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RESENHAS

AKKARI, Abdeljalil. Internacionalização das políticas educacionais: transformações e desafios. Petrópolis: Vozes, 2011. 143p

Internacionalização das políticas educacionais é uma obra organizada em dez capítulos e propõe uma análise contextualizada dessa temática na América Latina e no Brasil. É uma relevante contribuição para estudantes, professores e pesquisadores interessados no debate atual sobre políticas educacionais. Possibilita ampliar conhecimentos sobre aspectos de tais políticas e de conceitos que ultrapassam fronteiras e configuram-se de diversas maneiras, conforme países e regiões do mundo.

Seu autor, Abdeljalil Akkari, realiza estudos sobre políticas e desigualdades educacionais, educação comparada e conexões entre culturas e educação. É professor na linha de pesquisa "Dimensões Internacionais da Educação" da Universidade de Genebra e consultor da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e de outras organizações internacionais.

Na apresentação, essa obra aborda as influências das agências internacionais nas políticas nacionais e internacionais e destaca que o processo de internacionalização das políticas educacionais gera novas formas de regulação das políticas nacionais. Esse processo pode ser identificado, em diversos países, por meio de aspectos comuns, como a descentralização, a privatização, a redução de gastos no ensino público e a pressão sobre os professores para prestarem conta de suas ações pedagógicas, entre outros.

Akkari afirma que as reformas educacionais são "movimentos planetários", que se configuram de maneiras muito diferentes no âmbito dos sistemas educacionais nacionais. Os fluxos não são assimilados da mesma maneira. Essa assimilação depende da história da política educacional do país e de fatores que a fortalecem. Mostra que, diante dos novos paradigmas, o Estado foi obrigado a reconsiderar seu lugar nas políticas educacionais, o que não significa sua retirada da educação. Considerar o processo de reforma das políticas educacionais como uma simples estratégia de descentralização e desregulamentação é um erro, quando estes são, na verdade, processos de rerregulamentação. O Estado ainda dispõe de um forte poder de controle, e cada contexto apresenta especificidades em matéria de educação para além da pressão crescente das tendências globalizantes.

Sobre a influência das organizações internacionais nas políticas educacionais, o autor afirma que, a partir de 1980, com o enfraquecimento da UNESCO, o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI) assumiram a liderança no cenário educacional dos países em desenvolvimento. Essa transferência de liderança trouxe consequências para o campo educacional, pois essas instituições apresentam visões distintas. O autor discute essas diferenças e evidencia que a influência das organizações internacionais não se reduz apenas ao discurso. Concretiza-se, para além das contribuições financeiras, em ações políticas fortes que podem ser exemplificadas nas tendências à descentralização e à privatização da educação.

A descentralização é tida como uma estratégia de ação cuja ideia geral é a de evitar burocracia e custos. Dados sobre proporções de decisões educacionais tomadas em níveis escolar, regional e nacional são utilizados, pelo autor, para mostrar a diversidade de modos de gestão dos sistemas educacionais de países como Nova Zelândia, Suécia, Portugal, França, Estados Unidos e Suíça.

Akkari mostra que as justificativas para as formas organizacionais descentralizadas também variam em virtude dos contextos nacionais. O autor afirma que no Chile e na Grã-Bretanha, por exemplo, as motivações foram de ordem econômica; na Espanha foi política, relativa ao processo de democratização; e, no Oeste da África, a motivação foi pedagógica, uma vez que o desejo era adotar métodos e currículos vinculados à comunidade local.

Para o autor, a eficácia da descentralização sobre o desempenho educacional ainda precisa ser comprovada, e as poucas pesquisas que exploraram esse assunto apontam, na maioria dos casos, que o desempenho dos alunos é melhor em países com currículo, livros e exames mais centralizados.

