Acessibilidade / Reportar erro

A construção da identidade profissional de professores de língua portuguesa em formação inicial

Construcción de la identidad profesional de profesores de lengua portuguesa en formación inicial

RESUMO

Apresentam-se neste trabalho resultados de pesquisa desenvolvida com o objetivo de compreender, em suas bases identitárias e cognitivas, as concepções construídas por professores em formação inicial do que é ser docente e do que é ensinar e aprender língua portuguesa em condições de trabalho caracterizadas pela diversidade social e cultural e pela adversidade econômica. Observa-se como dois licenciandos em letras, participantes de um programa nacional de formação docente, recorrem a representações de escola e de docência para construir referências que fundamentem suas experiências formativas como professores e as projeções que constroem para seu trabalho pedagógico e sua identidade profissional. Constituem dados de análise os processos de referenciação produzidos pelos participantes com base no contraste entre suas experiências e expectativas prévias com aquelas vivenciadas nas escolas, nos diferentes momentos capturados pelos instrumentos metodológicos utilizados na pesquisa.

PALAVRAS-CHAVE:
formação de professores; identidade docente; ensino de língua

RESUMEN

Este artículo presenta resultados de investigación cuyo fin es entender, desde la perspectiva de su identidad y bases cognitivas, las concepciones construidas por los profesores en la formación inicial sobre lo que significa ser docente y enseñar y aprender portugués en condiciones de trabajo caracterizadas por la diversidad social y cultural, y por la adversidad económica. Se observa cómo dos licenciandos en letras, participantes en un programa nacional de formación docente, recurren a representaciones de la escuela y de la docencia para construir referencias que fundamenten sus experiencias formativas como docentes y las proyecciones que construyen para su trabajo pedagógico y su identidad profesional. Los datos de referencia son los procesos de referencia producidos por los participantes basados en el contraste entre sus experiencias y expectativas previas con las vivenciadas en las escuelas, en los diferentes momentos capturados por los instrumentos metodológicos utilizados en la investigación.

PALABRAS CLAVES:
formación docente; identidad docente; enseñanza de lenguas

ABSTRACT

This paper presents the results of a research project developed with the objective of understanding, from a teacher identity and cognition perspective, the concepts constructed by pre-service teachers of what it means to be a teacher and teach and learn portuguese in working conditions characterized by social and cultural diversity, as well as economic adversity. The study reveals how two undergraduate students in Letras (a teaching degree which entitles its holders to teach disciplines both in middle and high school) participating in a national teacher education program resorted to representations of the school and teaching in order to build references that constituted the foundations of both their formative experiences as teachers and the mental projections they constructed of their pedagogical work and professional identity. The data analysis focused on the referral processes produced by the participants based on the contrast between their previous and current experiences and expectations, captured by the methodological tools used in the research.

KEYWORDS:
teacher education; teacher identity; language teaching

INTRODUÇÃO

Apresentam-se, neste trabalho, resultados de pesquisa realizada com o objetivo de conhecer que efeitos a participação em contextos escolares caracterizados pela diversidade social, cultural e linguística produz nos processos de formação de professores e de construção da identidade docente.1 1 A pesquisa Conceptualisations of pedagogical contexts and development of appropriate pedagogies: a multiple-case study of pre-service language teachers working in peripheral urban state schools in São Paulo foi desenvolvida em colaboração entre docentes do Departamento de Educação da Universidade de Bath (Reino Unido) e da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP). Os sujeitos da pesquisa, dois licenciandos em letras de uma universidade pública estadual paulista, participantes de um programa nacional de formação docente,2 2 Os sujeitos da pesquisa, no momento da produção dos dados, ingressavam no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), da Universidade de São Paulo (PIBID - CAPES/USP). O PIBID é um programa nacional financiado pela Capes que concede bolsas a licenciandos e a professores formadores na universidade e na escola básica para o desenvolvimento de projetos para a formação inicial de professores. desenvolveram suas atividades formativas em escolas públicas localizadas em territórios distantes dos centros políticos, econômicos ou culturais da cidade, com resultados insatisfatórios nos índices de avaliação oficial de suas condições institucionais e de seus resultados pedagógicos. Seus alunos são provenientes de camadas mais pobres da população e compõem a diversidade cultural (nela incluída a diversidade linguística) prevalecente nas escolas públicas dos grandes centros urbanos do país. Analisaram-se as representações construídas por esses professores em formação inicial durante a realização de suas atividades no contexto escolar, observando-se o contraste entre suas experiências e expectativas prévias e aquelas vivenciadas nas escolas.

No Brasil, as discussões sobre identidade docente e discente tornaram-se fundamentais para a produção acadêmica sobre ensino de língua portuguesa principalmente a partir da década de 1980, quando, com a expansão do sistema público de ensino e a oferta de educação básica obrigatória de oito anos a todas as crianças em idade escolar, camadas da população não letradas e não escolarizadas passaram a frequentar os bancos escolares (Castilho, 1988aCASTILHO, A. T. Os sons. In: SÃO PAULO. Secretaria da Educação. Subsídios à Proposta Curricular de Língua Portuguesa para o 1º e 2º graus - coletânea de textos. São Paulo: CENP, 1988a. v. 1. p. 43-51., 1988bCASTILHO, A. T. Variação linguística, norma culta e ensino da língua materna. In: SÃO PAULO. Secretaria da Educação. Subsídios à Proposta Curricular de Língua Portuguesa para o 1º e 2º graus - coletânea de textos. São Paulo: CENP , 1988b. v. 1. p. 53-59., 2012CASTILHO, A. T. Variação dialetal e ensino institucionalizado da língua portuguesa. Cadernos de Estudos Linguísticos, Campinas, n. 1, p. 13-20, 2012. https://doi.org/10.20396/cel.v1i0.8636617
https://doi.org/10.20396/cel.v1i0.863661...
; Franchi, 1991FRANCHI, E. P. Pedagogia da alfabetização: da oralidade à escrita. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1991.; Geraldi, 1984GERALDI, J. W. (Org.). O texto na sala de aula: leitura e produção. Cascavel: Assoeste, 1984., 1991GERALDI, J. W. Portos de passagem. São Paulo: Martins Fontes, 1991.; Geraldi, Silva e Fiad, 1996GERALDI, J. W.; SILVA, L. L. M.; FIAD, R. S. Linguística, ensino de língua materna e formação de professores. D.E.L.T.A., São Paulo, v. 12, n. 2, p. 307-326, 1996.; Marinho, 2001MARINHO, M. A oficialização de novas concepções para o ensino de português. 2001. Tese (Doutorado) - Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2001.; Soares, 1984SOARES, M. Linguagem e escola: uma perspectiva social. São Paulo: Ática, 1984.).

A formação docente passou a ser questionada em pesquisas voltadas a compreender as condições que levariam a escola a não atingir seus objetivos por causa da prevalência de tradição pedagógica de caráter normativo/prescritivista (Bagno e Rangel, 2005BAGNO, M.; RANGEL, E. O. Tarefas da educação linguística no Brasil. Revista Brasileira de Linguística Aplicada, Belo Horizonte, v. 5, n. 1, p. 63-81, 2005. http://dx.doi.org/10.1590/S1984-63982005000100004
http://dx.doi.org/10.1590/S1984-63982005...
; Fregonezi, 1999FREGONEZI, D. E. Aconteceu a virada no ensino de língua portuguesa? Revista do GELNE, Natal, ano 1, n. 2, p. 82-85, 1999.). O trabalho docente tornou-se objeto de análises, discussões e proposições com o objetivo de se conhecer as causas de suas dificuldades e de se proporem concepções favorecedoras da constituição de práticas de ensino de caráter inovador ou transformador (Aparício, 1999APARÍCIO, A. S. M. A renovação do ensino de gramática no primeiro grau no estado de São Paulo. 1999. Dissertação (Mestrado em Linguística Aplicada) - Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1999.; Silva, Pilati e Dias, 2010SILVA, K.; PILATI, E.; DIAS, J. O ensino de gramática na contemporaneidade: delimitando e atravessando as fronteiras na formação inicial de professores de língua portuguesa. Revista Brasileira de Linguística Aplicada, Belo Horizonte, v. 10, n. 4, p. 981, 2010. http://dx.doi.org/10.1590/S1984-63982010000400008
http://dx.doi.org/10.1590/S1984-63982010...
; Signorini, 2007SIGNORINI, I. Significados da inovação no ensino de língua portuguesa e na formação de professores. 1. ed. Campinas: Mercado de Letras, 2007.).

As proposições acadêmicas e pedagógicas para o ensino de língua portuguesa e a formação de professores voltaram-se desde então para questões de identidade docente em sua relação com a tematização da função social e política da educação linguística numa sociedade economicamente desigual como a brasileira. Esses estudos têm observado o desenvolvimento de práticas mais autorais ou mais agentivas dos professores como recursos para se alterarem as condições do ensino de português na escola e os modos como os professores de língua portuguesa se constituem profissionalmente nessas condições (Benevides, 2006BENEVIDES, A. S. A formação de professores do curso de letras: aspectos para uma prática reflexiva. Revista Letra Magna, [S.l.], n. 5, p. 1-19, 2006.; Oliveira, 2006OLIVEIRA, M. B. F. Revisitando a formação de professores de língua materna: teoria, prática e construção de identidades. Linguagem em (Dis)curso, Tubarão, v. 6, n. 1, jan./abr. 2006.). Defende-se a necessidade de considerar a voz dos professores em formação no tocante ao que esta produz a respeito dessa mesma formação (Andrade, 2003ANDRADE, L. T. A escrita dos professores: textos em formação, professores em formação, formação em formação. Educação & Sociedade, Campinas, v. 24, n. 85, p. 1.297-1.315, dez. 2003. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302003000400010
http://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302003...
). A construção identitária do professor de língua portuguesa, realizada com objetivos de transformação social, poderia então confrontar a imagem negativa que é socialmente construída desse profissional (Kleiman, 2006KLEIMAN, A. C. B. Professores e agentes de letramento: identidade e posicionamento social. Revista Filologia e Linguística Portuguesa, Campinas, n. 8, p. 409-424, 2006. https://doi.org/10.11606/issn.2176-9419.v0i8p409-424
https://doi.org/10.11606/issn.2176-9419....
, 2009KLEIMAN, A. C. B. Projetos dentro de projetos: ensino-aprendizagem da escrita na formação de professores de nível universitário e de outros agentes de letramento. Revista Scripta, Belo Horizonte: PUC/MG, v. 13, n. 24, p. 17-30, 2009.). O professor posicionar-se-ia como um etnógrafo (Heath, 1983HEATH, S. B. Ways With Words. Cambridge: Cambridge University Press, 1983.) para conhecer seus alunos e saber quais suas necessidades de aprendizagem em função da cultura de seu grupo social (Kleiman, 2007KLEIMAN, A. C. B. Letramento e suas implicações para o ensino de língua materna. Signo, Santa Cruz do Sul, v. 32, n. 53, p. 1-25, dez. 2007. http://dx.doi.org/10.17058/signo.v32i53.242
http://dx.doi.org/10.17058/signo.v32i53....
).

