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Multiletramentos na escola

RESENHA

Acir Mário KarwoskiI; Beatriz GaydeczkaII

IDoutor em letras pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Professor da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). E-mail: acirmario@letras.uftm.edu.br

IIDoutora em letras pela Universidade de São Paulo (USP). Professora da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). E-mail: beatriz.gaydeczka@icte.uftm.edu.br

ROJO, Roxane; ALMEIDA, Eduardo de Moura (Orgs.). Multiletramentos na escola. São Paulo: Parábola Editorial, 2012, 264 p. (Estratégias de ensino)

Fruto do empreendimento de um grupo de professores de diversas instituições brasileiras, o livro Multiletramentos na escola, organizado por Roxane Rojo e Eduardo de Moura Almeida, conta com vinte e sete autores estudantes de cursos de pós-graduação stricto sensu, pesquisadores e professores da educação básica da rede pública e da rede privada de ensino; possui 264 páginas, capa, encadernação e diagramação modernas, a começar pelo sumário, que apresenta ao lado da paginação dos capítulos um ícone com a informação "conteúdo digital gratuito", elemento que anuncia a divulgação de conteúdo digital complementar no site da editora Parábola, o que o diferencia das demais publicações da área e expressa uma tendência da atual geração: conteúdos disponibilizados na rede mundial de computadores.

Cada capítulo se constitui de duas partes: na primeira, as seções de embasamento teórico mesclam-se às análises de objetos multissemióticos – o que facilita a compreensão dos conceitos discutidos; e na segunda parte são apresentadas propostas de ensino de língua portuguesa com foco na leitura crítica, análise e produção de textos. Essas propostas enfocam gêneros discursivos veiculados em ambientes digitais.

Roxane Rojo tem vasta experiência em ensino de língua portuguesa, é doutora em linguística aplicada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e professora no Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Eduardo de Moura Almeida é seu orientando no curso de mestrado em linguística aplicada no IEL/UNICAMP, formado em arte e cultura fotográfica pela Faculdade SENAC, licenciado em letras português/francês pela PUC-SP.

Rojo destaca na apresentação da obra, intitulada "Protótipos didáticos para os multiletramentos", que as discussões colocadas pelos autores no livro são oriundas de debates com estudantes do programa de pós-graduação no IEL/UNICAMP e de uma disciplina ministrada no Programa de Pós-Graduação Mestrado em Estudos Linguísticos na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), em 2010. Segundo a autora, os participantes dos cursos por ela ministrados foram convidados a escrever sobre experiências de sala de aula com protótipos. O conceito de protótipo comumente é associado à ideia de modelo. Em sua etimologia, protótipo traz dois radicais gregos: protos, que possui o sentido de primário, primeiro; e tipos/typos, que significa tipo, caráter, marca, modelo. Portanto, protótipo seria uma ideia primeira, algo feito pela primeira vez e que muitas vezes é copiado ou imitado, pois é um modo de fazer algo. Porém, o uso de protótipos/propostas por Rojo é empregado no sentido de "estruturas flexíveis e vazadas que permitem modificações por parte daqueles que queiram utilizá-las em outros contextos" (p. 8). Nessa perspectiva, a pesquisadora busca um modo de dar impulso, de motivar e de desafiar os docentes de educação básica que trabalham com língua e linguagens a refletirem a respeito da forma como crianças e jovens (da educação infantil até o ensino superior) vivenciam o letramento mediante a diversidade cultural e hipermodal dos meios digitais.

Dessa forma, o texto constrói uma reflexão a respeito da pedagogia dos multiletramentos. O convite de Rojo aos demais autores era para que

elaborassem trabalhos colaborativos que descrevessem, de maneira teoricamente embasada, propostas de ensino de língua portuguesa que eles tivessem experimentado em suas escolas com seus alunos ou que pudessem ser experimentadas por eles mesmos ou por outros colegas professores em outras ocasiões. Essas propostas de ensino deveriam visar aos letramentos múltiplos, ou aos multiletramentos, e deveriam abranger atividades de leitura crítica, análise e produção de textos multissemióticos em enfoque multicultural. (p. 8)

