24, n. 39, p. 31-46, jan./abr. 2011. https://doi.org/10.5902/1984686X1881
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, p. 43). Os estudos de Fleith (2007FLEITH, D. S. (org.). A construção de práticas educacionais para alunos com altas habilidades/superdotação. Brasília: Ministério da Educação , Secretaria de Educação Especial, 2007. v. 3., p. 55) destacam a importância da figura da mãe na educação dos filhos com AH/S:

É a família, particularmente a mãe, quem está conseguindo romper barreiras de maior isolamento que a sociedade tenta impor a estas crianças e adolescentes. É a mãe, interessada no desenvolvimento de seus filhos e filhas, quem recebe o diagnóstico. Quando a avaliação e orientação são bem feitas, começam as rotinas de psicólogos, fonoaudiólogos e terapeutas ocupacionais, a fim de desenvolver habilidades básicas ao ser humano como a expressão do sentimento e o autoconhecimento, a fala e a utilização do corpo de maneira adequada. (Fleith, 2007FLEITH, D. S. (org.). A construção de práticas educacionais para alunos com altas habilidades/superdotação. Brasília: Ministério da Educação , Secretaria de Educação Especial, 2007. v. 3., p. 55, grifo nosso)

No caso de P, a especificidade de sua mãe, ou seja, o fato de ela ser surda, de alguma forma, eleva ainda mais o grau de dificuldade de alguns encaminhamentos (psicológicos, fonoaudiológicos etc.). Isso não está pautado na surdez, mas nas barreiras comunicativas impostas pela própria sociedade. Assim, a mãe de P, diferentemente de mães ouvintes - que podem reivindicar e cobrar mais da escola, porque falam por meio da mesma língua -, ficava apenas com informações fragmentadas, que não lhe possibilitavam uma visão mais ampla dos problemas escolares enfrentados por P. De acordo com Fleith (2007FLEITH, D. S. (org.). A construção de práticas educacionais para alunos com altas habilidades/superdotação. Brasília: Ministério da Educação , Secretaria de Educação Especial, 2007. v. 3., p. 55), “pela cultura de exclusão, historicamente praticada, a escola transformou-se na principal barreira encontrada pela família para o desenvolvimento das AH/S dos seus filhos”. Se as famílias em que todos são ouvintes deparam com barreiras para discutir os direcionamentos/encaminhamentos de seus filhos com AH/S, que dirá a família em que há uma mãe surda, que depara, com frequência, com barreiras muito mais fortalecidas pelas diferenças linguísticas e pela falta de profissionais para mediar sua comunicação com a escola.

Nesse sentido, esses desafios encontrados pelos professores e pesquisadores, no que tange aos alunos que apresentam condições peculiares de aprendizagem, devem servir para a proposição de didáticas, estratégias e políticas, com o fim de oferecer a eles uma educação de qualidade, a qual lhes é de direito.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio deste artigo, objetivamos apresentar dados relativos a um estudo longitudinal que investigou o percurso de aprendizagem de P, tendo em vista o seu entorno familiar multilinguístico e suas altas habilidades. Os resultados indicam que P vivencia uma cultura familiar distinta daquela das crianças que têm pais ouvintes, e o fato de ele se comunicar por meio de duas línguas - PL e PS - o torna um sujeito bilíngue. Entretanto, viver entre ambas as culturas - surda e ouvinte - pode gerar dificuldades psicossociais também no ambiente escolar, uma vez que algumas escolas desconhecem as implicações que a LS pode trazer ao desenvolvimento escolar desses alunos.

É possível afirmar que tanto PL quanto PS são as línguas maternas de P e ainda:

  • as dificuldades de aprendizagem de P, nos anos iniciais, não foram relacionadas às AH/S, pelo fato de os professores não as identificarem;

  • seu modo peculiar de escrever não foi associado ao seu contexto multilinguístico nem/ou às AH/S, mas tomado como erro, uma vez que os professores desconheciam as línguas que envolviam esse sujeito;

  • a ênfase dos docentes estava mais inclinada às dificuldades e menos às habilidades desse aluno. Isso fez com que as dificuldades se acentuassem cada vez mais, levando o educando a desenvolver repúdio pela escola e total desinteresse pelos estudos.

No que tange aos problemas enfrentados por P, em seu processo de aquisição da escrita, nossos dados apontam para duas vertentes. A primeira relaciona-se ao fato de P ser bilíngue, ou seja, usar LS e LP para se comunicar. Com isso, ele internalizou, natural e simultaneamente, as duas estruturas linguísticas (LS+LP), e, portanto, sua escrita mostrou o conflito com ambos os padrões linguísticos. Os elementos fonológicos, morfológicos e estruturais das duas línguas implicaram alguns desafios no desenvolvimento da escrita de P. Cabe ainda ressaltar que as línguas alemã e ucraniana, presentes no contexto familiar de P, também influenciaram na pronúncia de alguns fonemas, como o /R/, por exemplo. Por isso, ele utilizava a estratégia de fuga, ou seja, evitava escrever. A segunda vertente diz respeito às AH/S de P, que, conforme vimos, podem gerar dificuldade no desenvolvimento perceptomotor, na caligrafia e, consequentemente, no processo da escrita.