Num sentido semelhante ao proposto pelos estudos anteriormente mencionados, o processo de formação docente aqui verificado se fundamenta na reflexividade dos professores em formação acerca de seu percurso formativo realizado num processo caracterizado pela autoria e pela agentividade, pela autonomia e pela criticidade.

PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

O presente trabalho fundamenta-se em conhecimentos produzidos no campo da formação de professores, principalmente em estudos voltados à compreensão dos modos de produção de conhecimentos por professores de língua em função das características dos contextos em que desenvolvem sua formação profissional. Parte-se do caráter social, cultural e historicamente situado do trabalho de formação docente, em que o saber, o fazer e o sentir se constroem em processos interativos e em resposta às demandas apresentadas por dado contexto e suas especificidades (Breen et al., 2001BREEN, M. P.; HIRD, B.; MILTON, M.; OLIVER, R.; THWAITE, A. Making sense of language teaching: teachers’ principles and classroom practices. Applied Linguistics, United Kingdom, n. 22, p. 470-501, 2001. http://dx.doi.org/10.1093/applin/22.4.470
http://dx.doi.org/10.1093/applin/22.4.47...
; Feryok, 2012FERYOK, A. Activity theory and language teacher agency. Modern Language Journal, Medford, MA, v. 96, p. 95-107, 2012. https://doi.org/10.1111/j.1540-4781.2012.01279.x
https://doi.org/10.1111/j.1540-4781.2012...
; Golombek e Doran, 2014GOLOMBEK, P. R.; DORAN, M. Unifying cognition, emotion, and activity in language teacher professional development. Teaching and Teacher Education, [S.l.], v. 39, p. 102-111, 2014. https://doi.org/10.1016/j.tate.2014.01.002
https://doi.org/10.1016/j.tate.2014.01.0...
; Golombek e Johnson, 2004GOLOMBEK, P. R.; JOHNSON, K. E. Narrative inquiry as a mediational space: Exploring emotional and cognitive dissonance in second language teachers’ development. Teachers and Teaching, [S.l.], v. 10, n. 3, p. 307-328, 2004. https://doi.org/10.1080/1354060042000204388
https://doi.org/10.1080/1354060042000204...
; Johnson e Golombek, 2011JOHNSON, K. E.; GOLOMBEK, P. R. (Eds.). Research on second language teacher education: a sociocultural perspective on professional development. New York: Routledge, 2011.; Tsui, 2007TSUI, A. B. M. Complexities of identity formation: a narrative inquiry of an EFL teacher. TESOL Quarterly, United States, n. 41, p. 657-680, 2007. https://doi.org/10.1002/j.1545-7249.2007.tb00098.x
https://doi.org/10.1002/j.1545-7249.2007...
, 2003TSUI, A. B. M. Understanding expertise in teaching: case studies of second language teachers. Cambridge: Cambridge University Press , 2003.). Afasta-se, assim, de concepções de formação docente baseadas em perspectivas metodologizantes ou aplicacionistas (Tardif, 2002TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.).

Em outro sentido, considera-se que o processo formativo se desenvolve em meio à complexidade dos contextos de atuação profissional, com a participação dos sujeitos em formação em contextos de múltiplos e diversos posicionamentos identitários. Entende-se, portanto, que o processo formativo não se organiza segundo princípios de causalidade ou de linearidade, mas como um sistema de relações não hierárquicas, não previsíveis ou predetermináveis (Burns, Freeman e Edwards, 2015BURNS, A.; FREEMAN, D.; EDWARDS, E. Theorizing and studying the language-teaching mind: mapping research on language teacher cognition. The Modern Language Journal, Medford, MA, v. 99, n. 3, p. 585-601, 2015. https://doi.org/10.1111/modl.12245
https://doi.org/10.1111/modl.12245...
).

Segundo essa perspectiva, a formação docente é concebida como um processo sociocultural, e não individual. Na direção do que sugerem Lee e Schallertb (2016LEE, S.; SCHALLERT, D. Becoming a teacher: coordinating past, present, and future selves with perspectival understandings about teaching. Teaching and Teacher Education, [S.l.], v. 56, p. 72-83, 2016.), a formação docente é considerada no presente estudo com base nos posicionamentos críticos que os sujeitos estabelecem para com os contextos em que se desenvolvem profissionalmente, sendo, portanto, sensíveis à diversidade social e à heterogeneidade linguística que caracterizam esses contextos. Pressupõe-se que a docência se constitui como prática social, cultural, moral e política (Crookes, 2015CROOKES, G. V. Redrawing the boundaries on theory, research, and practice concerning language teachers’ philosophies and language teacher cognition: toward a critical perspective. The Modern Language Journal, Medford, MA, v. 99, n. 3, p. 485-499, 2015. https://doi.org/10.1111/modl.12237
https://doi.org/10.1111/modl.12237...
) e que a formação docente de base crítica e sensível aos valores democráticos requer a vivência escolar, a experiência de vida e o desenvolvimento de valores pessoais eticamente responsáveis. Mostra-se insuficiente a formação técnica e metodológica reduzida a valores instrumentais, uma vez que a consciência crítica pode se desenvolver plenamente apenas se os sujeitos participam dos contextos, da vida em comunidade e do trabalho colaborativo (Freire, 1973FREIRE, P. Pedagogy of the oppressed. New York: Continuum, 1973.).

Quando se afirma que a formação de professores críticos se orienta pelo princípio de que a ação docente é uma ação de base moral e ética, primeiramente, parte-se do princípio de que o trabalho docente faz do professor um intelectual transformador (Kumaravadivelu, 2012KUMARAVADIVELU, B. Language teacher education for a global society - a modular model for knowing, analysing, recognizing, doing, and seeing. New York: Routledge; Taylor & Francis, 2012.), que pensa sobre sua prática em resposta a necessidades de mudança nos contextos e nos sujeitos que constroem esse contexto colaborativamente, em lugar de um técnico que passivamente aplica métodos, ou de um profissional que não teoriza, mas apenas pratica e reflete sobre sua prática. Consideradas as implicações sociais e didáticas do encontro pedagógico, afirmam Kubanyiova e Crookes (2016KUBANYIOVA, M.; CROOKES, G. Re-envisioning the roles, tasks, and contributions of language teachers in the multilingual era of language education research and practice. The Modern Language Journal, Medford, MA, v. 100, supplement 2016, p. 117-132, 2016., p. 126) a necessidade de evidenciar aos professores de língua em formação as bases morais de sua atuação como agentes que deverão enfrentar realidades políticas, econômicas e sociais para garantir que seus alunos desenvolvam suas possibilidades linguísticas.

O fortalecimento dos princípios políticos, morais e éticos subjacentes à formação de professores socialmente comprometidos procuraria responder aos cinco domínios de conhecimento sugeridos por Goodwin (2010GOODWIN, A. L. Globalization and the preparation of quality teachers: rethinking knowledege domains for teaching. Teaching Education, United Kingdom, v. 21, n. 1, p. 19-32, 2010. http://dx.doi.org/10.1080/10476210903466901
http://dx.doi.org/10.1080/10476210903466...
): o conhecimento pessoal, enraizado na biografia do sujeito e articulador de sua própria filosofia de ensino; o conhecimento contextual, que envolve a compreensão do que são a escola e a sociedade e de quem são as crianças e jovens da comunidade; o conhecimento pedagógico, envolvendo noções de conteúdo e currículo, bem como teorias e métodos de ensino; o conhecimento sociológico acerca da diversidade e da relevância cultural da educação, além das diferentes concepções de justiça social; e, finalmente, o conhecimento social, que fundamenta a instauração de processos democráticos e cooperativos em sala de aula, tanto para a construção de conhecimentos quanto para a resolução de conflitos (Goodwin, 2010GOODWIN, A. L. Globalization and the preparation of quality teachers: rethinking knowledege domains for teaching. Teaching Education, United Kingdom, v. 21, n. 1, p. 19-32, 2010. http://dx.doi.org/10.1080/10476210903466901
http://dx.doi.org/10.1080/10476210903466...
, p. 22).

Os dados analisados no presente trabalho foram produzidos observando-se a relevância desses domínios para a formação crítica dos professores de línguas. Nesse sentido, os sujeitos da pesquisa, professores de língua portuguesa em formação inicial, foram participantes de um programa de formação docente em que os princípios referidos podem ser verificados. Nesse programa, as proposições sobre o ensino de língua portuguesa e a formação docente orientaram-se pela defesa das possibilidades democráticas, de participação e de luta por transformações sociais, em direção à construção de uma sociedade mais justa, menos desigual economicamente e mais sensível à diversidade cultural e à heterogeneidade. Os sujeitos da pesquisa desenvolveram suas atividades formativas em escolas situadas na periferia econômica da cidade de São Paulo e, nesses contextos, puseram em movimento, no processo de constituição de suas identidades profissionais, memórias com as quais se reconectaram para construir concepções de escola, de docência, de ensino e de aprendizagem.