Em seguida, a autora abre a obra com o capítulo intitulado "Pedagogia dos multiletramentos: diversidade cultural e de linguagens na escola", cuja finalidade é discutir a necessidade de uma pedagogia dos multiletramentos. Questiona a autora: "Por que abordar a diversidade cultural e a diversidade de linguagens na escola? Há lugar na escola para o plurilinguismo, para a multissemiose e para uma abordagem pluralista das culturas? Por que propor uma pedagogia dos multiletramentos?" (p. 11). Para Rojo,

o conceito de multiletramentos aponta para dois tipos específicos e importantes de multiplicidade presentes em nossas sociedades, principalmente as urbanas, na contemporaneidade: a multiplicidade cultural das populações e a multiplicidade semiótica de constituições dos textos por meio dos quais ela se informa e se comunica. (p. 13)

Diante da multiplicidade de linguagens, mídias e tecnologias, necessário se faz saber dominar áudio, vídeo, tratamento de imagem, edição e diagramação, entre outras. Segundo a autora, são requeridas novas práticas de leitura, escrita e análise crítica; são necessários novos e multiletramentos (p. 21). Rojo faz referência ao termo multiliteracies, publicado pelo New London Group em 1996. Os multiletramentos funcionam, segundo ela, pautando-se em algumas características importantes: a) são interativos (colaborativos); b) fraturam e transgridem as relações de poder estabelecidas; e c) são híbridos, fronteiriços, mestiços (de linguagens, modos, mídias e culturas) (p. 23). Essas características impõem um novo modo de conceber, por exemplo, a autoria e a recepção dos enunciados. Ou seja, o processo de produção textual não é mais exclusivamente linguístico, integra imagem, som, movimento; além disso, não se vivencia mais uma produção estritamente individual ou de mão única (aluno-professor), mas colaborativa – mais de um sujeito contribui para a produção e retextualização. Portanto, esses objetos discursivos (hipermodais polifônicos) desafiam a repensar-se as concepções enunciativas de produção e de leitura de enunciados.

Rojo, a exemplo do New London Group, defende uma "pedagogia dos multiletramentos" ao propor a adoção em sala de aula de práticas situadas, instrução aberta, enquadramento crítico e prática transformadora. Segundo a autora, a proposta didática sustentada em critérios de análise crítica é "de grande interesse imediato e condiz com os princípios de pluralidade cultural e de diversidade de linguagens envolvidas no conceito de multiletramentos" (p. 300).

O livro divide-se em duas partes: a primeira, intitulada "Por uma educação estética", formada por seis capítulos com os seguintes títulos: a) "Blog nos anos iniciais do fundamental I: a reconstrução de sentido de um clássico infantil"; b) "Chapeuzinho Vermelho na cibercultura: por uma educação linguística com multiletramentos"; c) "Minicontos multimodais: reescrevendo imagens cotidianas"; d) "Hipercontos multissemióticos: para a promoção dos multiletramentos"; e) "Projet(o)arte: uma proposta didática"; e f) "Gêneros poéticos em interface com gêneros multimodais". E a segunda parte, intitulada "Por uma educação ética e crítica", é constituída de cinco capítulos: a) "O manguebeat nas aulas de português: videoclipe e movimento cultural em rede"; b) "A canção Roda-viva: da leitura às leituras"; c) "Documentário e pichação: a escrita na rua como produção multissemiótica"; d) "As múltiplas faces do Brasil em curta-metragem: a construção do protagonismo juvenil"; e e) "Radioblog: vozes e espaços de atuação cultural".

Convidamos o leitor à desafiante proposta apresentada pelo "novo grupo de Rojo". Aceitar o desafio de desenvolver em sala de aula experiências e protótipos didáticos inovadores no ensino de língua portuguesa visando ao letramento crítico é um dos principais objetivos do livro Multiletramentos na escola.

O Brasil precisa de professores críticos, ousados, inovadores e motivados, que topem o desafio de repensar a divisão canônica disciplinar das escolas – que já comprovou não ser atrativa aos estudantes da atual geração – para implantar uma cultura de práticas de leitura e escrita voltada à formação crítica dos estudantes, capaz de criar novos sentidos numa sociedade hipermultimodal em constante transformação. O livro destina-se a todos os profissionais que desejam implantar em escolas a "pedagogia dos multiletramentos".

Recebido em fevereiro de 2013

Aprovado em março de 2013

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Fev 2014
  • Data do Fascículo
    Dez 2013
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