Nesse contexto, a escola precisa estar atenta aos indícios de qualquer tipo de intolerância, com certas atividades, ou baixo rendimento escolar, relacionados aos alunos ouvintes, filhos de pessoas surdas, para que, dessa forma, possa tomar as iniciativas coerentes e de acordo com cada caso, a fim de ofertar igualdade de oportunidades e possibilidades para todos, conforme determinam as leis e diretrizes educacionais brasileiras que dizem respeito à inclusão.

Concernente ao estudo que ora apresentamos, faz-se necessário que sejam incorporadas às novas propostas pedagógicas dos cursos de formação de professores, assim como já determinado pela Resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE) nº 02/2015 (Brasil, 2015BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Resolução nº 2, de 1º julho de 2015. Conselho Pleno, 2015. Disponível em: Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=136731-rcp002-15-1&category_slug=dezembro-2019-pdf&Itemid=30192 . Acesso em: 22 maio 2018.
http://portal.mec.gov.br/index.php?optio...
), disciplinas direcionadas à educação especial e inclusiva, bem como se discutam com os futuros docentes, de maneira mais aprofundada, procedimentos para identificar, encaminhar e desenvolver estratégias que estimulem as habilidades dos discentes, para que eles não desenvolvam repúdio pela escola, ao precisar camuflar seu potencial e enfrentar desafios, conforme ocorreu na trajetória escolar de P.

Diante desses resultados, queremos frisar a importância e a urgência de refletir sobre políticas públicas de educação que (re)pensem a inclusão escolar dos filhos ouvintes de pais surdos. Constantemente, ouvem-se com indignação relatos referentes aos traumas e sofrimentos causados aos surdos, por mais de um século, ao se tentar empregar a metodologia oralista - que vislumbrava o desenvolvimento da fala do surdo, desconsiderando que o ensino e a aprendizagem desse aluno só poderiam ocorrer por meio de sua própria língua, a LS. Na atualidade, corre-se o risco de cair na mesma falha, agora relacionada com a educação dos filhos dos surdos. Nesse sentido, faz-se necessário atentar-se para as singularidades linguísticas e culturais dessas crianças, filhas de pais surdos, as quais precisam ser levadas em conta no ambiente escolar a fim de que seu desenvolvimento psicossocial não seja afetado.

Assim, mostra-se fundamental que a escolaridade dos filhos ouvintes de pais surdos seja discutida na disciplina de Libras, que faz parte dos currículos dos cursos de formação de professores, para que, ao depararem com esses alunos, os futuros docentes consigam articular teorias e práticas no que se refere à alfabetização desses sujeitos. Associado a isso, a escola precisa gerenciar meios de os pais surdos poderem emitir opiniões, argumentar e participar ativamente da escolaridade de seus filhos, de modo que tenham completo acesso à escola. Aparar essas arestas torna-se essencial para minimizar as barreiras entre a comunidade escolar e os pais em condições especiais. É na aproximação entre as partes que se oferecem condições de os docentes (re)conhecerem as singularidades linguísticas e culturais que permeiam a vida de seus alunos, sejam eles ouvintes, sejam não. Em contrapartida, oferece-se também oportunidade de os pais (re)conhecerem os desafios enfrentados, tanto pelos docentes quanto pelos seus filhos, podendo, dessa forma, contribuir de maneira mais direta e efetiva na educação de seus filhos.

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  • 1
    Com respaldo em Capovilla et al. (2017CAPOVILLA, F. C. et al. Dicionário da língua de sinais do Brasil: a Libras em suas mãos. São Paulo: Edusp, 2017. v. 1.), optamos por utilizar a nomenclatura “língua de sinais brasileira” em vez de “língua brasileira de sinais” (Brasil, 2002BRASIL. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Brasília, 24 abr. 2002. Disponível em: Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10436.htm . Acesso em: 16 out. 2020.
    http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/lei...
    ). Na compreensão desses pesquisadores e na nossa também, não existe uma língua brasileira de sinais. Em outros países que têm a língua de sinais oficializada, usa-se língua de sinais como uma base linguística única, como se as três palavras (língua de sinais) formassem uma só unidade vocabular e se acrescenta a adjetivação pátria ao final.
  • 2
    Os vídeos foram necessários para gravar as entrevistas com a mãe, visto que a comunicação com ela ocorreu por meio da língua de sinais. A primeira autora deste artigo é tradutora/intérprete de língua de sinais.
  • 3
    Usaremos a sigla I1 para nos referirmos à escola dos anos iniciais e I2 para a escola dos anos finais. Ambas as instituições são da rede pública de ensino e estão localizadas na mesma cidade do interior do estado do Paraná.
  • 4
    Tendo em vista o atendimento aos protocolos éticos, não divulgamos as imagens de P sinalizando em Libras.
  • 5
    Nas entrevistas, os docentes mencionaram que P fora encaminhado à psicóloga, mas nenhum deles sabia dizer o que continha nos relatórios.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Dez 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    26 Jun 2019
  • Aceito
    20 Maio 2020
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