O referencial teórico para a análise dos dados no presente estudo se fundamenta na perspectiva de que os objetos de conhecimento não são dados a priori, como referentes estáticos, mas são construídos em situações de interação, em processos de referenciação resultantes de nossa interação sociocognitiva com o mundo físico, social e cultural. Nesse sentido, “as entidades designadas são vistas como objetos-de-discurso e não como objetos-do-mundo” (Koch, 2002KOCH, I. G. V. A referenciação. In: KOCH, I. G. V. Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Cortez , 2002. p. 77-81., p. 79).

Confronta-se, assim, “a hipótese de um poder referencial da linguagem que é fundado ou legitimado por uma ligação direta (e verdadeira) entre as palavras e as coisas”, mas propõe-se que, “no lugar de pressupor uma estabilidade a priori das entidades no mundo e na língua, é possível reconsiderar a questão partindo da instabilidade constitutiva das categorias por sua vez cognitivas e linguísticas, assim como de seus processos de estabilização” (Mondada, 2002MONDADA, L. Construction des objets de discours et categorization: une approche des processus de référenciation. Tradução Mônica Magalhães Cavalcante. Revista de Letras, Fortaleza, n. 24, v. 1/2, p. 119-128, 2002., p. 118-119).

Os sujeitos, em suas ações de compreensão dos processos em que estão envolvidos e dos contextos em que cooperam, não apenas reativam referências prévias, mas constroem novos referentes (Marcuschi, 2001MARCUSCHI, L. A. Anáfora indireta: o barco textual e suas âncoras. Revista Letras, v. 56, dez. 2001. http://dx.doi.org/10.5380/rel.v56i0.18415
http://dx.doi.org/10.5380/rel.v56i0.1841...
). A construção dos objetos de discurso é assim resultante de processos colaborativos, discursivamente realizados na interação entre sujeitos em suas práticas simbólicas em contexto (Mondada, 2002MONDADA, L. Construction des objets de discours et categorization: une approche des processus de référenciation. Tradução Mônica Magalhães Cavalcante. Revista de Letras, Fortaleza, n. 24, v. 1/2, p. 119-128, 2002., p. 121). Essas construções não são caóticas ou desordenadas, mas sim estruturadas pela memória, e “operam a um nível psicológico, discursivo, linguístico, advindas de competências sociais, de pontos de vista, de atividades situadas e de práticas intersubjetivas e não de propriedades incertas do mundo” (Mondada, 2002MONDADA, L. Construction des objets de discours et categorization: une approche des processus de référenciation. Tradução Mônica Magalhães Cavalcante. Revista de Letras, Fortaleza, n. 24, v. 1/2, p. 119-128, 2002., p. 125-126).

No trabalho de coleta dos dados, buscou-se possibilitar que os sujeitos da pesquisa produzissem sentidos sobre suas vivências nas escolas, em suas atividades de formação docente, de forma situada, em resposta às interações com os sujeitos que constituem o contexto escolar. Desse modo, a referência ao contexto não é um construto existente a priori, mas uma construção situada, em que “uma pluralidade de atores situados que discretizam a língua e o mundo e dão sentido a eles, constituindo individualmente e socialmente as entidades” (Mondada, 2002MONDADA, L. Construction des objets de discours et categorization: une approche des processus de référenciation. Tradução Mônica Magalhães Cavalcante. Revista de Letras, Fortaleza, n. 24, v. 1/2, p. 119-128, 2002., p. 119).

As negociações de sentido realizadas pelos sujeitos da pesquisa evidenciam, assim, o processo de construção de categorias de compreensão do contexto em que desenvolvem suas ações formativas, o que permite caracterizar o trabalho de formação docente como um espaço de instabilidade, de recategorizações, característica que se contrapõe a concepções de ensino e de aprendizagem de caráter estático ou preestabelecido, como um conjunto de práticas de ensino definido por princípios metodológicos. Num sentido diverso, vê-se o contexto de formação docente como resultante de relações intersubjetivas em que se produzem efeitos de objetividade (Mondada, 2002MONDADA, L. Construction des objets de discours et categorization: une approche des processus de référenciation. Tradução Mônica Magalhães Cavalcante. Revista de Letras, Fortaleza, n. 24, v. 1/2, p. 119-128, 2002., p. 119).

Nesse sentido, nos dados em análise no presente estudo, observa-se como os sujeitos participantes buscaram memórias de suas experiências escolares, de ensino e aprendizagem, como fundamentos para a elaboração de suas concepções sobre formação docente e de suas projeções como futuros professores em efetivo exercício.

FUNDAMENTAÇÃO METODOLÓGICA E PRODUÇÃO DO CORPUS DE ANÁLISE

O estudo, de caráter exploratório-interpretativo, realizou-se sob a forma de um trabalho multissituado, composto de casos múltiplos, dos processos de formação docente em um programa institucional concretizado numa universidade pública paulista. Foram feitos quatro estudos de caso de professores de língua portuguesa em formação inicial, que desenvolveram suas atividades formativas em três escolas públicas estaduais na cidade de São Paulo.

O estudo fundamentou-se em uma abordagem multimodal para a coleta de dados, incluindo três métodos principais, todos eles baseados em entrevistas com os participantes da pesquisa. O primeiro método, denominado de árvore da vida (ADV), ou TOL, em sua sigla para tree of life (Merryfield, 1993MERRYFIELD, M. M. Reflective practice in global education: strategies for teacher educators. Theory into Practice, United Kingdom, v. 32, n. 1, p. 27-32, 1993.), tem caráter autobiográfico. Antes da entrevista, os participantes foram convidados a desenhar uma árvore destacando três de suas partes: as raízes, em que deveriam nomear as pessoas, os eventos e as ideias que contribuíram para suas decisões de se tornarem professores; o tronco, no qual deveriam ser identificados suas habilidades, interesses, relações interpessoais e eventos que apoiaram suas decisões para a escolha profissional; e, finalmente, os ramos, indicando expectativas e perspectivas que poderiam antecipar os modos de desenvolvimento de suas carreiras docentes. Esse primeiro conjunto de dados foi coletado antes de os participantes iniciarem suas atividades de formação nas escolas.

O segundo método consistiu em uma entrevista referenciada em registros fotográficos (ERRF, ou PDI - photo driven interview) feitos do contexto escolar pelos participantes, nas primeiras duas semanas após começarem suas atividades nas escolas. Eles foram convidados a fotografar pessoas, lugares ou situações que chamassem sua atenção. Então, usando as fotos como uma ferramenta de recuperação da memória, foram convidados a explicar por que fizeram cada registro fotográfico e o que pretendiam comunicar sobre o contexto observado por meio desses registros. A natureza interpretativa das fotografias permitiu aos pesquisadores observar o contexto pelos olhos dos participantes e foi muito útil para a compreensão de como cada um deles associava aspectos simbólicos e materiais em seus processos de (re)construção do contexto.

O terceiro método, denominado de retomada da experiência docente (RED, ou TER - teaching experience recollection), envolveu entrevistas retrospectivas que ocorreram de três a quatro meses após as atividades de formação docente dos participantes terem se iniciado. No decorrer desses meses, eles foram para as escolas pelo menos uma vez por semana para observar o trabalho dos professores que os supervisionavam, para conhecer o contexto em que realizavam suas atividades e para implementar os planos de ensino por eles desenvolvidos - individualmente ou com um colega parceiro - nas reuniões do programa de formação docente na universidade. Nesses planos de ensino, todos os participantes do programa, incluindo os sujeitos da pesquisa, foram convidados a propor atividades fundamentadas em práticas pedagógicas que considerassem importantes e necessárias e que estivessem fazendo falta ao contexto escolar em que atuavam. Para as entrevistas de pesquisa, os participantes foram convidados a compartilhar seus planos de aula e registros em diários de campo, bem como a explicar suas intenções e as práticas executadas, em um movimento de teorização da própria prática.

Cada entrevista durou entre 30 e 50 minutos. No conjunto, esses três métodos produziram uma quantidade substancial de dados, conforme ilustrado no Quadro 1:3 3 Os participantes tiveram suas identidades resguardadas em cumprimento ao código de ética das universidades em que se desenvolveu o projeto de pesquisa. Os pseudônimos utilizados são Carmen, Edna, Gisele e Rafael.

Quadro 1 -
Número de palavras transcritas, por participante, para cada ferramenta de coleta de dados utilizada.

Uma vez transcritos e categorizados, examinaram-se tais informações para localizar temas subjacentes aos enunciados de cada um dos participantes da pesquisa. Esses temas foram então reexaminados buscando-se aproximações que resultaram em nove categorias:

  1. acesso a recursos pedagógicos;

  2. ambiente escolar (físico e psicológico);

  3. uso de instalações escolares;

  4. relações de poder;

  5. cultura e práticas educativas;

  6. relações professor-aluno;

  7. ambiente de aprendizagem;

  8. cultura e práticas de ensino-aprendizagem;

  9. vir-a-ser professor e professora.

Como procedimento final, um exame mais aprofundado das categorias levou à identificação de duas grandes unidades de análise: observações críticas, definidas como percepções que revelam tentativas de problematizar contextos, discursos e práticas educacionais; e insights educacionais, definidos como percepções que indicam compreensões aprimoradas de contextos, discursos e práticas educacionais desenvolvidos durante as atividades dos participantes nas escolas.

Consideradas as unidades de análise depreendidas do trabalho com as entrevistas constituintes do corpus e as características identitárias dos sujeitos da pesquisa, identificadas em outras fases da pesquisa (Rodrigues et al., 2018RODRIGUES, L. A. D.; PIETRI, E.; SANCHEZ, H. S.; KUCHAH, K. The role of experienced teachers in the development of pre-service language teachers? professional identity: revisiting school memories and constructing future teacher selves. International Journal of Educational Research, Amsterdam, v. 88, p. 146-155, 2018. http://dx.doi.org/10.1016/j.ijer.2018.02.002
http://dx.doi.org/10.1016/j.ijer.2018.02...
), analisaram-se os dados referentes a dois dos participantes, Carmen e Rafael, selecionados em função de se apresentarem como casos contrastivos: eles, que realizaram suas atividades de iniciação à docência em uma mesma escola, produzem compreensões diversas de seus processos de formação docente em contexto, em função principalmente das experiências prévias que tiveram em seu percurso de escolarização, como descritas a seguir.

