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EDITORIAL

Uma das questões mais recorrentes nos debates educacionais dos últimos anos tem sido a implantação do sistema de ciclos. Há mais de duas décadas, professores, pesquisadores, pais, estudantes, coordenadores e gestores têm buscado materializar em suas práticas cotidianas os princípios que fundamentam as propostas surgidas em diversas redes de ensino do país; resistido e questionado a viabilidade dessa materialização; lançado mão de um instrumental teórico e metodológico para melhor compreender os avanços e os impasses dessa iniciativa; avaliar os resultados, na aprendizagem e nos processos de socialização dos alunos, dessa nova forma de organização da cultura escolar. Neste número da Revista Brasileira de Educação, publicamos um conjunto de artigos que problematizam essa temática. Esperamos, assim, contribuir para a qualificação desse debate e estimular a realização de novas pesquisas, capazes de fazer avançar o conhecimento existente sobre o tema.

Os três primeiros artigos publicados abordam, principalmente, os princípios que fundamentam as propostas de ciclos e o estado da produção acadêmica brasileira sobre o tema. Em "A pesquisa sobre a organização da escolaridade em ciclos no Brasil (2000-2006): mapeamento e problematizações", a partir da análise de teses e dissertações defendidas sobre ciclos no Brasil, Jefferson Mainardes realiza uma revisão sistemática sobre o tema, identificando as principais tendências, contribuições e lacunas a ele relacionadas. Entre as recomendações apresentadas pelo autor, destacamos a necessidade de que as pesquisas, baseadas em evidências empíricas, realizem, com mais força, as articulações entre os casos particulares estudados e as determinações políticas mais amplas. Em "A organização escolar em ciclos e a questão da igualdade substantiva", Marília Gouvea de Miranda discute os fundamentos teóricos das propostas de ciclos, a partir do debate em torno do princípio da igualdade substantiva. No terceiro artigo desse conjunto, "A organização do ensino fundamental em ciclos: algumas questões", Ocimar Munhoz Alavarse, baseado na análise de algumas iniciativas de redes públicas de ensino e da literatura relativa à temática, discute aspectos relacionados à organização do ensino fundamental em ciclos e em séries. Os dois últimos artigos que compõem o conjunto sobre ciclos - "A implementação dos ciclos de formação em Porto Alegre: para além de uma discussão do espaço-tempo escolar", de Andréa Rosana Fetzner, e "Os ciclos de formação como alternativa para a inclusão escolar", de Ângela Dalben - retomam as discussões mais amplas sobre os fundamentos da organização da escola em ciclos e analisam as experiências de duas redes públicas de ensino que, ainda nos anos de 1980, produziram grande impacto em vários outros municípios brasileiros: Porto Alegre e Belo Horizonte.

Os demais artigos publicados neste número da revista podem ser apresentados em dois grupos. O primeiro deles focaliza aspectos da formação e da atuação dos professores. Em "Docência, cinema e televisão: questões sobre formação ética e estética", Rosa Maria Bueno Fischer, a partir da análise de filmes e de um programa de televisão e baseada nas ideias de Michel Foucault, argumenta que essas mídias podem se tornar elementos fundamentais no processo de formação estética dos docentes. Hildete Pereira dos Anjos e colaboradoras, por sua vez, em "A inclusão escolar do ponto de vista dos professores: o processo de constituição de um discurso", analisam como professores de Marabá, Pará, concebem a inclusão escolar e cotejam essas concepções com as diferentes matrizes teóricas que, historicamente, têm sido elaboradas a respeito do tema. O artigo "Formação de professores: aspectos históricos e teóricos do problema no contexto brasileiro", de Dermeval Saviani, traça um histórico da formação de professores no país e discute os dois modelos teóricos que nela têm predominado: o modelo dos conteúdos culturais-cognitivos e o modelo pedagógico-didático. São artigos, portanto, que, a partir de diferentes olhares, trazem subsídios para se pensar a formação e a atuação docentes, tanto do ponto de vista da pesquisa quanto da prática pedagógica. Embora não focalize, especificamente, os professores, o artigo de José Arimatea Bezerra, "Alimentação e escola: significados e implicações curriculares da merenda escolar", também contribui, de maneira relevante, para se pensar a escola. Por meio da análise dos discursos dos professores, alunos e pais, o autor busca identificar e analisar que significados essa instituição atribui à merenda escolar, tema ainda pouco estudado entre nós.

O segundo grupo de artigos traz elementos para um conhecimento mais aprofundado sobre os jovens que frequentam (ou frequentaram) escolas. Ao problematizar as relações entre educação, formação de identidades, sexualidade e juventude, o artigo "Jovens produzindo identidades sexuais", de Debbie Epstein e Richard Johnson, traz contribuições significativas para o debate em torno de uma problemática ainda insuficientemente investigada no Brasil. Em "O engajamento político dos jovens no movimento hip-hop", Rosangela Moreno e Ana Maria Almeida também contribuem, de modo substantivo, para o conhecimento mais aprofundado dos jovens que participam de movimentos empenhados em ações coletivas, como é o caso do hip-hop.

Na seção "Documento", publicamos a conferência de abertura da 31ª Reunião Anual da ANPEd, realizada em outubro de 2008, proferida por Roseli Fischmann, sobre "Constituição brasileira, direitos humanos e educação". Nela, a professora discute o tema da reunião, escolhido em virtude dos 20 anos da promulgação da Constituição brasileira e dos 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Na seção "Espaço Aberto", por sua vez, publicamos o artigo de Gaudêncio Frigotto, "A polissemia da categoria trabalho e a batalha das ideias nas sociedades de classe". Particularmente no GT de Trabalho e Educação da ANPEd, o debate em torno dos conceitos abordados pelo autor tem sido constante e acirrado. É nessa direção que decidimos torná-lo ainda mais público, podendo alcançar um número maior de pesquisadores que se interes sem pela temática. Por fim, na seção "Nota de leitura", complementando os artigos do primeiro grupo, publicamos informações e comentários sobre a série Ciclos em revista, que tem como objetivo socializar pesquisas e experiências sobre o sistema de ciclos.

Esperamos que os textos publicados neste número da revista contribuam para o aprofundamento do debate em torno dos temas abordados e suscitem a realização de novas investigações, fortalecendo a produção científica brasileira na área de educação e fornecendo elementos para a produção - no campo das políticas públicas e das práticas cotidianas - de uma educação de qualidade.

A Comissão Editorial

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Maio 2009
  • Data do Fascículo
    Abr 2009
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