Akkari afirma que a privatização da educação é um processo generalizado e variável em diversos países do mundo e entre os níveis educacionais. Enfatiza que as fronteiras entre o ensino público e o privado são, cada vez mais, indefinidas. As formas de privatização vão desde os métodos de gestão e conceitos oriundos do âmbito empresarial até outros mais sutis, como a publicidade e o patrocínio da escola pública por meio de equipamentos e materiais didáticos. A expansão da rede privada se faz por meio de franquias, como é o caso do Sistema de Ensino Positivo no Brasil e de escolas internacionais de idiomas presentes no mundo todo. Nos Estados Unidos, as escolas públicas que adotam o modelo de negócios Google, ou seja, aquelas que vendem espaço publicitário em seu interior, são cada vez mais numerosas.

Akkari defende a possibilidade de que as políticas educacionais promovam maior regulação das relações entre as redes de ensino pública e privada, apontado duas questões fundamentais: a eficácia do maciço investimento público na educação básica para melhorar a qualidade do ensino e as reformas em curso no vestibular e suas consequências sobre a estrutura atual de um sistema educativo com diferentes ritmos.

O autor salienta que a obrigação de resultados, a prestação de contas e a boa governança passaram a ser constantes nas políticas educacionais de diversos países, por meio da noção de accountability. A prestação de contas auxilia os atores do sistema educacional a se ajustarem a um ambiente em constante evolução, a investigar a tomada de decisões, a prestar contas à sociedade civil sobre a gestão da escola e a assumir a responsabilidade do cargo recebido. O termo boa governança surgiu do pensamento neoliberal (1990) e logo se espalhou no vocabulário político para descrever uma forma de decisão coletiva baseada na negociação e nas interações entre várias instâncias.

Akkari discute a emergência de padrões educacionais e avaliações nacionais e internacionais como uma das facetas da internacionalização das políticas educacionais. Além disso, as reformas do currículo têm sido uma constante em muitos países. Ressalta que, mesmo com resistências, a relação entre desempenho de alunos em testes regulares e qualidade do trabalho de professores parece ter um futuro promissor com relação à pesquisa internacional em educação.

Para o autor, a formação de professores é um setor estratégico das políticas educacionais. Apesar de constituírem a classe profissional mais numerosa do mundo, a UNESCO prevê que, até o ano de 2015, alguns países correm o sério risco de ficar sem professores qualificados para atender à demanda de escolarização. Destaca três tendências internacionais na formação de professores: universitarização da formação; alongamento da duração; e aumento das qualificações exigidas para realizar a formação e a diversidade de modelos de formação. Ressalta que, no Brasil, a docência é submetida a um controle burocrático e rigoroso, como também apresenta precárias condições de trabalho, o que tem como consequência evoluções da profissão que permitem caracterizá-la como uma semiprofissão. O entusiasmo pela privatização e a descentralização conduz, por sua vez, à desprofissionalização.

Para finalizar, Akkari reafirma que a internacionalização pode transformar, permanentemente, o papel do Estado. Considera que ela é, simultaneamente, discurso e prática, necessidade e estratégia, processo e imposição. Refletindo sobre a internacionalização das políticas educacionais no Brasil, aborda a democratização, a descentralização, a medida do desempenho dos alunos, por meio de exames nacionais (Exame Nacional do Ensino Médio − ENEM; Sistema de Avaliação da Educação Básica - SAEB; Prova Brasil) e as influências das organizações internacionais, como o Banco Mundial e a UNESCO, defendendo que é impossível pensar na política educacional brasileira sem considerar as tendências e os debates internacionais.

Baseada em estudos realizados por renomados autores no âmbito mundial, essa obra oferece uma visão geral sobre os conceitos utilizados internacionalmente nas políticas educacionais, ressaltando que os aspectos centrais que perpassam essas políticas em diversos países tomam dimensões próprias em cada contexto.

Akkari ressalta que esse trabalho não esgota as possibilidades sobre o assunto. Levanta várias questões relativas à internacionalização das políticas educacionais que merecem ser objeto de pesquisa e debates, induzindo o leitor ao aprofundamento de estudos. Lembra que a globalização econômica e seus efeitos foram objeto de vários estudos, enquanto a internacionalização das políticas educacionais tem recebido pouca atenção. Assim, traz importante contribuição para estudantes, professores e pesquisadores interessados no debate atual sobre as políticas educacionais.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2016

Histórico

  • Recebido
    Abr 2014
  • Aceito
    Dez 2014
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