Carmen teve uma experiência de escolarização como aluna em que a escola era valorizada enquanto lugar de formação, de acesso à cultura ampla e à cultura escolar especificamente. Seu pai é professor (e lecionava na mesma escola em que ela estudou), suas memórias de seu tempo escolar são em geral positivas, e ela optou por cursar letras e ser professora em virtude da valoração que confere à escolarização e de sua projeção em relação a seu pai como professor (ser respeitado; gostar do que faz; ajudar os outros; ser reconhecido como profissional).

Quando observou a escola em que fez seu estágio, notou os pontos negativos diante das referências que tinha do que é a escola (não o respeito, mas a desconfiança; não a colaboração, mas a vigilância; não a vontade de ensinar e de aprender, mas a obrigatoriedade e a punição). Sua perspectiva sobre as atividades analisadas e realizadas em sala de aula foi a do déficit, em comparação com o modelo de escola que trazia em sua memória, evidenciando as faltas que se mostrariam nas atitudes dos alunos (que não aderem à aula; não respeitam a professora; não fazem a atividade) e de professores (que não queriam estar ali, naquele trabalho; que interrompem a aula para conversar com outro professor; que julgam negativamente os alunos, prevendo que serão mal avaliados em avaliações externas).

Rafael teve uma experiência escolar como aluno de não aderência à instituição, confrontando suas regras e não se adequando ao contexto institucional. As experiências valorizadas como positivas teriam vindo de sua participação numa organização não governamental (ONG), em que pôde se apropriar de recursos culturais que se aproximavam, ora mais, ora menos, de saberes escolares.

Quando observou a escola em que realizou suas atividades de formação docente, notou os pontos negativos, mas buscou compreendê-los colocando-se no lugar dos alunos que ali estudavam (pareceu projetar nesses alunos a mesma condição em que se observava quando também era aluno da escola básica). Assim, percebeu os problemas, mas entendeu e por vezes justificou sua existência em função das condições que favoreceriam a constituição desses fatos. Quando via sua prática como professor em formação, nas atividades executadas em sala de aula, tinha perspectiva otimista, pois considerava que a parte dos alunos que não aderiu às propostas o faria com a continuidade dos trabalhos; que, se a atividade não interessava em dado momento, era possível alterá-la por outra na tentativa de fazer com que os alunos se engajassem nas discussões (mesmo que não correspondesse a algo do conteúdo escolar esperado e/ou estabelecido para aquela atividade). Assim, regularmente, projetava positivamente os problemas e obstáculos com que deparava na realidade escolar vivenciada.

Do contraste entre os dois casos, pretendeu-se evidenciar os efeitos que representações de escola, de ensino e de docência que o professor em formação traz de seu percurso escolar produzem sobre seus modos de construir sua identidade docente. Com a análise, foram caracterizados os processos de construção de objetos de discurso que auxiliam a observar como os sujeitos da pesquisa se apoiam em experiências e referências prévias para construir conceitos e concepções do que é a docência em língua portuguesa. Como sugere Mondada (2002MONDADA, L. Construction des objets de discours et categorization: une approche des processus de référenciation. Tradução Mônica Magalhães Cavalcante. Revista de Letras, Fortaleza, n. 24, v. 1/2, p. 119-128, 2002.), procuramos explicitar como as referências à escola, à docência, ao ensino e à aprendizagem são construídas de modo social e culturalmente ancorado, revelando as versões do mundo produzidas por esses sujeitos, de modo mais ou menos objetivo, mais ou menos solidificado (Mondada, 2002MONDADA, L. Construction des objets de discours et categorization: une approche des processus de référenciation. Tradução Mônica Magalhães Cavalcante. Revista de Letras, Fortaleza, n. 24, v. 1/2, p. 119-128, 2002., p. 121).

ANÁLISE DOS DADOS E DISCUSSÃO

Para a produção dos dados de análise, procurou-se observar como o envolvimento de cada sujeito especificamente é singular conforme se ancore em bases afetivas ou em bases intelectuais. Nesse sentido, a produção dos dados realizou-se de acordo com os seguintes princípios metodológicos:

  • observar os procedimentos linguísticos e sociocognitivos com base nos quais os sujeitos de pesquisa se referem a si e a outros sujeitos, bem como a elementos materiais do contexto;

  • evidenciar os processos de categorização lexical quanto aos seus campos semânticos de referência, verificando “o processo de ajustamento das palavras que não se faz diretamente em relação ao referente dentro do mundo, mas no quadro contextual, a fim de construir o objeto de discurso ao curso do próprio processo de referenciação” (Mondada, 2002MONDADA, L. Construction des objets de discours et categorization: une approche des processus de référenciation. Tradução Mônica Magalhães Cavalcante. Revista de Letras, Fortaleza, n. 24, v. 1/2, p. 119-128, 2002., p. 123);

  • caracterizar, com o uso de cada instrumento metodológico (ADV, ERRF, RED), os processos pelos quais os sujeitos fazem a “construção das categorias flexíveis, ad hoc e úteis a todos os fins práticos, dependentes tanto mais da multiplicidade de pontos de vista que os sujeitos exercem sobre o mundo do que de restrições impostas pela materialidade do mundo” (Mondada, 2002MONDADA, L. Construction des objets de discours et categorization: une approche des processus de référenciation. Tradução Mônica Magalhães Cavalcante. Revista de Letras, Fortaleza, n. 24, v. 1/2, p. 119-128, 2002., p. 120).

O tratamento metodológico para a produção dos dados da pesquisa destacou os modos pelos quais memória e afeto se relacionam nos processos subjetivos para a conceptualização da realidade vivenciada pelos sujeitos.

RAFAEL E OS PROCESSOS DE REFERENCIAÇÃO DO QUE É A ESCOLA

Na entrevista realizada com Rafael aplicando-se o instrumento metodológico ADV, prepondera o número de referências a escola, em número de 36, em relação às referências a professor, em número de 32. Nessa entrevista, Rafael parte das referências de professor que construiu quando aluno da escola básica para categorizar em positivas ou negativas as condições de ensino e de aprendizagem em contexto institucional. A oposição entre referências positivas e negativas sustenta para o entrevistado o processo de categorização de suas experiências como ex-aluno e professor em formação: os seus estudos para o vestibular num curso preparatório, instituição em que teve “um professor de literatura fantástico”, o levaram a questionar por que não lera antes as obras de literatura: “Por que será que eu não tive esse contato com a literatura antes, por que que eu não levantei essas questões que essas obras literárias estão levantando antes?”. Rafael desenvolve processos de referenciação com base na categorização, como mais ou menos significativos, dos contextos institucionais de que participou quando aluno da escola básica.

Os contextos institucionais mais desafiadores com que deparara em seu percurso escolar levaram Rafael, assim, a revisar os modos como concebia o que era o estudo e a escolarização da aprendizagem, em que afirmava nunca ter tido “uma cultura de estudos”, “uma seriedade com os estudos”, pois o contexto escolar era pouco desafiador, com trabalhos feitos com base em cópia de outras fontes, numa elaboração que “não tinha nenhuma revisão mais criteriosa”, o que não permitia desenvolver-se como escritor ou como leitor. O que possibilitou alterar de algum modo essa caracterização de aluno desinteressado foi a participação num projeto escolar que inseria alguns estudantes como auxiliares em trabalhos institucionais: “Então, era, eu acho que isso fez eu começar a refletir na minha postura de que, [...] de que eu tinha, [...] além do papel de estudante, eu tinha, eu tinha algo mais ali e os professores eles exigiam isso”.

Sua participação em atividades culturais oferecidas por uma ONG também promoveu possibilidades de ressignificação de seus vínculos com a escola e a escolarização: “É um espaço que eu acho que tinha uma dedicação até [...] maior que a escola, talvez. Porque eu, talvez, veja mais significado ali”. Esse outro contexto institucional tornava possível refletir sobre o que são os processos de ensino e de aprendizagem que engajam os sujeitos: “É até uma provocação pra minha [...] futura atuação como professor é como tornar o espaço da escola tão significativo quanto todos os espaços externos”. Como se dedicava mais às atividades oferecidas pela ONG que à própria escola, Rafael hipotetiza sobre os motivos para que seus vínculos se estabelecessem desse modo e considera que é o fato de o contexto ser mais ou menos significativo para os sujeitos que favorece ou impede seu engajamento.

Logo, em seu percurso formativo, as participações em contextos significativos são os marcos apontados por Rafael para indicar os momentos que constituíram suas concepções sobre formação e escolarização, nos processos de referenciação que desenvolveu nesse percurso e o orientaram para a licenciatura: esses momentos que traz de sua memória se referem ao professor de sociologia que levava os alunos a pensarem criticamente: “Ele conseguia abordar temas e questões que faziam a gente refletir muito sobre a sociedade, sobre a própria estrutura escolar, né, matérias que eu vi depois no curso de formação como POEB [Política e Organização da Educação Básica], né, como introdução aos estudos com enfoque sociológico”; às atividades culturais oferecidas pela ONG de que participava: “Eu acho que a influência parte desse ambiente que eu pude frequentar ao longo da minha formação como adolescente”; o curso preparatório para o vestibular: “Mas foi a partir do contato com a literatura que eu decidi. Falei: não, acho que o contato com a literatura e o, enfim, essa mediação, é algo que eu quero explorar, é um desafio que eu quero aceitar”; e, com seu ingresso na universidade, o curso de letras: “Então a minha jornada hoje, ela tem como acho que o ponto de partida principal a universidade, né. Acho que é onde eu estou desenvolvendo tanto reflexão quanto formação, que eu acho que é fundamental pra retornar pra escola. Então eu sempre tô buscando absorver o máximo, né, daqui da [universidade]”. O processo de referenciação desenvolvido por Rafael para conceitualizar ou categorizar o que compreende por escola, docência e educação parece se apoiar num momento anterior, considerado negativo, para observar eventos, acontecimentos ou relações que inauguram momentos de transformação no presente, ou projetados para o futuro.

Nesse processo, a escola básica e as memórias que traz dela como estudante são o objeto que baliza os processos referenciais que Rafael constrói em seu discurso sobre sua formação docente, são as dificuldades que vivenciou na escola como aluno (“Acredito que eu não fui um aluno muito diferenciado, muito aplicado, assim como tem algumas exceções, né”). Assim, projeta para sua atuação profissional, quando professor já formado, poder “realizar um trabalho significativo”, “que tenha um impacto socialmente e que tenha um retorno financeiro”. O que permitiria essa associação entre interesses sociais e pessoais é o investimento em sua qualificação: “Tenho como objetivo, né, esse amadurecimento acadêmico, pra continuar abrindo essas portas”. A formação institucionalizada é mais uma vez avaliada positivamente nesse processo de reconstrução de Rafael dos sentidos atribuídos à escola, pois é a pesquisa acadêmica que sustentaria sua atuação como um professor que torna significativos os contextos escolares em que atua. É a solidez de sua formação, também, que lhe possibilitaria ingressar como docente em escolas que ofereçam melhores condições de trabalho: “Se for uma escola que tem um direcionamento que foge do padrão, aí eu poderia também ir mais com o sentido de pesquisa”.

O uso do instrumento metodológico ERRF favorece o olhar para a escola, mas destaca-se o interesse de Rafael pela instituição escolar (33 referências) mais que pelos professores (16 referências) que nela atuam, se comparado com os dados produzidos por Carmen, em que prevalece a referência aos professores (91 referências), e não à escola (23 referências). Observa-se nos processos de construção de objetos de discurso por Rafael a orientação pela busca de significação, de produção de contextos escolares, pelo trabalho docente, que se mostrem significativos para os sujeitos que dele participam, em contraste com a escola que traz em sua memória de aluno, que não desafiava os alunos à aprendizagem, pois pouco autoral e, assim, pouco interessante.

A escola com portas quebradas, banheiros depredados e grades como uma prisão é associada por Rafael com a escola em que estudou quando aluno do ensino básico, que apresentava características semelhantes, “um modelo muito replicado”. O professor em formação inicial questiona a precariedade que encontra nas condições de trabalho, mas orienta-se pelas possibilidades: “Porque eu tô falando que ela é precária, né, que ela é mal utilizada, mas ela tem um grande potencial”. Chamam sua atenção os problemas na estrutura física, na escola: “Então, existem salas que não têm porta e existem muitos alunos circulando no período de aulas, né, entre os corredores”. A existência de portas estabelece uma ordem, segundo Rafael, um princípio de organização para o contexto educacional:

Então, quando você tem essa porta que você consegue fazer essa divisão temporal, né, que você, que você corta, temporalmente, o contato com as pessoas do outro lado da porta, você consegue meio que, organizar o espaço pra realizar as atividades. Então eu acredito que tem essa importância, assim.

Em lugar de apontar esse fato apenas como algo negativo, um indício da precariedade do funcionamento escolar em que se encontra, projeta o efeito estruturante que pode ter para o trabalho pedagógico a satisfatória constituição da estrutura física da instituição. Assim, ante as restrições impostas pela materialidade do mundo (Mondada, 2002MONDADA, L. Construction des objets de discours et categorization: une approche des processus de référenciation. Tradução Mônica Magalhães Cavalcante. Revista de Letras, Fortaleza, n. 24, v. 1/2, p. 119-128, 2002.), Rafael constrói categorias (flexíveis) que lhe permitem conceitualizar o contexto que vivencia e projetar ações pedagógicas produtivas. Nesse sentido, como apontado em trabalho anterior (Rodrigues et al., 2018RODRIGUES, L. A. D.; PIETRI, E.; SANCHEZ, H. S.; KUCHAH, K. The role of experienced teachers in the development of pre-service language teachers? professional identity: revisiting school memories and constructing future teacher selves. International Journal of Educational Research, Amsterdam, v. 88, p. 146-155, 2018. http://dx.doi.org/10.1016/j.ijer.2018.02.002
http://dx.doi.org/10.1016/j.ijer.2018.02...
), experiências a princípio negativas podem ter efeito positivo no desenvolvimento de professores em formação inicial, uma vez que, da posição de caráter etnográfico, o professor em formação revisita suas memórias para compreender a situação que vivencia, mas também para revalorar suas próprias memórias.

Outra das fotos que faz do contexto escolar é de uma lousa, um quadro-negro, para quem “em especial é um instrumento histórico na constituição do espaço físico da escola, e é o suporte que, por meio dele, as palavras ganham vida”. Em seu processo de construção de objetos de discurso referentes à escolarização, Rafael apoia-se na reflexão sobre a necessidade de produzir contextos significativos, em que “as palavras ganham vida”, para projetar o que é uma escola interessante para os que dela participam. A lousa consiste no suporte material para “a palavra, ela é uma base pra ela poder dialogar com os alunos”. Esse espaço significativo é “historicamente um apoio, um apoio significativo do professor”. Mas, para que assim se configure, é preciso que a lousa seja ressignificada:

Tem muitos alunos, muitos professores que utilizam de uma forma que eu não concordo muito, né, que eu vivenciei muito na minha experiência como aluno que é o ato de, de ser escrito na lousa um texto médio, grande, e o aluno copiar esse texto e essa ser a única atividade pedagógica, né. Ela é o próprio fim. Então, o fim da escritura, ele acaba sendo mal utilizado.

Seu valor está no fato de que ela possibilita um trabalho docente mais autoral.

Observações semelhantes quanto a não se desenvolver todo o potencial para a produção de tempos e espaços de aprendizagem significativos são realizadas por Rafael em relação aos livros didáticos que permanecem armazenados numa das salas da escola, interditados ao uso dos alunos, porque sua distribuição não ocorreu: questiona o que faria se estivesse na condição de professor ou gestor, de modo a garantir que os recursos didáticos disponíveis fossem bem utilizados, o que, em sua perspectiva, se qualifica como fazer uso significativo dos recursos existentes: “Talvez, a questão não seja investimento, mas a formação para a utilização. Eu acredito que, se as pessoas tiverem uma formação que valoriza, que coloca um significado maior, consequentemente isso circularia muito mais, né”. Novamente, vê-se que Rafael recategoriza os objetos de discurso que aciona ao tratar da escola com base na valorização que atribui aos processos de formação como uma maneira de produzir contextos mais significativos.

Em seus processos de referenciação para a produção de possibilidades de compreensão do contexto escolar, Rafael questiona o modelo escolar que traz de seu passado como estudante: “Então eu pergunto à escola até quando ela vai continuar dessa forma, quando que ela vai começar a se atualizar, quando que ela vai começar a desconstruir algumas coisas, construir coisas novas, dar nova significações para os espaços”.

É interessante observar na passagem anterior que o valor atribuído à escola como instituição aparece marcado no próprio modo como Rafael a referencia na posição de para quem ele dirige seu questionamento (“Então eu pergunto à escola”). Nesse processo, parece que as pessoas são parte da instituição, e é esta que garante que as interações formativas se estabeleçam. Portanto, é sobre a escola que as ações de transformação operadas pelos sujeitos que dela participam devem ocorrer. Nesse sentido, parece que, para Rafael, a melhoria do ensino se realiza em decorrência da construção de contextos significativos, que resultam da atuação dos professores sobre as condições institucionais de seu trabalho.

Os dados obtidos com o uso do instrumento metodológico RED parecem apontar para uma mudança de perspectiva de Rafael no tocante a seu objeto principal de atenção, a escola, dado que, nesse caso, as referências ao termo professor (em número de 20) são bastante superiores às ao termo escola (em número de 9).

Seguindo a tendência apontada nas análises anteriores, parece que a referência ao professor se faz no sentido de construí-lo, discursivamente, como o agente de mudanças no contexto institucional escolar, no sentido de torná-lo mais significativo. Essa concepção de docência constrói-se com o contraponto que Rafael estabelece com o modo como qualifica a relação da professora supervisora com sua profissão:

Foi uma reflexão pra minha formação, foi como, a forma como ela [a professora supervisora] trabalhava com o livro didático: é, eu penso que, criticamente, é como se o livro didático fosse a didática dela, né, que ela de alguma forma terceirizava a prática pedagógica dela pros livros.

Quanto à submissão de sua atividade ao livro didático, Rafael responde projetando a autoria como marca de um trabalho docente significativo, de modo semelhante ao que fez ao tratar do uso de recursos tecnológicos em sala de aula.

A relação do docente com a profissão é uma das bases para o estabelecimento de processos interativos construtivos em sala de aula. Numa passagem da entrevista, observa criticamente a postura da professora, que, após conseguir a atenção dos alunos, interrompe a aula para atender a uma demanda externa, não mais conseguindo retomar a aula, pois não mais obtém o engajamento dos alunos: “Chamou a atenção dos alunos uma ou duas vezes e, quando ela conseguiu a atenção deles, ela começou a explicar, aí, bateram na porta. Era um, era uma secretária, uma inspetora que veio conversar com ela, e ela atendeu a esse chamado, né”. Essa postura é caracterizada por Rafael como resultante da quebra de compromisso, por parte da docente, para com os demais sujeitos da interação, o que o leva a tentar compreender a causa dessa situação: “É uma reflexão que eu tive pra minha formação, é esse comprometimento com o aluno em sala de aula, né. O tempo é tão curto, né, e passa tão rápido, ainda mais quando, ainda mais que, normalmente, nós fazemos um planejamento, né”.

A interação professor-alunos é representada assim como uma relação ética que precisa ser cuidada e construída continuamente:

São muitas pessoas, muitas vidas naquele momento que você, pra você cumprir o seu objetivo ali, você precisa né, tem que ser toda uma sequência de etapas de planejamento, né, de preparação e de também de mediação, né, além de você planejar, também, a forma como você vai conduzir aquilo também tem um nível de complexidade que você precisa, eu acredito, que construir essa base, né.

As recategorizações que Rafael constrói de suas experiências como professor em formação parecem se realizar, de acordo com os dados analisados, com base na contraposição em relação a práticas que considera pouco satisfatórias, as quais caracteriza com base em suas memórias de estudante, ou no que verifica na escola em que se forma professor. Em contraposição àquilo que observa etnograficamente como falta de sentido para os sujeitos, projeta outros modos de fazer, que constituem os contextos institucionais de ensino em bases significativas.

CARMEN E A CENTRALIDADE DO PROFESSOR NOS PROCESSOS DE REFERENCIAÇÃO

Nos dados obtidos com o instrumento ADV, as 76 referências a professor, em contraposição às 30 referências à escola, são construídas inicialmente com base na categorização daqueles a quem Carmen chama de “professores importantes” em sua trajetória de formação. Nessa categorização inicial, é ressaltada a combinação entre as qualidades pessoais desses sujeitos e seu conhecimento pedagógico por meio da utilização de expressões como: “ensinar com muito amor”, “passar carinho” e ter “olhinhos que brilhavam quando falava de [algum conteúdo]”, ensinar para os conteúdos “não serem tão chatos” e as aulas terem “uma forma mais divertida”, e dar aos estudantes “maior liberdade pra gente se abrir e, sei lá, poder ler o que a gente queria”. Carmen parte, portanto, de um posicionamento de que o ensino dos conteúdos, mesmo daqueles menos atrativos ou interessantes, pode ser positivado pelo afeto dedicado pelos professores ao exercício profissional.

Essa referência ao afeto como qualidade modalizadora da ação aparentemente leva à compreensão de que se trata de algo dado, ou seja, o sujeito tem ou não tem, é ou não é. Entretanto, sofre um deslocamento quando Carmen recorre à ideia de longa permanência em dado contexto escolar para acrescentar uma característica temporal a esse processo de referenciação. A entrevistada, ao falar de uma dessas “professoras importantes”, revela que ela era “uma professora assim com uma super-história, naquela escola há muitos anos” e acrescenta que “é uma das mais antigas na escola, ela ainda tá lá, tá dando aula”.

No movimento de ressignificar como são esses “professores importantes”, Carmen retoma a figura de seu pai, também professor, e pela referência a ele reitera e amplia a relação entre afeto e exercício profissional que se desdobra no tempo. Ela afirma que sempre achou “muito lindo” ver a emoção de seu pai-professor diante do impacto que ele tinha na vida de seus alunos. Para caracterizar isso, relata memórias de ter presenciado encontros casuais com ex-alunos no shopping: “Vindo algum aluno, ‘ah, professor! Estudei com você em [19]86 e agora sou advogado, me formei”; ou em festas da escola: “Daí vinha o pessoal, ‘ó, professor, consegui terminar o ensino médio’, ‘professor, entrei na faculdade’, daí ele ficava todo emocionado, daí ‘ah, não professor, não chora’, não sei o quê. Meu pai fica bem emocionado quando encontra um ex-aluno”. Nos dados, quando Carmen se refere à memória de seu pai-professor, ela usa expressões indicadoras de forte afetividade, como: “Eu sempre gostei de ver”, “eu sempre achei isso muito lindo”, “eu sempre achei isso muito legal”, “eu sempre falei, ‘nossa, isso é muito legal!’”, ou “achava muito lindo”.

Outros atributos dos “professores importantes” na trajetória escolar de Carmen, tais como “alguém legal” ou “alguém que dá para confiar”, entram em diálogo com essa reverência à imagem afetiva do pai-professor, levando à concepção de professor como um amigo: “Essa interação de professor e aluno, acho que ajuda [mais] ser um professor amigo do que aquele professor que pega no pé, que é chato. Acho que isso ajuda a conquistar os alunos”. Para ser capaz de conquistar, de estabelecer vínculos, Carmen volta a indicar uma qualidade menos temporal, mais inata: é preciso “ter jeito”. Para referenciar isso, a entrevistada recorre a outro membro da família, sua irmã mais nova, ao dizer: “Acho que ela também vai virar professora, porque ela tem jeito também de ajudar as pessoas”.

Desse movimento inicial de memórias afetivas de “professores importantes”, Carmen passa a discorrer sobre seu momento presente, em que, dada sua escolha afetiva pela profissão, se vê como professora. Aqui, evidencia-se um processo de natureza distinta na construção de seus objetos de discurso. Carmen deixa de lado a afetividade e passa a se ancorar em certa racionalidade que a posiciona num lugar que se manifesta como ausência, falta ou deficiência. Isso se evidencia no emprego de expressões autorreferenciadas, tais como: “Preciso estudar mais”, “me aprofundar”, “tenho interesse em estudar mais”, “ler e pesquisar”, “queria me aprofundar mais”, “eu nunca tinha pensado nisso”, “tem muita coisa pra aprender”. Essa momentânea fixação na percepção do não saber logo se reconfigura quando a entrevistada passa a falar sobre um trabalho que realizou durante três anos como professora de apoio em uma escola de reforço. Acerca de sua atuação, ela afirma-se em um lugar de experiência: “É mais como se fosse um, o que os pais não podem fazer porque estão trabalhando [estudar com os filhos], a gente faz” e “eu já tive aluno surdo, já tive aluno com, acho que era autismo, não lembro. E eu não fazia, elas me davam e eu tinha que estudar jeitos de ajudá-los a entender”. Nesse contexto de tamanha heterogeneidade, imbuída do desejo de promover aprendizagens verdadeiras, Carmen deposita no conhecimento - e não em atributos ou qualidades pessoais - a possibilidade de sair do lugar do não saber:

Eu queria me aprofundar mais sobre isso porque é uma coisa que me interessa e eu ficava com, com um peso porque eu não conseguia fazer ele entender alguma coisa que era, não era tão difícil, ele poderia entender se ele não tivesse aquele problema e daí não saía, ficava naquele, naquela coisa travada.

Nesse esteio, o saber fazer passa a reconfigurar a imagem de professor que Carmen cria para si, e ela acaba se vendo na ambivalência entre criar um método próprio, “não só os que já estão aí nas teses, livros, mas eu conseguir desenvolver algum método meu”, e experimentar técnicas e métodos de outros professores: “Eu gosto de pegar aquela matéria que eu tive [na faculdade] e tentar aplicar com o aluno, aí eu vou roubando ideias dos meus professores e aplicando nos alunos”.

Essa preocupação com o saber fazer pedagógico sofre um novo deslocamento quando Carmen reconecta a ação docente a suas memórias afetivas ao reafirmar que “cativar os alunos é o que falta para alguns professores, que eles chegam, dão aula e vão embora. E cativar eu acho que é o que, que é um, uma das coisas mais preciosas que um professor tem”. Essa constatação quase categórica coloca Carmen diante de um dilema moral:

Como eu tenho medo de falhar, nesse, nesse meio, de não conseguir passar o conhecimento para eles, que eles saiam do mesmo jeito que, que entraram, não aprendam, não aprendam nada. Ou se aprender, só aprendam para a prova.

Nessa breve trajetória, vemos como Carmen articula afetividade e as referências que traz em suas memórias para criar para si uma identidade docente. Partindo de uma categorização marcada por memórias afetivas que a ajudam a definir quem foram e como eram seus professores importantes, ela transita rumo a uma elaboração em que a relação com o conhecimento profissional ganha destaque na compreensão do que fazem e como agem os professores e, por consequência, como ela pretende ser e agir como professora.

Nos dados coletados com base na ERRF, as 23 referências à escola retratadas nas fotos se articulam às 91 referências a diferentes professores: a professora com quem Carmen interagiu durante seu contato inicial com a escola, outros professores da escola e seus próprios professores do passado e do presente, na universidade. A escola capturada por Carmen em fotos de grades, depósitos de livros, salas pouco mobiliadas, corredores vazios e paredes lisas é caracterizada como um não lugar: “Pra mim, é como se fosse uma escola abandonada”, “um corredor fantasma, não tem ninguém, eu acho muito triste ver, assim, as paredes sem, sem cartaz, ou coisas que, que indiquem que tem alunos por ali”, “não tem ninguém que cuide, nem os próprios alunos gostam de, de ficar nela [na escola]”, “eles jogam várias coisas no chão, papel, bolinha de papel, salgadinho, esse tipo de coisa”. E esse não lugar é marcado pela não ação: “É outro depósito, mas esse é mais triste porque esses são os livros que eles recebem, que é para dar pros alunos, só que, no caso, eles não dão”.

Essa tristeza que advém do confronto com o vazio, com a ausência de indício de produção de conhecimento naquele espaço, é explicada por Carmen pela invocação à imagem de escola por ela construída em seu próprio percurso escolar: “É que eu tava acostumada, na escola que estudei, a ter várias coisas nas paredes. Então, é bem estranho ver, não ter um mural na sala com avisos, com aviso de excursão, ou aviso de quais os dias das provas, algum trabalho que eles fizeram colado nas paredes”. Esse confronto entre duas imagens de escola tão diferentes entre si a leva a avaliar que essa escola é “uma escola que não é muito legal de ficar”.

Nesse não lugar que conflita com a memória afetiva de sua escola, Carmen vê uma relação professor-aluno também esvaziada e mecanizada: “Então quando a professora fala que vai passar um trabalho e vai valer nota, aí eles param” e “aí ela falou, ‘ah, é um trabalho sobre metonímia’ e era só essa a instrução, aí a professora deu o exemplo, ‘ah, como as placas de trânsito’, e foi isso. E daí todo mundo fez placas de trânsito”. Essa relação reduz os estudantes a negociadores de notas para avaliação: “‘Professora, me dá um pontinho!’. Ficam mendigando o, os pontinhos”.

Se nessa primeira caracterização a responsabilidade do esvaziamento do propósito da escola parece recair sobre a própria escola enquanto aparelho público e sobre os alunos, Carmen logo reconfigura os modos de construção do objeto de discurso ao narrar um episódio em que, em suas palavras, “A professora tinha conseguido controlar eles [os alunos], eles estavam fazendo a tarefa e pareceu que, finalmente, a gente ia ver uma aula começando e a gente tava superanimado”. Contudo essa expectativa foi logo rompida: “Aí veio uma moça e começou a conversar com a professora na porta e elas ficaram 15 minutos conversando [...]. Eles [os estudantes] iam começar a, a prestar atenção e daí a aula acabou. Mas nem começou direito”.

A responsabilização da professora pelo insucesso da relação pedagógica fica ainda mais forte quando Carmen apresenta aquilo que interpreta como a única estratégia adotada pela professora em suas aulas: a cópia. Em suas palavras, “mas, para português, é sempre assim, copiar tal, tal, tal exercício, então é só sempre esse negócio de copiar, copiar, às vezes eles copiam, sei lá, um texto, uma crônica, alguma coisa assim. Essa é a tarefa. Copiar o poema, copiar a piadinha”.

Essa professora, tão diferente da imagem de professor que Carmen traz de sua experiência como aluna e de sua projeção sobre que tipo de professora quer ser, é, então, condenada: “Acho que o problema não, não, não são eles [os alunos]. Às vezes o problema é até a professora”. Mas a condenação não dura muito e vai se diluindo à medida que Carmen, assumindo uma perspectiva de caráter etnográfico, passa a considerar as condições materiais de trabalho na escola: “A única tomada é essa aí de cima e a gente não tem como subir, escalar uma escada pra ligar as coisas. [...] O rádio não dá pra ligar, o computador também não vai dar pra ligar, o projetor, por exemplo, porque é tudo, a única tomada é no teto”. A culpabilização da professora também se dilui quando Carmen divide a responsabilidade com os estudantes: “Nesse dia não tavam os meninos que são os bagunceiros, mas as meninas simplesmente não estavam nem aí. Ela [a professora] estava dando aula normal, e as meninas, eu acho que elas estavam pintando a unha, nesse dia. Tavam nem aí, como se não estivesse acontecendo nada”.

Na tentativa de sair do pêndulo em que ora responsabiliza a professora, ora a escola, ora os alunos, Carmen faz duas ponderações: “Quando a aula é de um professor que gosta deles, gosta do que tá fazendo e gosta de estar lá ensinando, eles prestam atenção”; e “uma escola meio que pode melhorar porque, se eles cuidassem, fizessem uma reforma, alguma coisa do tipo colocar cartaz nas salas, trabalhos deles na parede, ficaria muito com cara de escola, não com uma cara de prisão”. Nesses excertos, vale observar como Carmen recorre a categorias gerais (evidenciadas na indefinição dos termos em destaque) para evidenciar o potencial transformativo posto naquele contexto inicialmente caracterizado como um não lugar.

Nota-se, também, que o conflito entre o que Carmen vivencia na experiência escolar de agora e sua experiência escolar como estudante parece dar ao processo de produção de sentidos alguma estabilidade referencial por um viés negativo, caracterizando o que vive no momento atual como incompreensível, ou difícil de categorizar: “Eu fico meio, eu estranho bastante porque na minha escola, quando eu estudava, não era desse jeito. O relacionamento era bem diferente. Daí eu fico estranhando, tipo, nossa!”.

As tentativas de Carmen, como um sujeito envolvido social e culturalmente, de explicitar como suas referências à escola, aos professores e aos estudantes são produzidas revelam a multiplicidade, a transitoriedade e a incerteza na construção da imagem de um professor que se realiza e realiza a sua atividade no contexto específico de uma escola. Isso lhe solicita que ative suas memórias de modo a constituir possibilidades de compreensão do contexto em que se encontra na atualidade, segundo um princípio etnográfico, e enseje a revaloração das próprias memórias, dos próprios valores que aciona para compreender as condições de trabalho em que desenvolve sua formação profissional.

Toda essa complexa trama de referenciação, inteira e totalizante no momento da enunciação e, logo no instante seguinte, parcial e insuficiente, pronta para ser alterada, manifesta-se na forma de síntese dos dados obtidos com o instrumento RED. Ao relatar seus primeiros movimentos de planejar e conduzir seu próprio trabalho pedagógico na mesma escola e nas mesmas salas de aula que conheceu como observadora participante e crítica, Carmen parece buscar maior equilíbrio entre as referências entre professor e escola, com 36 e 23 referências a cada um, respectivamente. É dessa experiência conflitiva e ancorada em diferentes referenciações das realidades vividas cronológica e sincronicamente que ela constrói um propósito que se materializa discursivamente de dois modos distintos. Em um deles, Carmen fala de si como professora hoje, identificando e enraizando seu estado de mudança no que faz como professora de apoio e reforço escolar: “Eu já comecei a deixar eles [os alunos] falarem, [...] desenvolverem o raciocínio, não ficar forçando”. No outro, ancora sua imagem de professora em uma escola de educação básica em um estado de vir a ser marcado pela intenção de diferenciar-se do que se caracterizou como professor com base em sua experiência de formação docente:

Então, eu acho que quando eu tiver uma, uma turma pra ser professora e tal, eu vou tentar ao máximo não ficar “não, você falou isso aí errado, não é assim que se fala”, ficar corrigindo os alunos na frente deles ou ficar “vamos lá, vamos copiar só isso”, ficar passando cópia. Que fosse uma aula mais interativa, que eles pudessem participar.

CONCLUSÕES

Carmen e Rafael constroem, em diálogo consigo mesmos e com suas memórias, versões subjetivas do mundo, tornadas públicas como objetos de discurso. Essas versões revelam o que cada um projeta em suas representações de escola e de professor como possibilidade de amálgama das contradições, criando estabilidades temporárias que tornam o exercício da profissão possível. A despeito das singularidades do processo de cada sujeito da pesquisa, é a experiência escolar significativa que ambos afirmam, reafirmam, expandem e explicam.

Para Carmen, como a escola que ela frequentou e os professores que fizeram parte de sua trajetória de estudante são diametralmente opostos ao que ela vê em sua experiência presente, o processo de referenciação segundo o qual ela constrói suas versões do mundo é marcado por idas e vindas que a levam a oscilar entre culpabilizar alguém pela ausência de significado (no geral, a professora) e se colocar na posição desse alguém para rever a interpretação e o julgamento que faz. Nesse sentido, o que move o processo de referenciação de Carmen é a dúvida, de modo que a idealização da experiência por ela vivida, fortemente marcada pela afetividade, se torna preponderante. Para ela, a vida e o significado da escola repousam nas relações interpessoais, o que a faz colocar a figura do professor e a valorização do aspecto pessoal, humano, no centro de sua elaboração sobre a instituição escolar.

Para Rafael, a sensação de revisitar algo já conhecido (a escola que ele vê hoje é igual à escola que ele frequentou quando aluno; os professores com quem convive são como boa parte dos professores de seu ensino básico) faz com que ele procure marcar positivamente as representações que constrói, numa ação que possibilite atribuir significação ao que venha a surgir como lacunas no presente ou nas memórias do passado. Em outras palavras, seu complexo processo de referenciação captado na análise é marcado pela certeza de que a escola tem de ser e pode ser diferente. Nesse movimento, Rafael busca nas teorias educacionais a que teve acesso em sua formação as ferramentas que permitem esse processo de transformação. Para ele, a escola precisa ser um lugar que propicie a relação com o conhecimento. Daí a centralidade das referências à escola como instituição construída por pessoas, especialmente por professores.

A presença do outro nomeado e referenciado, central ou perifericamente, ora como professor, ora como escola, no processo intrassubjetivo de Carmen e de Rafael, revela a instabilidade e a mudança não como problemas, mas como dimensões intrínsecas à produção discursiva e à cognição situada (Mondada, 2002MONDADA, L. Construction des objets de discours et categorization: une approche des processus de référenciation. Tradução Mônica Magalhães Cavalcante. Revista de Letras, Fortaleza, n. 24, v. 1/2, p. 119-128, 2002., p. 124). Tal instabilidade na identificação de objetos discretos pode ser observada também em um nível não linguístico (ou, pelo menos, em um nível cognitivo em que a verbalização não é necessária nem explicitamente implicada), nas práticas cotidianas. Em outros termos, a atividade cognitiva individual é, ela também, uma atividade constante de categorização, e não uma simples identificação nem o reconhecimento de objetos preexistentes. A categorização depende de um tratamento não exaustivo e seletivo do mundo, ele próprio suscetível de ver transformadas suas finalidades ou suas modalidades adaptativas.

Uma vez que os processos de referenciação se realizam em função dos conhecimentos prévios dos sujeitos, das representações que trazem de suas experiências, em suas memórias, a construção de objetos de discurso e sua categorização, pelos professores em formação, ocorrem sempre singularmente, em resposta à singularidade constitutiva dos sujeitos. Essa observação evidencia a impossibilidade de processos de formação docente que se pretendam instrumentais, padronizantes, ou normativos, pois os recursos dos sujeitos em formação se caracterizam pela heterogeneidade e pela instabilidade.

Ao entendermos a instabilidade como constitutiva dos sujeitos, somos impelidos a repensar o que se define por qualidade da educação para todos, professores e estudantes. Por se tratar de um fenômeno situado cuja existência não pode preceder os sujeitos que o constroem, a qualidade da experiência escolar não pode ser reduzida à eficiência das aprendizagens, tampouco ser o sucesso do ensino atrelado à eficácia das técnicas. Nesse sentido, a formação docente caracteriza-se como um processo de caráter etnográfico, que possibilita aos licenciandos conhecer o contexto em que atuam, ressignificando-o, mas também permite que os futuros professores ressignifiquem as próprias representações que trazem em suas memórias (intelectuais, afetivas), do que são a docência e a escola.

As análises dos processos vividos pelos sujeitos da pesquisa ilustram a complexa tessitura de identidades docentes que em suas singularidades se mostram, ao mesmo tempo, permanentemente instáveis e a todo o momento comprometidas com valores democráticos e com a diminuição das desigualdades sociais.

REFERÊNCIAS

  • ANDRADE, L. T. A escrita dos professores: textos em formação, professores em formação, formação em formação. Educação & Sociedade, Campinas, v. 24, n. 85, p. 1.297-1.315, dez. 2003. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302003000400010
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302003000400010
  • APARÍCIO, A. S. M. A renovação do ensino de gramática no primeiro grau no estado de São Paulo. 1999. Dissertação (Mestrado em Linguística Aplicada) - Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1999.
  • BAGNO, M.; RANGEL, E. O. Tarefas da educação linguística no Brasil. Revista Brasileira de Linguística Aplicada, Belo Horizonte, v. 5, n. 1, p. 63-81, 2005. http://dx.doi.org/10.1590/S1984-63982005000100004
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1984-63982005000100004
  • BENEVIDES, A. S. A formação de professores do curso de letras: aspectos para uma prática reflexiva. Revista Letra Magna, [S.l], n. 5, p. 1-19, 2006.
  • BREEN, M. P.; HIRD, B.; MILTON, M.; OLIVER, R.; THWAITE, A. Making sense of language teaching: teachers’ principles and classroom practices. Applied Linguistics, United Kingdom, n. 22, p. 470-501, 2001. http://dx.doi.org/10.1093/applin/22.4.470
    » http://dx.doi.org/10.1093/applin/22.4.470
  • BURNS, A.; FREEMAN, D.; EDWARDS, E. Theorizing and studying the language-teaching mind: mapping research on language teacher cognition. The Modern Language Journal, Medford, MA, v. 99, n. 3, p. 585-601, 2015. https://doi.org/10.1111/modl.12245
    » https://doi.org/10.1111/modl.12245
  • CASTILHO, A. T. Os sons. In: SÃO PAULO. Secretaria da Educação. Subsídios à Proposta Curricular de Língua Portuguesa para o 1º e 2º graus - coletânea de textos. São Paulo: CENP, 1988a. v. 1. p. 43-51.
  • CASTILHO, A. T. Variação linguística, norma culta e ensino da língua materna. In: SÃO PAULO. Secretaria da Educação. Subsídios à Proposta Curricular de Língua Portuguesa para o 1º e 2º graus - coletânea de textos. São Paulo: CENP , 1988b. v. 1. p. 53-59.
  • CASTILHO, A. T. Variação dialetal e ensino institucionalizado da língua portuguesa. Cadernos de Estudos Linguísticos, Campinas, n. 1, p. 13-20, 2012. https://doi.org/10.20396/cel.v1i0.8636617
    » https://doi.org/10.20396/cel.v1i0.8636617
  • CROOKES, G. V. Redrawing the boundaries on theory, research, and practice concerning language teachers’ philosophies and language teacher cognition: toward a critical perspective. The Modern Language Journal, Medford, MA, v. 99, n. 3, p. 485-499, 2015. https://doi.org/10.1111/modl.12237
    » https://doi.org/10.1111/modl.12237
  • FERYOK, A. Activity theory and language teacher agency. Modern Language Journal, Medford, MA, v. 96, p. 95-107, 2012. https://doi.org/10.1111/j.1540-4781.2012.01279.x
    » https://doi.org/10.1111/j.1540-4781.2012.01279.x
  • FRANCHI, E. P. Pedagogia da alfabetização: da oralidade à escrita. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1991.
  • FREGONEZI, D. E. Aconteceu a virada no ensino de língua portuguesa? Revista do GELNE, Natal, ano 1, n. 2, p. 82-85, 1999.
  • FREIRE, P. Pedagogy of the oppressed. New York: Continuum, 1973.
  • GERALDI, J. W. (Org.). O texto na sala de aula: leitura e produção. Cascavel: Assoeste, 1984.
  • GERALDI, J. W. Portos de passagem. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
  • GERALDI, J. W.; SILVA, L. L. M.; FIAD, R. S. Linguística, ensino de língua materna e formação de professores. D.E.L.T.A., São Paulo, v. 12, n. 2, p. 307-326, 1996.
  • GOLOMBEK, P. R.; DORAN, M. Unifying cognition, emotion, and activity in language teacher professional development. Teaching and Teacher Education, [S.l.], v. 39, p. 102-111, 2014. https://doi.org/10.1016/j.tate.2014.01.002
    » https://doi.org/10.1016/j.tate.2014.01.002
  • GOLOMBEK, P. R.; JOHNSON, K. E. Narrative inquiry as a mediational space: Exploring emotional and cognitive dissonance in second language teachers’ development. Teachers and Teaching, [S.l.], v. 10, n. 3, p. 307-328, 2004. https://doi.org/10.1080/1354060042000204388
    » https://doi.org/10.1080/1354060042000204388
  • GOODWIN, A. L. Globalization and the preparation of quality teachers: rethinking knowledege domains for teaching. Teaching Education, United Kingdom, v. 21, n. 1, p. 19-32, 2010. http://dx.doi.org/10.1080/10476210903466901
    » http://dx.doi.org/10.1080/10476210903466901
  • HEATH, S. B. Ways With Words. Cambridge: Cambridge University Press, 1983.
  • JOHNSON, K. E.; GOLOMBEK, P. R. (Eds.). Research on second language teacher education: a sociocultural perspective on professional development. New York: Routledge, 2011.
  • KLEIMAN, A. C. B. Professores e agentes de letramento: identidade e posicionamento social. Revista Filologia e Linguística Portuguesa, Campinas, n. 8, p. 409-424, 2006. https://doi.org/10.11606/issn.2176-9419.v0i8p409-424
    » https://doi.org/10.11606/issn.2176-9419.v0i8p409-424
  • KLEIMAN, A. C. B. Letramento e suas implicações para o ensino de língua materna. Signo, Santa Cruz do Sul, v. 32, n. 53, p. 1-25, dez. 2007. http://dx.doi.org/10.17058/signo.v32i53.242
    » http://dx.doi.org/10.17058/signo.v32i53.242
  • KLEIMAN, A. C. B. Projetos dentro de projetos: ensino-aprendizagem da escrita na formação de professores de nível universitário e de outros agentes de letramento. Revista Scripta, Belo Horizonte: PUC/MG, v. 13, n. 24, p. 17-30, 2009.
  • KOCH, I. G. V. A referenciação. In: KOCH, I. G. V. Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Cortez , 2002. p. 77-81.
  • KUBANYIOVA, M.; CROOKES, G. Re-envisioning the roles, tasks, and contributions of language teachers in the multilingual era of language education research and practice. The Modern Language Journal, Medford, MA, v. 100, supplement 2016, p. 117-132, 2016.
  • KUMARAVADIVELU, B. Language teacher education for a global society - a modular model for knowing, analysing, recognizing, doing, and seeing. New York: Routledge; Taylor & Francis, 2012.
  • LEE, S.; SCHALLERT, D. Becoming a teacher: coordinating past, present, and future selves with perspectival understandings about teaching. Teaching and Teacher Education, [S.l.], v. 56, p. 72-83, 2016.
  • MARCUSCHI, L. A. Anáfora indireta: o barco textual e suas âncoras. Revista Letras, v. 56, dez. 2001. http://dx.doi.org/10.5380/rel.v56i0.18415
    » http://dx.doi.org/10.5380/rel.v56i0.18415
  • MARINHO, M. A oficialização de novas concepções para o ensino de português. 2001. Tese (Doutorado) - Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2001.
  • MERRYFIELD, M. M. Reflective practice in global education: strategies for teacher educators. Theory into Practice, United Kingdom, v. 32, n. 1, p. 27-32, 1993.
  • MONDADA, L. Construction des objets de discours et categorization: une approche des processus de référenciation. Tradução Mônica Magalhães Cavalcante. Revista de Letras, Fortaleza, n. 24, v. 1/2, p. 119-128, 2002.
  • OLIVEIRA, M. B. F. Revisitando a formação de professores de língua materna: teoria, prática e construção de identidades. Linguagem em (Dis)curso, Tubarão, v. 6, n. 1, jan./abr. 2006.
  • RODRIGUES, L. A. D.; PIETRI, E.; SANCHEZ, H. S.; KUCHAH, K. The role of experienced teachers in the development of pre-service language teachers? professional identity: revisiting school memories and constructing future teacher selves. International Journal of Educational Research, Amsterdam, v. 88, p. 146-155, 2018. http://dx.doi.org/10.1016/j.ijer.2018.02.002
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.ijer.2018.02.002
  • SIGNORINI, I. Significados da inovação no ensino de língua portuguesa e na formação de professores. 1. ed. Campinas: Mercado de Letras, 2007.
  • SILVA, K.; PILATI, E.; DIAS, J. O ensino de gramática na contemporaneidade: delimitando e atravessando as fronteiras na formação inicial de professores de língua portuguesa. Revista Brasileira de Linguística Aplicada, Belo Horizonte, v. 10, n. 4, p. 981, 2010. http://dx.doi.org/10.1590/S1984-63982010000400008
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1984-63982010000400008
  • SOARES, M. Linguagem e escola: uma perspectiva social. São Paulo: Ática, 1984.
  • TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.
  • TSUI, A. B. M. Understanding expertise in teaching: case studies of second language teachers. Cambridge: Cambridge University Press , 2003.
  • TSUI, A. B. M. Complexities of identity formation: a narrative inquiry of an EFL teacher. TESOL Quarterly, United States, n. 41, p. 657-680, 2007. https://doi.org/10.1002/j.1545-7249.2007.tb00098.x
    » https://doi.org/10.1002/j.1545-7249.2007.tb00098.x
  • 1
    A pesquisa Conceptualisations of pedagogical contexts and development of appropriate pedagogies: a multiple-case study of pre-service language teachers working in peripheral urban state schools in São Paulo foi desenvolvida em colaboração entre docentes do Departamento de Educação da Universidade de Bath (Reino Unido) e da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP).
  • 2
    Os sujeitos da pesquisa, no momento da produção dos dados, ingressavam no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), da Universidade de São Paulo (PIBID - CAPES/USP). O PIBID é um programa nacional financiado pela Capes que concede bolsas a licenciandos e a professores formadores na universidade e na escola básica para o desenvolvimento de projetos para a formação inicial de professores.
  • 3
    Os participantes tiveram suas identidades resguardadas em cumprimento ao código de ética das universidades em que se desenvolveu o projeto de pesquisa. Os pseudônimos utilizados são Carmen, Edna, Gisele e Rafael.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    06 Fev 2019
  • Aceito
    30 Jul 2019
ANPEd - Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação Rua Visconde de Santa Isabel, 20 - Conjunto 206-208 Vila Isabel - 20560-120, Rio de Janeiro RJ - Brasil, Tel.: (21) 2576 1447, (21) 2265 5521, Fax: (21) 3879 5511 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: rbe@anped.org.br